O diagnóstico de uma cardiopatia costuma estabelecer-se a partir da história clínica e do exame físico.
Utilizam-se determinados exames complementares para confirmar o diagnóstico e determinar a
gravidade e as consequências da doença, assim como para facilitar a planificação do tratamento.
Figura 2. A incidência oblíqua anterior direita, com esôfago contrastado, permite avaliação do átrio
esquerdo, do ventrículo direito e do tronco da artéria pulmonar.
Figura 3. A incidência oblíqua anterior esquerda permite melhor avaliação das câmaras cardíacas
esquerdas, principalmente do ventrículo esquerdo.
Figura 5. O crescimento do ventrículo direito modifica a borda esquerda da silhueta cardíaca, elevando
a ponta do coração, que, assumindo a configuração arredondada, diminui o ângulo cardiofrênico
esquerdo.
A identificação e a análise detalhada de todas as estruturas visíveis à radiografia simples necessitam
de várias incidências: póstero-anterior e oblíquas anterior esquerda e direita. O perfil esquerdo é
menos utilizado.
O perfil esquerdo, também realizado com esôfago contrastado, permite avaliar o átrio e o ventrículo
esquerdos e o diâmetro ântero-posterior do tórax.
Vários são os sinais radiológicos envolvidos nas múltiplas alterações morfológicas do coração.
A silhueta cardíaca mostra os aumentos da área cardíaca por meio do índice cardiotorácico. Define-se
o índice cardiotorácico como a relação entre o diâmetro transverso do coração e o diâmetro interno do
tórax. Diâmetro transverso do coração é a distância linear entre as bordas externas do átrio direito e a
curva ventricular esquerda. Diâmetro interno do tórax é a distância linear entre a borda externa das
hemicúpulas diafragmáticas. O índice cardiotorácico normal mede, em média, 0,5, ou seja, o diâmetro
transverso do coração é aproximadamente a metade do diâmetro transverso interno do tórax.
A
B
Figura 7. O crescimento atrial esquerdo pode dar-se em todos os sentidos. Para a direita, origina o
"sinal do duplo contorno" sobre a projeção do átrio direito. Para a esquerda, origina o "quarto arco",
localizado entre as projeções do arco pulmonar e do arco ventricular esquerdo.
Figura 9. O aumento da artéria aorta pode dar-se em todos os sentidos. As alterações aórticas
secundárias a cardiopatias comprometem a porção ascendente e o arco aórtico. Radiologicamente,
observam-se aumentos do botão aórtico e presença de um arco, à direita, na projeção da veia cava
superior.
Na comunicação interatrial, a vasculatura pulmonar, a artéria pulmonar e o ventrículo direito estão
aumentados. O átrio direito está freqüentemente dilatado nos pacientes idosos. O átrio esquerdo está
aumentado nos casos de fibrilação atrial, de doença arterial coronária e nas associações com prolapso
da válvula mitral incompetente.
Figura 10. Na avaliação do hilo e da circulação pulmonar, o fluxo pulmonar pode estar diminuído,
aumentado, ou invertido. O fluxo pulmonar está diminuído na insuficiência ventricular direita e nas
cardiopatias com "shunt" direita-esquerda. No primeiro caso, a diminuição do fluxo reflete baixo
débito cardíaco com as câmaras direitas dilatadas. No segundo caso, o hipofluxo pulmonar advém da
fuga parcial do sangue das câmaras direitas para as esquerdas. Em ambas as situações a artéria
pulmonar é pequena e o contorno cardíaco esquerdo pode alterar sua convexidade normal. Nos fluxos
pulmonares aumentados, a sobrecarga circulatória acarreta dilatação e aumento da tortuosidade das
artérias e veias pulmonares. Nos fluxos invertidos decorrentes de hipertensão venocapilar, observam-
se aumentos do fluxo para as porções superiores dos pulmões (região de menor resistência vascular)
e diminuição do fluxo para as porções basais (região de maior resistência vascular).
Na persistência do canal arterial, os sinais radiológicos são evidentes quando o fluxo ductal é
significativo. Nesses, radiologicamente, são observados aumentos da vasculatura pulmonar, do átrio e
do ventrículo esquerdo. Ao contrário das comunicações interatriais e interventriculares, na persistência
do canal arterial, a artéria aorta é proeminente. Há dificuldades radiológicas no diagnóstico preciso do
ducto persistente. No ducto calcificado, observa-se imagem curvilínea dentro da sombra aórtica, logo
abaixo do botão aórtico no sentido para baixo e para a direita, devendo ser diferenciado das placas
ateromatosas calcificadas que têm imagens semelhantes.
O exame radiológico da estenose valvular pulmonar é caracterizado pela dilatação do tronco da artéria
pulmonar resultante do aumento da velocidade sanguínea. Como o jato sanguíneo direciona-se
preferencialmente para o ramo esquerdo, a artéria pulmonar esquerda tende a ficar mais dilatada. O
fluxo pulmonar está normal ou diminuído e o crescimento ventricular direito é raro.
Na maioria dos casos, o diagnóstico da coarctação da aorta é feito por meio de radiografia do tórax na
incidência póstero-anterior. Nessa, o botão e a porção descendente da aorta são normais.
Classicamente é discreto o "três invertido" de convexidade superior formado pelo botão aórtico,
artéria subclávia esquerda e porção dilatada da aorta pós-estenótica. Outros sinais radiológicos
observados são o obscurecimento do botão aórtico pela dilatação da artéria subclávia esquerda e as
erosões ósseas pela circulação colateral pré-estenótica. A ausência de erosões não exclui o
diagnóstico, pois ocorre em apenas um quarto dos casos de coarctação aórtica em adultos.
Os indicadores radiológicos de cardiopatia congênita são anormalidades extracardíacas
freqüentemente associadas a anomalias do coração. Na dextroversão, o "situs" é "solitus", porém o
coração está localizado à direita e o arco aórtico e a bolha gástrica estão do lado esquerdo. Os vasos
sanguíneos abdominais e os átrios estão em posição normal. Na dextrocardia, a incidência de
cardiopatia congênita é de 98%. Desses, 80% têm transposição corrigida dos grandes vasos. As
associações com defeitos do septo interventricular e estenose pulmonar são freqüentes.
COMENTÁRIOS
Os avanços tecnológicos das últimas décadas aprimoraram o diagnóstico e a terapêutica em
Cardiologia.
A ecocardiografia, procedimento não-invasivo, permitiu a análise minuciosa das alterações funcionais
e morfológicas de várias cardiopatias congênitas, adquiridas e isquêmicas. Associada ao estresse físico
ou farmacológico, mostrou-se útil na avaliação segmentar da isquemia e da viabilidade miocárdica.
A Medicina Nuclear, por meio dos radioisótopos, devido à elevada sensibilidade, tornou-se o método
de eleição no diagnóstico diferencial entre os segmentos isquêmicos e fibróticos e na avaliação da
viabilidade miocárdica.
O cateterismo cardíaco, introduzido como método propedêutico, acumulou, na última década, a função
terapêutica em múltiplas cardiopatias congênitas, adquiridas e isquêmicas.
Os avanços tecnológicos modificaram a metodologia propedêutica clássica. Nesse contexto, a história
clínica, o exame físico, o eletrocardiograma e a radiografia do tórax foram relegados a segundo plano
no diagnóstico e na orientação terapêutica. Conseqüentemente, os custos médicos elevaram-se,
tornando-se inacessíveis à população de baixo poder aquisitivo.
A anamnese subjetiva e orientada por profissionais capacitados é fonte de numerosas informações no
diagnóstico das doenças. A sistematização do exame físico, com técnicas clínicas apropriadas e
executadas por profissionais treinados, permite, juntamente com a anamnese, a formulação
diagnóstica de muitas doenças e síndromes com alterações orgânicas múltiplas.
A eletrocardiografia clássica, apesar da baixa sensibilidade como dado isolado, permite o diagnóstico
morfológico de várias enfermidades quando associadas à anamnese e ao exame físico. Trata-se de
exame não-invasivo, de fácil realização e reprodutível, podendo ser utilizado como exame seqüencial
no acompanhamento de determinadas doenças: infarto agudo do miocárdio, pericardite e avaliação
terapêutica das arritmias cardíacas. Também é utilizada nos estudos epidemiológicos, determinando a
prevalência da cardiopatia isquêmica, identificando doenças cardíacas latentes e avaliando os riscos
pré-operatórios e pré-admissionais de algumas atividades profissionais específicas. Pode-se afirmar
que, noventa anos após sua introdução, a eletrocardiografia tem seu lugar na cardiologia clínica.
A radiografia do tórax, exame de baixo custo, é realizada em todos os centros médicos, fornecendo
informações úteis do sistema cardiovascular, pulmonar e outras estruturas torácicas. Freqüentemente,
é responsável pelo diagnóstico inicial de múltiplas enfermidades torácicas ou localizadas em outros
segmentos corporais. Da mesma forma que a eletrocardiografia, é um exame não-invasivo, de baixo
custo, acessível a toda a população, inclusive a de baixo poder aquisitivo. É reprodutível, podendo ser
utilizado no diagnóstico e no acompanhamento evolutivo de numerosas doenças. Entretanto, deve ser
realizado por técnicos treinados e a interpretação das imagens deve ser avaliada por médicos
competentes.
A história clínica, o exame físico, a eletrocardiografia e a radiografia do tórax "são exames de
reconhecido valor", "são tradicionais e duradouros", e "estão em moda ano após ano". Segundo o
dicionário Webster, preenchem as definições de um clássico.
REFERÊNCIAS
1. Ramos Jr J. Semiotécnica da Observação Clínica. Fundo Procienx, 1970.
2. Leatham A. Splitting of the first and second heart sounds. Lancet 1954;267:607.
3. Einthoven W. Un nouveau galvanomettre. Arch N Sc Ex Nat 1901;6:625-30.
4. Einthoven W. Le telecardiogramme. Arch Int Physiol 1906;4:132-64.
5. Einthoven W. Die Galvanometrische Registereing des menschlicher. Elektrocardiogramms: Zugleich
eine B eurtheilung der Anwendung des Capilar. Elektrometers in der Physiologie. Pflugers. Arch Physiol
1903;99:472-80.
6. Bayés de Luna A. Electrocardiografia Clínica. Espanha: Ediciones Dayma S.A., 1992.
7. Fisch C. Electrocardiography and vectorcardiography in heart disease. In: Braunwald E. 4 ed. New
York: WB Saunders Company.
8. Fisch C. Evolution of the clinical electrocardiogram. J Am Coll Cardiol 1989;14:1127-38.
9. Friedberg CK, Zager A. "Non specific" ST and T wave changer. Circulation 1961;23:655-61.
10. Tabak L, Marden E, Mason HL, et al. Digital recording of electrocardiographic data for analysis by a
digital computer. Trans Med Elect 1959;6:167-71.
11. Castellanos A, Kesslerk M, Myerburg RG. The resting electrocardiogram. In: Hurst. The Heart. 8
ed. New York: McGraw Hill, Inc.
12. Willens JL, Abreu Lima C, Arnaud L, et al. Effects of combining ECG interpretation results on
diagnostic accuracy. Eur Heart J 1988;9:1348-55.
13. Guidelines for Electrocardiography. A report of the ACC/AHA task force on assessment of
diagnostic and therapeutic cardiovascular procedures (Committee on Electrocardiography). Circulation
1992;85:1221-8.
14. Bayés de Luna A, Fort de Ribot R, Trilla E, et al. Electrocardiography and vectorcardiography study
of interatrial conduction disturbances with left atrial retrograde activation. J Eletrocardiol 1985;18:1.
15. Schwartz P, Wolf S. QT interval prolongation as predictor of sudden death in patiens with
myocardial infarction. Circulation 1978;57:1074.
16. Marti V, Bayés de Luna A, Guindo J, et al. Value of dynamic QTc in arrhythmology. New Trends in
Arrhythmia 1987;3(4):683.
17. Lauler DP. Magnesiun deficiency. Am J Cardiol 1989;63(suppl 14):1G.
18. Rios JJC. Clinical ECG correlations. Filadelfia: FA Davis, 1977.
19. East T, Oran S. The ECG in ventricular aneurysms following cardiac infarction. Br Heart J
1952;14:125.
20. Kannel WB, Abbott RD. Incidence and prognosis of unrecognized myocardial infarction. An update
on the Framingham study. N Engl J Med 1984;311:1114.
21. Iida K, Sugishita Y, Ito I. Changes of grant negative T wave in patients with hypertrofic
cardiomyopathy. Clin Cardiol 1990;13:272-8.
22. Mckenna WJ, England D, Doi YL, et al. Arrhythmia in hypertrophic cardiomyopathy. Influence on
prognosis. Br Heart J 1981;46:168.
23. Spinto P, Maron B. Relation between extent of left ventricular hypertrophy and ocurrence of suden
death in hypertrophic cardiomyopathy. J Am Coll Cardiol 1990;15:1521-6.
24. Magalhães HP. Princípios de radiologia do coração e dos vasos da base. São Paulo: Editora Sarvier,
1980.
25. Braunwald E. Tratado de medicina cardiovascular. New York: Editora Roca, 1987.
VOLTA