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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriarñ)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).
Esta necessidade de darmos
conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste site Pergunte e
Responderemos propóe aos seus leitores-
aborda questoes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
disslpem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.


Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR


Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e
passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteudo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados
ANO XXXVII JULHO 1996 410)
A Igreja, Minha Máe ':

"A Biblia. Matyah (O Evangelho segundo Mateusj"," ;••;?


porAndréChoüraqui '

"Os anos obscuros de Jesús" - . ■■',

"Jesús viveu na india"?, por HolgerKersten


"O Catecismo da Igreja Católica e nossa Catequesé",;
por Wolfgang Gruen ' •

As duas Meninas que Impressionam o Mundo

O Culto a Satanás

Impotencia Como Impedimento Matrimonial


PERGUNTE E RESPONDEREMOS
JULHO1996
Publicacáo Mensal
N°410

Diretor Responsável SUMARIO


EstévSo Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia
A Igreja, Minha MSe 289
publicada neste periódico
Utn Judeu traduz o Evangelho:
'A Biblia. Matyah (O Evangelho segundo
Dlretor-Adminislrador: Mateus)", por André Chouraqui 290
D. Hildebrando P. Martins OSB
Sensacionalismo:
"Os Anos Obscuros de Jesús" 298
Administrado e distribuido:
Imaginacao Tendenciosa:
Edicoes "Lumen Christí"
"Jesús viveu na india'?, por
Rúa Oom Gerardo, 40 - 5* andar - sala 501 Holger Kersten 302
Tel.: (021) 291-7122
Livro Polémico:
Fax (021) 263-5679
"O Catecismo da Igreja Católica e
nossa Catequese", por
Endereco para correspondencia: Wolfgang Gruen 316
Ed. "Lumen Christi"
Caixa Postal 2666 Siamesas e felizes:
As duas Meninas que Impressionam
Cep 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ o Mundo 325

Mesmo em nossos Días:


Impressao e EncademacSo O Culto a Satanás 329
Elucidando Equívocos:
"Impotencia como Impedimento
Matrimonial 335

"MARQUES SARAIVA"
GRÁFICOS E EDITORES Uda. COM APROVACAO ECLESIÁSTICA
Tais.: (021) 273-9498 /273-9447

NO PRÓXIMO NÚMERO:

Existe o Destino? - "Por que Mana chora?" - Congelamento de Seres Humanos:


sim ou nio? - Manipulacao da Vida. - "A Biblia. No Principio" (A. Chouraqui). - "A
Igreja de Jesús" (Rufino Velasco).

(PARA RENOVACÁO OU NOVA ASSINATURA: R$ 28,00).


(NÚMERO AVULSO R$ 2,80).

-O pagamento poderá ser á sua escolha:-

1. Enviar EM CARTA cheque nominal ao Mosteiro de Sao Bento do Rio dé Janeiro, cruzado, ano
tando no verso: "VÁLIDO SOMENTE PARA DEPOSITO NA CONTA DO FAVORECIDO" e,
onde consta "Cód. da Ag. e o N° da C\C, anotar: 0229 -02011469-5.

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Rio de Janeiro, enviando, a, seguir, xerox da guia de depósito para nosso controle.

3. VALE POSTAL pagável na Ag! Central 52004 - Cep 20001-970 - Rio.


Sendo novo Assinante, é favor enviar carta com nome « endereco legiveis.
\ Sendo renovacao
^ *
A IGREJA, MINHA MÁE
Existe na rica Tradicao crista urna firmacSo de S. Cipriano, Bispo de Cartago
e mártir (t 258), que talvez surpreenda muitos cristáos de nossos dias: "Nao
pode ter Deus como Pai quem nao tenha a Igreja por máe" (De Catholicae
Ecctesiae Unitate, c. 6). Estas palavras foram escritas numa época turbulenta,
em que S. Cipriano se via frente a duas tentativas de ruptura da Igreja; para ele,
a fidelidade á Igreja era a fidelidade a Deus Pai; serfilho do Pai Celeste é ser'
filho da Igreja.-Como entenderisto?

O Evangelho nos diz que "ninguém vai ao Pai senao por Cristo" (Jo 14,6),...
Cristo que é inseparável do seu corpo eclesial ou da sua Igreja (cf. Cl 1,24). O
misterio da Encamacao nao é um fato isolado, mas algo que repercute em toda
a historia do Cristianismo. A vida do Pai, que se derramou sobre a humanidade
de Cristo, chega a cada.cristáo através da S. Igreja, que, por isto, é adequada-;
mente chamada "Máe" na Tradicáo crista. .

Máe... Este vocábulo é dos mais significativos para todo ser humano. É
talvez o primeiro conceito que a crianca formula, a primeira palavraque ela
pronuncia. É da máe que a crianca recebe a vida e os rudimentos da educacáo
e do saber; os ensinamentos, os exemplos, os costumes, o amor da mae se
gravam na memoria dos filhos e se tomam decisivos para o futuro destes. É na
sua máe que a crianca encontra o primeiro sustentáculo, o seu amparóla sua
forca e alegría; é a máe que explica o mundo áo filho e Ihe mostra tüdo o qué lia
de bomebelo, como tambénrí o que hade insidioso, nestemundp. ■ ■ - v

Pois bem. A Tradicáo crista é constante ao afirmar que a Igreja é.nossa


Mae. Nao conheco Jesús Cristo senáo através dos ensinamentos multissecúlares
da Santa Máe Igreja; recebi o Livro que me fala de Jesús Cristo, das máos
dessa Máe e Mestra; foi ela que ouviu, por primeiro, a Palavra de Cristo; vivenciou-
a, aprofundou-a e consignou-a por escrito nos Ijyros do Novo Testamento,.Alias,
que cristáo seria eu, que seria minha fé, que s^ria minha oracáo, se eu estiyes-
seentregue a mim mesmo e me encontrasse a sos diante da Bíblia?.Talyéseu
fizesse a Biblia dizér o*que éu pensasse, em vez de ouvira génüína mensagefñ
dé Cristo recebida de viva voz pela Igreja e oportunamente rédigida pelas süas
máos, queforam Mateus.' Marcos, Lucas... V.!^ • s-^t¡\\
Mesmó aqueles que se afastam da Igreja para ficar somente com Jesiis
Cristo, só podem falardo Cristo que eles conhecem através da Igreja. Nao há
outra via de acesso a Cristo senáo a Tradicáo viva da Igreja. Apesar disto,' há
aqueles'que a abandonam, embora alimentados por essa Santa Máe. Um vento
de criticaamarga bate em murtas mentes e resseca os coracóes.-impedindo-os
de ouvir.o sopro doBspírito. Muito sabiamente dizia S. Ágostínno: "Onde está a
lgreja,:^í está ó Espirito de Deus". ;."., ".,",■ .',";'-':-u'':í
A'igrejaé minha Míe... As censuras que Ihe sao feitas.-Viáo carecem,
todas, de fundamento. Más o volume dessas queixas náó supera á grandeza do
misterio-sacramento que é a Santa Máe irjrBja, n Cnrpn f\c. Cristo prolongado!
«•ue-wa.
BIBLIOTECA E.B.
CENTRAL
289 ,?a lr.it i O r
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XXXVII - N° 410 - Julho de 1996

Um Judeu traduz o Evangelho:

"A BÍBLIA. MATYAH -^


(O EVANGELHO SEGUNDO MATEUS)"

....,.,. r^RÓrAndréíchouraqui
: - ~. ". - .- ;;. - I
■ ., "•"-■ '."-■"; ¿ .>'-.' ."',h i-ii-:ii"Ti| "i P¡, i
Em síntese: André Chouraqui, judeu.de orígem argelina, tem-se
dedicado á tradugao da Biblia, para a Unguagem-moderna, levando
em conta a mentalidade semita de que<estavam¡impregnados Jesús,
os Apostólos e os Evangelistas. Ovolume correspondente ao
Evangelho segundo Mateus aprésente interessantes páginas de
IntrodugSo á Biblia em geral, á historia contemporánea de Cristo, á
própría figura de Jesús e ao texto do Evangelho de Mateus. O autor é
muito equilibrado ao abordar as relacdes entre Judaismo e
Cristianismo; respeita a pessoa de Jesús e as concepgóes que os
cristaos professam a respeito do Senhor Jesús Cristo. O texto
portugués traduzido do francés, qué por sua vez traduz ó grego
levando em consideragap o fundo semita do Evangelho, é um.texto
duro, principalmente quando verte os nomes próph'ós, mas fieléassaz
ilustrativo. Os comentarios ao texto do Evangelho sao de ordem
lingüística mais do que doutrínal. ,,,■,,, ■„ ,. -.ii5- ai,,..;i?í.^

André Chouraqui é israelita nascido na Argelia em 1917, de familia


sefaradi; viveu na Fran9a; onde fez parte da Resistencia ao nacional
socialismo antes de se tornar Delegado Geral da Alianca Israelita
Universal; trabalhou no Estado.de,Israel desde .1957, dedicando-se á
reaproximacáo das comunidades religiosas, especialmente de judeus
e crístáos. Tem espirito aberto, desejoso de transpor as barreiras que
distancian! os homens entre si. Vem-se aplicando desde os vinte anos
de idade á traducáo da Biblia, procurando fazer reviver ñas línguas

290
"A BiBLIA. MATYAH (O EVANGELHO SEGUNDO SAO MATEUS)" 3

modernas o genio e a forca do hebraico e das línguas semitas em


geral. Tem assim conquistado a simpatía e a gratidáo dos homens de
estudo em geral.

Publicou urna traducáp francesa comentada do livro do Génesis,


como também urna traducáo francesa e um comentario do Evangelho
segundo Mateus1. A seguir, apresentaremos algumas das características
desta obra notável.

Nao podemos deixar de notar aqui o contraste existente entre a


seriedade e a objetividade das afirmacóes de Chouraqui (judeu
sinceramente judeu) e a leviandade com que certas revistas ilustradas
abordam a credibilidade dos Evangelhos; entre outras, sejam citadas
ISTO É. de 3/4/96, pp. 87s e SUPER-INTERESSANTE de abril 1996,
pp. 46-56. Explanando o pensamento de Chouraqui, encontramos a
réplica de auténtico dentista ás sentencas divulgadas portáis revistas.
Ver pp. 298-301 deste fascículo.

1.INTRODUCÁO

Chouraqui apresenta, no limiarda sua obra, tres preludios sobre:


1) as pesquisas feitas pelo autor no mundo bíblico; 2) a historia do
Novo Testamento no tempo de Jesús; 3) trapos típicos do Evangelho
segundo Mateus.

1.1. Lera Biblia Hoje

O autor comeca com urna observacáo muito interessante sobre o


valor da S. Escritura como tal:

"Se um autor, vindo de urna provincia perdida no meio de um


continente desconhecido, chegasse a um, editor com um manuscrito
redigido em urna língua misteriosa e anunciasse que sua obra seria
traduzida em 1435 línguas e dialetos; que seria lida durante dois
milenios por centenas de milhoes de leitores de todos os continentes,
entre todas as nagóes da Térra; que e/a inspiraría a fundagSo de tres
religides universais, de milhares deconfíssñes e seitas; que provocaría
revolucdes e guerras, e ao mesmo tempo suscitaría com semelhante
intensidade entregas místicas e heroísmo nunca vistos; que, dois ou
tres milenios após ter sido escrita, ela continuaría a ser vendida em
todo o mercado editorial do mundo, com edicóes de milhoes de
exemplares por ano; e que, enfim, urna enorme parte da humanidade

1 Andró Chouraqui. A BÍBLIA. MATYAH (o Evangelho segundo Mateus). Colegio


"Bereshit". TradugSo de Leneide Duarte. Ed. Imago, Rúa Santos Rodrigues 201-A,
Rio de Janeiro (RJ). 160 x 230mm. 369 pp.

291
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

vería.nela um último recurso e sua única esperanca de salvacáo é


preciso dizer como ele seria recebido?

É, no entanto, esta impossível aposta que a Biblia realiza no


campo do pensamento e de sua transmissSo, que, de fato, superou
todos os limites de espago e venceu o tempo. Este livro de Israel,
escrito em hebraico e em aramaico e, em grego, o Novo Testamento,
nSo surpreende apenas pela universaiidade e pela Iongevidade dé
sua carreira: o que faz mais aínda, talvez, ao falarao homem de todas
as idades, em todas as línguas, em todos os seus níveis de consciéncia
ezde cultura. Se,um milagreé o que torna real o impossível, estamos
diante de um 'milagre'.no campo da comunicagüo universal. \Ora¿em
plena :era atómica é possivel ler sob urna nova luz este documento
único, escrito ñas idades do bronze e do ferro" (p. 7). ■_■;■> ¡ oír.;

;;A seguir,, Chouraqui explica como foi desenvolvendo <o seii


trabalho de traducáo da Biblia: esmerou-se sempre ermprocurar o
sentido original dos vocábulps hebraicos e_aramaicos do texto
sagrado, a fim de que o homem do século XX possa entender o texto
no seu expressionismo auténtico, táo isento quanto possivel de
¡nterpretacóes subjetivas. Toda a obra de Chouraqui visa a tal efeito.

1.2. Limiar para um novo Pacto .-. . .," n',.v;..


Tal é o título que o autor dá a urna visáo panorámica da historia
de Israel nos tempos de Cristo. "A historia universal tomou urna nova
diregio a partir de um acontecimento dramático, ocorrido na Judéia,
no primeiro século da era crista, da qual ele marca o ¡inicio" (p. 13).

Chouraqui corneja mostrando que o monoteísmo de israel corría


perigb (como alias; sempre correu pütrora¡ em graü maiórou'menor)
nos tempos "de yesusííGorn"éfeitof vivia^cercado de povos pagaos e
até-mesmojiaípartlr dé-rersírio^Antíoco IV'Epifánes (t 164 á;C), sofría
¡nfluénciasVpagás.ppGpa^ de
rIsí«eM%tfo;cpjpl^
tYTf5ern|l67^á?GV»<cf.32Me smvfci&avrirñfíicSn h¿ a*,•cae
devSJenrsatéYTfjemtiá7AatcmiSfs&Mc
cultos;<.1emplos,ísal'cerdotes:eTl¡turgias favorece,-como regra, a invasáo
de-um^incretismo-emíuma'sociedade1 profundamente heterogénea"
(p."15). ■-■■-i? ^ c- --.-. ;i o¡..',i,i'-.-. . v ,::. •...-.

■ 'y eO:povo de Israéliéra dbminádoipor na?6es pagas desde 587 a.C;


achava-se extenuadorou.exangüe no.tempo de Cristo. Os romanosl
em 66-70, julgavam estar dando o golpe final ao po'vo que Ihes parecía
exterminado; referindo-se á revolufáo dos judeus contra os romanos
que durou de 66 a 70, "Tácito avalia em seiscentos mil o número de
vítimas da guerra dos judeus, enquanto Flávio José fala em um milháo
e o Talmud em um milháo e meio de mortos e de deportados vendidos

292
"A BÍBLIA. MATYAH (O EVANGELHO SEGUNDO SAO MATEUS)" 5

como escravos; um escravo hebreu, sublinha Tácito, valia entáo


menos do que um jumento nos mercados do Mediterráneo" (p. 17).

Os romanos impunham pesado jugo a todos os povos que eles


vencessem. De 132 a 135, um punhado de judeus remanescentes na
térra de Israel tentou urna última revolta sob Bar-Kokhba, que acabou
extinguindo qualquer possibilidade de resistencia judaica. Vencidos
pelas armas, ou mesmo colaborando com o inimigo detestável e
odiado, os israelitas tinham gravadas no coracáo numerosas máximas
de represalia: "Mesmo o melhor dos goíms (leia-se: romanos), mata-
o" ou "Nao se deve confiar num goí (leia-se: romano) mesmo que ele
esteja no túmulo há quarenta anos".

Jesús nasceu aproximadamente no ano 6 da era crista, num país


ocupado pelos romanos cinqüenta e seis anos antes. Sim; Herodes
morreu no ano 4 a.C, quando Jesús devia ter no mínimo dois anos de
idade (cf. Mt 2,16). Chouraqui nao hesita em afirmar, com os
Evangelhos, que Jesús nasceu em Belém e viveu a maior parte de
sua vida em Nazaré. Cresceu numa atmosfera extremamente tensa;
terá lido a Biblia assiduamente; conhecia de cor, em hebraico, os textos
sagrados que na escola eram explicados em linguagem mais familiar,
ou seja, em aramaico:

"Os Evangelhos sao a narrativa da vida patética de léshoua'ben


losseph e da agáo que ele prepara no silencio de suareclusao na
Galiléia, e conduz no esplendor de urna pregagao que acabará na
cruz" (p. 22).

Os mais antigos manuscritos completos do Novo Testamento


grego datam do século IV; há, porém, manuscritos ou pergaminhos
parciais, que contém ou somente os Evangelhos ouisomente um
Evangelho ou somente as epístolas ou alguma epístola paulina .,
anteriores ao século IV; existem também 72 papiros (o papiro é anterior
ao pergaminho) fragmentarios que datam dos séculos II e III. Estes e
outros testemunhos do texto do Novo Testamento, ultrapassando a
casa dos tres mil1, permitem atualmente recomponotéxto original do
Novo Testamento em edicóes críticas fidedignas, dasi'quaisiairíais
abalizada é a de Aland, Black, Martini (The Greek NéwTestament)
das United Bible Societies, de Nova lorque. <

No.tempo de Jesús estavam em uso tres línguas na Palestina: o


hebraico, que era o idioma materno do hebreu; era a língua sagrada
da Tora e das antigás tradicóes de Israel. O aramaico (muito próximo'

1 Podem-se contar cerca de 5.400 manuscritos do Novo Testamento se nesta


cifra se influem os Lecionários ou fragmentos //dos na Liturgia antiga.

293
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

ao hebraico) tornara-se a lingua internacional mais difundida no


Oriente Próximo; era falado desde o retorno do exilio (538 a.C.) na
Judéia e na Galiléia. Quanto ao grego, era o idioma do imperio greco-
romano, ao qual pertencia a Palestina. Jesús devia falar comumente
o aramaico, mas, quando comentava a Tora, é provável que utilizasse
o hebraico. Os Apostólos e discípulos que, saindo da Palestina,
pregavam em grego, guardavam o substrato aramaico próprio da
pregacio de Jesús e dos Apostólos na térra de Israel.

"As dificultades acumuladas impulsionaram certos críticos a negar


qualquer realidade histórica á pessoa de léshoua', ou a afirmar a
¡mpossibilidade, com base nos Evangelhos, de escrever urna biografía
coerente dele. Hoje, a crítica é mais prudente do que foi no sáculo
passado. Novas descobertas arqueológicas, como as de documentos
da importancia dos manuscritos do Mar Morto, permitem criar urna
ponte entre as exigencias da pesquisa histórica e as certezas
teológicas da fé". (p. 27).

Ao pregar sua doutrina, Jesús nao se identificava com nenhum


partido ou grupo de judeus do seu tempo: nao era essénio, nem fariseu
nem saduceu nem zelota... Atraía, porém, as massas pelo vigor de
sua pregacáo como também por seus feitos portentosos em favor de
doentes e possessos.

"A entrada triunfal em Jerusalém e o escándalo que léshoua'


provoca no Templo, expulsando os mercadores, cristalizaram as
oposigoes e eliminaram as hesitagdes: urna vez que nada nem ninguém
pode deter o novo profeta em quem seus seguidores reconhecem o
Messias, ele deverá perecer" (p. 34).

Muito interessante é o modo como Chouraqui encara a


ressurreicáo de Jesús:

"Entretanto, léshoua', nos dizem os evangelistas, nao morre


senSo para ressuscitartrésdiasídepois e se manifestar, vivo a seus
discípulos. Ofato n§o ocórre-sem provocar areagao dos seguidores,
que véem nele a vitaría do messias sobre amorte, um milagro que
confirma o messianismo de léshoua', filho de Elohims. Os adversarios
do Crucificado denunciam um subterfugio - o corpo tena sido roubado
para simular sua ressurreigSo - ou um fato natural - léshoua',
carpinteiro robusto e aínda jovem, teña sobrevivido ao coma
consecutivo á sua crucificagSo. Entre essas posigóes extremas,
múltiplas teorías foram sustentadas para explicar o misterio da
ressurreigño do Cristo ou, para empregar a linguagem dos hebreus,
seu despertar e seu reerguer dentro os mortos.

Mas o caráter realmente excepcional, único, da vida e da morte

294
"A BÍBLIA. MATYAH (O EVANGELHO SEGUNDO SAO MATEUS)" 7

de léshoua' se encontra também na fecundidade de sua breve


existencia: o espirito se depara com realidades tSo poderosas e táo
contraditórías que hesita em Ihe dar urna explicacáo naturalista, sem
ter de recorrer ao tradicional apelo ao sobrenatural. Urna música
reencontrada, escrevi ao falar sobre esse livro, onde um dos pioneiros
do renascimento de Israel, losseph Hai'm Brenner, reconhecia 'o osso
de nossos ossos, carne de nossa carne'. É seu canto que precisa ser
urgentemente reencontrado, seu canto anunciador de esperanga, de
amor, de vida. Em lugar de alimentar lamentáveis polémicas, guerras,
cismas, controversias que desonraram a humanidade, saibamos
descobrir nesse Anuncio um lugar privilegiado de reencontró
inspiragño, paz e salvagao". (pp.35s). - v . •
i •..-.. -- •■■...;
Como se vé, Chouraqui, embora nao seja cristáo, julga que b
fato histórico chamado "Cristianismo", com seus vinte séculos de
existencia, exige urna explicacáo á altura; Chouraqui chéga a admitir
discretamente o sobrenatural na origem do Cristianismo para poder
justificar o surto e a continuidade do Cristianismo. í

1.3. "Limiar para Nlatyah"

O autor agora se volta diretamente para o texto do Evangelho


segundo S. Mateus. ■ •,-

Este parece ter sido o primeiro ensaio do Evangelho; escrito em


aramaico na Palestina, foi traduzido para o grego possivelmente antes
da queda de Jerusalém (ano de 70), pois, se o autor do texto grego
conhecesse a ruina da Cidade Santa, nao teria deixado de a mencionar.

"O Evangelho nSo é umlivro,dehistória fríamente objetiva, mas


um anuncio, umkérygma que empenha os discípulos de léshoua'num
combate de vidae morte, do qual depende asalvagSode Israel assim
como a do resto do mundo. . :. t: ■■ ;_

•Mateus-resume>ém 1701 versfcdiqs% vida-de léshoua', <de>seu


nascimento até sua morte, enfaiizando~jsúávatividade publicare'sua
morte; os quatro últimos anos da vida de léshoua' sSo expostos em
413 versículos; os 33 anos desuavida:ocupam658 versículos.

Renán escreveu: o Evangelho derMateus nos faz entrar num


palacio mágico construido inteiramente.de pedras luminosas. A
narrativa é admiravetmente orientada para o drama da paixáo.
Sistemático ría composigáo geral de sua obra, Mateus o é também no
modo de reagrupar os temas: léshoua', evocado nos capítulos 5 a 7
como um grande mestre de justiga, é apresentado, em urna segunda
etapa que descreve dez milagres, como um incomparável taumaturgo

29 5
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

(8,1-9 a 9, 34). A tensáo que opoe léshoua' ás outras familias


espirituais de Israel é analisada em urna segao separada (11,2-12,50).

Característica é também a constante citagáo em Matyah da Biblia


hebraica, para ele o termo de referencia supremo, de onde léshoua'
extrai toda sua autenticidade e toda a sua legitimidade- Tudo
aconteceu para cumprir o que disse Adonai porseu inspirado.

Esta frase, que introduz citagóes da Biblia hebraica, reaparece


em Mateus cerca de onze vezes, com pequeñas variantes. .Mateus
cita a Biblia mais de sessenta vezes, sem contaras inumeráveisalusóes
que faz déla sem mencioná-la explicitamente;yparazseu;aud¡tório;de
iniciados, urna simples frase, urna simples palavra^remeteá matriz
bíblica da qual todo o Novo Testamento tema indestrutívelmarca.

Mesmo quando a cita em grego na versáodosLXXou/ivremente


traduzindo ele mesmo um texto que conhece quasexle cor/como todos
os letrados de Israel, o autor está .visiveimente impregnado'de
hebraísmos. Isto se senté quase a cada palávra:' aínda que escreva
em grego, aínda que conhega bem oaramaico;íeleí>pensá antes de
tudo na língua da Biblia, em hebraico. Contam-se assim 329 casos de
semitismos flagrantes em Mateus;,que recorre :freqüenteménte a
expressóesjudaicas tomadas de empréstimo ás liturgia&dassinagogas
e do Templo. A retroversño de Mateus em hebraico escorre como a
agua da fonte e nos permite ler este evarígelho'nSo'.palavra por
palavra, como em grego, mas pelo espirito.'^..■:;?..«;^1 <?.--;.■_ :¡¿<•..•..

Os paralelismos que caracterizam o estilodá Biblia ^hebraica sSo


cultivados por Mateus a ponto de fazer deles um procedimento: a
comparagáo entre Mateus 7, 24-27«e Lucasi6;s\47r49¡'é\significativa
neste sentido. Paralelismos, quiasmos-inclüsoe's.'tcitágóés de:palavras
ou sentengasrevelam com evidencia um autonhebreuivivehdoemum
meio da Judéia e de tradigóes judaicas, do'ensinamento da Biblia e
das tradigóes dos rabis. Exatamente sobre issolgs'creveuSeda
Rigaux:'i...o-iiúmus,do príme¡roievangélhQkéíísém(tico\:\ví
testamentario e palestino" (pp. 41s).±;r^:%Z^^^^0&'

2.0 TEXTO DO EVANGELHO >/> ¿c/^

O texto de Mateus traduzido por Chouraqui do^gregó para o


francés e vertido para o portugués por LeneideíDuartejprocura ser
fiel/o mais possível, ao original grego, levando'em(cónta o substrato
aramaico; daí o carátér um tanto duro da tradupáb'.da qual se seguem
alguns espécimens:

1) Mt 16,8: léshoua' penetra-lhes o pensamento e diz: "Porque

296
"A BÍBLIA. MATYAH (O EVANGELHO SEGUNDO SAO MATEUS)" 9

fazeis reflexdes entre vos mesmos, anóes da adesSo porque nao


tendes paes?" .

2) Mt 16,13-16: léshoua' va/ para o lado de Caesarea de


Philippos. Ele pergunta a seus adeptos: "Quem os homens dizem que
é o filho do homem?"

Eles dizem: "Alguns: lohanán, o Imersor; outros: Éíyahou; outros:


Irmeyahou ou um dos inspirados."

Ele Ihes diz: "E vos, quem dizeis que sou?"

Sim'ón Petros responde e diz: "Tu és o messias Bén Elohíms o


filho do Elohims da vida."

3) Mt 17,15: "Adón, matricia meu fílho! Sim, ele está lunático e


sofre muito. Ele cai, ás vezes, no fogo e, és vezes, na agua".

4) Mt 17, 20-24: Ele Ihes diz: "Por causa da vossa adesao. Amén,
sim, eu vos digo, se vos tivésseis adesSo como um grSo de mostarda,
diríais a esta montanha: 'Move-te daqui até lá'eela se movería. Nada
vos sería impossível".

Quando eles passam por Galil, léshoua' Ihes diz: "O filho do
homem vai ser entregue ñas mSos dos homens.

Eles o mataráo, e, a o terceiro dia, ele despertará." Eles se


entrístecem muito.

Eles vao a Kephar-Nahoum. Os cobradores de meio-siclo


aproximam-se de Petros e Ihe dizem: "Vosso Rabí nño paga o meio-
siclo?"

Os comentarios ao texto sao de ordem lingüística ou historiográfica;


pouco entram em doutrina ou teología. Alias, Chouraqui sempre respeita
as proposicóes da fé católica.

No fim da obra, encontram-se Apéndices valiosos sobre os Nomes


Divinos na Biblia, Fontes, Transliteracóes e Abreviacóes, Legendas dos
Mapas, Glossário de Nomes Próprios... - o que torna o livro ainda mais
interessante.

Em suma, a obra de Chouraqui é instrumento útil para se estudar o


Evangelho segundo S. Mateus. O que pode impressionar agradavelmente
o leitor, é o espirito aberto e compreensivo do judeu André Chouraqui,
propenso a reconhecer a grandeza singular de Jesús Cristo.

297
Um Judeu traduz o Evangelho:

"OS ANOS OBSCUROS DE JESÚS'

Em síntese: A Sra. Elizabeth Clare Prophet, gurú norte


americana, há vinte anos vem estudando a vida de Jesús ejulga poder
afirmar, na base de manuscritos tibetanos, encontrados em 1887, que
os dizeres de Jesús foram alterados pela Igreja e que Jesús esteve
na India, no Nepal e no Tibe. Estas teses s§o desmentidas pela
pesquisa dospróprios manuscritos do Novo Testamento, que sao cerca
de tres mil, datados dos prímeiros sáculos do Cristianismo e
reconhecidos pela critica como fidedignos; o estudo desses
manuscritos n§o permite dizer que houve truncamentos ou
modificagóes substanciáis dos mesmos. A hipótese de que Jesús
esteve na India é desfeita em particular pelos textos de Me 6, 3s e Mt
13, 55, como também pela tomada de consciéncia do género literario
dos Evangelhos; estes nao pretenden) serum relato biográfico, mas o
eco escrito da pregacao dos Apostólos, que visavam a suscitar a fé
dos ouvintes, sem deixarde referir fatos históricos (ver artigo seguinte
deste fascículo).

A revista ISTO É, edicáo de 3/4/96, pp. 87s, publicou um artigo


de Carla Gallo e Gisele Vitoria, que sintetiza o pensamento da Sra.
Elizabeth Clare Prophet, gurú norte-americana e sacerdotisa
ecuménica, 54 anos de idade, que afirma ter Jesús vivido na (ndia
entre os treze e dezenove anos de idade como também após a sua
crucifixáo (da qual nao terá resultado a morte do Crucificado).

O artigo está cheio de imprecisóes ou mesmo erras, que seráo


aportados ñas páginas seguintes.

1. A SRA. ELIZABETH E SUAS FONTES

A Sra. Elizabeth diz "ouvir a voz de Jesús desde garata"; Jesús a


ajuda ñas suas pesquisas religiosas. Adepta da reencarnacáo, afirma
que já foi "Santa Marta, seguidora de Cristo, e Santa Clara". É
doutrinada por outro mestre, o Conde de Saint-Germain, que viveu
na Franca do século XVIII e atualmente é mensageiro da Era de Aquárío
(Nova Era), depois'de ter sido outrora Bispo de París (século VI) com
o nome de Saint-Germain; foi também, em encarnacáo anterior, Sao
José, pai adotivo do próprio Jesús.

298
"OS ANOS OBSCUROS DE JESÚS" 11

Elizabeth foi nomeada por Saint-Germain "mensageira da Grande


Fraternidade Branca"; como tal, ela profere palestras, ensina mantras
e oracóes, que ajudam a espalhar a chama violeta (energía que dá as
pessoas maior percepcáo para entender os ensinamentos cristáos).

Peregrinou por diversas religióes no intuito de esclarecer seu


dom sensitivo, quando, aos dezoito anos de idade se fixou no
esoterismo indiano.

As fontes que Elizabeth consulta para explicar a figura de Jesús,


sao polémicos manuscritos tibetanos encontrados em 1887 pelo
jornalista Nicolás Notovitch no mosteiro budista de Himis em Ladakh.
Nesses pergaminhos Jesús teria o nome de Santo Issa, um joverri
israelense queaos treze anos de idade teria partido secretamente da
casa de sua máe Maria em Jerusalém, com o objetivo de se preparar
para cumprir a sua missáo. "Lá os lamas Ihe teriam ensinado a
compreender os escritos sagrados, a curar com a ajuda da oracáo e
a expulsar espiritas malignos dos corpos dos homens, "diz Elizabeth,
citando os manuscritos. Conforme os pergaminhos, Jesús teria voltado
para a Palestina, onde foi condenado pelo crime de heresia e
crucificado. Apesar das coincidencias, até hoje ninguém provou que
de fato Santo Issa foi mesmo Jesús Cristo (art. citado, p. 87).

Mais: diz Elizabeth aínda que Jesús nao morreu na cruz. "Os
apostólos deram-lhe um tipo de erva que fez com que ele parecesse
morto", garante. "Depois de sobreviver ao martirio, diz o artigo citado,
o filho de Deus teria voltado á India e lá vivido até os oitenta e um
anos. Ao contrario do que prega a Igreja, Cristo nao seria um adepto
do celibato. Em Caxemira, onde teria vivido o resto de seus dias, Jesús
se casou e teve filhos. "Quem for á india e pesquisar entre as
comunidades locáis, poderá ter noticias dos descendentes de Cristo1
diz Elizabeth".

Para a escritora norte-americana, o Novo Testamento pode ter


omitido varios fatos e ensinamentos de Jesús por conta dos interesses
da Igreja. "Roma quis manter o Messias debaixo de seus pés. Essa
nova versáo de sua historia mostra que eie é universalista, nao está
limitado.ao Cristianismo. Jesús abracou o budismo, o hinduísmo e viu
urna interacáo entre todas as religióes do mundo', diz Elizabeth. Esta
autora considera ridicula a tese de que Cristo acumuiou sabedoria
dentro de urna carpintaria" (artigo citado, p. 88).

Elizabeth Prophet assegura que "as palavras de Cristo divulgadas


até hoje nao sao fiéis. A intencáo da líder espiritual é justamente trazer
á tona os verdadeiros ensinamentos de Jesús" (artigo citado, p. 88).

299
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

2. UMAAVALIAQÁO

1. A pessoa de Elizabeth Propheté a de urna figura eclética, dada


a revelacóes pessoais, contatos com o além mediante mestres
espirituais. Isto distingue-a da figura de um (a) intelectual, pesquisador
(a) que trabalha em cima de raciocinios lógicos e de pravas evidentes
ou científicas. Elizabeth Prophet pode ter autoridade na área do
esoterismo e do ocultismo, mas nao a tem no setor dos eruditos
pesquisadores da Biblia. Alias, nenhum destes, por mais anticristáo
ou anticatólico que seja, reconhece manuscritos tibetanos como fontes
auténticas para estudar a figura e a doutrina de Jesús.

Pode-se perguntar se Elizabeth estudou a bibliografía grega, a


siria, a copta, a armenia relativas a Jesús e datadas dos cinco prímeiros
séculos da era crista. Estas fontes sao da máxima autoridade pela
sua antiguidade e pela sua multiplicidade variegada.

.2. A autora, alias, parece conhecer muito pouco a historia do


texto do Evangelho, pois, segundo o artigo de ISTO É, "apenas
quarenta anos depois da morte de Jesús, algumas comunidades cristas
primitivas comecaram a escrever manuscritos que, traduzidos por
lingüistas e historiadores dos séculos X e.XI, deram origem ao Novo
Testamento"; tal seria o modo de pensar de Elizabeth Prophet. - Ora
esta proposicáo é totalmente descabida, pois existem manuscritos,
ao menos fragmentarios, do Novo Testamento datados dos séculos II
e III; há outros bém mais conservados e extensos dos séculos IVA/...
Os críticos do texto grego comparam entre si os tres mil manuscritos
antigos do Novo Testamento e assim confeccionam edicóes fiéis do
texto bíblico, sendo a melhor a de Aland, Black, Martini (The Greek
New Testament. United Bible Societies, Nova lorque).

Mais: nos últimos anos tém sido descobertos papiros fragmentarios


de Mt (Mt 26, dez linhas) e Me (Me 6,52s), que os pesquisadores chegam
a datar de meados do sáculo I. Em conseqüéncia, as datas de redacáo
dos Evangelhos teriam que ser revistas em favor de rhaior proximidade
de Jesús. Alias, entre o Senhor Jesús e a redacáo dos Evangelhos
nao houve hiato, mas hóuve, sim, continuidades pois a pregacáo do
Evangelho nunca cessou; foi realizada primeiramente dé viva voz pelos
Apostólos ñas regióes da Palestina, da Siria, da Asia Menor, e aos
poucos foi sendo cristalizada por escrito em fragmentos, que sao as
unidades das quais se originaram os Evangelhos na sua íntegra ou
na sua forma hodierna; cf. PR 399/1995, pp. 347-353; 288/1996, pp.
194-200; 354/1991, pp. 482-494; 388/1994, pp. 386-395.

3. É prava de ignorancia dizer que "o Novo Testamento pode ter


omitido varios fatos e ensinamentos de Jesús por conta dos interesses
da Igreja... Roma quis manter o Messias debaixo de seus pés" (p. 88).

300
"OS ANOS OBSCUROS DE JESÚS" 13

- Os escritos do Novo Testamento foram-se formando no século I


independentemente da autoridade da Sé de Roma. Os Apostólos e
Evangelistas (Pedro, Paulo, Joáo, Tiago, Judas, Mateus, Lucas,
Marcos) escreveram com sua autoridade de Apostólos e Evangelistas'
sem que houvesse confuto entre o Bispo de Roma (que seria Pedro
ou algum dos seus sucessores: Lino, Cleto, Clemente...) e os autores
sagrados. Urna vez escritos, os textos do Novo Testamento foram
copiados e recopiados, podendo-se acompanhar a historia dos
manuscritos existentes ñas principáis bibliotecas do mundo; o
confronto desses manuscritos revela que nao houve truncamente ou
"censura" dos mésmos; eles sao reproduzidos na suá integra com as
variantes compreensíveis na'obra de todo copista. É falso,"portento;
admitir cortes, omissóes, retoques nos textos sagrados para atender
a interesses da Igreja dos primeiros séculos; sóque.m nao conhece ó
assunto, pode ousar afirmar tal despropósito. É de notar ainda que
os manuscritos do Novo Testamento nao sao propriedade exclusiva
da Igreja; estao espaihados por diversas cidades do mundo, adquiridos
por quem se pode apoderar deles. • . . : .

4. Mais absurda airida se torna essa ousadia no caso da Sra.


Elizabeth Prophet, que jújga que. Jesús foi limitado pela Igreja ao
Cristianismo; na vérdadé "Jesús teria abracado o budismo, o
hinduísmo, e teria visto urna interacáo entre todas as religióes do
mundo". Esta suposicáo da Sra. Elizabeth é.insustentávelr.pois o
Cristianismo e as religióes da India, sao incompatíveis entre si pelo
fato de que o Cristianismo é monoteísta (professa que há um só Deus),
ao passo que o hinduísmo; o bramanismo e o budismo sao panteistas
(afirmam que tudo é Deus). Donde se vé que o ecleticismo de Jesús
nao seria lógico nem viáyel.-A Sra/Elizabeth nao poderá "trazerá
tona os verdadeíros ensjnaméntos'de*Jesús", stejjrescindír dos tres
mil códigos e manuscr¡tó|utiiizados'atí^
do Novo Testamento; naoMacérvo deleste'miinho.'doíé^o'dpíNovo
Testamento mais seguro e fidedigno do que o acervo utilizado pelos
críticos que editam os Eváñ'gelhos e as epístolas do Novo Testamento;
é táo -volumoso é tio'significativo esse acervó déniariuscritos qué
difícilmente se conseguirá outro que o iguale em valore autoridade.

5. Quanto áidéia de que Jesús tenha estado na India, no Nepal e


no Tibe, será discutida no próximo artigo deste fascículo,1 "em' que
comentaremos__a1 obra de um defensor de tal tese. '.

301
Imaginado tendenciosa:

"JESÚS VIVEU NA ÍNDIA"?

por Holger Kersten

Em síntese: O livro de H. Kersten é tendencioso; aborda a figura


e a vida de Jesús a partir de premissas gratuitamente preconcebidas;
Jesús vem a ser, segundo o autor, um Bodhisattwa; por conseguinte,
deve terforgosamente tido relagoes com a india e sua filosofía religiosa.
Estabelecida esta tese, Kersten forca os textos bíblicos e nao bíblicos
a fím de fundamentarem o seu pensamento, chegando por vezes as
raias do ridículo. O livro assim tem pouco valor científico; representa
urna expressio singular da filosofía religiosa contemporánea, que tem
contra si testemunhos da arqueología, da historiografía, da medicina
e de vinte séculos de tradigao crista; é difícil crer que só no século XX
(dezenove séculos e mais após a morte de Jesús) se tenha podido
chegar á verdade a respeito dele; hoje saberíamos mais sobre Jesús
do que souberam as prímeiras geragóes cristas; estas teráo sido todas
iludidas e simplonas; teráo transmitido a falsidade até nossos
tempos!... A singularidade da vida e da doutrina de Jesús se depreende
de um exame atento de sua mensagem, que pode ser estudada nos
livros de doutrina do Catolicismo.
* * *

Holger Kersten é um estudioso alemáo que viajou pelo Oriente


até a India e julga ter descoberto vestigios de passagem de Jesús
por diversos países (Turquía, Mesopotámia, Pérsia, Afeganistáo...).
Jesús terá finalmente morrido em Srinagar, na Caxemira (India), onde
dizem que se encontra a sua sepultura. O autor compartilha a filosofía
budista e julga poder enquadrar Üesüs'tléntro dos moldes de um
Bodhisattwa (manifestado do Divino-segundo o panteísmo indiano).

O livro em que H. Kersten propoe suas idéias, conheceu oito


edicóes sucessivas na Alemanha. Traduzido para o inglés, com alguns
retoques do autor, foi vertido para o portugués, com o título "Jesús
viveu na india", obra que já tem algumas edicoes.no Brasil.1
Examinaremos, a seguir, o conteúdo desse livro e Ihe faremos
comentarios.

1 "Jesús viveu na india. A desconhecida historia de Cristo antes e depols da


Crucificagáo". Ed. Best Seller. Sao Paulo 1988 (2a ed.).

302
"JESÚS VIVEU NA INDIA"? 15

LÁTESE DO AUTOR

Holger Kersten aceita que Jesús tenha nascido em Belém da


Palestina (cf. p. 106). Todavía nao foi um judeu ortodoxo (cf. p. 83). O
título de Nazareno que Ihe atribuiram, nao se refere a Nazaré, cidade
onde Jesús terá vivido, mas á seita dos Nazireus ou Essénios, aos
quais Jesús se filiou (cf. pp. 11 Os); foi iniciado na sabedoria budista
em Alexandria, quando menino refugiado no Egito para escapar da
perseguicáo de Herodes (cf. 105). Mais tarde Jesús deve ter estado,
durante algum tempo, em Qumran (cf. pp. 117.148), sede dos Essénios
junto ao Mar Morto. Tal seita compartilhava teorías orientáis esotéricas,
conforme Kersten. Jesús viajou para a india, onde se aprofundou ñas
doutrinas do budismo, inclusive na da reencarnacáo. Já formado,
voltou para a Palestina; visto, porém, que a sua pregacáo incomodava
os israelitas, foi condenado á morte e crucificado. Todavía nao morreu
na Cruz; o exame atento do Sudario de Turim, conforme Kersten, revela
que nelle foi envolvido um homem aínda vivo. Ora Jesús se refez das
contusóes recebidas por ocasiáo da sua Paixáo; para isto contribuiu
um sedativo (vinagre) que Ele tomou quando estava pregado á cruz;
isto o ajudou a repousar no sepulcro e sair deste nao necessariamente
tres días depois de sepultado, mas em data posterior (cf. pp. 173-5).
Os essénios, companheiros de Jesús, devem ter colaborado para que
o Mestre se recuperasse aos poucos. Urna vez refeito, Jesús
primeramente foi para Damasco (Siria); apareceu a Paulo na estrada
de Damasco (cf. p. 199); depois foi-se dirigindo de novo para a india,
onde ainda pregou intensamente com o nome de Yaz Asaf; deve ter
morrido como budista fiel por cerca de 80, com 80 anos de idade
aproximadamente I O autor chega a admitir que Jesús tenha viajado
também para o Ocidente, onde teria visitado a Franca e talvez a
Inglaterra "para instruir Congregacóes afilhadas" (p. 205). Jesús nao
pregou a ressurreicáo, mas a reencarnacáo. O nome Cristo é
equivalente a Krishna.

O Cristianismo hoje existente, conforme Kersten, nao corresponde


ao pensamento de Jesús, que tinha algo de esotérico ou secreto (cf.
p. 203), mas é obra de S. Paulo, que recorreu a concepcóes gregas,
inclusive á da morte expiatoria, para elaborar a mensagem expressa
em suas cartas. Os Evangelhos sao pouco fidedignos, pois teráo sido
escritos tardíamente, diz H. Kersten, reproduzindo um modo de ver
alheio a Jesús.

Para .corroborar sua tese, o autor afirma que Abraáo era oriundo
da India; neste país existe urna pequeña cidade chamada Hará, que
. deve corresponder a Hará, donde o Patriarca emigrou conforme Gn
11, 32 (cf. p. 50). O povo de Abraáo passou para o Egito; reduzido á
escravidáo, foi tirado do cativeiro por Moisés, cujo túmulo se acha em
Caxemira, conforme Kersten (cf. p. 59). Salomáo foi instruido na India

303
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

(cf. p. 64). O diluvio bíblico deve ter ocorrido na india (cf. p. 66). As
dez tribos que se separaram da casa de Davi após a morte de Salomáo
(930), emigraram para o Oriente e foram deter-se na India (Caxemira),
onde Kersten diz haver grande número de israelitas até hoje (cf. pp.
72-82). Joáo Batista terá sido educado na india (cf. p. 129).

Em suma Kersten revoluciona todas as concepcóes do Antigo e


do Novo Testamento, dando á historia bíblica urna interpretacáo
hinduísta ou budista. Para tanto, apoia-se freqüentemente nos escritos
da Sra. Helena Blavatsky, fundadora da Teosofía no século passado.
Serve-se também de obras modernas de historia das religióes e
arqueología; reproduz numerosas fotografías e gráficos, dando assim
um cunho aparatoso ao seu livro, apto a impressionar um leitor
imperito.

Procuremos refletir sobre a tese de Kersten.

2. PONDERANDO OS DADOS...

Quem lé atentamente a explanacáo do autor alemáo, é logo


incitado a perguntar: quais as fontes e premissas que a sustentam?

Eis a resposta: Kersten professa a cosmovísáo religiosa hinduísta


(ora sob a forma do budismo, ora sob a da Teosofía1). Em
conseqüéncia, aborda a Biblia com a intencáo de reduzir toda a
mensagem desta ao sistema budista: o povo de Israel era ligado á
india; Jesús foi budista, aprendeu na India antes de ensinar na
Palestina e voltou á india para pregar, depois que escapou da morte
de cruz. Esta teoría apela para

1) a lacuna existente nos Evangelhos entre os doze e trinta anos


de vida de Jesús;

2) o Sudario de Turim, que parece ter envolvido um homem vivo


e nao um cadáver, conforme Kersten;

" 3) os apócrifos do Antigo e do Novo Testamento.

1 Teosofía (de Théos = Deus, e sophia = sabedoria) é um sistema de filoso


fía religiosa que teve origem no século passado por obra da Sra. Helena
Blavatsky e do Cel. H. Olcott. inspirándose em fontes místicas e práticas
ascéticas da india e do Tibe. As suas duas principáis doutrinas sao o
panteísmo (tudó'é Deijsbu a Diyindade se identifica com a natureza e o
intimó do homem) e a reéncárriá$ao, segundo a leí 'do Karma: CónseqOeh- ■
tómente; a Teosofía ó dualista 6V tem a materia na conta de elemento mau,
do qualo homem tem que se desfazer para conseguir sua verdadeira felici-
dadé.- ;>- ' ■•-..■

304
"JESÚS VIVEU NA INDIA"? 17

É preciso, pois, que indaguemos qual o valor destas pilastras da


teoría de Kersten.

2.1. A lacuna entre os 12 e 30 anos de Jesús

Muitos leitores se impressionam pelo fato de que os evangelistas


nada dizem sobre o período dos 12 aos 30 anos de Jesús; Mateus e
Lucas referem algo sobre a infancia de Jesús até os dois anos de
idade; Lucas narra um episodio ocorrido aos doze anos; depois cala
se até o Batismo de Jesús aos trinta anos (cf. Le 3,23). Marcos eomeca
simplesmente com Joáo Batista a pregar e.batizar no deserto (cf. Me
1,1-11).

Tal silencio leva diversos autores modernos a supor que os


evangelistas nada sabiam a respeito de tal período, porque Jesús
terá viajado para o exterior, a fim dé se imbuir da sabedoria tibetana,
indiana ou egipcia; Jesús terá sido um dos grandes iniciados em
doutrinas ocultas e reservadas... Assim pensam os rosa-crucianos,
os esotéricos em geral, os teosofistas, muitos espiritas... Esta
concepcáo difunde-se com insistencia, podendo calar ñas mentes de
leitores despreparados.

Que dizer?

O assunto já foi longamente abordado em PR 206/1977, pp. 68-


72. Sumariamente deve-se observar: a tese de Kersten e seus
correligionarios supóe que os Evangelhos sejam uma biografía. Ora
toda biografía eomeca com o nascimento do herói, percorre os anos
de sua formacáo, de sua carreira profissional e descreve o seu
declínio. Se falta algum destes elementos, o leitor tem razáo de
estranhar.

Tal, porém, nao é o género literario dos Evangelhos. Estes nao


foram concebidos como biografía de Jesús, mas, sim, como o eco
escrito da pregacáo oral dos Apostólos. Ora a pregacio dos Apostólos
comecava pela Páscoa final de Jesús, anunciando, antes do mais,
que Ele morreu e ressuscitou para nos salvar... Quenrí aceitasse esta
mensagem (querigma), era entáo catequizado ou recebia os
ensinamentos apregoados por Jesús durante a sua vida pública, ou
seja, a partir dos trinta anos... Com isto encerrava-se a tarefa dos
arautos da Boa-Nova; por conseguinte, com isto encerrava-se também
a tarefa dos Evangelistas; Sao Marcos ateve-se estrítamente a este
esquema, percorrendo apenas a vida pública e a glorificacáo final do -
Senhor. - Sao Mateus e Sao Lucas quiseram, por conta própria,
acrescentara tal esquema alguns dados atinentes á infancia de Jesús;
sao quadros mais ou menos avulsos ou urnas poucas noticias
referentes a Zacarías e sua familia, a Maria, a José, e aos prímeiros

305
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

lempos do Menino Jesús; há um intervalo entre Jesús aos quarenta


dias no templo de Jerusalém e Jesús aos doze anos entre os doutores,
como também há urna lacuna entre os doze e os trinta anos de Jesús';
nenhum desses hiatos desmerecia a missáo dos Evangelistas, que"
tinham em vista estrita apenas a pregacáo e a glorificacáo de Jesús.
Donde se vé que nao se deve estranhar a ausencia de noticias sobre
Jesús entre os doze e trinta anos. Só concebe surpresa quem nao
conhece o assunto e o encara a partir de categorías estranhas.

Em síntese, eis a diferenca entre biografía e "Evangelho":

BIOGRAFÍA:

Nascimento > Formado > Vida pública > Declínio


12 3 4
EVANGELHO:

Infancia < Vida pública < Páscoa final


3 2 1

Isto nao quer dizer que os Evangelistas tenham comecado a


escrever a partir da Páscoa final de Jesús, mas, sim, que a mensagem
evangélica se foi desenvolvendo oralmente a partir da Páscoa e
glorificacáo de Jesús.

De resto, sabe-se que Jesús, anteriormente á sua vida pública,


era carpinteiro e vivia em Nazaré, como se depreende de Mt 13, 55 e
Me 6,3; os numerosos ouvintes na sinagoga de Nazaré perguntavam:
"Nao é o carpinteiro, o filho de María, irmáo de Tiago, Joset Judas e
Simáo?".

Vé-se, pois, que é totalmente gratuita a hipótese de que Jesús


tenha ido ao Oriente remoto antes de sua vida pública. Nao há
fundamento para se sustentar isto. Ao contrario, a literatura apócrifa
narra episodios da vida de Jesús em Nazaré, exercendo a profissáo
de carpinteiro. Ver a propósito PR 318/1988, pp. 500s.

2.2 Jesús nao morreu na Cruz?

Os argumentos aduzídos por H. Kersten para afirmar que Jesús


nao morreu na Cruz, sao, em grande parte, depreendidos do exame
do Sudario de Turim (cf. pp. 141-190). - A propósito observe-se:

1) O Sudario nao pode servir de base para estruturar alguma


teoría, visto que a sua autenticidade ainda está em discussáo.

306
JESÚS VIVEU NA ÍNDIA"? 19

2) Mesmo que se admita a genuinidade da Mortalha, ela leva a


crer que Jesús morreu realmente e ai foi envolvido. O Dr. Pierre Barbet,
cirurgiáo francés, escreveu a respeito um livro minucioso de índole
científica, reconstituindo a Paixáo e a Morte de Jesús á luz da imagem
do Sudario1. Além disto, os dentistas sempre viram no Sudario a
imagem de um homem realmente morto. A tese de Kersten é totalmente
singular.

3) Independentemente do Sudario, a morte de Jesús na Cruz


consta das narracñes do Evangelho e de toda a Tradicáo crista. Os
maus tratos e a perda de sangue que Jesús padeceu desde a agonía
no horto das Oliveiras até a crucifixáo, explicam a sua morte na Cruz;
esta, de resto, foi averiguada pelos soldados, que nao Ihe quiseram
quebrar as pernas, como fizeram aos dois ladrees crucificados ao
lado de Jesús; por cautela, transpassaram-lhe o lado comum golpe
de lanca, que por si bastaría para matar Jesús (cf. Jo .19,31-37).

4) A fim de fugir da forca probatoria dos fatos, Kersten afirma


que o golpe de lanca foi apenas "urna arranhadura ou escoriacáo
superficial, e nao um golpe violento e muito menos um ferimento
profundo" (p. 182). Também para escapar á evidencia dos argumentos,
julga Kersten que Jesús ficou mais de tres días no sepulcro em
tratamento (possivelmente porporcionado a Jesús por companheiros
nazarenos ou essénios); cf. p. 195. Tais explicacóes sao artificiáis
porque inspiradas por preconceitos, como, alias, também é ridicula a
explicacáo dada á Ascensáo de Jesús, quarenta dias depois de
ressuscitado: "O caminho para Betánia segué em direcáo ao Sul, nos
contrafortes do Monte das Oliveiras até o pico da Ascensáo num aclive
bastante pronunciado. Quem chega até o picó da montanha.logo é
perdido de vista pelos que ficam um pouco mais abaixo" (p. 196). Isto
quer dizer que Jesús terá descido para o outrq'lado da montanha, de
modo a desaparecer aos olhos dos Apostólos;.háó,se',terá elevado
aos céus!... '..,".'. ./.''^\¿ '' .
5) Toda a Tradicáo professa á morte de Jesús na/Cruz e indica
seu sepulcro em Jerusalém. Nao há, entre os cristáos, noticia alguma
de sepultura de Jesús na india; sea houvesse, os cristáos teriam
peregrinado até lá, como peregrinaran! a Jerusalém, desde cedo até
nossos dias. É, pois, totalmente fora de contexto e de verossimilhanca
a hipótese de Kersten; é somente.o desejo.de.fazer de.Jesús um
Bodhisattwa que explica a sua engenhos¡dade.,fántasiosa.

6) Os preconceitos de Kersten sao mais e mais evidentes. Assim,


por exemplo, em Mt 26, 48 e paralelos se lé que a Jesús, antes de
morrer, deram a beber vinagre, bebida acidulada de que usavam os

1 A Paixáo de Cristo segundo o Cirurgiáo. Ed. Loyola, Sao Paulo.

307
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

soldados romanos. - Ora Kersten levanta a hipótese de que se tratava


de urna bebida usual na India (suco da planta asclepias acida), "que
permitía que as pessoas familiarizadas com a droga ficassem
aparentemente mortas por varios dias, despertando depois em estado
de euforia que durava também varios dias. Em tal estado de éxtase
religioso, podía manifestar-se urna consciéncia mais elevada dotada
de novos poderes de percepcáo" (p. 173). Ora é gratuito procurar
nos costumes da India urna interpretacáo para o vinagre que Jesús
bebeu antes de morrer.

É também sumaria demais a explicacáo dada as chagas dos pés


de Jesús: "Experiencias cirúrgicas com cadáveres tém demonstrado
que a crucificacáo por crávos nao destroi nem os vasos sanguíneos
mais importantes nem qualque'r osso. O cravo foi introduzido entre
oito ossos do pulso, afastando-os levemente. A perfuracio do pé
ocorreu no segundo metatarso, ferindo apenas a carne. Depois das
feridas maiores terem-se fechado, o homem vitimado precisaría apenas
de paz e tranqüilidade para se restabelecer, o que poderia ter sido
conseguido através da bebida narcótica" (pp. 193s).

H. Kersten nao leva em conta o fator mais decisivo para a morte


dos crucificados, que era a asfixia. Mesmo que as chagas produzidas
pelos cravos nao fossem mortais, a posicáo de quem pendia na cruz
levava á morte rápida por asfixia. Eis o que se lé no livro do Dr. Barbet:

"A fixagáo dos bragos levantados, portanto em posigao de


inspiragSo, acarreta relativa imobilidade das costefas e grande
incómodo na respiragáo; o crucificado tem a impressao de
sufocamento... O coragéo deverá trabalhar mais, suas pulsagóes se
precipitam e enfraquecem. Segue-se urna certa estagnagáo dos vasos
de todo o corpo. E como, por outro lado, a oxigehagáo se faz mal nos
pulmoes que funcionam insuficientemente, a sobrecarga de ácido
carbónico provoca excitagSo das fibras musculares e, como
conseqüéncia, urna especie de estado tetánico de todo o corpo" (p

Mais:

"Podemos citar o testemunho de dois antigos prísioneiros de


Dachau, que, varias vezes, presenciaram a aplicagáo do suplicio e
dele conservam terríficante lembranga... Suspendiam o condenado
pelas duas maos, quer urna ao lado da outra, quer separadas. Os
pés fícavam a certa distancia do solo.

Em pouco tempo, o incómodo respiratorio ficava intolerável. O


paciente procurava remediá-io erguendo-se com os bragos para poder
retomar fólego; conseguia-se manter no ar até 30 e 60 segundos.

308
"JESÚS VIVEU NA INDIA"? 21

Prendiam-lhe, entáo, pesos aos pés para dificultar os


soerguimentos. A asfixia se desfechava entño rápidamente em tres
ou quatro minutos. No último momento, tiravam os pesos, permitindo
de novo os soerguimentos para que, retomando fólego, conseguisse
reviver...

Após urna hora de suspensáo, tornavam-se estas confragües


cada vez mais freqüentes, mas também mais fracas e a asfixia se
estabelecia progressivamente e definitivamente. A testemunha
descreve a caixa torácica intumescida ao máximo, a cavidade
epigástrica muito profunda. As pernas rijas pendiam sem se agitar.
A pele ficava violeta. Abundante suor aparecía em todo o corpo,
escorrendo até o chao e manchando o cimento. Especialmente
profuso era este suor nos poucos minutos que precediam a morte;
os cábelos e a barba ficavam literalmente ensopados, aínda em
temperaturas próximas ao zero. Deviam esses agonizantes ter urna
temperatura bem elevada.

Depois da morte ficava o corpo em extrema rigidez. A cabega


caía para-a frente, no eixo do corpo. A morte sobrevinha, em media,
ao cabo de tres horas; ou um pouco mais tarde, quando as maos
ficavam separadas" (pp. 101 s).

Por conseguinte, o estudo atento e objetivo do Evangelho


colocado no contexto da arqueología e da medicina confirma que
Jesús realmente morreu na Cruz.

Passemos a outra das teorías de H. Kersten.

2.3. Jesús foi um Bodhisattwa?

Á p. 83 do livro de Kersten lé-se o seguinte:

"O fato de Jesús poder ser considerado como a perfeita


encarnagSo do ideal que floresceu na india com o budismo
Mahayana é de singular importancia. Mesmo nos pequeños
detalhes, ele apresenta as características do Bodhisattwa ideal
delineadas no século 3o a.C, quando o budismo abandonou o
intimismo dos monges Hinayana, para tornarse urna religiéo
popular e universal. A existencia terrena de um Bodhisattwa é
totalmente determinada por sua missáo de salvador, destinado a
introduzir todas as almas no caminho reto da redengáo dos
sofrimentos humanos.

Apesar de todas as tentativas feitas no sentido de obscurecer


a verdadeira origem dos ensinamentos de Jesús, e apesar da

309
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

rigorosa canonizagao dos evangelhos, aínda encontramos mais de


cem passagens' claramente enraizadas na antiga tradicáo budista"
(p. 83).

A fim de avahar esta afirmacáo. perguntamo-nos: que é o


Budismo? •

- O Budismo é um sistema filosófico panteísta; identifica a


Divindade, o mundo e o homem como sendo urna só substancia
Em conseqüéncia, nao é Deus quem salva o homem mas é o
homem que salva a si mesmo mediante a serie de reencarnacóes
(samsara), que dáo.á pessoa a chance..de extinguir o apego á
materia mediante rigorosa ascese e esvaziamento interior. O corpo
e tido como algo de;desprezível; quem se reencarna, está sendo
punido pela lei do karma; o ideal é desencarnar-se definitivamente1.

Ora a doutrina de Jesús é radicalmente diversa de tal sistema


Comefeito ■> -- —

,w -Jesús se sitúa no termo de chegada do Antigo Testamento, que


professava o monoteísmo estrito e a transcendencia de Deus- cf Mt
5,17-19. Ele veio trazer a plenitude da Revelacáo iniciada no judaismo,
afirmando a unicidade de um só Deus, cuja vida é táo rica que elá
subsiste em tres Pessoas (as quais nao perfazem tres deuses);

- para Jesús, a materia nao é má; por isto a consumacáo do


homem se dará mediante a ressurreicáo dos corpos; cf. Mt 22,29-32.
Ele mesmo predisse a sua ressurreicio (cf;»Mt 16,21; 17,22s- 20 17-
19) e ressuscitou (cf. Mt 28,1-20...). Examinaremos á parte (cf. pp.
312s) as passagens do Evangelho aduzidas em favor da
reencarnacáo.

- "Quase tudo o que foi dito sobre Jesús encontra paralelo ñas
■.§{$93$,^lencjas,indianas"..(p. 136). -.Kersten aponta milagres de
n^estres indianos para firmar sua sentenga. Ora este ponto de contato
¿oténue^M^itos, horhens, especialmente na India, dotados de
faculdades parapsicológicas, podem ter efetuado facanhas
surpreendehtes.tidas como-milagrosas. Isto, porém, nao basta para
que.estabele9amos o paralelo dos mesmos com Jesús.

1 O panteísmo de Kersten se manifesta na seguinte passagem:


"A'príricipál'causadesse equívoco (decllnio do sonso religioso) 6 urna má
interpretagao do conceito de Deus. O divino neo se coloca a urna distancia
utópica, mas dentro de cada um de nos, inspirando urna vida em harmonía
com o Infinito e o reconhecimento de que nossa curta existencia nao passa
.de um momento da eternidade, da qual faz parte" (p. 14).

310
"JESÚS VIVEU NA ÍNDIA"? 23

- Sao Paulo e o grande teólogo a quem se deve urna profunda


penetracao do pensamento de Cristo nos escritos do Novo Testamento
Corri efeito; Sao Paulo tinha consciéncia de ser discípulo de Jesús
(cf. Gl 1,15-24; At 9, 26-30; 22,3-21; 26,4-23); só queriü testemunhar
o que de Jesús aprenderá (cf. 1Cor 15,3-10; 11,23-32); refere-se a
Jesús como Filho de Davi (cf. Rm 1,3), nascido da mulher (Gl 4 4) O
grande mérito de Sao Paulo foi ter mostrado que a Lei de Moisés se
consumou em Cristo, de modo que Este trouxe o cumprimento das
promessas feitas aos Patriarcas de Israel (2Cor 1,20). O pensamento
paulino deve ser entendido a partir das premissas judaicas e bíblicas
do Apostólo muito mais do que em funcáo de categorías do helenismo
Eis a propósito as observacóes de G. Bellinato:

"Nao obstante o impacto da educagáo grega, a coloragao peculiar


da personalidade de Paulo, o seu vulto espiritual e a raíz profunda de
sua contextura existencia! sao hebraicas. 'SSo hebreus?' (=
conhecedores aprimorados da língua hebraica), também eu. SSo
descendentes (semen) de Abraao? (= desfrutando da absoluta pureza
da raga), também eu' (2Cor 11,22). Sim, Paulo, ao ensejo da defesa
pessoal contra os judaizantes, tem palavras de ufanía e altivez, por
ser um legitimo rebento da estirpe judaica (cf. Fl 3, 4-6). Paulo vive
num contexto grego, mas respira num clima espiritual hebraico" (Paulo-
Cartas e Mensagens, p.11).

2.4. Os apócrifos

Os apócrifos do Novo Testamento sao livros oriundos nos


primeiros cinco séculos da Igreja, com aparéncia de textos bíblicos.
Apresentam-se como complementacáo da literatura bíblica canónica
falando dos ancestrais de Maria SS., da infancia de Maria, da infancia
de Jesús, da sua vida oculta, da sua Paixáp, etc. Sao marcados por
tres tragos característicos:

- contém elementos de historia aceitáveis ou fidedignos, pois nem


tudo o que se refere a Jesús foi consignado nos Evangelhos canónicos.
A Igreja tira dos apócrifos os nomes dos genitores de María (Joaquim
e Ana), a apresentacáo de María no Templo aos tres anos de idade
os esponsais de María e José...; '

- contém elementos altamente fantasiosos, devidos ao fervor


exuberante de antigos cristáos, que ¡maginavam um Jesús portentoso
do nascer ao morrer;

- contém elementos heréticos, isto é, doutrinas destoantes da'


mensagem oficial da Igreja. Para dar maior énfase ou urna,aparente
autoridade ás suas doutrinas, muitas escolas teológicas dissidentes
redigiam-nas em estilo de Evangelho, Atos de Apostólos, epístola
etc.

311
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Sendo assim, vé,se que é necessária certa cautela cuando se


íí °s apócr¡fos; fácilmente pederá alguém dar créditoindevido
imZZ ía9° d0S mesmos- A Palavra de Deus pregada pe os
Profetas e por Jesús vive no ámago da S. Igreja assistída por Jesús
Ur°rlTESPÍrÍt0 * *" de qU6 ná0 S° ^iíf^K
. 3. A REENCARNAQÁO E O CRISTIANISMO
3.1. A Reencarnacáo nos Evangelhos

Os escritos do Novo Testameno estáo intimamente associados


ao pensamento judaico pré-cristáo. Ora este nao admitía a
reencarnacáo das almas. Sendo esta doutrina professada por filósofos
gregos, os judeus se fecharam a ela, pois eram infensos a qualquer
tipo de sincretismo religioso. - Foi nesse ambiente que Jesús preqou
o seu Evangelho. a

Feita esta observacáo, passemos ao exame sucinto dos textos


bíblicos geralmente citados em favor da reencarnacáo.

3.1.1. Joáo Batista e Elias

Mt 17, 10-13: Os judeus julgavam que Elias nao morrera, mas


fora arrrebatado aos céus (cf. 2Rs 2,11) e, por isto, voltaria á térra
para revelar e ungir o Messias. Ora, nos tempos de Cristo,
politicamente agitados, o profeta Elias era esperado em Israel com
particular insistencia. Pois bem; Jesús respondeu que Joáo Batista
fizera as vezes de Elias por reproduzir as atitudes fortes e destemidas
do profeta (cf. Le 1,17). O próprio Joáo Batista negou peremptoriamente
ser Elias, quando os enviados dos judeus o interrogaram (cf. Jo 1,21).
A luz destas ponderacoes, entenda-se também o texto de Mt 11,14s.

Mais: no momento da Transfiguracáo apareceram a Jesús Moisés


e Elias (cf. Mt 17,3). Ora, naquele tempo Joáo já fora executado por
Herodes ou já morrera. Por conseguinte, deveria aparecer a Jesús
Joáo Batista e ñáo Elias, conforme a doutrina da reencarnacáo, pois
esta ensina que, quando o espirito se materializa, sempre se apresenta
na forma da última encarnacáo. - Donde se vé que Joáo Batista nao
era a reencarnacáo de Elias.

3.1.2. Jesús e Nicodemos

Jo 3,3: O adverbio grego ánothen, que por vezes é traduzido


por de novo, reaparece em Mt 26,51, para significar que, por ocasiáo
da morte de Jesús, o véu do Templo se cindiu ánothen, isto é, de
cima a baixo (nao de novo).

312
"JESUSVIVEUNAiNDIA"? 25

Nicodemos nao entenderá as palavras de Jesús- fiel aos


ensinamentos judaicos, julgava impossível a reencarnacáo- "Como
pode um homem nascer sendo velho? Poderá entrar segunda vez no
seto de sua máe e voltar a nascer?" (Jo 3,4). Jesús logo dissipou a
duvida, explicando que nao se tratava de renascer no sentido
biológico, mas, sim, de nascer de outro modo, ou seja pela agua e
pelo Espirito: "Em verdade. em verdade te digo: quem nao nascer da
agua e do Espirito, nao poderá entrar no Reino de Deus" (Jo 3 5)
Positivamente, Jesús tinha em vista o Batismo, que torna o homém
filho de Deus.

3.1.3. Jesús e o cegó de nascenca

Jo 9,1 s: Os judeus julgavam que todo mal é conseqüéncia de um


pecado. Porconseguinte, no caso de üm cegó de nascenca, pensariam
num pecado dos pais (que, segundo a mentalidade do da, seria punido
sobre os filhos), ou num pecado do próprio cegó: esta última hipótese
deveria parecer-lhes absurda, pois sabiam que as enancas nascem
sem ter cometido previamente nem bem nem mal (cf. Rm 9,11). Assim
perplexos, lancaram suas interrogacóes a Jesús, sem se dar ao
trabalho de procurar terceira solucáo para o caso. Ora, Jesús
respondeu sem abordar o aspecto especulativo da questáo, elucidando
djretamente a situacáo concreta que Ihe apresentavam: nem urna
hipótese nem outra, mas um designio superior de Deus ("... para se
manifestarem nele, cegó, as obras de Deus").

De resto, a Escritura é diretamente contraria á reencarnacáo


quando, por exemplo, afirma: "Foi estabelecido, para os homens,
morreruma só vez; depois do qué, há o julgamento" (Hb 9,27). Notemos
também as palavras de Jesús ao bom ladráo: "Hoje mesmo estarás
comigo no paraíso" (Le 23,43). Os textos muito enfáticos em que Jesús
e os Apostólos anunciam a ressurreicáo dos mortos, o céu e o inferno,
sao outros tantos testemunhos que se opóem á reencarnacáo: vejam-
se Mt 5,22; 13,50; 22,23-33; Me 3,29; 9,43-48; Jo 5;28s; 6,54; 1Cor
15,13-19. ' • •- ■ :

3.2. A Reencarnacáo na Tradicáo da Igreja

Examinemos os testemunhos dos primeiros séculos do Cristianismo.

Clemente de Alexandría (t 215) julga ser a doutrina da


reencarnacáo arbitraria, porque nao se baseia nem ñas sugestóes-
da nossa consciéncia nem na fé católica; lembra que a Igreja nao a
professa, mas, sim, os hereges, especialmente Basilides e os
Marcionistas. Cf. Eclogae ex Scripturis Propheticis XVII PG 9, 706;
Excerpta ex Scriptis Theodoti XXVIII, PG 9, 674; Stromata III, 3; IV,
12 PG 1114s. 1290s.

313
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

S. Irineu (t 202) observa que em nossa memoria nao se encontró


83S0s?'°eme PretenHsaS,?X¡Sté-nCÍas anteriores (A?v Haer II 33 PG 7
S£Í ^TLlll*: °_P°!.o dogma da ressurreicáo dos ' PG ?"
restituir a cada

Outros autores antigos se poderiam citar a propor semelhantes


ST2;,0 ™"™*?«™\ P°'ém, é Or¡gePnerde Atexíndria
ÍÍh« )
todos os
P- .P°S; á-9UISa de hiPótese. a Preexistencia das almas:
espintos tenam sido criados desde toda a eternidade e
dotados da mesma perfeicáo inicial; muitos, porém. teráo abusado da
sua liberdade e pecado. Tal pecado haverá sido, para Deus, a ocasiáo
de criar um mundo material, a fim de servir de lugar de castigo e
punficacao. Conforme a falta cometida, cada espirito teve que tornar
em punicao, um corpo mais ou menos grosseiro. Os que nao se
punficassem devidamente nesta vida, deveriam passar, depois da
morte, para "um lugar de fogo". Mas finalmente todos seriam
reintegrados na suprema felicidade com Deus; o inferno nao seria
eterno.

Notemos que estas idéias foram propostas com reservas e a título


de hipóteses (cf. Peri Archon; PG 11,224). Todavía os discípulos de
Orígenes, chamados origenistas, eram monges do Egito, da Palestina
e da Siria, que se beneficiavam dos escritos ascéticos e místicos do
mestre, mas eram pouco versados em teología; por conseguinte, nao
tinham criterios para distinguir entre as verdades de fé e as proposicdes
hipotéticas de Orígenes. Os origenistas, portanto, nos séculos IV/VI
professaram como artigos de fé nao só a preexistencia das almas e a
restauracáo final de todos na felicidade inicial, mas também a
reencarna9áo. Contrariavam assim o pensamento do próprio Orígenes,
que era avesso á reencarnado, tida por ele como "fábula inepta e
impía" (In Rom. V. PG 14, 1015).

As doutrinas dos origenistas chamaram a atencáo das


autoridades da Igreja. Em 543, o Patriarca Menas de Constantinopla
redigiu e promulgou quinze anatemas contra Orígenes, dos quais os
quatro primeiros nos interessam diretamente:

1. "Se alguém crer na fabulosa preexistencia das almas e na


repudiável reabilitagáo das mesmas (que é geralmente associada
áquela), seja anatema.

2. Se alguém disserque os espiritos racionáis foram todos criados


independentemente da materia e alheios ao corpo, e que varios deles
rejeitaram a visáo de Deus, entregándose a atos ilícitos, cada qual
seguindo suas más inclinagóes, de modo que foram unidos a corpos,
uns mais, outros menos perfeitos, seja anatema.

314
"JESÚS VIVEU NA ¡NDIA"? 27

3. Se alguém disser que o sol, a lúa e as estrelas pertencem ao


conjunto dos seres racionáis e que se tornaram o que eles hoje sao
por se voltarem para o mal, seja anatema.

4. Se alguém disser que os seres racionáis nos quais o amor de


Deus se arrefeceu, se ocultaran) dentro de corpos grosseiros como
sao os nossos, e foram em conseqüéncia chamados homens, ao passo
que aqueles que atingiram o último grau do mal tiveram, como partilha,
corpos fríos e tenebrosos, tornándose o que chamamos demonios e
espíritos maus, seja anatema".

O Papa Vigílio e os demais Patriarcas deram a sua aprovacáo a


esses artigos. Concluímos, pois, que a 'doutrina da reencarnacáo
nunca foi professada oficialmente pela Igreja Católica (contradiz ao
Credo cristáo); todavia após Orígenes (século III) foi professada por
grupos particulares de monges orientáis, pouco iniciados em teología;
em 543 foi solenemente rejeitada pelas autoridades da Igreja. A mesma
condenacáo ocorreu nos Concilios ecuménicos de Liáo (1274) e
Florenca (1439), que ensinám a ¡mediata passagem desta vida para
a sorte definitiva no além (DS 857 [464] e 1306 [693]). O Concilio
Vaticano II, por sua vez, fala do "único curso da nossa vida terrestre
(Hb 9,27)", tencionando assim opor-se á teoría da migracao das almas;
cf. Lumen Gentium n° 48.

4.CONCLUSÁO

Verifica-se que o livro de H. Kersten é tendencioso; aborda a


figura e a vida de Jesús a partir de premissas gratuitamente
preconcebidas; Jesús seria um Bodhisattwa; por conseguinte deve
ter fogosamente tido relacóes com a india e sua filosofía religiosa.
Estabelecida esta tese, o autor forca os textos bíblicos e nao bíblicos
a fim de fundamentaren! o seu pensamento, chegando porvezes ás
raias do ridículo. O livro assim tem pouco valor científico; representa
urna expressáo singular da filosofía religiosa contemporánea, que tem
contra si testemunhos da arqueología, da historiografía, da medicina,
e de vinte séculos de Tradicáo crista; é difícil crer que só no século
XX (dezenove séculos após a morte de Jesús) se tenha podido chegar
á verdade a respeito dele; hoje saberíamos mais sobre Jesús do que
souberam as primeiras gera9óes cristas; estas teráo sido todas iludidas
e simplonas;, teráo transmitido a ilusáo até nossos días!

A singularidade da vida.e da doutrina de Jesús se depreende de


um examé atento de sua mensagem, que pode ser estudada no livro
Riquezas da Mensagem Crista de D. Cirilo Folch Gomes (Ed. Lumen
Christi, C. p. 2666, 20001-970 Rio-RJ) ou nos Cursos de Iniciacáo
Teológica e de Cristologia por Correspondencia (C. p. 1362, 20001-
970 Rio-RJ).

315
Livro Polémico:

"O CATECISMO DA IGREJA


CATÓLICA E NOSSA CATEQUESE1
porWolfgang Gruen

Em síntese: O Pe. Wolfgang Gruen distingue entre Compendio


da Fé e Catecismo. Aquele pode ser hegemónico e autoritario, ao
passo que o Catecismo há de ser popular. A luz desta premissa, o
autor critica o Catecismo da Igreja Católica como sendo obra de
clérigos prepotentes e dominadores, vasada em linguagem segura e
alta, utilizando a Biblia em estilo fundamentalista. Propoe que o povo
simples julgue o Catecismo sob a inspiragño do Espirito Santo. - Ora
o Catecismo nao pode ser redigido na ótica de alguma ideología,.nem
na dos clérigos nem na dos leigos; há de ser redigido na ótica da fé
entregue por Cristo á sua Igreja e professada pelo-magisterio desta.
A linguagem respectiva nao pode deixar de exprimir a certeza e a
esperanga que a fé transmite, pois a fé n§o é construgáo hipotética,
¡á que e/a encaminha o homem pelas estradas da vida em demanda
de valores definitivos. A linguagem do Catecismo também nSo pode
deixar de recorrer a vocábulos clássicos, consagrados pelo uso, mas
sujeitos a ser explicados com clareza e fídelidade aos destinatarios
do Catecismo em cada regiSo do mundo.

Em suma, o Catecismo n§o é urna obra a ser "leiloada" entre os


fiéis, mas é urna expressio do magisterio da Igreja, á qual Cristo
prometeusua assisténcia infalível (cf. Mt 16,16-18; 18,18; 28,18-20);
é "texto de referencia segura e auténtica para o ensino da doutrina
católica","é norma segura para o ensino da fé" (Joño Pauto II,
ConstituigSo Depositum Fidel J.

• O Pe. Wolfgang Gruen, salesiano, é condecido por suas obras


de exegese bíblica e de catequética. Publicou um livro que analisa o
Catecismo da Igreja Católica (CIC) em tom de crítica que pretende
ser amiga e construtiva/mas se ressente deazedume e parcialidade1.
Já o título o insinúa, distinguindo entre o "Catecismo da Igreja Católica"
e "nossa Catequese". A seguir, examinaremos o conteúdo da obra e
formularemos algumas consideracóes que ela sugere.

1 O Catecismo da Igreja Católica e Nossa Catequese. Perspectivas. Ed.Vozes


Petrópotts. 135 x 210mm. 101pp.

316
"O CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA E NOSSA CATEQUESE" 29

1. O TEOR DO LIVRO

1. Em' poucas palavras, o autor distingue entre Compendio da


Fé e Catecismo. Aquele seria urna súmula dos artigos do Credo,
proposta em catéter intelectual e escolar, ao passo que Catecismo
sería urna proposicáo das verdades da fé elaborada em vista das
condicóes concretas em que vive o povo, ou seja, levando-se em conta
a pobreza e as muitas carencias da populacáo brasileira e latino
americana em geral. Em outros termos: o Catecismo seria a fé
considerada na ótica do povo ou dos pobres ou das bases.

Ora Gruen julga que o CIC foi redigido segundo o modelo dos
anteriores Catecismos da Igreja, oü seja, de maneira intelectualjzante
e escolástica; atende á ótica das. classes dominantes, impohdo a
doutrina de maneira prepotente:

"Que é catequese? O CIC, citando a Exortagáo Apostólica


Catechesi Tradendae, de 1979, parte do principio de que 'a
catequese é urna educagáo da fé das criangas, dos jovens e dos
adultos, a qual compreende especialmente um ensino da doutrina crista
dado em geral de maneira orgánica e sistemática, com o fim de os
iniciar na plenitude da vida crista' (n° 18). Como se vé, ensino,
doutrina, orgánico, sistemático, tudo aponta para urna atividade
típicamente nocional, até escolarizada. Em conseqüéncia do
autoritarismo com que este ensino era ministrado, o termo Catecismo
e seus derivados passaram até a evocar urna /dé/a de doutrinagao
agressiva, de manipulagáo da mente: 'Vocé está querendo me
catequizar?' É urna pena, pois catequese é justamente o contrario11
(p. 61).

"Por que insistir táo unilateralmente nos conhecimentos


teológicos? NSo é de vida, amor, esperanga, tibertagSo de tutelas
descabidas que hoje mais precisamos? A dinámica do provisorio nao
é mais crista do que esta fíxagSo do divino e da fé que mais sabe
sobre a idolatría?'' (p. 64).

Por conseguinte, nao pode haver um Catecismo único para toda


a Igreja, mas deve haver muitos Catecismos, de acordó com a
diversidade das regióes em que se realiza a Catequese.

2. Após estas premissas genéricas, o autor passa a avaliar os


diversos aspectos do CIC.

2.1. llustracdes. Gruen crítica as quatro ilustracóes ou imagens


que acompanham o texto do Catecismo: em nenhuma aparece a
comunidade ou a multidáo; tém um ar de repouso no além; lembram a
vida eterna e nao parecem levar em conta a vida das comunidades
militantes aqui na térra (pp. 72s).

317
30"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Gruen ?heLíanz9?esl1^ 'Ín9Ua9em * "^ eXata" Ortodoxa. •"■•


a) Linguagem segura de si, "linguagem de quem sabe OUPr
ensinar e nao e muito achegado a questionarnentol..?o?CICnao gSsfa
de ponto de interrogado. Quando faz urna perqunta sabe92
responder (cf. n« 282.309). Um termo como "o inferno" (n»' 1033-1037)
nao comporta nenhum ponto de interragacáo" (p. 74). '

h«.,iÍ! ün9Ua9em "alta",."culta, repleta de citacóes que abonem a


doutnna,... uso desnecessário do grego e do latirn" (p 75)

o ♦ °) |rin9ua9emi problemática. Os termos utilizados nao sao


entendidos no mundo de hoje: forma e materia, natureza e pessoa
hipóte»? ai/Cia7?7a)°1 economia divina, embolismo, epiclese, sinaxe]

"O Catecismo continua tranquilamente a apresentar, como se nada


tivesse mudado no modo de compreendéJas, categorías como paraíso
ñas ongens da humanidade, pecado imperdoável dos anjos
encarnagao do Verbo de Deus, predestinagao divina (n° 600) sacrificio
%xJHa£r-!? pel° Pecad0 (n° 616), descida de Jesús aos infernos (n°
632-637) e tantos outros. Nao é fugir de urna responsabilidade aue
cabería justamene a esta obra?" (p. 78).

2.3. Uso da Biblia. Gruen reconhece o ampio recurso a textos


bíblicos no CIC (mais de 3.000 citacóes), mas julga que sao
interpretados de maneira fundamentalista, isto é, ao pé da letra sem
levar em conta os progressos da lingüística, da arqueología, da
historiografía antiga... que podem modificar o clássico entendimento
do texto sagrado. Afirma também que "falta as citacóes o calor do
entusiasmo por esta Biblia que de repente está suscitando e animando
comunidades, devolvendo o senso de sua dignidade aos pobres,
abrindo os olhos do povo, criando um modo de falar, rezar e cantar]
um jeito profético de ser cristáo. Faltou a percepcáo deste papel da'
Biblia na comunidade; alias, sequer urna vez nestas páginas fala-se
em comunidades - só em Igreja no sentido ampio do termo" (p. 80).

2.4. Os pobres e pequeños. "Análogo ao da Biblia e da


comunidade é o tratamento que o CIC dá aos pobres e pequeños.
Estáo presentes; há até afirmacóes valiosas sobre eles, como as do
denso n° 544. Mas nao aparecem como relevantes no conjunto da
obra; sao tematizados, mas nao sao vistos como dimensáo
evangélicamente relevante. Sao olhados com carínho, mas de cima
para baixo" (p. 81).

"Exemplos de acentuagoes desproporcionáis: no n° 328 diz o


cabegalho: 'A existencia dos anjos - urna verdade de fé". - Tudo bem;
mas por que enfatizar que justamente esta é urna verdade de fé? O

318
"O CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA E NOSSA CATEQUESE" 31

mesmo repete-se no n° 388; no cabegalho, o pecado original é


proclamado 'urna verdade essencial da fé'. Desproporciona! parece-
nos também o espago excessivo concedido no livro a questóes
relativamente margináis: duas páginas sobre a existencia e as funcóes
dos anjos (p. 87-88). Duas páginas sobre a descida de Cristo aos
infernos (p. 156-157)" (pp. 82s).

3. Em conclusáo, o autor convida o leitor a aceitar o CIC em


espirito de comunháo com a Igreja (p. 91), mas, ao mesmo tempo,
julga-o radicalmente viciado, porque redigido na ótica clerical,
hegemónica e dominadora. Disto se segué lógicamente que o CIC
tem que ser refeito... e refeito na ótica do pobre e pequenino. Quem
fará esse novo Catecismo, será "urna equipe de leigos e clero,
mulheres e homens" (p. 98).

2. QUE DIZER?

Proporemos cinco pontos de reflexáo.

2.1. A ótica do CIC

O autor julga que o CIC foi escrito na ótica dos clérigos e


dominadores, quando deveria ser redigido'na ótica dos pobres e
pequeños. Em ambos os casos, dizemos, há ideología, isto é, visáo
parcial, unilateral... -A doutrína católica nao é urna mensagem de
clube ou partido de filósofos, técnicos e profissionais humanos, mas
é a mensagem da fé; portanto é á luz da fé que deve ser redigida.
Ora a fé é a mesma para pobres e nao pobres, para leigos e clérigos.
A fé se encontra formulada na Biblia e também na Tradicáo oral, que
antecede e acompanha a Biblia e que é professada pela Igreja através
do seu magisterio assistido por Cristo.

Está claro que em cada regiáo a mesma e única doutrína da fé


pode ser adaptada as circunstancias dos destinatarios respectivos.
Diz o Santo Padre na Constituicáo Fidei Depositum publicada logo
no inicio do CIC: "Este Catecismo... destina-se a encorajar e ajudar a
redacáo de novos Catecismos locáis, que tenhám ém conta as diversas
situacóes e culturas, mas que conservem cuidadosamente a vinidade
da fé e a fidelidade á doutrína católica".

O magisterio nao é senhor arbitrario e prepotente da doutrína de


Jesús Cristo, mas é o servidor ao qual Jesús confiou o encargo de
guardar e transmitir fielmente o Évangelho; ele está sujeito ao
Evangelho e a Jesús Cristo. Tenha-se em vista a Constituicáo Dei
Verbum do Concilio do Vaticano II:

"O oficio de interpretar auténticamente a palavra de Deús escrita


ou transmitida oralmente foi confiado únicamente ao Magisterio vivo
da Igreja, cuja autorídade se exerce em nome de Jesús Cristo. Tal

319
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Magisterio evidentemente nao está ácima da palavra de Deus


seuserv,Qo, nSo ensinando senao o Que foitran£>MHn"S\

2.2. Catecismo da Igreja e Moral Católica

a«c 2 ^f * Gruen.eftá muito ¡nteressado em que o Catecismo responda


aos problemas existenciais do povo simples, vítima de injusticas Parece
fazer desse interesse o criterio para julgar o Catecismo da Igreia - A
proposito escreve sabiamente o Cardeal Joseph Ratzinger Prefeito
da Congregacao para a Doutrina da Fé: • riclcllu

. "Após a queda das ideologías, o problema do homem, o problema


moral poe-se hoje de modo totalmente novo: que devemos fazer?
Como a ordem das coisas se tornará justa? Que é que nos
proporcionará um futuro digno de ser vivido?

O Catecismo trata dessas perguntas; por isto é um livro que


interessa a todos, muito além do ámbito estritamente teológico ou
eclesial... Nao reproduz urna opiniao privada, que invente tal ou tal
resposta, mas formula a resposta que procede da grande experiencia
comunitaria da Igreja de todos os séculos. Esta experiencia é devedora
a um acontecimento que ultrapassa os limites do simplesmente
humano; transmite o que puderam ver e ouvir pessoas que estiveram
em contato com o próprio Deus...

Seria entSo o Catecismo um livro de Moral? Em resposta, devemos


dizer: ele o é, mas é também algo mais. Trata do homem, mas na
persuasao de que a questáo do homem nao pode ser separada da
questSo de Deus. Nao se pode falar corretamente sobre o homem, se
neo se fala também de Deus. Mas nao conseguimos falar de Deus em
termos corretos se Ele mesmo neo nos diz quem Ele é. Por isto as
normas moráis que o Catecismo oferece, nao podem ser desligadas
daquilo que ele diz sobre Deus e sobre a historia de Deus conosco.O
Catecismo deve ser lido como um todo. Seria falso ler as páginas
sobre Moral, desligando-as do seu contexto, isto é, da profíssSo de
fé, da doutrina sobre os sacramentos e a oragáo' (Introdugéo á obra
II Catechismo del Vaticano II, por varios autores, Miláo 1993, pp.
6s).

Estas palavras explicam por que o Catecismo expóe a doutrina


do pecado original, do anuncio da Redencáo feito por Jesús aos justos
do Antigo Testamento logo após sua morte na Cruz (= descida á
mansáo dosmortos, em Hnguagemfigurada), comotambémtrata dos
anjos e das suas funcóes no plano de Deus... Estes nao sao temas
de Teología Moral, nem temas que levem diretamente á mudanca das

320
"O CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA E NOSSA CATEQUESE" 33

estruturas sociais, mas pertencem ao patrimonio da fé, sem o qual a


Moral corre o risco de degenerar em ideología. Para efetuar os
primordios do Reino de Deus na térra, todos precisam da graca do
Redentor, que vem através dos sacramentos e da oracáo.

2.3. Firmeza e Seguranca ñas Sentencas de Fé

A mensagem da fé é urna cosmovisáo na qual há artigos firmes e


seguros; a fé tem suas certezas. O fiel católico nao tem receio de o
dizer nem se envergonha disto. Tais certezas sao necessárias, pois a
fé tenciona orientar a caminhada dos fiéis para o seu Objetivo
supremo e decisivo; orientar com inseguranca e risco de erro é pouco
honesto; se eremos em Deus e na sua Revelacáo, eremos que esta
propóe referen ciáis seguros para a caminhada rumo á Vida. Dai dizer
o Santo Padre Joáo Paulo II que o Catecismo deve "servir como texto
de referencia seguro e auténtico para o ensino da doutrina católica"
(Constituicáo Fidei Depositum).

Está claro que o grande depósito da fé pode deixar pontos


secundarios sem resposta. Há quem pergunte: por que tal e tal
desastre ou desgraca ocorre? - A fé projeta luz sobre o problema do
sofrimento e da morte em geral, mas ela nao fornece explicacáo para
cada caso infeliz. A fé professa a existencia da Providencia Divina,
mas nao elucida por que o misterio da iniqüidade ou do pecado é táo
atuante no mundo; o crístáo sabe que o Senhor do campo nao quer
arrancar o joio que cresce ao lado do trigo enquanto nao chega o dia
da messe (cf. Mt 13,29s); é certo, portanto, que o joio nao existe sem
que a Providencia Divina o saiba e o permita, mas a Providencia nao
nos dá satisfacáo a respeito de cada caso de joio neste mundo. Estas
interrpgacoes existem nao só na mente dos leigos, mas também na
dos clérigos, mas elas nao afetam o edificio da fé, que tem certeza de
que a última Pajavra dá historia é a do Reí dos Reis. De resto, S.
Agostínho afirma que Deus nunca permitirla o mal no mundo se nao
soubesse tirar dos males bens ainda maiores (Enquirídio cap. 27).

Também os ^pequeños precisam de certezas, pois, como todo ser


humano, eles concebenrras questóes fundamentáis: "Quem sou eu?
Donde venho? Para onde vou? Por que sofro? Por que luto para ser
honesto? Por que hei de morrer? Que haverá depois da morte?". A
resposta firme e clara para tais perguntas é o elemento mais
necessário para que alguém possa estruturar a sua vida e levá-la
corajosamente adiante, como alerta o psicólogo Viktor Frankl em sua
Logoterapia. Ora a doutrina da fé propóe a resposta nítida e segura
a todo e qualquer crístáo através do Catecismo.

^^Pp?R^. ^V<ío.^jefér^^a^^ss^füngao/doCatecisrno,- de fírmar


'é'cortfirmafá fé noVsegüintesiérrhbs: •' ■ '
>>h'-\v;\vH •>. ¿\í=l, ^oíweveb .n<v^ou aoVí >;•:•;.■. -.:■:■<< <.■■■ ..-• .-.-■ ■ ■ .
nvi\>'JMuitos>Jié¡s¿BSt§o. perturbados>em sua fé.por um conjunto de
321
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

ambigüidades, de incertezas e de dúvidas, que atingem a fé no que


ela tern de essencial... Enquanto o silencio envolve aos poucos alguns
místenos fundamentáis do Cristianismo, vemos delinearse urna
tendencia a reconstruir, a partir de dados da psicología e da sociología
um Cnst,an,smo desligado da tradigáo ininterruptaque o faz chega'r
até a fé dos Apostólos, e a exaltar urna vida crista destituida de
elementos religiosos' (Quinqué iam Anni n. 1).

Estas palavras foram proferidas cinco anos após o encerramento


do Concilio do Vaticano II (1962-1965), quando as teorías e hipóteses
em Teología e Moral sacudiam fortemente o povo de Deus e Ihe
causavam mal-estar, A Igreja tinha a obrigacio de atender a esses
seus filhos (pequeños e grandes), que se angustiavam por ver
solapadas fundamentáis verdades da fé (relativas a Jesús á
Eucaristía, á Igreja, á Virgem Maria, aos últimos fins...), sem que a
autoridade da Igreja, encarregada de guardar íntegro o depósito da
fé, se pronunciasse claramente.

2.4 Linguagem alta e problemática

O Catecismo foi escrito para todos os fiéis, também para aqueles


que tém um tanto de cultura religiosa ou de cultura geral. Daí o
emprego de vocábulos técnicos ou consagrados pelo uso secular, quer
na língua latina, quer na grega, quer na vernácula. Faz-se oportuno
recordar o ocorrido após o Concilio do Vaticano II, quando alguns
teólogos julgaram que o termo transubstanciagao se tornara
ininteligível para o pensamento contemporáneo; procuraram substituí-
lo pelo vocábulo "tránsfinalizácao" e "transignificacao"; a experiencia
redundou em confusáo na mente dos fiéis e deterioracáo do sentido
da fé; daí a encíclica Mysterium Fidei do Papa Paulo VI (3/9/65),
que pede ;o,retorno áipalavra "transubstanciacio" para evitar os mal
entendidos-suscitados pela troca. Escreve S. Santidade:

"23... Salva a integridade da fé, é necessário salvar também a


maneira exata .de falar, niq acontega que, usando nos palavras ao
acaso, entrem no nosso espirito - o que Deus n§o permita - idéias
falsas como expressño da crenga nos mais altos misterios. Vem a
propósito a advertencia de S. Agostinho sobre o modo diverso como
falam os filósofos e os crístaos: 'Os filósofos, escreve o Santo, falam
livremente, sem medo de ferír os ouvidos das pessoas religiosas em
coisas muito difíceis de entender. Nos, porém, devemos falar segundo
urna regra determinada, para evitar que a liberdade de linguagem

322
"O CATECISMO DA IGREJACATÓLICA E NOSSA CATEQUESE" 35

venha a causar maneiras de pensar impías, mesmo quanto ao sentido


das palavras'.1

24. Donde se concluí que se deve observar religiosamente a regra


de talar que a Igreja, durante longos séculos de trabalho, assistida
pelo Espirito Santo, estabeieceu e foi confirmando com a autorídade
dos Concilios, regra que muitas vezes se veio a tornar sinal e bandeira
da ortodoxia da fé. Ninguém presuma mudé-la, a seu arbitrio ou a
pretexto de nova ciencia. Quem há de tolerar que fórmulas dogmáticas
usadas pelos Concilios Ecuménicos a propósito dos misterios da
Santíssima Trindade e da EncarnagSo, sejam acusadas de
inadaptagao á mentafidade dos nossos contemporáneos e outras Ihes
sejam temerariamente substituidas? Do mesmo modo, nao se pode
tolerar quem pretenda expungir, a seu talante, as fórmulas usadas
pelo Concilio Tridentino ao propor a fé no Misterio Eucaristico. Essas
fórmulas, como as outras que a Igreja usa para enunciar os dogmas
de fé, exprimem conceitos que nSo estSo ligados a urna forma de
cultura, a determinada fase do progresso científico, a urna ou outra
escola teológica, mas apresentam aquilo que o espirito humano, na
sua experiencia universal e necessária, atinge da reaiidade,
exprimindo-o em termos apropriados e sempre os mesmos, recebidos
da linguagem ou vulgar ou erudita. Sao portanto fórmulas inteligíveis
em todos os tempos e lugares.

25. Pode haver vantagem em explicar essas fórmulas com maior


clareza e em palavras mais acessiveis, nunca porém em sentido diverso
daquele em que foram usadas. Progrida a inteligencia da fé, contanto
que se mantenha a verdade imutávelda fé. OI Concilio Vaticano ensina
que nos dogmas 'se deve conservar perpetuamente aquele sentido
que, duma vez para sempre, declarou a Santa Madre Igreja, e que
nunca é lícito afastarmo-nos desse sentido, pretextando e invocando
maior penetragio12".

Nao há dúvida, como diz Paulo VI, as clássicas palavras nao mais
usuais na Catequese e na Liturgia modernas podem e devem ser
explanadas ou "trocadas em miúdos", em vista dos fiéis mais simples,
mas nao háo de ser banidas do vocabulario da fé, pois elas carregam
consigo e conotam toda urna "bagagem" de conceitos que outras
vocábulos, mais recentes, já nao carregam.

2.5. Uso da Biblia no CIC

Wolfgang Gruen julga que a Biblia é utilizada "sem o calor do


entusiasmo" que ocorre ñas comunidades. - Respondemos que calor

1 De CIvítate Dei X 23.


2 Constituigáo Dogmática De Fide Catholica c.4

323
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

e entusiasmo sao atitudes subjetivas, lícitas e aceitáveis, que a


linguagem do CIC nao exclui em seu estilo sobrio. O texto do Catecismo
há de ser objetivo, porque se dirige a todos os fiéis, podendo cada
um responder-lhe subjetivamente como queira. Sem dúvida, todos
desejamos "vida, amor, esperanca, tibertacáo de tutelas descabidas"
(p. 64). Estes valores, porém, háo de serconseqüéncia da assimilacáo
da Palavra de Deus na sua objetividade ou no seu significado eterno;
bem entendido, o Logos (= a Palavra) desencadeará urna praxis
(urna Ética ou urna acáo social) capaz de promover, com grande
eficacia, o Reino de Deus neste mundo.

Quanto a fundamentalismo, é despropositado atribui-lo aos


autores do CIC. Sao pessoas eruditas, cuja obra passou pela revisáo
feita pelo episcopado do mundo inteiro antes.de ser promulgada.
Fundamentalismo é a ignorancia preconcebida das conquistas da
exegese moderna, ficando o fundamentalista preso cegamente á letra
do texto bíblico - o que certamente nao se deu com os teólogos
redatores do CIC. W. Gruen parece querer um uso da Biblia vista á
luz da historia contemporánea. Tal uso nao é excluido, mas supóe
que se considere primeiramente o texto bíblico no seu contexto
histórico antigo, dentro dos,parámetros da lingüística, da arqueología,
da paleografía...

3.CONCLUSÁO
W. Gruen, no final do seu livro, preconiza que seja aceito o CIC
em espirito de comunháo eclesial (p. 91), mas afirma que o povo é
que o deverá interpretar á luz da pneumatologia ou da ¡nspiracáo do
Espirito Santo (p. 90). - O protestantismo nao diría coisa diferente:
atribuí a cada crente ou a cada comunidade o direito de interpretar a
Biblia segundo o seu "livre exame",... livre exame que se supóe guiado
pelo Espirito Santo.
Em última análise, é o crente quem julga a Revelacáo, e nao a
Revelacáo quem julga o crente. Para os católicos, Deus fala com a
sua autoridade por meio-da instancia á qual Ele prometeu a sua
assisténcia infalível, instancia que é o magisterio da Igreja (cf. Mt
16,16-18; 18,18; 28,18-20;.Jo.14,26; 16,-13-15).-¡O magisterio, quando
se pronuncia oficialmente, intencionando propor aos fiéis um artigo
de fé ou de Moral, goza dodcarisma da inerrancia que de corre da
assisténcia do Senhor Jesús é do seu Espirito. Por isso o CIC nao
está sujeito a ser julgado ou criticado pelos fiéis (clérigos ou leigos),
mas é "urna norma segura para o ensino da fé",é "texto de referencia
seguro e auténtico para o ensino da doutrina católica" (Constituicáo
Fidei Depositum). Poderá ser adaptado ás circunstancias da vida de
cada comunidade, desde que se,preserve a identidade da doutrina e a
inspiracao da obra. O Espirito Santo vive na Igreja de Cristo para que
cada fiel o possa receben Seja Ele o Mestre que continué, no corado
de cada clérigo e leigo, a obra que Ele iniciou no corpo da Santa
Igreja! • ■

324
Siamesas e felizes:

AS DUAS MENINAS QUE


IMPRESSIONAM O MUNDO

Em síntese: O caso das duas meninas Abigail e Britanny,


xifópagas norte-americanas, se explica por defeituosa divisSo do ovo
fecundado, do qual procedem. A medicina conhece casos semelhantes,
inclusive o dos irmaos siameses ou tailandeses Chang e Eng (1811-
1874), que puderam gerar filhos por terem os respectivos troncos
isentos de vinculagSo mutua. O caso das meninas norte-americanas
é mais grave, porque tém duas cabegas, mas um só tronco, dois bragos
e duas pernas, o que muito as inibe. Todos esses casos se devem a
urna faina da natureza, sem que haja necessidade de pensar nuni
castigo infligido pelajustiga divina a espirítos que, amaram demais ou
odiaram demais um ao outro em existencia pre'gressa. Por certo, o
Criador é infinitamente perfeito, mas nenhuma criatura pode ser
infinitamente perfeita, pois, em tal caso, deixaria de ser criatura para
seriguai ao próprio Deus. Em conseqüéncia; toda criatura pode falhar.
Todavía Deus nunca permitiría o mal no mundo se n§o tivesse recursos
em sua sabedoria para tirar dos males berís aínda maiores; a
Providencia Divina acompanha cada caso de desgraga e sabe fazer
redundar os males em bem daqueles e daquelas que amam a Deus
(cf. Rm 8,28). Estas verdades se aplicam ao caso dé Abigail e Britanny.
- Sería ilícita qualquer tentativa de tirar a vida deesas duas meninas
ou de urna só délas, quer no seio materno, quer depois de nascidas.

* *■* "' ; • "'"'

Muito chamou a aten?áo do grande público o caso de Abigail e


Britanny Hensel, duas meninas de seis anos^de idadeique-nasceram
com<duas cabecas e um tronco só^com ,duas¡pernas; sao ditas, em
linguagem técnica, xifópagas e, popularmentersiamesas .:O fenómeno,
raro como é, suscitou numerosas perguntas, que passamos a
considerar.

1. O FENÓMENO COMO TAL

O caso de Abigail e Britanny é muito raro na historia da


humanidade, dada a estritíssima vinculacáo de um só tronco para
duas cabegas. Já se tém registrado casos semelhantes muito menos
graves, pois a ligacio entre os dois individuos se fazia de maneira
mais tenue, ou seja, á altura da cintura, ficando os dois troncos livres.

325
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

O nome xifópago vem precismante de xifo, que traduz o grego


xiphos, espada, apéndice. O osso dito estemo, osso dianteiro do
peito, termina, em sua parte inferior, num apéndice alongado e
cartilaginoso; ora a ligacáo entre duas pessoas xifópagas se faz na
maioria das ocorréncias, pela regiáo xifoide ou mediante o apéndice
do esterno. O caso mais famoso foi o dos homens chamados
respectivamente Chang e Eng, nascidos no Siáo (Tailandia de hoje) a
SE. da Asia; viveram de 1811 a 1874; tinham os troncos livres e a
ligacáo xifoide; foram, durante muitos anos, expostos em feiras e palcos
nos Estados Unidos, e conseguiram gerar mais de vinte filhos Daí o
nome de siameses que popularmente se dá aos xifópagos.

O fenómeno tem sua explicacáo científica. Devé-se ao fato de


que o ovo fecundado as vezes se divide... Caso se divida totalmente,
sao aerados dois individuos gémeos normáis; todavía pode nao se
dividir por completo; daí a separacáo na parte superior, originando
duas cabecas, e a ligacáo existente entre os troncos ou mesmo a
ausencia de dois troncos. A natureza é sabia de modo geral, mas
pode falhar, e, conseqüentemente, dar origérri ao qué se chama, no
plano biológico, monstros.

Pergunta-se agora: qual o papel do Sénhor Deüs diante do


fenómeno?

2. A SABEDORIA DIVINA E O FENÓMENO XIFÓPAGO

Há quem explique a xifopagia e, de modo especial, o caso das


meninas Abigail e Britanny, como expressáo da justica de Deus.
Estariam pagando um pecado de sua encamacáo anterior; sim, ou
ter-se-áo amado demais ou odiado demais urna áoutra; daí voltarem
a este mundo numa encarnacáo que as deixa dolorosamente unidas
num só tronco. /:...,;:-^ '£ ;:;v-;r

Tal explicado é arbitraria ou destituida de fundamento. Levaría


a dizer que todo individuo infeliz neste mundo está expiando pecados
de sua vida anterior, e todo individuo feliz nestaívída está récebendo
o premio de virtudes praticadas nurria encarnacáb'antérior -WquVé
¡nsustentável; há ai um juízo temerario; além do-qüé^lahmodo^de
pensar avalia a felicidade pela fruicáo de beris matériais é corporais
apenas.

Nao é preciso procurar em hipotética existencia pregressa a


explicacáo para o fenómeno das duas meninas xifópagas norte
americanas. A ciencia, com seus dados experimentáis muito claros,
elucida a ocorréncia, como foi dito atrás; Deus nao é o Justiceiro cegó
que cobra de suas criaturas conforme a lei do karma; outra á posicáo
do Criador diante do fenómeno em pauta.

Na verdade, deve-se dizer que Deus é infinitamente perfeito; por

326
AS DUAS MENINAS QUE IMPRESSIONAM O MUNDO 39

¡sto nao pode falhar. Mas as criaturas nao sao infinitamente perfeitas
pois sao constantemente ameacadas pela sua fragilidade mesma Daí
as falhas da natureza também no plano biológico. Deus permite que
elas ocorram, pois sao algo de natural. O Criador nao quis fazer um
mundo artificial, de marionetes, policiado a todo momento...; mas
permite que as criaturas sigam seu curso. Todavía, diz S. Agostinho,
Deus nunca permitiría o mal se Ele nao tivesse recursos, em suá
sabedoria, para tirar do mal bens aínda maiores (Enquirídio c. 27). -
Nao raro pode-se perceber quanto isto é verídico: um acídente de
carro, com fratura de ossos, é considerado urna desgraca no momento
em que ocorre; todavía, visto posteriormente e a distancia, pode
parecer um beneficio, pois que deu ocasiáo á vítima de parar um
pouco, rever sua vida, sua escala de valores, para recomecar com
mais lucidez e seguranca. A consciéncia desta verdade já levava os
gregos pré-cristáos a dizer: "Páthos-máthos - Sofrimento é escola,
é educacáo". Verdade é que nem sempre se percebe o beneficio
resultante de alguma desgraca, mas a fé crista ensina firmemente
que nao há sofrimento destituido de Providencia Divina; esta faz
concorrer todas as coisas para o bem daqueles que amam a Deus
(cf. Rm 8,28).

3. ABORTO PARA IMPEDIR MONSTRUOSIDADE?

Há quem pergunte como é que os médicos norte-americanos nao


detectaram o futuro nascimento de seres monstruosos; tendo-o
detectado, poderiam ter interrompido a gravidez da gestante.

A propósito sejam feitas tres observacóes:

1) Pode-se falar, no caso, de monstruosidade física ou corpórea,


pois, em relacáo ao ser humano normal, as duas meninas xifópagas
sao diferentes. Tal monstruosidade, porém, nao ocorre no plano ético
ou moral; as meninas nao tém culpa de háver nascido como sao;
ademáis sao gentis e bem identificadas com o seu modo de viver, a
tal ponto que nao se querem separar urna da outra.

2) Os médicos nao detectaram o fenómeno que se estava


produzindo no seio materno; como consta das reportagens, porque a
cidade onde vivem os pais das meninas é pequeña e desprovida dos
recursos mais sofisticados da medicina.

3) Mesmo que o tivessem detectado, nao seria lícito provocar o


aborto, pois este é sempre um homicidio, quaisquer que sejam as
circunstancias em que se produza. Ninguém tem o direito de definir
quem pode vlvér e quem deve morrer, mesmo que o faca em nome da
filantropía; só Deus pode dispor da vida humana. Alias, torna-se
oportuno lembrar os casos de famosas pessoas que, embora
deficientes, vieram a ser grandes vultos da historia:

327
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Helen Keller (1880-1968), norte-americana, era cega, surda e


muda. Orientada pela educadora Annie Sullivan, aprendeu a ler,
escrever e falar por sinais, e chegou a diplomar-se com louvor no
Radcliffe College de Cambridge em 1904. Escreveu "A historia de minha
Vida" (1903) e o "Diario de Helen Keller" (1938); ver PR 402/1995
506-517;

Marie Heurtin (t 1921), cega, surda e muda, foi educada


pacientemente por pessoas especializadas; conseguiu bom grau de
cultura e tornou-se útil á sociedade;

Marta Obrecht, também cega, surda e muda, após educacáo


apropriada, veio a ser boa dona de casa, costurando á máquina,
datilografando e desempenhado outros afazeres técnicos;

Ana María Poyet tornou-se cega, surda e muda com a idade de


tres meses. Nao obstante, seu pai foi-lhe educando o tato, de modo
que pode conhecer e exprimir muitas nocóes. Um sopro sobre a máo
significava pai, dois sopros máe, tres sopros a vos. Aos sábados,
quando o pai, simples trabalhador, voltava á casa levando o salario
da semana, a menina apalpava as moedas respectivas, reconhecia o
seu valor e manifestava a sua alegría.

Estes dados já evidenciam que a sentenca de morte proferida


sobre pessoas deficientes no seio materno ou já nascidas vem a ser
grande injustica. Quem é contrario á pena de morte para os criminosos,
há de ser contrario também á pena de morte para uma crianca inocente
ou para uma pessoa deficiente ou enferma. É a lógica que o manda.

4. ELIMINAR UMA DAS DUAS CABECAS?

Alguém dirá: por que nao eliminar uma das cabecas para que
uma só das duas meninas viva mais tranquilamente?

- Respondemos: as duas meninas disseram que nao querem ser


separadas uma da outra; acostumaram-se a viver como vivem e estáo
tranquilas. Eliminar uma das duas cabecas seria praticar um homicidio
- o que é pecaminoso. O que importa no caso, é que se Ihes
proporcione muito carinho por parte dos pais, familiares e amigos para
que as duas meninas se sintam aceitas e entrosadas na sociedade,
"ocupando o seu lugar ao sol". De resto, a Providencia Divina dirá até
que idade elas poderáo viver; tal tipo de vida é sempre ameacado e
periclitante. O futuro dessas duas enancas está ñas máos de Deus.
Ele fará o que for melhor para as duas e para os seus familiares.

328
Mesmo em nossos dias:

O CULTO A SATANÁS

Em síntese: A Italia foi, em comego de 1996, abalada peía prisáo


de um fundador de seita devotada ao Maligno: os Bambini di Satana
(os Meninos de Satanás). Marco Dimitrí quer ser chamado "a Besta
666"; foi detido por haver violentado urna jovem de dezesseis anos
durante urna "Missa Negra". Os seus seguidores recrutam adeptos
entre adolescentes alunos da Escola Media italiana. O fenómeno tende
a se expandir na Italia e no mundo; explicase, em parte, pelo
desespero que acomete a sociedade contemporánea; descrente dos
valores tradicionais, endeusa os antivaíores (verdade é que o culto a
Satanás já se praticava desde remotas épocas no seio do Cristianismo
e fora). A "Missa Negra" é urna parodia da Missa católica; glorifica
Satanás e leva á devassidao sexual, fruto de paixóes excitadas.

* * *

No comeco de 1996 veio a público na Italia um grupo de jovens


intitulado Bambini di Satana - Meninos de Satanás. Tem sede em
Bolonha. O respectivo chefe Marco Dimitri, fundou tal seita em 1982;
foi preso, porém, em data recente, sob a acusacáo de ter violentado
urna jovem de dezesseis anos durante urna "Missa Negra". Os fatos
noticiados pela revista Famiglia Cristiana de 21/02/1996, pp. 30-32,
nos dáo ocasiáo de abordar a temática do culto a Satanás.

1. O FUNDADOR E A SEITA

Marco Dimitri nasceu em Bolonha. Adolescente, já era irrequieto,


a tal ponto que foi expulso da Escola por molestar os seus colegas.
Quería ser chamado Bestia (Besta). Os pais o levaram a um mago
para que fosse exorcizado - o que só contribuiu para agravar a
situacáo. Dimitri comecou a ler "textos sagrados" do satanismo; entrou
numa seita para-satánica, que ele depois abandonou, acabando por
fundar sua seita própria: os Bambini di Satana.

O grupo se reúne em igrejas execradas ou profanadas e em


antigos curráis abandonados na regiáo rural de Bolonha. Deixa seus

329
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

sinais ñas paredes dos respectivos templos, ás vezes cobrindo


símbolos do SS. Sacramento e altares; entre esses sinais estáo as
palavras de um hiño, que assim reza: "Se queres conhecer-me, mata
os teus semelhantes. A morte é a alma e a lei é Satanás; com ele has
de matar". As letras podem aparecer em vermelho cor de sangue,
lembrando o que acontece ñas cerimónias do culto satánico.

No principio de 1996 Dimitri foi preso com dois de seus


assessores mais próximos, acusados de ter violentado urna jovem de
dezesseis anos. Nao é a primeira vez que Marco caí sob os tentáculos
da policía; todavía sempre se livrou de qualquer penalidade, saindo
com a "folha corrida limpa". Isto Ihe suscitou publicidade, coisa que
ele sempre procurou ávidamente, encontrando geralmente algum meio
de comunicacáo que Ihe desse cobertura.

Os seguidores de Dimitri recrutam adeptos entre os alunos


menores de idade de escolas medias italianas através de emboscadas;
Dimitri os reunía em seu escritorio, no centro de Bolonha, onde lia
cartas pintadas e recebia seus clientes, embora pareca pouco
entender de ocultismo. Chegam ás suas máos centenas de cartas de
meninas prontas a dar tudo por urna caricia. Esses contatos diversos
levaram muito dinheiro á seita de Dimitri, o qual vendía por cinco
milhóes de liras italianas os cursos para os aspitantes ao sacerdocio
satánico; somente no fim do curso era permitido ao candidato
participar de um dos ritos satánicos de fundo sexual.

Os seguidores da seita, aparentemente bonachóes, habituados


á imprensa e á televisáo, revelaram-se individuos perigosos, dados a
todo tipo de perversáo. A policía encontrou nos arquivos do grupo
fichas de matrícula assínadas com o sangue das pessoas matriculadas;
cerca de cinqüenta destas eram menores de idade, alguns de doze
anos, mas todos "consagrados" ao demonio. Encontraram-se também
fotografías pornográficas e varios outros elementos congéneres.

Alias, a pederastía, o sadismo e outras perversóes sexuais sao


correntes entre os cultores de Satanás. Sexo, dinheiro e poder sao
os tres objetivos do pacto com Satanás. Quanto a outras práticas da
seita, é difícil conhecé-las, pois os adeptos guardam silencio a respeito.

2. A PROPAGAQÁO DO SATANISMO

As pesquisas nao convergem entre si quando se trata de avaliar


as proporcóes do fenómeno. Na Italia parece estar presente tanto no

330
O CULTO A SATANÁS 43

Norte como no Sul. Em Ñapóles a Prefeitura mandou fechar um Centro


Social no qual os rapazes adorava m um grande bode pregado á cruz.
Há quem fale de cinco mil satanistas na Italia. Todavia Silvana Radoani,
que se tem dedicado a tal estudo, afirma serem vinte mil, reunidos em
87 grupos na Italia e 128 grupos no mundo inteiro. Estes números
sao contestados pelo Prof. Massimo Introvigne, Diretor de um Centro
de Investigares em Turim: julga que os auténticos satanistas, com
doutrina, liturgia e organizacáo, nao sao mais do que seiscentos,
reunidos em vinte grupos. Em senso lato, podem ser mais numerosos,
caso se considerem satanistas aqueles que usam símbolos satánicos
ou os magos que evocam Satanás após cobrar alto preco ou ainda os
¡ovens que se reúnem em grupos informáis de satanismo "ácido",
mergulhado no mundo dos tóxicos e das drogas. Parece que, na
verdade, os que freqüentam certos Centros de Satanismo sao urna
populacáo flutuante ou também disposta a se dividir e subdividir,
chegando alguns a se juntar ao crime organizado.

Todavia é cedo que quem entrou num desses grupos, difícilmente


consegue sair do mesmo. Sao poucos os egressos, e, quando
ocorrem, geralmente sofrem de graves perturbares mentáis.

Torna-se oportuno agora considerar o que seja a "Missa Negra".

3. A MISSA NEGRA

A Missa Negra é um rito que faz a parodia da Missa católica,


oferecendo a Satanás a adoracáo e o louvor devidos a Deus só. Há
varias cerimónias de "Missa Negra". Os rituais apresentados por
Roland Villeneuve em seu livro "L'Univers Diabolique", Paris 1972,
pp. 264-370 datam dos séculos XVI/XVII e fazem eco aos de séculos
anteriores; deles sao extraídos os tópicos seguintes:

A Missa do Diabo, a partir do século XVI, é exatamente a contra


parte do Oficio católico. É a parodia do que Jesús fez na sua última
ceia. O que é abencoado, torna-se amaldicoado; o que é branco, torna
se preto... Por ocasiáo da elevacáo da hostia e do cálice, os
sacerdotes-magos exclamam: "Corvo preto! Corvo preto!" para evocar
o Maligno. E estes clamores sao acompanhados por contorsóes e
saltos. O Demonio, dizem, voa no momento da consagracáo em torno'
do cálice. Quando a assembléia vé essa borboleta, levanta-se e
conjura: "Belzebu! Belzebu!" Nao há ato penitencial nem aleluia.
Evitam-se os sinos e as sinetas, pois causam horrenda dor ao
Demonio...

331
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Como o cálice, também a hostia é preta e, mais, difícil de ser


engolida; traz a figura do Demonio, que diz por ocasiáo da
consagracáo: "Isto é o meu corpo". Ele levanta a hostia ácima de seus
chifres; neste momento toda a assembléia a adora. Cercando o altar
em semicírculo, prostram-se por térra. O Demonio faz entáo um sermáo
e intima-os a comungar, dando a cada qual um pedacinho da hostia,
a fim de que o possam engolir; entrega a cada qual dois goles de um
remedio infernal, e uma bebida de táo mau gosto e odor que, ao
engolirem-na, suam e, ao mesmo tempo, ficam gelados em seus corpos,
em seus ñervos e em suas medulas.

Era "bom costume" roubaro pao eucarístico ñas cápelas católicas


a fim de o profanar no culto satánico. Satanás, dizem, divertia-se
atirando as hostias aos sapos. Estendia sua sanha aos presbíteros
da Igreja, fazendo que estes apresentassem as hostias ao Maligno.
Na Alemanha e na Austria as mofas virgens eram incitadas a perfurar
as hostias com tres punhaladas; uma certa María Renata Saenger
percutía-as com alfinetes, em total odio a Deus.

Em 15/01/1632 o Parlamento de Dolé condenou á morte o cidadáo


Nicola Nicolás, de Anjeux, porque em 1628 levara o SS. Sacramento
do altar para um culto satánico, tendo-o misturado com excrementos
humanos porordem do Diabo; as sagradas partículas desapareceram.

As profanacóes do SS. Sacramento eram freqüentes no fim da


Idade Media e nos dois séculos seguintes: as hostias eram pisoteadas,
conculcadas, transpassadas...; podiam ser torradas no forno.

Entre outros traeos, aínda se narra que o Diabo, por meio do seu
representante, exortava os seus seguidores a praticar o estupro, o
incesto e a sodomía. Os presentes respondiam em unissono e táo
forte quanto possivel: "Mestre, ajuda-nos!" O Maligno entáo
apressava-se por aspergi-los com a sua urina como se fosse agua
benta. O oficiante revestia uma capa preta sem cruz; tomava em máos
o Livro das Blasfemias, que servia de Canon ou de Oracáo oficial e
central da Missa Negra; continha as mais abjetas blasfemias contra a
SS. Trindade, o SS. Sacramento do altar, os outros sacramentos e
ritos da Igreja Católica; estava redigido em língua que o povo ignorava.
O sinal da cruz era feito obligatoriamente com a máo esquerda.

Sata, por seu representante, ridicularizava os dogmas católicos


e propunha uma vida nova aos seus fiéis; prometia-lhes nao menos

332
O CULTO A SATANÁS 45

do que a vida eterna. No momento do Ofertorio, declarava: "Eu sou o


verdadeiro Deus; ao menos voces me véem, me sentem e me podem
tocar. Ao passo que o Outro... é melhor nao falar dele". Os discursos
de Satanás e sua presenca eram táo "reais" e persuasivos que os
magos o adoravam no sentido próprio da palavra. Urna certa María de
la Ralde, de 28 anos de idade, afirmava que ela gostava de ir a um
culto satánico tanto quanto a urna festa de nupcias; julgava que era
muito mais satisfatório e gratificante do que ir a urna Missa
convencional, pois o Diabo dava a crer que ele era o verdadeiro Deus,
e a alegría dos feiticeiros, naquela ocasiáo, era o comeco de urna
gloria muito maior.

Era normal recitar ladaínhas e oracñes em honra do Demonio;


eram acompanhadas de blasfemias e expressóes de demencia.

Sao estes alguns traeos típicos dos cultos satánicos, que culminam
na chamada "Missa Negra", parodia sacrilega da S. Missa. A existencia
desse ritual em nossos dias significa a capitulacáo da razáo e da
sanidade mental diante da imaginacáo e dos impulsos desregrados
da carne. Também a mística precisa dos subsidios da razáo. O Demonio
existe, mas nao pode ser concebido como um deus poderoso, ao qual
se deva prestar culto.

APÉNDICE

Após redigir o artigo destas últimas páginas, recebemos outra


noticia da Italia, extraída do jornal LA STAMPA, de Turim, edicáo de
28/02/1996, devida ao repórter Fabio Albanese.

Desta vez, o cenário é a cidade de Catánia na Sicilia, onde foram


presos em comeco de 1996 cinco homens (alguns de certa posicáo
social) acusados de violacáo de sepulturas, rapto e destruigáo de
cadáveres, incendios e atos obscenos. Tinham sede na igreja do
antigo mosteiro beneditino de S. Nicoló l'Arena, igreja que parece ter
sido transformada em templo satánico, onde se realizaram, como se
eré, Missas Negras e orgias demoniacas. Tais protagonistas sao, para
grande surpresa dos habitantes de Catánia e do público em geral: o
monge beneditino Michele Musumeci, de 42 anos, antigo Reitor da
igreja de S. Nicoló l'Arena; Antonio Germana, 34 anos, perito do
Patrimonio Artístico-cultural de Catánia, encarregado da restauracáo
da mencionada igreja do mosteiro beneditino; Santo Privitara, 37 anos,

333
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

Conselheiro Comunal de Catánia, e dois animadores da cultura, a


saber: Davide Pulvirenti, 20 anos, e Nicoló Elio Ambram, 28 anos.

A historia comecou quando em 1993 Antonio Germana e Santo


Privitera ofereceram seus prestimos gratuitos á Administracio do
Patrimonio Histórico de Catánia no intuito de recuperar o monumento-
igreja que fora abandonado havia decenios; o mosteiro tornara-se
Faculdade de Letras. A Prefeitura aceitou a proposta e confiou a tarefa
de recuperacáo a Antonio, que se pos a trabalhar com os quatro
companheiros citados e alguns outros voluntarios; enquanto as obras
corriam, foram promovidas conferencias e debates de ordem cultural,
assim como urna visita á cripta da igreja, da qual participou o Prefeito.
Eis, porém, que no quarteiráo se foram espalhando rumores estranhos
enquanto furtos e estragos na igreja eram denunciados pelos vigias
do monumento.. Este.fato deu inicio ao inquérito por ordem da
Prefeitura. Durante urna semana, os policiais montaram guarda ao
monumento, mas nada foi apurado. Todavía a escuta de conversas
telefónicas e a apreensáo de correspondencia particular deram motivo
ao aprisionamento dos cinco homens: eram acusados de ter violado
urnas funerarias, utilizado paramentos litúrgicos da igreja e organizado
relacionamento sexual em grupo por ocasiáo"dos seus ritos. Destes
parecem ter participado outras pessoas¡; inclusive menores de idade,
que contaram ao magistrado o quéiviram e ouviram. Foi rescindido o
contrato entre Antonio Germana e á Prefeitura.

Os acusados rejeitam qualquer suspeita de desonestidade,


afirmando que se trata de um com pió contra eles. Santo Privitera
declarou: "Aquilo de que nos acusam, é o contrario do que nos fizemos
por aquélá igreja. Ocórre ümá confusáo, fruto de mal-entendidos, que
coincidém com a vihda do novo Reitorda igreja, Pe. Ignazio Mirabella".
Apesar das contestacóes, pesa sobre os cinco homens a grave
acusacáo de ter cometido atos e ritos secretos e obscenos em
homenagemao.piabo na cripta da ¡greja de S. Nicoló l'Arena.

Eis, pois, mais um caso récente de culto ao Demonio na Italia.


Pode-se afirmartranqüilamente que outros países sao também sedes
de tais orgias.

A propósito:

Roland Villeneuve, L'Univers Diabolique. Albín Michel, París


1972.

Bernard Teyssédre, Naissance du Diable de Babylone aux


Grottes de la Mer Morte. París, Albin Michel 1985.

334
Elucidando Equívocos:

IMPOTENCIA COMO
IMPEDIMENTO MATRIMONIAL

O caso do matrimonio recusado a Edir Antonio de Brito e Elzimar


de Lourdes Serafim, em Patos de Minas, suscitou grande alarde, em
parte devido á incompreensáo dos termos em foco.

O motivo da recusa nao foi discriminacáo de deficiente físico,


mas foi a impotencia,... impotencia de realizar a cópula sexual; tal
situacáo pode ocorrer também a nao deficientes físicos. Se é misten
distinguir entre impotencia e deficiencia física, também é necessário
nao confundir impotencia e esterilidade. A esterilidade supoe a
possibilidade de cópula sexual; esta, porém, no caso, nao tem fruto
ou é infecunda.

Impotencia é impedimento para o casamento, visto que fe re o


próprio conceito de matrimonio. Este é urna instituicáo natural. Com
efeito; a natureza fez o homem e a mulher para que se complementem
mutuamente tanto no plano psicológico como no físico; o casamento
é precisamente o contrato pelo qual um homem e urna mulher resolvem
unir-se em vista de plena complementario mutua, que pode resultar
em fruto do amor ou prole (caso a natureza o propicie). Se nao há
possibilidade de cópula carnal, nao se realiza ó conceito de casamento.
Nao obstante, pode haver, sem casamento, convivencia amiga sob o
mésmo teto e apoio recíproco de um homem e urna mulher. - Com
isto nao queremos dizer que casamento se reduz ao consorcio sexual;
é certo que ele tem muitas outras belas facetas, que valem como tais,
mas essas facetas tendem, por si mesmas, ase consumar na üniáo
carnal.

Estas nocdes de ordem filosófica sao corroboradas pelos textos


bíblicos. Logo em sua primeira página a Escritura nos diz que Deus
fez o homem ea mulher e os abencoou, dando-lhes a ordem: "Sede
fecundos e prolíficos, enchei a térra e dominai-a" (Gn 1,28). Ao que o
Senhor Jesús acrescenta, fazendo eco a Gn 2,24: "Seráo dois numa
só carne" (Mt 19,5).

335
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 410/1996

A impotencia (incapacidade de realizar a cópula carnal) sempre


foi considerada impedimento para o matrimonio, até mesmo em
legislacóes civis. O Código de Direito Canónico a sanciona em seu
canon 1084 § 1: "A impotencia coeundi antecedente e perpetua
absoluta ou relativa, por parte do homem ou da mulher. dirime ó
matrimonio por sua própria natureza". Isto quer dizer que só se trata
da impotencia anterior ao casamento; se ela sobrevém a um dos
cónjuges, nao anula o casamento validamente contraído. Trata-se
também de impotencia incurável - oque, alias, é o caso de Edir
Antonio, que, como diz a imprensa, nem tem o órgáo sexual masculino
e, mesmo com a prótese, nao é capaz de ejacular.

Estes dados bem mostram que, da parte da Igreja, nao há


preconceito contra os deficientes. Ao contrario, toda a historia do
Cristianismo manifesta grande número de instituicóes da Igreja em
favor dos enfermos e carentes em ge ral.

Tem-se argumentado contra a decisáo do Sr. Bispo de Patos (MG),


lembrando que a Igreja faz o casamento de anciáos, ásvezes
septuagenarios. Nao há ai motivo de surpresa;'mesmo que sejam
esteréis, sao potentes; especialmente a potencia sexual masculina é
duradoura. Mais urna vez se vé quanto importa distinguir entre
impotencia e esterilidade.

Há também quem apele para o casamento entre María SS. e S.


José. Foi um casamento singular; sem dúvida, é irrepetível, pois María
era chamada a ser a Máe do Filho de Deus feito homem. Todavía
notemos: nao está dito que os cónjuges eram impotentes no caso.

Quanto a chamar o presidente da CNBB á Cámara dos Deputados


para fornecer explicares, pode-se admitir que o Cardeal Móréíra
Neves se preste a tal. Todavia é de notar que a Igreja no Brasil é livre;
impedindo o casamento religioso, ela náó está impedindo o matrimonio
civil de Edir Antonio e Elzimar Lourdes, caso o Estado (o queira
conceder. Como ¡nstituicáo particular/a Igreja tem o direito de possuir
sua Iegisla9áo própria atinente a assuntos direta ou ihdiretamente
religiosos.

É de crerque, apaziguadas as primeiras emocóes, possam todos


compreender que o caso de Edir e Elzimar nao feriu a justica nem a
caridade. A Igreja tem estima por esses dois filhos, que poderáo
livremente realizar seu ideal de apoio mutuo nao conjugal.

Estéváo Bettencourt OSB.

336
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G.R.D., SP. 1991.168 páginas R$ 15,00.

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Brasil no século XX. Editora Convivio, SP. 1978). Análise das personalidades
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