Introdução
A natureza multifacetada de relações públicas não se limita a interagir
isoladamente com um determinado público. Por isso a atividade pode ser definida como
uma filosofia de relacionamentos estratégicos com muitos públicos. Aceita esta
definição aparentemente óbvia, importante, porém, no seu sentido, surge a necessidade
de explicar o que significa “relacionamentos estratégicos” e “muitos públicos”. Pode-se
concluir, a bem da síntese, que são relacionamentos corporativos inteligentes. Aqueles
feitos com ciência de todo o contexto relacional e nos quais os públicos representam
todos os grupos ou setores em relação, permanente ou não, com a organização. Essa
afirmativa genérica, para ser admitida, precisa levar à especificação do público, objeto
da relação, e explicar ainda o tipo, a temporalidade, o objetivo, as expectativas e outras
características do relacionamento, ressaltando-se que o principal foco de relações
públicas concentra-se no relacionamento com públicos específicos. Levanta-se aqui
outro problema: determinar quais são os públicos que podem ser contemplados na
definição. Introduz-se assim a necessidade de pesquisar a relação organização/públicos
e vice-versa, pois será a partir dela que se classificam os públicos.
O estudo dos públicos
Reconhecidos autores de relações públicas como Philip Lesly, Doug Newsom e
Alan Scott, Scott M.Cutlip e Allen H. Center, ao estudar os relacionamentos das
organizações com seus públicos, consideram essa relação dentro de uma visão macro,
direcionada aos papéis que os diferentes públicos desempenham na sociedade e, como
são parte dela, analisam os laços desses públicos com as organizações. Philip Lesly, por
exemplo, dá atenção aos empregados como público e à comunidade na qual situa os
demais públicos, como se formassem nesse meio externo uma “pirâmide do poder”,
dedicando atenção ainda aos públicos, que denomina “especiais”, representados por
mulheres, jovens, negros, idosos, e outros. Os manuais de relações públicas, em geral,
afirmam que é fundamental identificar os públicos, conhecê-los, para que, ao lidar com
eles, as organizações sejam bem-sucedidas nesse relacionamento. A partir desse
conceito, estabelecem os diversos autores uma longa lista de públicos, considerados os
principais e prioritários para a ação da empresa, enquanto necessita relacionar-se com
eles por motivos institucionais, promocionais e de negócios.
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Pode-se dizer que as relações públicas se dirigem ao público, ou mais exatamente aos
diferentes públicos. Com efeito, é uma idéia a ser guardada nesta série de conferências que
não existe um público, mas uma pluralidade de públicos, um grande número de públicos
que são, de tal forma, diferentes uns dos outros que, falar a um, não quer dizer que os outros
possam compreender-nos (2003, p. 12).
Houaiss. Ou seja, aquilo que é notório, conhecido de todos, praticado sem segredo. Em
sentido mais restrito, público pode ter três significados:
a) o conjunto de pessoas que lêem, vêem, ou ouvem, uma obra literária, dramática, musical;
b) o conjunto de pessoas que assistem efetivamente a um espetáculo, a uma reunião, a uma
manifestação;
c) o conjunto de pessoas às quais se destina uma mensagem artística, jornalística, publicitária, etc.
(Houaiss, 2001, p. 2330).
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Como também nós afirmamos.
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Herbert Blumer, sem dúvida um dos especialistas mais autorizados neste domínio, escreve
que o público é a reunião “elementar e espontânea” que age diante de uma questão
controversa. Este grupo não apresenta organização, uma vez que sua existência está
centrada sobre o problema em questão. Quando surgem as controvérsias, então nascem os
públicos. Para Blumer, o vocábulo “público” serve, portanto, para designar um grupo de
pessoas que se defrontam diante de um ponto em debate e não se reuniram a não ser a título
efêmero para atingir os fins da discussão (Andrade, 1977, p. 69).
Dewey, na referência de Grunig, define público quase na mesma linha que Blumer:
“O público é um grupo de pessoas que: 1. Enfrenta problema similar; 2. Reconhece que o
problema existe; 3. Organiza-se para fazer alguma coisa sobre o problema” (Dewey,
apud Grunig, 1983, p. 143-144).
Pressupostos de um novo critério
para definir o conceito de público
Verificamos a incoerência da noção tradicional de públicos (internos, externos e
mistos), por ser incompleta e estar fundamentada em uma visão chamada de “geográfica” e
nas estruturas empresariais centralizadas e de menor complexidade nos seus relacionamentos.
Embora tenhamos explicitado outros critérios, vimos que seus autores não os definem com
clareza, de maneira convergente, capaz de orientar as ações voltadas a esses públicos nas
atuais condições operacionais das empresas. Impõe-se, assim, a busca de um critério que
enfeixe todos os públicos de uma organização e os defina na dimensão de seu peso na sua
constituição, na sua sobrevivência, nos aspectos de sua interdependência e dos objetivos de
relacionamentos, permanentes ou eventuais, com os públicos.
Nossa intenção é encontrar uma conceituação de caráter universal, lógica, que se
aplique com eficácia aos diferentes públicos da organização de modo a definir o tipo e as
demais interfaces da relação. Ao conceito sociológico de público não se pode atribuir uma
conceituação lógica de convergência, pois o primeiro objetivo do relacionamento da
organização com seus públicos é o interesse institucional, promocional ou mercadológico.
Assim acontece com todos os públicos ligados à ação operacional da empresa – empregados,
clientes, fornecedores e revendedores, por exemplo. A razão é que empresas e públicos têm
interesses comuns de produtividade e lucratividade. Tornam-se, em busca do êxito, parceiros
a tal ponto que, de parte a parte, aumenta o nível de exigências no relacionamento, como
certificações de qualidade, de defesa do meio ambiente e outras.
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Resultados
Tipo de Objetivo Nível de Expectativas
Público esperados
relacionamento da empresa dependência dos púbicos
pela empresa
Empregados Legal Obter Essencial Dedicação Reconhecimento
Negócios produtividade Estratégica Lealdade Salários justos
Social Ter capacidade Satisfação Não-discriminação
operacional Comprometi- Pagamento em dia
Obter mento
lucratividade
Sindicato Social Obtenção de Não-essencial Confiança Cumprimento de acordos
Político apoio Respeito aos Reconhecimento legal do
Legal Ausência de acordos sindicato
conflitos Ética na relação
Clientes Negócios Aumentar as Essencial Credibilidade Produtos de qualidade
Parceria a curto vendas Satisfação Assistência técnica
e longo prazo Dar excelente Fidelidade Bom atendimento
atendimento Preços justos
Referencial teórico
A demonstração da interdependência entre a empresa e os públicos é clara por si
mesma, mas exige que encontremos critérios que a posicione de maneira lógica. Nessa
busca, podemos afirmar, em primeiro lugar, que há públicos que facultam a constituição
da organização, sua viabilização e a realização de negócios. Outros complementam a
ação da organização, divulgando-a e promovendo seus produtos. Desse posicionamento,
deduz-se que a interdependência empresa-públicos pode ser essencial ou não-essencial.
Nessa visão lógica, não interessa o critério geográfico de públicos internos e externos e,
sim, o quanto e em que grau determinado público contribui para a constituição da
organização e sua viabilização, o que pode ser fundamentado em três critérios,
examinados a seguir.
1. O primeiro critério é o grau de dependência da organização de seus públicos
para sua constituição, existência e permanência no mercado. Essa característica é que
determina se o público é essencial ou não-essencial à existência da empresa e à sua
sustentação. Essa distinção lógica nos permite estabelecer que há dois tipos de públicos
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Critérios de Relacionamentos
namento
1º critério Grau de dependência jurídica e Públicos:
situacional da organização de ٠ Essenciais constitutivos
seus públicos: constituição, ٠ Essenciais não-constitutivos
existência, sobrevivência. primários
secundários
2º critério Grau de participação, maior ou ٠ Se da participação depender a
menor nos negócios da empresa, sobrevivência da empresa,
na defesa de seus interesses e na temos um público essencial.
sua promoção. ٠ Caso contrário, temos públicos
não-essenciais.
٠ A relação públicos/empresa é
classificada como:
qualificada, setorial,
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associativa, comunitária.
3º critério Grau de interferência dos ٠ Rede de concorrentes: local,
públicos sobre a organização e os regional, nacional,
seus negócios. Esses públicos não internacional
participam nem da constituição, Prioridade variável; definida
nem da manutenção da empresa. pelo maior ou menor conflito
Podem interferir no de interesses.
desenvolvimento de seus ٠ Rede de comunicação de
negócios e até na sua massa: Poder da imprensa –
sobrevivência. interfere na legitimação ou
descrédito da empresa junto à
opinião pública
Essa classificação inclui os públicos especiais do cenário externo que, pelo seu
poder operacional ou representativo, podem exercer fortes influências no desempenho
da organização, classificando-se em dois subsistemas: rede de concorrentes e rede de
comunicação de massa.
1. A rede de concorrentes:
Representa qualquer tipo de organização que oferece ao mercado os mesmos
produtos, serviços ou similares que uma outra já produz e comercializa. As empresas de
hoje não podem ignorar a concorrência sempre mais agressiva sob o ponto de vista de
sua ação e principalmente por sua capacidade de inovação tecnológica. O
desenvolvimento da concorrência é extremamente rápido. Anteriormente, era apenas
local, hoje vai além da regional, nacional, é global. Sem dúvida, a representa um dos
públicos mais importantes a ser considerados por qualquer empreendimento. Como tal
deve ser estudada e analisada em todos os seus aspectos, levando-se em conta que os
concorrentes internacionais revestiram-se de maior peso pelo advento da globalização,
reduzindo fronteiras, aproximando países, oferecendo produtos mundiais e alterando
substancialmente o mercado de bens e serviços, criando novos campos de atuação ou
eliminando os indesejáveis. Pode-se, assim, distinguir: concorrentes diretos, indiretos,
nacionais e internacionais, o que dependerá da amplitude do raio de ação de cada
empresa.
A rede de relacionamentos internacionais, seja a de caráter diplomático ou
comercial entre países, seja a de relação das empresas com organismos mundiais,
geradores de compromissos legais e comerciais, não pode ser esquecida no estudo dos
públicos, pois assume, na atualidade, significativa importância, exatamente pelo poder
que tem de interferir nas atividades das organizações, que dependem hoje do sistema
globalizado de comércio.
2. A rede de comunicação de massa:
Representa forte preocupação para qualquer organização, por conter o poder da
imprensa sob todas suas formas de influenciação. Pode, em qualquer tempo, agir de
modo favorável ou desfavorável à empresa, contribuindo para sua legitimação ou seu
descrédito na opinião pública. Esse público, pela sua natureza, reveste-se de
características exclusivas, que devem ser bem conhecidas e analisadas pelas empresas,
de modo a se estabelecerem diretrizes claras e objetivas de relação com ele. Trata-se de
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público muito amplo, de alto risco relacional e de grande poder de persuasão, que deve
sempre estar na mira e na preocupação de qualquer organização.
Os conceitos expostos são, a seguir, demonstrados em dois quadros
representativos da cadeia de relacionamentos lógicos – essenciais e não-essenciais.
Quadro demonstrativo da
conceituação lógica de públicos
Públicos essenciais
Públicos não-essenciais
Referências bibliográficas
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