Pois bem, eu descobri por minha conta a razão pela qual o levain é hoje pouco utilizado,
ainda que o resultado dificilmente seja igualado. Abri o livro, separei os ingredientes e
comecei a preparar a receita. Ralei uma maçã com a casca e as sementes, misturei com 50
gramas de açúcar cristalizado e coloquei a mistura num pote de vidro. Coloquei a tampa
sem vedar para que os gases da fermentação pudessem se dissipar. Pus o pote de vidro em
um armário fechado e tomei todo o cuidado para que a temperatura permanecesse
constantemente média, como mandava o figurino.
Deixei a mistura ali por cinco dias úteis já que no final de semana o fermento não trabalha
(essa piada não é minha, é do Olivier). Passaram-se os dias e eu fui bisbilhotar o bolo. Na
receita, Olivier dizia que eu deveria sentir um forte cheiro de álcool, mas senti um aroma
diferente. E era bom.
O passo seguinte foi adicionar água e misturar bem para soltar o fermento. Depois, eu
deveria coar a mistura num pano limpo, comprimindo bem a massa. Nesse ponto eu
acreditava que já poderia em breve assar meus pães com meu próprio levain. Ledo engano.
Agora, o tamagoshi passava a viver em um novo ambiente, agregado a porções de farinha.
De 12 em 12 horas eu deveria me desfazer de parte da mistura e acrescentar mais farinha.
Se fosse necessário, essa troca deveria ser feita de seis em seis horas. Essa mistura básica
tem um nome: é o chef. Eu o batizei de sócio.
Quando pensei que o fermento estava em condições de ser usado, vi que a receita
continuava na página seguinte e ainda seriam necessárias mais duas semanas para finalizar
a operação, com a exigência de manutenção do atendimento ao paciente, de 12 em 12
horas.
Tem gente que mantém esse processo por anos a fio, mas eu o abortei. Estava criando um
monstro e tinha a certeza de que o Imposto de Renda não iria aceitá-lo como dependente
nas minhas próximas declarações.