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O conto engajado de Lygia Faqundes Telles Mela Ellon Weib ab yune E resistimos, testemunhas e participantes deste tempo e desta sociedade com o que tem de bom. E de ruim. E tem ruim é beca. Lygia Fagundes Telles texto litersrio & considerado de natureza engajada quando apresenta ideias que transmitem uma escolha e consequentemente uma participacéo ativa do escritor nas discussbes de ordem social, historica e politica que envolver a sociedade da qual ele faz parte, Nesse caso, 0 artista da palavra se recusa a apenas assistir passivamente aos eventos sociais € icos de sua época e, por essa raza, coloca-se, por meio de sua obra a servigo de um ideal, de uma causa, ‘Assim € o perfil da paulista Lygia Fagundes Telles (LET). De uma acentuada consciéncia social, a escritora nao perde 0 ensejo, n suas entrevistas, de dizer o quanto sua obra é engajada, isto & comprometida com a sociedade da qual ela ¢ testemunha. A prosa de Lygia nos faz. vivenciar as consternagoes dos que jazem A margem de uma sociedade discriminat6ria, opressiva, repressora, racista, desigual. Constantemente abordando temas nos quais poe tem discussio a situagio da classe oprimida, sua obra é marcada por na Iucidez e uma sensibilidade que mostram as mazelas sociais sem abrir mao da beleza estétiea Nos contos reunidos em fnvengio ¢ Meméria (2000) 0 engajamento literdrio de Lygia € uma marca constante. Fruto de sua maturidade artistica, nessa obra a invengéo nao se deixa reprimir pela meméria, a0 contrario, elas fundem-se pairando sob 0 mistério da criagio literdria ao ponto de nao sabermos 0 que de fato & real eo que é ficcao. A tinica certeza é, segundo a autora, que “a ficgao vira realidade e a realidade vira ficco” (TELLES, 2009, p. 139). Mas, como essa realidade & representada na prosa Iygiana? Ora, com a efervescéncia das palavras, que sio escolhidas com esmero para conceber quer seja a vor. do opressor, quer seja a vor do oprimido. Isso porque a prosa de LFT reine uma privilegiada hheterogencidade linguistica; diversidade que & social e se concretiza por meio das vozes particulares que formam o enredo. Eo que podemos observar nos contos presentes em Invengéo e Meméria, como em Que se chama solidéo, narrativa que aborda a historia de duas jovens pajens (da propria aurora?) érfis e pobres, cada uma arraigada ao peso da margi reagia contra as ordens da pequena patroa dizendo que os negros nao eram mais escravos ~ “ui perguntar ao meu pai o que era isso, escravidao. Ele (..] comegou a recitar uma poesia que falava num navio cheio de negros esfaimados, presos em correntes ¢ chamando por Deus. Fiz que sim com a cabega e fui oferecer & Juana a melhor raquela manha” (TELLES, 2009, p.12) que parecia tio dis lade da narradora, néo cra distante da realidade da negra érfi que em busca aborro? Quem o fez? Nao se sabe, é um mist jovem mulher. jo que morre com a Milicante da causa feminina, LET nao abre mao de em seus livros abordar sobre a situagio da mulher brasileira ante a sombra do pattiarcalismo, seja para desvelar a opressio feminina ou para revelar o surgimento a de mulher livre dos esteredtipos patriarcais. Assim, a autora escreve em Jnvencao € Meméria além de temas como o aborto em Que se chama solidéo também sobre a liberagao sexual, a educagao e participagio politica das mulheres, assuntos presentes nos contos A danga com 0 anjo © Nada de novo na frente ocidental. ja sua nova face, ist Esses dois ailtimos contos mencionados sio narrados em plena Segunda Guerra Mundial e mostram que enquanto o planeta Acxoru AXNDERSEE LETRAS 58 cra definhado pelo sangue © a paz parecia perdida, as mogas nio podiam pensar em participar da luta armada, elas deveriam lurar im, mas para nao perder a virgindade antes do casamento: “o mito a castidade ainda na plenitude, nem o mais leve sinal da bandeira hasteada nestas palmeiras. E.0 nosso sabié ainda nao sabia niio sabia de nada. O anunciado mercado de trabalho para tha inventado) estava apenas na teoria” (TELLES, 2009, p. 25). Mesmo que 2 revolugio femainina caminhasse lentamente, as protagonistas de A danga com 0 anjo © Nada de novo na frente ocidental sabiam © que queriam e nao era 6 0 casamento, mas a conquista dos seus direitos como cidadas, a conquista da liberdade. E para isso era necessério ingressar no universo dos homens, apesar das reagbes contririas: “o que significava aquilo? As mocinhas também iam combater?” (TELLES. 2009, p. 116). Nao bastava ser escritora e estudar em la s6 de homens? Nao! Para a heroina de Nada de novo na “Freme ocidental era preciso também ser soldado, se necessirio ir i guerra, defender a patria e ser capaz de fazer a diferenca Sabendo que 0 que nos torna capazes de fazer a diferenca em favor do outro (aqui entendido como aquele que esta as margens da sociedade) é 0 movimento que paira entre a vontade ¢ a mudanga, Es capaz? Es capaz de fazer como 0 Principe Feliz ¢ a pequena Andorinha, do conto de Oscar dado em O Cristo da Bahia, que se doaram em favor boas obras? Ou apenas és capaz da indiferenca como as autoridades desse conto que 20 verem o Principe sem ornamentos ¢ riquezas ¢ 2 Andorinha morta os resumiram a lixo? Ha quem prefira a segunda opgio ou o caminho mais cil, como © protagonista do conto Se é capaz. Nesse texto, Lygia usa como fio condutor da narrativa 0 poema Se, de Rudyard Kipling, gue como uma carta de principios para a formacio de um virtuoso Homem é dada de presente pelo velho avo a0 neto adolescente. Mas 0 rapazinho logo percebe que a virtude & algo complexo, ‘coisa de bombeiro” e ele opta pela ps trou firme na politica e com um dinico objetivo, enriquecer. Tinha um nome decorativo, boa aparéncia ¢ sabia seduzir quando falava. Encio, 54 REVISTA ANL NTA ues DLE yuecer rapidamente, mas sem pr a que visar apenas 0s coftes pi TELLES, 2009, p. 33) E foi assim que um mogo que fora tao bem para nao se corromper, deixou-se contaminar pela pe pelo poder, pelo enriquecimento icar ninguém, é evidence, a diivida: “foi no poder que me perdi ow (TELLES, 2009, p. 36). Ora, estar perdido e entregue ao mal, a crueldade do mundo moderno é uma realidade da qual as personagens de Invencio ¢ Meméria nao tém como se esquivar, especialmente os jovens. Iss0 € perceptivel no conto O menino ¢ o velho no qual uma crianga € prematuramente dominada pela criminalidade a0 assassinar roubar o seu benfeitor. Representagao de uma geragio reprimida pela violencia, pelo édio, pelo descaso das autoridades politicas, que assim como o “mar pesado, cor de chumbo” ruge rancorosa (TELLES, 2009, p. 73)? estava perdido?” ‘mudanga do pais no decorree de sua ¢ Meméria fica mais reservada quant utilizar a literatura como discurso soc desvelando as -mazclas sociais, Lygia deixa transparecer a esperanga e por meio da sua palavra engajada arrisca-se mais uma vez dando 4 sociedade a oportunidade de se auto-analisar ¢, por conseguinte mudar. Sobre isso, 0 fildsofo Sartre em Que é Literarura? (2004, p. 65) nos diz ratura “e sobretudo se ela se vé vista, itor the apresenca a sua imagem e a intima a assumi-la ou entao a transformar-sc” Tudo isso pode parecer ut6pico se consideramos o piblico de es do nosso pais, visto que na nossa realidade de terceiro mundo a leitura ainda é privilégio de poucos ¢ a grande massa nao tem 0 wo de com 0 universo literario. Como entéo alcangar ACAD NORTE RIO.RANDENSE OR LETRAS 5 esse piblico tao distante para que possamos acreditar, de fato, em ‘uma transformagio social? Segundo Sartre, para que isso aconteca, é preciso escrever para esse piiblico, aproximé-lo da literatura, © escritor se lancaré entio no desconhecido: falari, rho escuro, a pessoas que desconhece, 2 quem nunca ringuém falou, a néo ser para mentir-lhes; emprestara a sua vor s céleras ¢ inquietagées dessa gente: através dele, homens que nunca se viram refletidos em espelho algum, ¢ que aprenderam a sortir € a chorar como encontrar-se-4o de sibito em face da (SARTRE, 2004, p. 198). ‘Oescritorengajadolanga-seentaoauma ‘esperangacega’ .como afirma Lygia, que resiste as adversidades do subdesenvolvimento, protestando € participando da realidade do seu tempo com tudo © que ha de positivo © negativo na sociedade: “inspiragio para os é ELLES, 2009, p.138). E € inspirada «ria do seu pais que LFT traca os seus enredos, inguagem € compreensiva, mas densa; sem hermetismo, cae assim ela vai construindo personagens tio humanas que tha entre o real ea ficsio torna-se ténue. ‘Além dessa forte inspiracio na contemporaneidade histérica do pais, em Invengiéo ¢ Meméria outca marca rm construgio dos enredos éa presenga da intertext tos ha referencias diretas a outros textos ea partir deles as ages vvaos sendo encadeadas: sea & cantiga de roda Se essa rua fosse minha em Que se chama solidao, ou mesmo ao romance Nada de novo na Frente Ocidental, de Remarque, no conto homénimo, muitos outros igrandes textos e escritores séo citados como elemento estético para © desdlobramento ¢ compreensio das narrativas. Dentre esse dilogo intertextual destacamos 0 conto Dia de dizer néo, um dos mais engajados do livro, que faz alusdo & Cidade de Deus, de Santo Agostinho © também ao poema A flor ¢ a Niusea de Carlos Drummond de Andrade (2003, p. 27). Dessa relagéo 56 REVISTAAML NA igica entre esses textos LFT vai delineando a sua indignagio 20 wasor da vontade”, isto é, 0 “politico-invasor” que nao respeitando ‘05 nossos direitos invade a nossa liberdade, comprometendo-a. E, ante o sim do “comodismo e da servidio" dos que néo conseguem reagir ao invasor resta apenas a desesperanga ¢ 0 medo nessa “cidade dos homens” maus, sos de onde nao se pode fugir: “Mas fugir para onde se a ea Violencia (as irmas gémeas) estio em toda parte num sé galope, montadas nos pilides cavalos do ‘Apocalipse”. E dai paira a diivida “o homem ficou mais cruel ou ele foi sempre desse jeito mesmo?” (TELLES, 2009, p. 59-60). A isso podemos também acrescentar a indagacao de Drummond: “Devo seguir até 0 enj6o? Posso, sem armas, revoltar-me?”. Contra a énfase 20 capitalismo dessa nauseante sociedade FT dé a narradora a oportunidade de ico falando na rédio. Néo ao hospital usada como “resistencia de ferro" as injirias da opressio politica, um nndo que representa uma agéo contra o sistema desumano que assola © terceiro mundo: “Nao, Nio... vou repetindo € no cansaco Faco agora apenas um gesto meio vago para o mendigo gue me aborda na calgada e que fixa em mim um olhar interpelativo” (TELLES, 2009, p. 65). Por conseguinte, © néo cm evidéncia nesse conto lygiano reflere nio somente uma resistencia do ser social, também é uma forma de resi seja, €a propria literatura reagindo contra a ideologia dominante tal como uma flor que brota no asfalto e vai perfurando-o a0 mesmo fempo em que abranda “o tédio, o nojo 0 édio", conforme escreveu Drummond E € por meio dessa palavra de resistencia que LET constr6i em fnvengao e Meméria uma prosa de impacto e de Ansia, mas que também deleita-nos por sua intensidade e profundidade ao escrever téo bem sobre a condigio humana. Assim sendo, a narrativa de Lygia faz jus as palavras de Alfredo Bosi (2002, p. 135) quando afirma que a literatura “descobre a vida verdadeira, e que esta abrag2 © transcende a vida real”, uma vez que “por ser ficgao, resiste & ORTF-RIO GRANDENSE DE LETRAS 57 mentira. E nesse horizonte que 0 espaco da literatura, considerado cm geral como o lugar da fantasia, pode ser o lugar da verdade mais 1] ANDRADE, Carlos Drummond de. A rosa do povo. Rio de Janeito: Record, 2003. 2] BOSI, Alfredo. Literatura e resisténcia, Sao Paulo: Companhia das Letras, 2002. 3] SARTRE, Jean-Paul. Que é a Literatura’, Sio Paulo: Atica, 2004. 4) TELLES, ygia Fagundes. Invengao « Meméria. Sao Paulo: Companhia das Letras, 2009. 58 eVIST AML Natt

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