um filme de 1975 vencedor de cinco Oscar (incluindo melhor filme) e referência até
hojecomo símbolo na luta antimanicomial. Vamos aqui analisar sua estrutura narrativa.
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Aqui temos o nosso primeiro ponto de virada. Em uma sequência em que o Dr.
Spivey, diretor do hospital, conversa com McMurphy, o anti-herói é informado de que
está internado para que seja avaliado se de fato apresenta problemas mentais. Ainda que o
responsável direto pela estadia de McMurphy no hospital, o dr. Spivey se resguarda à
função de arauto. O conflito é passado para a enfermeira Ratched, a quem o anti-herói
claramente se opõe durante todo o filme.
Para isso, o Chefe é preciso ser convencido de tal tarefa. Nesse aspecto a lógica
da narrativa comum se subverte um pouco. McMurphy é também um mentor para o
Chefe quando o convence de sua natureza indígena de liberdade a qualquer custo. E o
Chefe é quem no final realiza a tarefa sonhada por McMurphy. A relação entre os dois,
no entanto, é sempre vertical: o Chefe revela-se disposto a fazer qualquer coisa por
McMurphy e não o contrário. Embora revezem entre si os arquétipos de mentor e herói
(anti-herói, no nosso caso), a relação de forças sempre se mantém igual: McMurphy é
sempre lido comoprotagonista.
Em uma cena que funciona como ponto central, defende a estadia de McMurphy
no hospital pois sabe que a prisão não lhe fará bem. Essa rápida, porém importante
convergência de interesses entre o anti-herói e a antagonista prova como uma análise
maniqueísta é perniciosa para um filme como Um estranho no ninho. A cena,
estrategicamente localizada no centro da narrativa, funciona como um espelho: o jogo
entre mocinho e bandido é frágil e aqui não pode ser refletido.
Seu conceito de ser livre é falho quando não percebe que até a ausência total de
regras já é uma norma. Por outro lado, as rígidas leis do hospital e o episódio de quando é
lobotomizado suscitam uma discussão sobre a alienação e o quanto estamos dispostos a
vender nosso poder de decisões em troca de segurança social. Em Um estranho no
ninhoconstrói-se um discurso paralelo à narrativa que expõe as fragilidades do conceito
de liberdade na sociedade pós-moderna.