SÃO PAULO
2009
JULIO CESAR GALVES GOMES MANGINI MOSQUEIRO
São Paulo
2009
2
BANCA EXAMINADORA:
Professor Orientador:________________________________
Professor Argüidor:_________________________________
Professor Argüidor:_________________________________
3
Aos meus filhos, minha inspiração, meu
chão, meu maior motivo, dedico meu
amor, este trabalho e minha vida.
4
Agradeço a Luciana que sempre
acreditou em mim e neste projeto; aos
meus pais, Renato e Nair, que me deram
a vida; a minha avó, Carmem, que me
proveu; ao meu avô, Isidoro, que me
serviu de exemplo de pessoa digna; aos
meus filhos que me motivaram e
agradeço também ao Tício e ao Caio, por
sofrerem todo tipo de sorte para que
possamos ter uma melhor compreensão
do Direito.
5
Se quisermos progredir, não devemos
repetir a história, mas fazer uma história
nova. M. Gandhi.
6
1 Resumo
7
2 Sumário
1 Resumo..................................................................................... 07
2 Sumário.....................................................................................08
3 Introdução................................................................................ 10
4 Evolução histórica: do Pátrio Poder ao Poder Familiar...... 11
4.1 Pátrio Poder na Roma Antiga................................................ 11
4.2 Antigo direito luso-brasileiro.................................................. 13
4.3 Constituição Republicana de 1891......................................... 16
4.4 Código Civil de 1916................................................................ 16
4.5 Estatuto da mulher casada...................................................... 19
4.6 Lei do divórcio......................................................................... 20
4.7 Constituição Federal de 1988..................................................22
4.8 Estatuto da Criança e do Adolescente................................... 23
4.9 Código Civil de 2002................................................................ 24
4.10 Lei da guarda compartilhada................................................. 25
4.11 Estatuto da Família................................................................. 29
5 Guarda e Convivência ............................................................ 34
5.1 A tirania do Guardião............................................................. 34
5.2 Modalidades de guarda........................................................... 36
5.2.1 Guarda mono parental, exclusiva e única............................. 36
5.2.2 Aninhamento ou nidação........................................................ 37
5.2.3 Guarda alternada.................................................................... 38
5.2.4 Guarda Compartilhada ou conjuntiva.................................. 38
5.3 Livre Visitação......................................................................... 41
5.4 Definição da guarda e convivência após a dissolução
Conjugal................................................................................... 42
5.5 A Mediação na disputa de Guarda e Convivência................45
6 Formas de exercício do Poder Familiar................................. 47
6.1 Exercício Exclusivo.................................................................. 48
8
6.2 Exercício Conjunto e Exercício Compartido........................ 48
6.3 Exercício Solidário................................................................... 49
6.4 Melhor Exercício...................................................................... 50
7 Síndrome da alienação Parental............................................. 52
7.1 Definição................................................................................... 53
7.2 Diagnósticos do DSM-IV relacionados à Síndrome de
Alienação Parental................................................................... 57
7.2.1 Diagnósticos aplicáveis a ambos os genitores e às
crianças com SAP.................................................................... 57
7.2.2 Diagnósticos aplicáveis a pais alienadores............................. 58
7.2.3 Diagnósticos do DSM-IV aplicáveis às crianças com SAP.. 59
7.2.4 Diagnósticos do DSM-IV aplicáveis aos pais alienados........ 60
7.3 Alienação pelo outro, segundo Lacan.................................... 61
8 O Movimento Social Organizado em busca da Igualdade
Parental..................................................................................... 64
8.1 APASE...................................................................................... 65
8.2 Pai Legal.Net............................................................................ 67
8.3 Pais por Justiça........................................................................ 68
9 Considerações Finais............................................................... 69
10 Bibliografia............................................................................... 71
9
3 Introdução
1
Entre outras.
2
451-449 a.C.
3
Do Pátrio Poder.
4
CRETELLA, J. J. Curso de Direito Romano..., cit. p. 112.
11
definição de estar ou não sob a patria potestas do paterfamilias dependia do status da
pessoa frente a essa família, como muito bem definiu Cretella:
Cretella nos mostra que um dos fatores mais importante para a definição do
status familiae é o advindo do casamento podendo este ser:
- cum manu, onde a mulher deixa seu antigo status familiae e passa para a situação de
alieni iuris, ou seja, sob a patria potestas do paterfamilias de seu marido, podendo ser
seu avô, seu pai, ou ele mesmo, caso este tenha o status familiae de sui iuris.
- sine manu, “que é aquele em que a mulher não cai sob o poder do marido” 6, ou de
seu paterfamilias, mantendo sua condição anterior ao casamento.
5
Idem, ibidem, p. 108.
6
Idem, ibidem, p. 119.
7
Reconhecimento civil do descendente, ou seja, do cognatio.
12
do filius a certas dignidades; abandono do filius pelo pater; perda da libertas ou da
civitas pelo pater.8
Segundo Venosa:
8
CRETELLA, J. J. Curso de Direito Romano..., cit. p. 117.
9
Patriarca.
10
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 23.
11
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado: Parte Especial..., cit., p.38-39
13
Este patriarcalismo que veio da Coroa Portuguesa se expressava nos senhores de
engenho e barões do café, que deixaram marcas indeléveis na história brasileira.12
José Virgílio Castelo Branco Rocha, nos mostra através de seus estudos as
principais características do pátrio poder no antigo direito luso-brasileiro: a) só o pai
exercia o pátrio poder, não competindo à mãe senão certos direitos relativos à
obediência filial; b) a maioridade iniciava aos 25 anos de idade, mas não cessava com
ela o pátrio poder se o filho continuasse sob a dependência do pai; c) o pátrio poder só
dizia respeito aos filhos legítimos e legitimados, não alcançando os naturais e os
espúrios; o pai podia nomear tutor aos filhos naturais, que eram chamados à sucessão
se o pai fosse peão.13
Quanto as atribuições do pai à pessoa dos filhos, Castelo Branco disse que
consistia em: a) educá-los e dar-lhes profissão, de acordo com a condição e posses do
pai; b) castigá-los moderadamente, e, se incorrigíveis, entregá-los aos magistrados de
polícia para os fazer recolher à cadeia por tempo razoável, obrigando-se a sustentá-los;
c) repeti-los de quem lhos subtraísse e proceder contra os que os pervertessem ou
concorressem para isso; d) exigir e aproveitar seus serviços, sem obrigação de soldada
ou salário, salvo se lhos prometeu; e) nomear-lhes tutor testamentário e designar as
pessoas que hão de compor o conselho de família; f) substituí-los pupilarmente; g)
defendê-los em juízo ou fora dele; h) contratar em nome do filho impúbere, quando o
contrato lhe pudesse vir de proveito, e intervir com sua autoridade nos contratos do
filho púbere.14
15
Idem, ibidem, p. 39-40.
16
ROCHA, José Virgílio Castelo Branco. O pátrio poder..., cit., p. 40-41.
17
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado: Parte Especial..., cit., p. 143.
15
Regra de significativa importância e que consistiu num marco da evolução do
pátrio poder, por deixar de considerá-lo como prerrogativa exclusivamente
masculina, ainda que o jugo do homem somente viesse a ser definitivamente
superado quase cem anos depois.18
4.3 Constituição Republicana de 1891
Todos são iguais perante a lei. A República não admite privilégios de nascimento,
desconhece foros de nobreza e extingue as ordens honoríficas existentes e todas as
suas prerrogativas e regalias, bem como os títulos nobiliárquicos e de conselho.
18
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 23.
19
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 26.
16
observar as considerações de José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José
Ferreira:
20
OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Direito de Família. Porto Alegre:
Fabris, 1990. p. 302.
21
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 26.
22
PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos de família..., cit., p.125
17
exerce o homem autoridade sobre a mulher.23 Esta visão pode ser entendida se
considerado o artigo 240 do Código Civil de 1916.24
23
BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil..., cit., p. 99-100.
24
CC/1916, art. 240: “A mulher assume, pelo casamento, com os apelidos do marido, a condição de sua
companheira, consorte e auxiliar nos encargos da família.”
25
CC/1916, art. 383: “O filho ilegítimo não reconhecido pelo pai fica sob o poder materno. Se, porém, a mãe não
for reconhecida, ou capaz de exercer o pátrio poder, dar-se-á tutor ao menor.”
26
CC/1916, art. 379: “Os filhos legítimos, os legitimados, os legalmente reconhecidos e os adotivos estão
sujeitos ao Pátrio Poder, enquanto menores.”
27
CC/1916, art. 385: “O pai e, na sua falta, a mãe são os administradores legais dos bens dos filhos que se achem
sob seu poder, salvo no disposto do art. 225.”
28
CC/1916, art. 389: “O usufruto dos bens dos filhos é inerente ao exercício do pátrio poder salvo a disposição
do art. 225.”
29
CC/1916, art. 390: “Excetuam-se (do usufruto): I – Os bens deixados ou doados ao filho com a exclusão do
usufruto paterno; II – Os bens deixados ao filho, para fim certo e determinado.”
CC/1916, art. 391: “Excluem-se assim do usufruto como da administração dos pais: I – Os bens adquiridos pelo
filho ilegítimo, antes do reconhecimento; II – Os adquiridos pelo filho em serviço militar, de magistério, ou em
qualquer outra função pública; III – Os deixados ou doados ao filho, sob a condição de não serem administrados
pelos pais; IV – Os bens que ao filho couberem na herança (art. 1.599), quando os pais forem excluídos da
sucessão (art. 1602).”
18
A dissolução da sociedade conjugal, independente da forma, seja pelo
desquite, seja pela anulação, não alterava a titularidade do Pátrio Poder, exceto quanto
a questão da guarda, sendo que, no caso de desquite amigável, deveria ser considerado
o que for pactuado entre os cônjuges31. Já no desquite judicial era previsto três
possibilidades distintas: a) Havendo cônjuge culpado, os filhos deveriam ficar com o
inocente; b) Sendo a culpa recíproca, adotou se como critério a lei do sexo, ou seja, até
os seis anos, os filhos ficariam com a mãe, após esta idade, os meninos passariam a
ficar sob a guarda do pai, enquanto que as meninas deveriam permanecer com a mãe,
para Comel este critério atendia o conservadorismo machista da época.32 Entretanto
ressalva-se, no artigo 327, a possibilidade de o juiz, em qualquer caso, estabelecer a
guarda dos filhos sem obedecer a essas regras, baseando-se no interesse e bem estar
dos filhos.33
30
CC/1916, art. 392: “Extingue-se o Pátrio Poder: I – pela morte dos pais ou do filho; II – Pela emancipação, nos
termos do parágrafo único do art. 9º, parte Geral; III – Pela maioridade; IV – Pela adoção.”
31
CC/1916, art. 325: “No caso de dissolução da sociedade conjugal por desquite amigável, observar-se-á o que
os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos.”
32
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 31.
33
CC/1916, art. 327: “Havendo motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos, regular, por
maneira diferente da estabelecida nos artigos anteriores, a situação deles para com os pais.
34
Lei n.º 4.121 de 27 de agosto de 1962.
35
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 33.
19
do artigo 38036 do Código Civil de 1916, dispositivo que perdurou até a promulgação
da Constituição Federal de 1988. Nota-se que ao final deste artigo esta disposto que
“na falta de um [...] passará o outro a exercê-lo com exclusividade”, então por lógica
que não havendo impedimento por partes dos genitores, o exercício do Pátrio Poder na
constância do casamento deverá ser exercido de forma conjunta. Comel considera que
esta mudança significou a aquisição, por parte da mulher, do direito subjetivo inerente
ao Pátrio Poder, levando em consideração que pelo fato de este ser atribuído ao
“marido em colaboração da mulher”, manteve-se a chefia da família pelo marido, só
que agora com a previsão da participação da mulher, ficando este fato evidenciado no
parágrafo único em que se prevê a predominância da vontade do marido sobre a
mulher, ainda que tenha ressalvado a mulher recorrer ao juiz para a solução da
divergência.37 Portanto em se tratando ao Pátrio Poder o pai continuava em primeiro
plano enquanto que à mulher cabia o papel de coadjuvante.
36
CC/1916, art. 380: “Durante o casamento, compete o Pátrio Poder aos pais, exercendo-o o marido com a
colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com
exclusividade.
Parágrafo único: Divergindo os progenitores quando ao exercício do Pátrio Poder, prevalecerá a decisão do pai,
ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz para a solução da divergência.”
37
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 34.
38
Lei n.º 6515 de 26 de dezembro de 1977.
39
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 36.
20
Para a dissolução amigável manteve-se ao que era previsto anteriormente,
qual seja a de respeitara decisão conjunta dos pais sobre a guarda dos filhos.40 Nos
casos de separação litigiosa e de anulação de casamento 41 definiu-se três
possibilidades: a guarda deverá ficar com o cônjuge inocente; havendo culpa recíproca
deverá ficar com a mãe; não sendo conveniente que fique com nenhum dos pais, os
filhos deveriam ficar sob a guarda a pessoa idônea da família de qualquer um dos
cônjuges.42
Outra modificação importante que esta lei trouxe, mesmo não sendo assunto
central deste trabalho, foi a respeito da equiparação dos filhos maiores inválidos aos
menores, com a finalidade de protegê-los quanto à guarda e aos alimentos. 44
O dispositivo inovador mais importante trazido por esta lei foi o que disse
respeito ao pai que não tem os filhos sob sua guarda, sendo introduzido,
expressamente, o direito de visita, de companhia e de fiscalização da manutenção e
educação, nos termos do artigo 15.45 Este Instituto até hoje é controverso, pois não há
que se falar em exercício de Poder Familiar se dele não emergir o direito de
40
LDi, art. 9º: “No caso de dissolução da sociedade conjugal pela separação judicial consensual (art. 4.º),
observar-se-á o que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos.”
41
LDi, art. 14: “Os casos de anulação de casamento são regulados da mesma forma que os de separação
litigiosa.”
42
LDI, art. 10: “Na separação judicial fundada no caput do art. 5.º, os filhos menores ficarão com o cônjuge que
a ela não houver dado causa.
§ 1.º Se pela separação judicial forem responsáveis ambos os cônjuges, os filhos menores ficarão em poder da
mãe, salvo se o juiz verificar que de tal solução possa advir prejuízo de ordem moral para eles.
§ 2.º Verificado que não devem os filhos permanecer em poder da mãe nem do pai, defirirá o juiz a sua guarda a
pessoa notoriamente idônea da família de qualquer dos cônjuges.”
43
LDi , art. 12: “Na separação judicial fundada no § 2.º do art. 5.º, o juiz deferirá a entrega dos filhos ao cônjuge
que estiver em condições de assumir, normalmente, a responsabilidade de sua guarda e educação.”
44
LDi, art. 16: “As disposições relativas à guarda e à prestação de alimentos aos filhos menores estendem-se aos
filhos maiores inválidos.”
45
LDi art. 15: “Os pais, em cuja guarda não estejam os filhos, poderão visitá-los e tê-los em sua companhia,
segundo fixar o juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.”
21
convivência e de acompanhar sua vida escolar e educacional, portanto, se a separação
não altera o Poder Familiar, exceto de ter os filhos em sua companhia, obviamente que
automaticamente deveria ser garantido uma convivência mínima para a manutenção
dos laços parentais e a participação efetiva na vida dos filhos, como o de ter acesso as
informações curriculares escolar.
Por ultimo, quanto a este tema, vale ressaltar que esta Lei conferiu ao juiz o
poder discricionário46 para, no interesse e a bem dos filhos, regular a guarda de
maneira diferente ao previsto em lei. Esta discricionariedade deslocou a guarda que
antes era simplesmente inerente ao Pátrio Poder para o melhor interesse da criança,
parâmetro que predomina até os dias atuais47.
46
LDi, art. 13: “se houver motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos, regular de maneira
diferente da estabelecida nos artigos anteriores a situação deles com os pais.”
47
Pelo menos na teoria.
48
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 39.
49
CF/1988, art. 5.º I; art. 226 § 3.º, 4.º, 5.º e 6.º; art. 227 § 6.º.
50
CF/1988, art. 5.º: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;”
22
de então, a igualdade jurídica entre homens e mulheres, repercutindo diretamente na
titularidade do Pátrio Poder, tendo sido expresso de forma mais especifica e taxativa
no artigo 226 § 5.º.51
51
CF/1988, art. 226 § 5.º: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo
homem e pela mulher.”
52
CF/1988, art.226 § 3.º: “Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”
53
CF/1988, art. 226 § 4.º: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos
pais e seus descendentes.”
54
CF/1988, art. 227, § 6.º: “Os filhos havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.”
55
Lei n.º 8.069 de 13 de julho de 1990.
56
ECA, art. 21: “O Pátrio Poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que
dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à
autoridade judiciária competente para a solução da divergência.”
23
Tal dispositivo reafirmou o exercício da função paterna em igualdade de
condições entre homem e a mulher, o que já determinara a Constituição Federal,
coibindo quaisquer discriminações, privilégios ou distinções entre eles, pois
investidos ambos nas prerrogativas inerentes a tal Instituto protetivo.57
59
Para analisarmos o Código Civil de 2002 é mister que lembremo-nos que
o Projeto de Lei que culminou neste código, teve início na Câmara dos Deputados em
1975, tramitou por cinco legislaturas, 60 ocorrendo, neste ínterim, os trabalhos
constituintes e a promulgação da nova Constituição de 1988.
57
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 46.
58
Idem, ibidem, p. 46.
59
Lei n.º 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
60
Duas na Câmara dos Deputados; duas no Senado Federal; e finalmente uma última na Câmara.
61
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 53.
24
equiparação dos filhos, já estavam previstos. Portanto coube ao novo Código Civil
disciplinar sobre o que já havia sido instituído na legislação anterior, principalmente
na Constituição de 1988.
Outra novidade trazida pelo novo Código Civil, que repercute diretamente
no Poder Familiar, diz respeito a antecipação da maioridade de 21 para 18 anos, sendo
que não há que se falar propriamente em inovação, já que a Constituição de 1988 já
previa a imputabilidade penal a partir dos 18 anos, bem como condição para
elegibilidade para o cargo de vereador, portanto não havia outra possibilidade à
legislação civil.62
É mister a análise individual dos dois artigos alterados a começar pelo 1.583
em que a redação antiga era:
62
Idem, ibidem, p. 73.
63
Lei n.º 11.698 de 13 de junho de 2.008.
64
Tomei emprestado esta expressão utilizada por Fraçoise Dolto, especialmente em seu livro: “Quando os pais
se separam”, sendo o contínuo aquele que tem o convívio permanente com o filho e o descontínuo o que tem
convivência esporádica, prevista no acordo de visitação. É salutar esta nomenclatura para se evitar a confusão já
que, na Guarda Compartilhada, ambos os genitores passam a ser guardiões, independente da posse ou convívio.
25
Passando a seguinte redação:
65
Normalmente papel designado à mãe
26
Continuando com a análise da Lei da Guarda Compartilhada, dizia o artigo
1.584 antes da alteração:
Decretada a separação judicial ou o divorcio, sem que haja entre as partes acordo
quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições
para exercê-la.
Parágrafo único. Verificando que os filhos não devem permanecer sob a guarda
do pai ou da mãe, o juiz deferirá a sua guarda à pessoa que revele compatibilidade
com a natureza da medida, de preferência levando em conta o grau de parentesco
e relação de afinidade e afetividade, de acordo com o disposto na lei específica.
66
Deirdre de Aquino Neiva, advogada e procuradora do Distrito Federal.
67
BARRETO, Lucas Hayne Dantas. Considerações sobre a guarda compartilhada . Jus Navigandi, Teresina, ano
7, n. 108, 19 out. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4352>. Acesso em: 19 jan.
2009.
68
UFBA
28
O Instituto da guarda compartilhada vem à baila para socorrer as deficiências
que outros modelos de guarda, principalmente o da guarda dividida - onde há o
tradicional sistema de visitas - possuem. Tais modelos, ao privilegiar
sobremaneira a mãe, na esmagadora maioria dos casos, levam a profundos
prejuízos aos filhos, tanto de ordem emocional quanto social, no seu
desenvolvimento. Estes revezes atingem também o próprio pai, cuja falta de
contato mais íntimo leva fatalmente a um enfraquecimento dos laços parentais,
privando-o do desejo de perpetuação de seus valores e cultura.69
69
BARRETO, Lucas Hayne Dantas. Considerações sobre a guarda compartilhada . Jus Navigandi, Teresina, ano
7, n. 108, 19 out. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4352>. Acesso em: 19 jan.
2009.
70
Projeto de Lei 2.285/07 de 25 de outubro de 2.007.
71
Instituto Brasileiro de Direito de Família
29
Rodrigo da Cunha Pereira 72 este projeto instalou novos paradigmas jurídicos para a
organização das famílias, por discutir assuntos polêmicos ignorados pelo Código
Civil, pois apesar de ter sido aprovado em 2002 este já nasceu ultrapassado, em
relação as concepções da família, segundo Pereira.73
Pelo fato de que o projeto de lei do Estatuto das Famílias lidar com questões
polêmicas, assim como na sociedade dentro do parlamento ele também angariou
partidários, como também encontrou resistências de alguns parlamentares. O Projeto
propõe alterações profundas na estrutura e no sistema jurídico que trata do Direito de
Família e ainda há um fator que dificulta o avanço legislativo, que são os apensos que
ele recebeu, pois os projetos de lei que foram apensados tratam de propostas polemicas
que mesmo sem configurar na proposta inicial do Estatuto da Família, por força de lei,
tiveram que tramitar conjuntamente por tratar de assuntos semelhantes.
No artigo 8775 que define a Autoridade Parental fica clara esta inovação,
pois antes mesmo de se definir a quem cabe a Autoridade, fala se no caput deste artigo
que a autoridade Parental deve ser exercida no melhor interesse dos filhos, sendo este
preceito reforçado no parágrafo segundo, que dá ao filho o direito de participar de seu
processo educacional, levando se em consideração seu nível de discernimento. Quanto
ao parágrafo terceiro, este, coroa a idéia da nova concepção da relação jurídica entre
pais e filhos trazida por este Projeto, ou seja, da idéia de autoridade com forte grau de
responsabilidade, sendo que esta nova concepção pode ser notada na possibilidade da
perda da Autoridade Parental, caso esta não seja exercida no melhor interesse do
filho76, bem como o seu restabelecimento também segue este princípio77.
74
PL/2.285/07 Titulo IV Da Filiação - Capítulo III – Da Autoridade Parental
75
PL/2.285/07, Art. 87: “A autoridade parental deve ser exercida no melhor interesse dos filhos.
§ 1.° Compete a autoridade parental aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro a exerce com
exclusividade.
§ 2.° O filho tem o direito de ser ouvido, nos limites de seu discernimento e na medida de seu processo
educacional.
§ 3.° Aos pais incumbe o dever de assistência moral e material, guarda, educação e formação dos filhos
menores.”
76
PL/ 2.285/07, Art. 94. “Perde por ato judicial a autoridade parental aquele que não a exercer no melhor
interesse do filho, em casos como assédio ou abuso sexual, violência física e abandono material, moral ou
afetivo.”
31
Em relação a titularidade da Autoridade Parental, prevista no parágrafo
primeiro do já mencionado artigo 87, não há nenhuma inovação ao que já esta previsto
na legislação atual, bem como quanto a situação da dissolução da união dos pais,
prevista no artigo 88.78
77
PL/2.285, Art. 95: “É possível, no melhor interesse do filho, o restabelecimento da autoridade parental por
meio de decisão judicial.”
78
PL/2.285/07, Art. 88: “A dissolução da entidade familiar não altera as relações entre pais e filhos.”
79
CC/2002, art. 1.637: “Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles
inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público,
adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder
familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença
irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.”
80
PL/2.285, Art. 91: “Constituindo os pais nova entidade familiar, os direitos e deveres decorrentes da
autoridade parental são exercidos com a colaboração do novo cônjuge ou convivente ou parceiro.
Parágrafo único. Cada cônjuge, convivente ou parceiro deve colaborar de modo apropriado no exercício da
autoridade parental, em relação aos filhos do outro, e representá-lo quando as circunstâncias o exigirem.”
81
CC/2002, art 1.636: “O pai ou a mãe que contrai novas núpcias, ou estabelece união estável, não perde, quanto
aos filhos do relaciona mento anterior, os direitos ao poder familiar, exercendo-os sem qualquer interferência do
novo cônjuge ou companheiro.”
82
Ou companheira.
83
Ou madrasta.
32
criança e do adolescente, papel este que muitas vezes é dificultado justamente pelo
seu não reconhecimento legal. Por outro lado, deve se tomar cuidado para que o
guardião tirano não utilize da pessoa do padrasto para consumar a SAP 84, pois se a
aprovação desta medida pode ajudar no dia a dia da nova família, por outro pode ser
uma porta de entrada da exclusão do genitor não guardião. É mister que se abra um
parêntese aqui, pois mesmo não fazendo parte do Projeto de Lei do Estatuto da Família
se faz necessário citar a lei 85 recentemente aprovada pelo Congresso que altera o art.
57 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para autorizar o enteado ou a enteada
a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta. Deve se ter cautela para
analisar esta nova possibilidade, pois assim como o reconhecimento da participação do
padrasto na vida do enteado, a possibilidade de adoção do nome deste, tanto pode ser o
reconhecimento de uma vida de dedicação e amor, como pode ser a consumação
injusta da Síndrome de Alienação Parental. Portanto é fundamental da avaliação do
caso concreto.
Por fim, ainda que pareça não ter relevância para o tema deste trabalho, pois
este visa analisar o Poder Familiar em respeito aos filhos, vale ressaltar que neste
Projeto de Lei, em um Capítulo e Título86 diferente do que se trata da Autoridade
Parental, especificamente, existem dois artigos que merecem nossa atenção.
Entende se que a guarda deriva do Poder Familiar e esta deve ser exercida
baseada no melhor interesse do menor, entretanto o fenômeno que ocorreu paralelo
com a luta por igualdade de gênero para o exercício parental foi o de um relativo
esvaziamento do Poder Familiar e uma hipertrofia do Instituto da Guarda, pois na
prática, exerce o Poder Familiar plenamente quem tem a guarda do menor, ou se
autorizado por quem a tenha.
Inúmeros são os atos tidos como tiranos por parte do Guardião sendo um
deles, e muito comum atualmente, o de mudança de domicilio sem consulta, ou pior,
sem nenhum aviso ao genitor não guardião, ficando este sem saber onde o filho reside,
conseqüente não podendo ter nenhum tipo de convivência com este. Para resguardar a
relação jurídica do genitor não guardião com o filho, o deputado federal Paulo
Baltazar89 apresentou um projeto de lei90 no ano de 2006 que tipificava como conduta
ilícita a mudança de endereço sem comunicação ao genitor não guardião, podendo o
genitor guardião ser penalizado com a perda da guarda, 91 mas infelizmente o Deputado
não obteve êxito na aprovação deste projeto, demonstrando o legislador, mais uma
vez, sua visão limitada e retrógrada.
89
Paulo César Baltazar da Nóbrega , deputado federal pelo PDT, estado do Rio de Janeiro.
90
Projeto de Lei 6937 de 2006.
91
PL/6937, art. 2.º: “Fica acrescentado o § 2º ao art. 1.584, da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, (Novo
Código Civil), renumerando-se o parágrafo único como § 1º, que passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1.584 ...
§ 2º A perda da guarda poderá ser determinada pelo juiz quando o o seu detentor mudar de residência sem a
devida comunicação ao genitor ou à justiça, no prazo de 15 dias.
92
Evandro Luiz Silva é psicólogo e Mestre em Psicologia, ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina,
com formação em Psicanálise. Mediador, Perito e Assistente Técnico em processos nas Varas de Família há mais
de 11 anos.
34
A guarda acaba por definir a quem caberá decidir tudo na vida da criança, bem
como responder por ela. Na guarda exclusiva, o cônjuge que a detém – cujas as
visitas ao filho são preestabelecidas - não pode interferir nas decisões tomadas
pelo cônjuge que a detém [...] .Embora alguns juízes e advogados discordem deste
entendimento, na prática é assim que acontece. [...] O Pátrio Poder ou Poder
Familiar são figuras inexpressivas na prática. 93
Não ter a guarda é quase como ficar de espectador na vida do filho, vendo o
guardião decidir tudo, tendo que pedir permissão para, por exemplo, ver o filho
além daquele dia de visita estipulado pelo juiz, que em muitos casos é quinzenal. A
relação, como o próprio termo inapropriado de “visita” propõe, é social e não
parental.95
93
SILVA, Evandro Luiz. Perícias psicológicas nas varas de família..., cit., p. 49.
94
SILVA, Evandro Luiz. Perícias psicológicas nas varas de família..., cit. 49.
95
Idem, ibidem, p.50
96
Teoricamente.
35
Síndrome de Alienação Parental97, assunto que discutiremos em um capítulo
especifico, mas não poderia deixar de ser citado aqui, pois ele é uma conseqüência dos
atos de tirania do guardião.
Obviamente que a tirania do guardião também pode ser exercida pelo pai,
pelos avôs, ou até por outros que fazem o papel de guardião, mas diante de outros
fatores e o protecionismo em demasia dado à mulher, faz com que este fenômeno
ocorra quase que totalitariamente decorrente dos atos espúrios da mãe guardiã.
A respeito das visitas muito bem frisou a insigne Dra. Maria Berenice
Dias99:
Desde que os genitores consigam se entender, fazendo com que a rotina não
seja radicalmente alterada, como morar em bairros próximos, por exemplo, esta
modalidade de guarda pode ser conveniente para o bom desenvolvimento da criança e
do adolescente., mas há que se considerar o caso concreto, não podendo ser uma regra
geral.
103
Leila Maria Torraca de Brito. Psicóloga, mestre e doutora em Psicologia pela PUC/RJ. Professora do IPUERJ
– UERJ.
104
BRITO, Leila Maria Torraca. Guarda compartilhada..., cit. P. 53.
39
que nem sempre é possível, nesses casos, buscar acordos, cabendo ao juiz – como
intérprete dos princípios que estruturam cada sociedade – a designação do
exercício unilateral de responsabilidades... ...Assim, entende-se que é justamente
quando o guardião interpõe obstáculos à participação daquele que não possui a
guarda que a determinação da Guarda Compartilhada vai marcar, ou definir o
primeiro, que ele não é o único na relação de parentalidade com a criança.105
Mas para isso o guardião contínuo deve facilitar este contato inclusive
respeitando as decisões que sejam convenientes serem tomadas conjuntamente.
Entendemos que muitas pessoas somente colaborarão para tal se constrangidos através
da possibilidade de sofrerem coerção, caso impeçam o outro genitor de exercer o
Poder Familiar, ainda que estando distante.
105
BRITO, Leila Maria Torraca. Guarda compartilhada..., cit. P. 61-62
106
Ou do guardião descontínuo.
40
Portanto percebe-se que a Guarda Compartilhada é a melhor alternativa para
a possibilidade de uma melhor convivência bem como um justo e equilibrado exercício
do Poder Familiar, independentemente da situação de entendimento entre os genitores
ou mesmo a distância entre as residências destes. Entretanto é salutar que reflitamos
sobre a importância da valorização do Poder Familiar, independentemente da
modalidade de guarda, lembrando que este Instituto deveria imperar sobre a guarda,
mas infelizmente sucumbiu a ela.
A livre visitação, apesar de não ser prevista em nosso ordenamento, pode ser
pactuada entre os genitores. Sendo motivo de discórdia entre os profissionais de
psicologia, pois enquanto que alguns acreditam que é a única forma de manter uma
relação isonômica entre os genitores e filhos, outros acreditam que gera instabilidade
na relação dos filhos com o guardião contínuo, inclusive atrapalhando a vida social
deste.
Quanto a questão legal nada impede que os genitores acordem para a livre
visitação, mas não há que se falar que esta modalidade de convivência possa ser
imposta pelo Estado.
107
Eliana Riberti Nazareth; Psicóloga; psicanalista; terapeuta de família e de casal; mediadora.
108
NAZARETH, E.R. In. GRISARD FILHO, W. et al. Guarda Compartilhada... cit. p. 94.
42
partir do estabelecimento do saber científico da Psicologia que houve a demanda
para a Psicologia Jurídica. Assim, se entendermos por Psicologia a ciência que
estuda os processos mentais e o comportamento humano, poderíamos definir a
Psicologia Jurídica como a ciência que vem estabelecer e descrever relações entre
os processos mentais e comportamentos do homem em relação ao que é legal, que
é justo, que está dentro da ordem do Direito.109
109
SILVA, Evandro Luiz. Perícias psicológicas nas varas de família..., cit., p. 10.
110
Juridicamente conhecido como regulamentação de visitas.
111
In SHINE, Sidney. Avaliação Psicológica e a Lei, 2008, p. 31-32.
43
São Paulo. Comparando com outras pesquisas realizadas no Recife e na
Espanha, as autoras concluem que a concordância das decisões com os laudos
periciais são quase unânimes.112
112
SILVA, Evandro Luiz. Perícias psicológicas nas varas de família..., cit., p. 16.
113
Sidney Kiyoshi Shine, psicólogo (USP 1983), Psicanalista (Sedes Sapientiae 1992), especialista em
Psicologia da Criança e Estudo psicanalítico da relação do casal pela Clínica Tavistock (1995)
44
tentativa e erro ou aproximações sucessivas a partir daquilo que se reconhece.
No nosso caso, avaliação psicológica para determinação de guarda é o modelo
clínico (A literatura faz referência à psicologia experimental no que diz respeito
aos processos de percepção aplicados ao testemunho). A dificuldade maior do
psicólogo é poder fazer bom uso do modelo clínico em função do que percebe ser a
questão legal (disputa de guarda) e a sua função institucional (perícia).114
Contribuindo para esta reflexão Eduardo Ponte Brandão 115 traz outro
elemento ao debate que é a questão da necessidade do entrosamento da Psicologia e o
Direito, sobre isto Brandão faz a seguinte afirmação:
114
SHINE, Sidney. A espada de Salomão..., cit. P. 242-243
115
Eduardo Ponte Brandão, psicólogo, mestre em Psicologia (PUC-RJ), psicólogo do Poder Judiciário/RJ.
116
BRANDÃO, E. P.. (Org.) Psicologia Jurídica no Brasil....cit. p.51
45
alternativa mais viável, sendo que para isto fatalmente tem que, não só abrir mão de
alguns interesses particulares, como rever alguns conceitos. Para contribuir a isto os
profissionais do Direito, em sua formação, são preparados para aturar no litígio, se
compararmos a carga horária das disciplinas “preparatórias para o embate” com a
carga horária das disciplinas que ensinam uma via alternativa de resolução de
conflitos117 perceberemos que o operador do Direito se forma “para a briga”, isto
acaba sendo mais um fator contra a igualdade parental, pois o cônjuge ferido que quer
se vingar do outro através dos filhos precisa de alguém que lhe abra os olhos
mostrando outras alternativas e não que concorde com suas mazelas ou, pior, acabe
incentivando sua insanidade. Por isso a mediação é a melhor via para a pacificação das
partes, sem imposições e sim com conscientização. Um famoso advogado defendeu a
Mediação a mais de cem anos atrás, infelizmente ele não conseguiu influenciar seus
colegas da mesma forma que influenciou as pessoas de uma forma geral, assim disse
Mahatma Gandhi118:
117
Como a Mediação e Conciliação, por exemplo.
118
Mohandas Karamchand Gandhi. 1869/1948.
119
Disponível em: < http://www.pensador.info/p/frases_de_mahatma_gandhi/1/>. Acesso em: 10 nov. 2008.
46
separação, entre outro. Estamos acostumados a delegar responsabilidades.
Estamos habituados, quando nos vemos em situação de conflito, a, por exemplo,
esperar que o Estado, representado por um juiz, nos diga e determine o que fazer
por meio de uma sentença judicial. Um Sistema que desempenha a função
complementar de interferir exageradamente promove a dissociação de qualidades
fundamentais dos seres humanos que se referem a planos diferentes do existir.
Impede que se dê a necessária aproximação entre aspectos de quem se concebe
como indivíduo autônomo, autor de sua história e de seu destino e cidadão, autor
de seus atos sociais.120
120
NAZARETH, E.R. In. GRISARD FILHO, W. et al. Guarda Compartilhada... cit. p. 94-95.
121
Que é de titularidade simétrica entre os genitores independente de quem tem o filho sobre os seus cuidados.
47
6.1 Exercício Exclusivo
Os atos complexos e que tem uma relativa perpetuidade merece uma atuação
conjunta dos genitores, não se admitindo um agir sem a concordância do outro.
Imaginando que para os atos mais corriqueiros não fosse dispensada a necessidade de
atuação conjunta causaria um verdadeiro pandemônio dificultando o dia a dia desse
menor, podemos aceitar o exercício compartido, em que um executa, mas o outro
valida este ato, ainda que de forma tácita. Entretanto alguns atos como: permissão para
casamento; adoção; emancipação, entre outros, que não se imagina que possa ser
122
CC/2002, art. 1.631: “Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou
impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.”
48
realizado unilateralmente, mas não são somente estes que deveriam ser praticados
conjuntamente, pois deveríamos considerar como efeitos perpétuos, por exemplo, a
escola em que a criança estuda; a religião praticada; a participação em processo de
psicoterapia; mudança da residência para outra comarca; bem como situações em que
influenciam definitivamente a vida da criança.
49
obrigação, que não podem ser fracionados e devem ser sempre considerados na
totalidade. Nesse sentido, então, tem-se que o exercício solidário do Poder
Familiar é aqueele em que cada um dos pais pode desempenhá-lo sozinho,
independentemente de concordância ou participação do outro, uma vez que é
123
detentor da totalidade.
Não há uma unanimidade doutrinária para esta nomenclatura, mas boa parte
entende que o exercício solidário é aquele em que se pratica isoladamente o ato,
tomando para si a responsabilidade total do Poder Familiar, obviamente que o a
maioria dos atos parentais são aqueles corriqueiros normais de convivência, e não há
que se imaginar que para todo ato precisaria pedir a anuência do genitor ausente, mas
sim que existe a aprovação por presunção. No exercício solidário há a carência da
presunção assim como da aprovação ainda que de forma tácita, pois a existência do
outro é desconsiderada.
124
MELLO, C. A. B. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade... cit, p. 10-11
51
que a mulher deveria incorporar na própria personalidade, para ser igual ao
homem.125
Não podemos afirmar com certeza se foi este equívoco que levou à
aproximação dos papéis sociais: masculino e feminino, mas com certeza foi um dos
principais fatores. Obviamente que isto refletiu na quebra da divisão do papel do pai e
o da mãe, mas não podemos esquecer que dificilmente nos tornaremos seres
andrógenos, ou seja, sempre haverá diferenças. Bem como sempre existirá a diferença
na função de pai em relação a função de mãe, mas isto não significa que não possa
ocorrer adaptações bem sucedidas no desempenho dessas funções, entretanto um ser
humano é concebido por uma mãe e por um pai e deles ele se torna dependente, de
várias maneiras, não só para seu desenvolvimento físico e intelectual, mas também
para seu desenvolvimento psíquico e emocional, portanto a melhor forma de exercício
do Poder Familiar é aquela em que tanto o pai quanto a mãe possam participar da vida
do filho e dar o melhor de si a ele.
125
COMEL, Denise Damo. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 190
126
PEREIRA, R. C. Direito de Família..., cit, p.115.
52
7.1 Definição
127
IN. Gardner, R. A. (1985a), Recent trends in divorce and custody litigation. The Academy
Forum, 29(2):3-7.
128
Richard A. Gardner: Psiquiatra, professor titular do Departamento de Psiquiatria Infantil da Faculdade de
Medicina e Cirurgia da Universidade de Columbia, New York, New York, EUA.
129
Ou outro genitor; ou os dois genitores, se a guarda esta com terceiros.
130
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 02
131
Psicose; perversão; borderline; histeria; Transtorno obsessivo compulsivo.
53
Muitos questionam sobre o uso termo “síndrome”, sendo que atualmente, e
principalmente, os advogados evitam utilizar este termo nas petições, temendo o risco
de não serem considerados pelos magistrados, portanto utilizando somente a expressão
“alienação parental”.
132
Fobias; paranóias; obsessões, etc.
133
Igor Nazarovicz Xaxá, Bacharel em Direito; militante do movimento que luta pela igualdade parental; pai da
Anna Júlia.
134
XAXÁ, I. N. A Síndrome de Alienação Parental e o Poder Judiciário... cit. p. 19.
54
que pelo fato de ainda não existir um reconhecimento formal pelos órgãos oficiais de
catalogação internacional de doenças, esta não deva, ainda, ser definida como uma
síndrome. Neste sentido afirmou Alexandra Ullmann 135:
135
Alexandra Ullmann Teixeira Lima: Psicóloga; advogada; militante na área da Família.
136
ULLMANN, A. IN: XAXÁ, I. N. A Síndrome de Alienação Parental... cit, p. 19
137
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 04.
138
Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais – quarta edição (Diagnostic and Statistical Manual of
Mental Disorders - Fourth Edition) publicado pela Associação Psiquiátrica Americana (APA) em Washington
em (1994), corresponde à quarta versão do DSM e é a principal referência de diagnóstico para os profissionais de
saúde mental dos Estados Unidos da América e de Portugal na prática clínica.
139
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 04.
140
DSM – V. Nova versão a ser publicada em breve.
55
Outra defesa que Gardner faz sobre o equívoco de não se querer utilizar o
termo “síndrome”, diz respeito ao afastamento do entendimento desta denominação
sobre o prisma do senso comum e consideração como o fenômeno é conhecido dentro
da área da saúde, qual seja, de que uma síndrome é uma doença que tem um grupo de
sintomas múltiplos que ocorrem em grupo e tem uma especificidade em causa
subjacente, podemos melhor entender através da explicação do próprio Gardner:
Alguns que preferem usar o termo Alienação Parental (AP) alegam que a SAP
não é realmente uma síndrome. Essa posição é especialmente vista nos tribunais
de justiça, no contexto de disputas de custódia de crianças. Uma síndrome, pela
definição médica, é um conjunto de sintomas que ocorrem juntos, e que
caracterizam uma doença específica. Embora aparentemente os sintomas sejam
desconectados entre si, justifica-se que sejam agrupados por causa de uma
etiologia comum ou causa subjacente básica. Além disso, há uma consistência no
que diz respeito a tal conjunto naquela, em que a maioria (se não todos) os
sintomas aparecem juntos. O termo síndrome é mais específico do que o termo
relacionado a doença. Uma doença é geralmente um termo mais geral, porque
pode haver muitas causas para uma doença particular. Por exemplo, a
pneumonia é uma doença, mas há muitos tipos de pneumonia- p.ex., pneumonia
pneumocócica e broncopneumonia - cada uma delas tem sintomas mais
específicos, e cada qual poderia razoavelmente ser considerado uma síndrome
(embora não haja o costume de se utilizar comumente esse termo).141
141
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 02-03.
142
Idem, ibidem. P. 02.
143
Normalmente o guardião ou quem faz o papel de cuidador.
56
Segundo Gardner a SAP pode ser dividida em três níveis sendo eles o leve;
moderado e severo. Os principais sintomas que a criança apresenta são: campanha
denegritória contra o genitor alienado; racionalizações fracas, absurdas ou frívolas
para a depreciação; falta de ambivalência; fenômeno do “pensador independente”;
apoio automático ao genitor alienador no conflito parental; ausência de culpa sobre a
crueldade a e/ou a exploração contra o genitor alienado; a presença de encenações
„encomendadas‟; propagação da animosidade aos amigos e/ou à família extensa do
genitor alienado144. Vale lembrar que, nos casos leves, esses sintomas podem não
ocorrerem em sua totalidade, mas com a progressão para o moderado ou severo, a
possibilidade da ocorrência da maioria, ou totalidade, dos sintomas é muito alta.
144
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 03.
57
A primeira relação feita pro Gardner foi em relação ao Transtorno psicótico
compartilhado145, fenômeno em que ocorre o compartilhamento psíquico da ideação
paranóide, esta hipótese é muito bem explicada por Gardner desta forma:
Outra relação está na questão dos problemas nas relações pais e filhos147
propriamente dita, que é prevista no manual.
145
DSM-IV: 297.3 Transtorno psicótico compartilhado. A. Um delírio acontece em um indivíduo no contexto de
uma relação próxima com outra pessoa(s) que esteja com um delírio já estabelecido. B. O delírio é similar em
conteúdo ao daquela da pessoa que já está com o delírio estabelecido.
146
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 09.
147
DSM-IV. V61. 20. Problema nas relações Pais – filhos.
148
DSM-IV. 297.71 Transtorno delirante. A. Delírios não-bizarros (isso é, envolvendo situações que ocorrem na
vida real, tais como ser seguido, envenenado, contaminado, ser amado à distância, ser traído pela esposa ou
amante, ou ter uma doença) com a duração de pelo menos 1 mês.
149
DSM-IV. 301.0 Transtorno de personalidade paranóide. A. Uma desconfiança e uma suspeita difusas dos
outros tais que seus motivos são sempre interpretados como malévolos, começando na idade adulta e presentes
em uma variedade de contextos, sendo indicado por quatro (ou mais) do seguintes sintomas: 1. ter suspeitas, sem
base suficiente, de que os outros são exploradores, prejudiciais, ou que o estão enganando;
58
Segundo Gardner, no caso dos alienadores, estes transtornos podem
apresentar sintomas antes dos eventos que acarretam a SAP, normalmente eclodindo
com o fim do relacionamento com o outro genitor, ou, caso apareçam antes da
separação, sendo a causa, inclusive, da própria separação.151
2. ficar preocupado, com dúvidas injustificadas, sobre a lealdade ou a confiabilidade dos amigos ou colegas;
3. ficar relutante em confiar nos outros por causa do medo despropositado de que a informação seja usada de
forma maliciosa contra si; 4. ler significados aviltadores ou ameaçadores escondidos em observações ou em
eventos benignos; 5. carregar persistentemente rancores, isto é, ser implacável com insultos, ofensas ou deslizes.
6. perceber ataques ao seu caráter ou reputação que não são aparentes aos outros e ser rápido em reagir
irritadamente ou contra-atacar; 7. ter suspeitas periódicas, sem justificação, a respeito da fidelidade do
esposo ou do parceiro sexual.
150
DSM-IV. 301.83 Transtorno de personalidade borderline (TPB)
151
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 14.
152
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 14-17.
153
DSM- IV. 312.8 Transtorno de conduta: A. Um padrão de comportamento repetitivo e persistente no qual os
direitos básicos dos outros, assim como normas/regras sociais importantes, adequadas à idade, são violados.
Manifestado pela presença de três (ou mais) dos seguintes critérios nos 12 meses anteriores, com a presença de
pelo menos um dos critérios nos últimos 6 meses: a. Agressão às pessoas e aos animais; b. destruição de
propriedade; c. defraudação ou furto; d. sérias violações de regras.
154
DSM-IV. 309.21 Transtorno de ansiedade de separação A. Ansiedade inadequada e excessiva envolvendo o
afastamento de casa ou de figuras importantes de vinculação, evidenciado por três (ou mais) dos seguintes
sintomas: a. aflição excessiva e recorrente frente à ocorrência ou previsão de afastamento de casa ou de figuras
importantes de vinculação; b. relutância ou recusa persistente em ir à escola ou a qualquer outro lugar em razão
59
finalmente, o transtorno de ajustamento, principalmente em seus subtipos: com
humor deprimido156; com ansiedade157; combinado com ansiedade e humor
deprimido158; com alteração de conduta159; combinado com alteração das emoções e de
conduta160.
do medo da separação; c. repetidas queixas de sintomas somáticos (tais como dores de cabeça, de estômago,
náusea ou vômito) quando a separação de figuras importantes de vinculação ocorre ou é prevista.
155
DSM-IV. 300.15 Transtorno dissociativo não especificado: Essa categoria inclui os transtornos em que a
característica predominante é um sintoma dissociativo (isto é, um rompimento nas funções geralmente integradas
da consciência, memória, identidade ou percepção do ambiente) que não encontre os critérios para nenhum
transtorno dissociativo específico. Os exemplos incluem estados de dissociação que ocorrem nos indivíduos que
foram sujeitos a períodos de persuasão prolongada e coercitiva (por exemplo: lavagem cerebral, reforma do
pensamento ou doutrinação quando cativo).
156
DSM-IV. 309.0 Transtornos de ajustamento com humor deprimido.
157
DSM-IV. 309.24 Transtornos de ajustamento com ansiedade.
158
DSM-IV. 309.28 Transtornos de ajustamento combinado com ansiedade e humor deprimido.
159
DSM-IV. 309.3 Transtornos de ajustamento com alteração de conduta.
160
DSM-IV. 309.4 Transtornos de ajustamento combinado com alteração das emoções e de conduta
161
GARDNER, Richard A. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental
(SAP)? Trad. Rita Rafaeli... cit. pag. 17-18.
162
DSM-IV. 301.82 Transtorno de personalidade esquiva.
163
DSM-IV 301.6 Transtorno de personalidade dependente.
60
7.3 Alienação pelo outro, segundo Lacan e sua tipificação
164
O ser não se julga completo e sim como parte do outro e assim dependente dele.
165
Bruce Fink: Psicanalista; professor adjunto de Psicologia da Duquesne University.
166
FINK, B. O sujeito lacaniano... cit. p. 9-10
61
desejo de nossos pais, imaginemos então a potencialidade alienadora que uma mãe
com a guarda exclusiva e com a complacência do Poder Judiciário pode ter sobre uma
criança! Pode parecer uma preposição por demais determinista na visão de alguns
leigos, mas esta teoria psicanalítica merece nossa atenção, principalmente pelo fato de
que ela nos ajuda a compreender a SAP, para tanto, vejamos um exemplo trazido por
Fink:
Vamos imaginar, e esta é uma história puramente fictícia, que Albert Einstein
ouviu por acaso uma conversa, que talvez não fosse para ser ouvida por ele, onde
o pai dizia para a mãe: “Ele nunca será nada”, e sua mãe concordava, dizendo:
“É verdade; ele é preguiçoso como o pai dele.” Podemos imaginar que Albert não
era ainda crescido o suficiente para entender todo o significado das palavras ou
adivinhar seu sentido. No entanto, elas acabaram sendo armazenadas em algum
lugar e ficaram adormecidas pro muitos anos, para somente serem reativadas e
atormentá-lo de forma implacável quando ele tentava progredir na escola
secundária. Por fim, as palavras adquiriram sentido e causaram sua reprovação
em matemática na escola secundária – esta parte da história é aparentemente
verdadeira – embora a ele não faltasse, com certeza, capacidade para
compreender a matéria.167
167
FINK, B. O sujeito lacaniano... cit. p. 27.
168
Período de grande importância da função de pai.
62
“Meus pais se separaram quando eu tinha dois anos de idade. Minha mãe
rasgou todas as fotos. Eu não sabia nada sobre ele, não tinha lembranças. Ela
dizia que ele não prestava, tinha traído e tentado matá-la. Quando eu tinha uns
oito anos, meu pai foi nos visitar. Foi um encontro estranho e tenso. Estava com
raiva daquele homem. Quando minha mãe disse que ele voltaria no jantar do
dia seguinte, fiquei ansiosa. Bolei perguntas. Quando ele não apareceu, minha
mãe falou: “tá vendo, não disse que ele não prestava? Ele veio aqui apenas para
diminuir a pensão”. Na verdade, minha mãe combinara com ele de nos levar
(eu e minha irmã) para a praia. Ele ficou no sol nos esperando e não
aparecemos. Nunca mais voltou. Minha mãe disse a ele que era melhor se
afastar porque sua visita fez muito mal a nossa estabilidade emocional. Sobre a
pensão, também era uma mentira. Minha mãe havia se casado novamente, mas
não tinha avisado o meu pai que continuava a lhe pagar pensão e, neste
episódio, além de nos visitar requereu à Justiça a exoneração. Só fui
reencontrar meu pai onze anos mais tarde, aos 19 anos de idade, nos EUA,
onde ele morava com a segunda esposa e seus filhos. E isso só foi possível
porque eu rompi com a minha mãe. Hoje em dia, posso dizer que meu pai é
meu confidente, amigo e companheiro de todos os momentos. Foi um
relacionamento construído em base mais sólida, a verdade. Muita gente acha
que as mulheres fazem isso porque são possessivas em relação aos filhos ou que
é só vingança contra o ex-marido, mas que as crianças são bem tratadas. É
falso. Uma pessoa que faz isso não respeita o filho com o ser humano. Um
genitor que é capaz de alienar também comete maus tratos sem maiores
pudores. Já ultrapassou o limite da moralidade mesmo”. Karla, Jornalista.
Brasília – DF Filha de Sócrates169
Notamos pelo depoimento de Karla que o relacionamento com o seu pai foi
retomado, ou seja, assim como no exemplo anterior, a alienação foi superada, pelo
menos no que diz respeito a sua essência, mas não é por isso que podemos
desqualificar o quanto ela deve ter sofrido, o quanto isto deve ter afetado sua auto
estima, seus relacionamentos interpessoais, seus sonhos ou mesmo sua visão de
mundo. Não podemos aqui dar respostas a estas dúvidas, seria leviana tal tentativa,
mas podemos imaginar que assim como Albert, Karla sofreu muito, e ainda pode
169
In: XAXÁ, I. N. A Síndrome de Alienação Parental e o Poder Judiciário... cit. p. 69-70
63
sofrer por conseqüência de sua alienação, mesmo que ela não saiba que a dor é
decorrente dela, ainda que, teoricamente, superada.
8.1 APASE174
172
MSN; Skype e outros.
173
Ou melhor seria dizer: que sofrem com a tirania do guardião.
174
Associação de pais e mães separados.
175
Principalmente de seu Presidente Analdino Rodrigues Paulino.
65
Guarda Compartilhada176 e agora na luta pela aprovação do Projeto de Lei 177 que
tipifica os atos e condutas que acarretam a SAP.
176
Lei n.º 11.698 de 13 de junho de 2.008. Já abordada neste trabalho.
177
PL/4053/2008. Já mencionado neste trabalho.
178
www.apase.org.br
179
Nossa história. Disponível em: < http://www.apase.org.br/>. Acesso em: 19 jan. 2009.
66
8.2 Pai Legal.Net
180
www.pailegal.net
181
Homem & Pai.
67
promoção do debate, da investigação e do estudo cético da paternidade e da
guarda compartilhada. Nos acessam profissionais, professores e estudantes que
usam para inspiração e referencia em seus trabalhos, o material vivo expresso
no grupo de discussão como também opiniões, análises e teses publicadas no
site. Cooperamos e estimulamos outras associações com fins de promoção do
debate nacional e a reformulação do código civil, que apesar de ter removido o
arcáico privilégio da mãe em relação a guarda dos filhos, deixa um vácuo onde
podem ocorrer muitas injustiças, principalmente ao pai participativo. Além do
material científico existente no PaiLegal muitos textos são opiniões próprias
derivadas de experiências pessoais. Por ser a Guarda Compartilhada um
modelo ainda novo no Brasil a existência de ambos tipos de textos se faz
necessária para poder fomentar o debate e estimular as ações. Use os nossos
recursos. Conte comigo e os profissionais e entusiastas da paternidade que
formam a Equipe PaiLegal. Somos todos voluntários e trabalhando para, junto
com você, conseguirmos deixar um mundo mais justo para os nossos filhos. Dê
a sua opinião e faça sugestões, enfim - participe! Juntos, vamos ajudar o pai a
ser cada vez mais legal. De um pai participativo na vida de seus filhos, que sabe
o quanto amor temos para dar e a dor de se ter subtraído o direito de criar
nossos filhos,.182
A ONG Pais por Justiça, nome inspirado no grupo de pais de Londres que
tornaram notória a luta pela convivência com os filhos ao escalarem prédios públicos
fantasiados de super heróis. Com participantes em vários estados brasileiros este
movimento nasceu da indignação de um grupo de pais que se viram em situação
semelhante de não poder participar da vida do filho. Esta ONG nasceu de uma
comunidade do Orkut em 2007, e, inicialmente, motivou vários pais a ir à luta, mas
infelizmente pela falta de resultados práticos e devido ao intenso sofrimento a que
estavam expostos, os dirigentes deste movimento não conseguiram dar continuidade a
proposta inicial. Isto não acontece somente com a “Pais Por Justiça”, este paradoxo
trágico ronda todas as ONGs que lutam pela igualdade parental, qual seja: os motivos
que faz com que os pais vão a luta são os mesmos que os imobilizam ou que impeçam
182
Quem somos. Disponível em: < http://www.pailegal.net/quemsomos.asp>. Acesso em: 30 jan. 2009.
68
que eles possam se organizarem ou interagirem, isto por falta de tolerância ou fé no
outro. Fácil julgar e condenar as pessoas que estão em situação de extremo sofrimento,
difícil e entender e tolerar a pessoa por sua condição. Pois perder a fé nas instituições é
o mesmo que perder a fé em si mesmo, assim como perder a fé no outro, ainda que
este outro esteja em situação similar, pois, como já dito, já não se acredita em si
mesmo e o outro sou eu.
9 Considerações finais
Paz e bem!
70
10 Bibliografia
COMEL, D. D. Do poder familiar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
FINK, B. Trad. Maria de Lourdes Sette Câmara. O sujeito Lacaniano: entre a linguagem e o
gozo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
72