Viabilidade e perspectivas
Publicação conjunta:
– Cáritas Brasileira
Regional Rio Grande do Sul
SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA
4 CONHECENDO AS EXPERIÊNCIAS
BIBLIOGRAFIA
1 APRESENTAÇÃO
Precisamente com essa finalidade, foi idealizada e realizada a pesquisa que origina
esta publicação. Ela expressa o interesse comum de um conjunto de entidades do RS,
com marcada atuação junto aos setores populares, em particular no apoio a projetos
comunitários e a associações locais de produtores. Aproximando suas frentes de
trabalho, essas entidades promoveram, em 1996, o 1º Encontrão de Experiências
Alternativas de Organização Popular e Geração de Renda, com representantes de
grupos e organizações de apoio de todo o Estado. A fim de manter uma instância de
articulação, somar esforços e prosseguir nas ações em parceria, criou-se a seguir um
fórum permanente de entidades, do qual participam, entre outras, a Cáritas Brasileira -
Regional RS, a Comissão Pastoral da Terra, o Centro de Assessoria Multiprofissional, o
4
O projeto de pesquisa foi idealizado por esse fórum e contou com o apoio e o
acompanhamento de entidades que o integram, no planejamento global, na
mobilização de recursos, na organização de eventos e na avaliação dos resultados.
Seus proponentes e realizadores entendem que é oportuno contribuir para um balanço
dos resultados e das perspectivas desse novo campo de solidariedade popular.
Vivemos dias em que se acumula um longo período de desorganização e segregação
social, em que se redesenham os atores e as condições de ação sócio-política e,
ainda, em que os setores progressistas reavaliam os seus modelos programáticos e
estratégicos de transformação macrosocial, para os quais sempre esperaram contar,
precisamente, com o potencial reunido pelos movimentos populares.
Tendo ao fundo essas questões e objetivos, a pesquisa foi direcionada para duas
metas principais complementares, no sentido de avaliar a viabilidade e as perspectivas
da economia solidária, em seu estágio atual no Rio Grande do Sul:
pesquisa, houve igualmente uma revisão bibliográfica dos estudos e teorias sobre o
assunto, enfocando também o atual contexto econômico, suas determinações
estruturais, suas transformações mais amplas e seus impactos no âmbito regional e
local.
A vinculação da pesquisa a uma instância mais ampla, composta por entidades com
atuação na área, permitiu a adoção de uma metodologia participativa e interativa.
Eventos promovidos pelo fórum constituiram-se em momentos importantes de
pesquisa: em primeiro lugar, o Encontro Estadual de Economia Popular Solidária,
realizado em 18/04/97, com a finalidade de lançar a pesquisa e mobilizar entidades e
agentes; os Encontros Regionais, realizados no primeiro semestre de 1998; o 2º
Encontrão Estadual de Alternativas Populares, com mais de 250 presenças, ocorrido
em 15/08/98. Tais eventos serviram para subsidiar a pesquisa e, simultaneamente,
para o debate e a difusão dos conhecimentos gerados, possibilitando uma articulação
permanente entre pesquisa, assessoria e extensão universitária.
Quinze anos após sua ressurgência no país, o solidarismo econômico das classes
populares apresenta-se com um quadro diverso e uma trajetória merecedora de
atenção, no sentido de compreender sua gênese e delinear seus possíveis
desdobramentos. Resumir em grandes linhas esse quadro, indicar algumas hipóteses
que se vêm formulando sobre o futuro da economia solidária, destacar por fim
determinados problemas, práticos e teóricos, que esse campo de experiência tem
apresentado, são os objetivos deste capítulo. Com essa visão de contexto, melhor
poder-se-á situar o objeto da pesquisa e avaliar os seus resultados.1
Os motivos que induziram parcelas importantes dos setores populares a buscarem tais
alternativas de sobrevivência, remetem ao padrão de desenvolvimento nacional
instaurado nos anos 60. O efeito das políticas instauradas sob sua égide foi provocar
uma integração social altamente seletiva, enquanto se acelerava a desarticulação da
sociedade e aprofundavam-se as desigualdades. No lugar do welfare state, tivemos no
1
Uma boa parte das considerações que seguem foi publicada, sob forma de artigo, na Revista Contexto e Educação
(Gaiger, 1998) e republicada, a pedido, na Revista Renovação (CNBB - Regional Sul 3, nº 319, ago. 1998).
2
O único setor onde há recenseamentos sistemáticos é o das cooperativas, caso em que as cifras apontam um
crescimento importante nos últimos anos. Um levantamento amplo e inédito da economia solidária no Brasil é a
meta de um projeto de pesquisa, preparado pela UNITRABALHO, uma rede bilateral entre sindicatos e
universidades.
3
Para uma visão de conjunto, contemplando diferenças regionais, ver Cáritas (1995) e Gaiger (1996).
7
Tais tendências, por um largo tempo, foram vistas primordialmente como resultado de
uma condução autoritária do Estado e de uma concepção elitista do crescimento
econômico. O front principal situava-se no campo político (pela democratização e pela
ascenção de novas forças ao poder) e nas relações de classes (pela instauração de
um pacto social que redistribuísse os frutos do crescimento). No cenário mais amplo, a
política e a economia mundial apareciam divididas em dois blocos e em duas lógicas: a
do mercado e a do planejamento estatal. Estado x mercado constituía a disjuntiva em
que se dava o embate ideológico e político (Laraña, 1996: 325).
Por conseguinte, as frentes de ação que não tencionavam esses antagonismos eram
consideradas subsidiárias, ou mesmo desagregadoras. Não havia muito o que indagar
sobre o potencial das experiências comunitárias, tanto mais que delas se ocupavam
programas de instituições com um papel secundário ou de discutível confiabilidade
política, como a filantropia das igrejas e as ações de promoção de inúmeras agências
internacionais, para não falar do braço social do Estado. Tratava-se, naquela ótica, de
ações assistenciais, ambíguas, que incidiam sobre as conseqüências do modelo
vigente e não sobre os pilares que o sustentavam. Ações cujo valor esgotava-se na
lógica de defesa e resistência em que se movia, efetivamente, a quase totalidade
daquelas experiências.
Os anos 90, no entanto, deixaram claro que a degeneração do tecido social é a face
dramática de uma reestruturação global da economia, em curso há três décadas,
decorrente da reconversão tecnológica e produtiva do capitalismo deste final de século
e do reordenamento internacional dos mercados e dos grandes agentes e pólos
econômicos (Harvey, 1989; Antunes, 1995). Com a aplicação da informática à
automação industrial e a gama de inovações na organização do trabalho, o
crescimento industrial já não gera uma ampliação significativa na oferta de postos de
trabalho. Fenômenos como a reengenharia, a terceirização e a disseminação do
trabalho temporário ou a domicílio, são componentes de uma quebra na estrutura
ocupacional, com efeitos imediatos sobre as carreiras, a qualificação e as chances de
inserção sócio-profissional. O conhecimento e a formação intelectual passam a ser
requisitos indispensáveis para o ingresso no mercado. A geração de empregos, quando
8
ocorre, vem acompanhada de uma profunda segmentação, que reserva à maioria dos
trabalhadores condições precárias de trabalho, a que se somam o debilitamento das
políticas de proteção dos trabalhadores e as enormes deficiências na escolarização e
na formação para o trabalho.
Casos similares registram-se na Argentina, país dos mais afetados pela nova realidade
econômica e deparando-se hoje com um quadro de reforma acelerada do Estado, alta
concentração do capital, queda do poder aquisitivo e desemprego crescente. A aposta
em pequenos empreendimentos associativos, mediante a requalificação técnica dos
produtores, tem gerado bons resultados, em particular quando se observa o apoio do
poder público local e o interesse de instituições dotadas de recursos e competências
(I.C.D.A., 1997).
Observa-se, por exemplo, uma revitalização das cooperativas de trabalho, braço menor
da tradição cooperativista européia. Em 1985, estimativas apontavam a existência de
32.000 empresas do gênero, empregando mais de 800.000 trabalhadores. No Reino
Unido, as cifras evoluíram, entre 1976 e 1985, de 80 para 1.200; na Espanha, as 250
cooperativas de trabalho conhecidas em 1979 deram lugar, nove anos depois, para
2.000 empresas (Defourny, 1988: 140). No que se relaciona à comercialização,
estimava-se, em 1993, um volume de comércio alternativo 200 milhões de dólares; em
1996, o continente apresentava perto de 3.000 estabelecimentos, vinculados à
European Fair Trade Association (Laraña, 1996: 332-33).
Outro exemplo a registrar são os LETS,4 iniciados no Canadá e hoje com centenas de
experiências no Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia e outros países (Singer, 1997).
Basicamente, os LETS são um sistema local de troca de produtos e serviços, mediante
crédito mútuo Toda a venda origina um crédito, pagável por meio de outros produtos e
serviços dos associados à rede. O mesmo vale para as aquisições, cujo débito é
saldado mediante oferta similar do sócio devedor. Quanto mais o negócio cresce em
transações e amplitude, maiores são os benefícios de cada membro, sem com isso
implicar um incremento proporcional dos seus investimentos. O capital social é
formado naturalmente, elevando o interesse dos associados.
4
Local Employment and Trading System, ou “sistema local de emprego e comércio”.
11
Em seu conjunto, essas diferentes iniciativas inserem-se numa realidade mais ampla,
de desenvolvimento de uma economia alternativa, onde coexistem atores diversos e
sobrepõem-se interações locais, regionais e inter-regionais. Embora baseada em
microexperiências, observa-se que a economia alternativa está evidenciando
capacidade de operar em escala maior, ao lado da economia privada individual e da
economia pública estatal (Defourny & Monzon-Campos, 1996). Em moldes alternativos,
identificam-se hoje, além de diversas redes de comércio regional e internacional5, a
difusão de práticas de agricultura alternativa6, o surgimento de fundos de inversão
ética7 e a multiplicação de empresas de reciclagem e reaproveitamento de resíduos
domésticos e industriais.
5
Não são poucas as articulações entre grandes firmas internacionais e projetos de geração de renda no Brasil (Cf.
Silveira & Amaral, 1994). No comércio entre o Terceiro Mundo e os países de economia avançada, a rede mais
importante é formada pelas Organizações de Comércio Alternativo.
6
Coordenadas pela International Federation of Organic Agriculture Movements.
7
Nos quais os depositantes arbitram sobre os critérios de aplicação dos seus investimentos, a exemplo do fundo
Faim et Développement, na França.
12
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA
Como primeiro passo, definiu-se uma estratégia para identificar e coletar dados sobre
essas iniciativas, durante as visitas de campo e, quando necessário, mediante contatos
específicos. Como roteiro para as entrevistas e para a análise da documentação
recebida, ambos consignados através de uma planilha de registro, selecionaram-se os
seguintes aspectos:
a) Para a caracterização do programa ou agência: as ações desenvolvidas, as
formas de articulação e de interação, os resultados e as perspectivas de
atuação;
b) Para a interpretação dos dados: a lógica econômica e social praticada ou
estimulada, a relação existente entre o setor público e o privado no que
respeita àquela iniciativa, a concepção de desenvolvimento e de apoio aos
setores populares que pauta sua ação.
3) Por fim, o nível das experiências de geração de renda, alvo principal da pes-
quisa de campo. Seu estudo levou em conta quatro dimensões: a) as
características do grupo empreendedor, tais como origem e extração social,
necessidades, formas anteriores de solidariedade, recursos materiais, técnicos
e intelectuais; b) a organização do trabalho e da produção, dada pelo tipo de
coletivização e de divisão social e técnica das atividades, pelo grau de
formalização organizacional, pelo tipo de planejamento, etc.; c) a integração à
economia de mercado e as articulações horizontais, de diferentes naturezas,
bem como as características da demanda a que atendem; d) a presença de
aportes externos, em termos de financiamento, assessoria e outras formas de
apoio e assistência.
As visitas de campo
Relatórios Individuais
Internet
Consolidação
4 CONHECENDO AS EXPERIÊNCIAS
Categorias N° de experiências %
Alimentação 7 20,0
Confecções 7 20,0
Produção agrícola 7 20,0
Comercialização 5 14,3
Agroindústria 3 8,6
Reciclagem 2 5,7
Serviços 2 5,7
Outros 2 5,7
Total 35 100,0
Quadro 1 – Classificação por tipo de atividade
A fim de se obter uma visão panorâmica das experiências pesquisadas, algumas das
suas características foram tabuladas e submetidas a um estudo de freqüência e de
correlação simples11. Entre as constatações desse estudo preliminar, valeria destacar
brevemente o seguinte:
esse ângulo, nota-se que o número de membros ou sócios não é algo fortuito, mas
depende das demais características do empreendimento. Isso cria dois perfis
contrastivos, entre experiências de pequenas e de grandes dimensões:
1º perfil 2º perfil
Alguns aspectos relacionados aos perfis não causam surpresa; sabe-se, por exemplo,
que projetos de confecção são tipicamente femininos e habitualmente urbanos. Outros,
no entanto, parecem menos óbvios, como o predomínio masculino dentro das
cooperativas ou o caráter multi-familiar dos empreendimentos rurais. Mesmo se a rigor
não há grandes novidades, a tipologia indica que certas atividades correspondem a
situações sociais e econômico-materias específicas e comportam, para serem bem
sucedidas, um número determinado de membros. A envergadura do empreendimento
não depende portanto do grau de boa vontade ou de solidarismo. Traída por seu
excessivo entusiasmo, a idéia do quanto maior, melhor pode redundar em fracasso.
Outro aspecto que merece atenção é a longevidade dos empreendimentos, uma vez
que um êxito passageiro pouco significa. Para ser efetivo, deve perdurar ao longo dos
anos, com a continuidade da experiência.
12
Os anos 80 e 90 registraram várias iniciativas de comercialização direta, com apoio de associações de produtores,
sindicatos, igrejas e outros agentes. A idéia, às vezes um tanto simplista, consistia em eliminar os atravessadores e
beneficiar tanto os pequenos produtores quanto os trabalhadores urbanos que consumiam os produtos agrícolas.
23
A avaliação de cada experiência visitada mostrou que são mais comuns os casos de
conjunção, em que ambos os vetores se desenvolvem (40%), do que de disjunção
(11,5% de exclusividade para o vetor empresarial e 23% para o vetor solidário). Não há
ademais nenhum caso de desenvolvimento unilateral de algum deles, com
desenvolvimento nulo do outro. Esse fato aponta uma tendência à compatibilização
entre as duas lógicas e ao reforço mútuo de uma e outra.15
Idealismo
Realismo
– gerenciamento
– propriedade comum – planejamento
– cooperação – capacitação
– democracia – eficiência
– autogestão – viabilidade econômica
Esquema 2
Sendo assim, a união das forças e aptidões individuais funciona como mola mestra da
empresa solidária (Razeto, 1993: 41), apresentando efeitos positivos tanto no processo
de produção quanto nos de distribuição e consumo.16 O trabalho cooperativo
representaria assim não somente uma opção pelo solidarismo, mas uma alavanca que
16
Segundo alguns autores (cf. Carpi, 1997), as vantagens comparativas dos empreendimentos residiriam, entre
outras, na maior flexibilidade, criatividade, eficiência ambiental e implicação dos indivíduos, metas que por sinal
estão exigindo hoje, sem retorno garantido, estratégias sofisticadas das empresas capitalistas. O aumento da
produtividade, vital no atual sistema econômico, torna inútil o incremento linear em tecnologia desacompanhado
de uma exploração intensiva do trabalho. A virtude dos empreendimentos solidários está em que permitem
avançar nessa direção sem desfigurar, mas, pelo contrário, fortalecendo o seu caráter cooperativo.
25
Por essa razão, antes de apresentá-los, é importante ressaltar que esses fatores
acarretam conseqüências inevitáveis, a começar pela natureza dos projetos solidários
que cada grupo social terá interesse ou sentido em desenvolver, mas não impedem
que tais projetos evoluam em direções opostas, de acordo com as decisões do grupo
empreendedor. Ou seja, agem como fatores determinantes, mas não obrigatoriamente
decisivos. Mesmo quando em princípio beneficiam o grupo - no sentido, por exemplo,
da autonomia (preparo profissional já adquirido, experiência com negócios, etc.) - não
são uma condição suficiente, podendo levar os indivíduos a uma perspectiva
unicamente pessoal, em que a cooperação assume um caráter meramente
instrumental e pragmático.
A COANOL constitui outro exemplo, pois desfruta em seu notável crescimento do fato
de situar-se na região dos municípios de Ronda Alta e Sarandi, com grande tradição de
lutas sociais e de associativismo. É a região onde praticamente nasceu o Movimento
Sem-Terra e na qual exerce grande influência política, já tendo, inclusive, entre seus
integrantes, um prefeito e alguns vereadores eleitos.
Quando do seu início, o Grupo de Produção 1A, em Jóia, era formado por 26 famílias.
No decorrer do trabalho, ocorreram conflitos e rompimentos, de modo que atualmente
o grupo é formado por apenas seis famílias. Os planos idealizados no início são
29
A UNAIC, por seu turno, encontra-se numa região onde enfrenta resistência e
concorrência por parte de outras associações de produtores, do sindicato de
produtores rurais, do poder municipal e de órgãos de apoio e assessoria. Assim, é
obrigada a estabelecer complicadas negociações para realizar seu trabalho segundo
nova orientação. Outra experiência com dificuldades em parte semelhantes é a
Associação da Linha Jabuticaba: seus participantes sentem-se atrelados à cooperativa,
para a qual entregam sua produção. Foram também notoriamente prejudicados por
erros da assessoria técnica que montou seu projeto de condomínio rural. Encontram-se
isolados de outras assessorias e de acompanhamento.
A Unidade de Reciclagem Ruben Berta trabalha sob certa tutela desde o seu início. É
um grupo constituído de fora para dentro. O paternalismo e a forma de condução de
determinadas lideranças externas, ao que se pode inferir, não favorece que a
inexperiência e despreparo dos membros sejam superados e o grupo alcance sua
autonomia. Por seu lado, o grande aporte de recursos a fundo perdido que recebeu o
projeto Dikasa aponta para a hipótese de equívocos importantes na avaliação do
projeto, por parte dos agentes mediadores. Na prática, independentemente das
intenções, o projeto funcionou como meio para garantir o sustento do seu coordenador,
em retribuição por seu engajamento em ações pastorais e sociais.17
17
Segundo agentes ligados ao projeto, o coordenador sempre se interessou mais pelas suas atividades pastorais do
que propriamente pelo trabalho no Dikasa. Utiliza, inclusive, como argumento para o insucesso do projeto, o fato de
ser um “igrejeiro”, e não ter aptidão para atividades produtivas ou comerciais.
30
Um terceiro tipo de fatores gerais está relacionado à forma como o EES organiza e
incrementa as suas atividades. Esse aspecto é terminante, uma vez que define a
orientação da experiência, e depende basicamente das decisões do grupo
empreendedor, para as quais se vale de informações, de formações recebidas e do
debate interno que propicia. Três fatores merecem destaque:
Gílson
- aval do aluguel marido
- estoques e capital de giro
- carro e transporte
- aval para empréstimo
Luci
- bancos e burocracia irmãs
primas
Celoir
Lea Rodízio de tarefas - titular do aluguel
- confeitaria e cozinha - padeira-mor
marido primas
Osmar Filhas
- conserto das máquinas - fazem pão da manhã
(técnico em eletrônica) - dormem no ponto p/ segurança
18
As farinheiras são um dos exemplos mais interessantes da metamorfose que pode ocorrer numa atividade
tradicional, fortemente arraigada na cultura do pequeno agricultor do semi-árido, levando-a a assumir feições
comerciais e empresarias. Ver a respeito Gaiger (1996).
32
Massas Delícia e confecções Pega Bem sugerem haver uma supremacia da lógica
empresarial, em prejuízo da solidária. No primeiro caso, trabalham oito pessoas, das
quais apenas três são sócias e tiram dividendos das sobras do projeto. Das outras
cinco, três são remuneradas por hora de trabalho e duas recebem um valor fixo
mensal. Aparentemente, somente as três sócias participam das decisões a respeito
dos rumos do projeto. Poder-se-ia sustentar que, objetivamente, no estágio atual a
experiência é alternativa apenas para as três sócias, representando um emprego
convencional para as demais participantes. No empreendimento Pega Bem, também
ocorre um desnível desse tipo, uma vez que dois sócios são os proprietários e as
outras sete pessoas, sócios-trabalhadores.
Distinção
Combinação
O trabalho constitui o elemento central dos EES. Ele é o recurso mais importante,
senão único, dos trabalhadores que se solidarizam e canalizam suas forças para o
empreendimento. Assim sendo, torna-se o fator produtivo preponderante, com grande
peso específico em relação ao capital, composto pela modesta infra-estrutura,
tecnologia instalada, equipamentos e pequenos aportes monetários. O trabalho
adquire, ademais, um valor simbólico e moral, posto que no EES passa-se a produzir, a
contribuir com uma atividade útil para a sociedade, ampliando-a e dando-lhe um novo
sentido; a partir do trabalho, o EES institui, com toda a força de uma experiência
concreta, valores como justiça e eqüidade, ao mesmo tempo que propicia um
enriquecimento humano, cognitivo e tecnológico da atividade laboral. Por fim, se o
trabalho é a garantia básica do EES, também é por ele assegurado: manter cada posto
de trabalho passa a ser prioridade bem maior do que a lucratividade. Como salienta
Razeto (1997a: 96), a valorização do trabalho próprio define a racionalidade destas
pequenas empresas de trabalhadores.
Não pairam dúvidas de que as características dos EES, particularmente o modo como
se organiza o processo de trabalho, trazem, por si mesmas, uma série de vantagens e
satisfações adicionais, além de benefícios materiais indiretos. A renda monetária, de
resto seguidamente próxima ao que se poderia auferir nos empregos oferecidos pelo
mercado de trabalho, fica de certo modo em segundo plano, diante da condição ímpar
de ser co-proprietário e gestor do negócio, de dispor do poder de decisão em prol dos
trabalhadores e de si próprio, de recuperar a auto-estima, de viver o trabalho, enfim,
como algo edificante e dignificante.21
Esse fato fica estampado na pesquisa. Quase a uma só voz, os membros dos EES
visitados afirmam sentirem-se numa nova vida. Apesar das dificuldades e incertezas,
mal cogitam em voltar a trabalhar para um patrão, ou a arriscarem-se sozinhos com um
negócio próprio, que estimam uma quimera nos dias de hoje. De todo modo, alguns
reais a mais no fim do mês jamais justificariam suportar as condições do
assalariamento ou a precariedade do setor autônomo informal. Aliás, quando
comparam o EES com outras alternativas, entre elas as microempresas convencionais,
com acerto o fazem colocando-se não no lugar do proprietário do negócio, em posição
privilegiada, mas no de seus empregados, em suas condições de trabalho comumente
aviltantes e com ganhos no geral irrisórios.
21
Sobre o valor do trabalho como atividade humanizante, dentro do panorama contemporâneo de crise da chamada
“sociedade de trabalho”, consultar o brilhante ensaio de Antunes (1997). No âmbito da economia solidária, ver os
sugestivos trabalhos de Razeto (1997a; 1997b) e Arruda (1997).
36
Por seu lado, confecções AMME, embora de cunho semi-familiar, decidiu estender a
condição de sócio a todos os seus membros. A opção incluiu as vendedoras, cuja
integração foi posterior e gradativa, como forma de interessá-las na prosperidade do
empreendimento e resolver um problema crônico, comum a outras experiências, de
ineficácia na comercialização. As vendedoras passaram a desempenhar um papel
importante nas alterações da linha básica da confecção e na ampliação da demanda,
ao trazerem sugestões e encomendas da clientela.
Confecções Pega Bem, tendo por origem e por base atual uma empresa familiar, de
propriedade dos líderes do empreendimento, configura uma situação objetiva de
divisão social do trabalho. O propósito reiterado por seus membros é constituir uma
associação autogestionária e democrática, por intermédio da socialização progressiva
do capital inicial, à medida que o mesmo se dilui com a expansão do negócio. Os
meios para realizá-lo são, contudo, motivo de hesitação no grupo.
Para fazer frente à demanda e preservar sua clientela, os membros do grupo GESMA
não hesitam em bancar longas jornadas de trabalho e dedicar-se exclusivamente ao
empreendimento. Além de entenderem essa quota de sacrifício como algo transitório e
preferível à admissão prematura de novos sócios, contabilizam a satisfação de
trabalharem por conta própria e demonstrarem a viabilidade do solidarismo.
24
Situações como essa trazem o problema da reintrodução do assalariamento no interior dos EES. No caso em
análise, entendeu-se que a admissão de novos sócios, sem levar em conta o elevado investimento realizado desde o
início do projeto e a conseqüente valorização das quotas-parte, seria um expediente artificial e perigoso. A
compensação estaria no tratamento humano dispendido aos trabalhadores sob contrato. No fundo, a questão diz
respeito aos limites do solidarismo nas condições atuais da sociedade.
38
Esse é sem dúvida um dos pontos nevrálgicos e mais controversos dos EES. Um
primeiro problema consiste em superar um sistema de cálculo que não considera o
valor agregado pelo trabalho dispendido no empreendimento (nem mesmo em horas)
e, simplesmente, adiciona aos demais custos um percentual, definido um tanto
aleatoriamente, de modo a não encarecer a mercadoria diante dos preços da
concorrência. Assim sendo, não há base real para a identificação das linhas de
produção deficitárias, para o planejamento da produção, realocação da força-de-
trabalho, etc. A previsão de ingressos não pode ser cotejada com a estrutura de custos
e medidas corretivas acabam tomadas de forma errática. Via de regra, a remuneração
do trabalho finda extremamente deprimida e instável, frustrando as expectativas dos
sócios e hipotecando sua permanência.25
Não há fórmulas nem pistas seguras. Não obstante, algumas lições se depreendem
das experiências focalizadas na pesquisa. A primeira, de que um maior empenho ou
dedicação ao empreendimento deve ser de algum modo recompensado, segundo
normas estabelecidas pelo grupo, sob pena de se cair em paternalismos ou de coibir o
espírito de iniciativa. A segunda, de que os recursos materiais e financeiros
disponibilizados pelos sócios devem ter sua contrapartida, como forma de preservar as
bases reais do empreendimento e orientá-lo para sua efetiva auto-sustentação. Tais
procedimentos não causam abalos quando decididos em conjunto e quando o
25
Ver a respeito Gaiger (1994, cap. 2). As dificuldades em estabelecer preços e custos são de resto freqüentes, como
se pode observar em experiências do Rio de Janeiro (Abreu et al., 1997).
26
Um problema suplementar está em individualizar os ganhos em função da produtividade pessoal de cada
associado. Desconhecer essas diferenças pode ser fator de desestímulo e comprometer a produtividade global do
empreendimento; reconhecê-las implica resolver o problema técnico de medi-las, no contexto de um trabalho de
equipe, e o problema político de sancionar princípios e regras condizentes, sem desfigurar o empreendimento.
40
A avaliação da eficiência não deve ademais ser isolada da discussão sobre a eficácia
dos empreendimentos, isto é, sobre os fins a serem alcançados e a possibilidade de
atingi-los. Obviamente, a eficácia dos EES não se reduz ao faturamento econômico,
pois tem a ver com satisfação de necessidades e objetivos materiais, sócio-culturais e
ético-morais. Supera a racionalidade dirigida primordialmente à acumulação, da
mesma forma que não se enquadra na estreita relação mercantil entre produtores e
consumidores. A racionalidade dos EES, em outras palavras a relação entre fins e
meios, está compreendida por valores, voltados à qualidade de vida e à evolução do
ser humano. Ela está orientada pela reprodução ampliada (Coraggio, 1997: 36)27 da
27
Sobre o conceito de reprodução ampliada, consultar também: CORAGGIO, L. Desenvolvimento humano e
educação. São Paulo: Cortez, 1996.
41
Massas Delícia adquiriu um ponto de vendas escolhido de forma criteriosa. Neste local,
combina a venda de sua produção própria com a oferta de outros produtos. Atua
também como fornecedor para outros sete estabelecimentos. Comercializa alguns
produtos no próprio local da produção, além da venda sob encomenda, com entrega a
domicílio. Planeja ainda empregar vendedores ambulantes.
O primeiro deles diz respeito à indiferenciação dos diversos elementos que intervêm no
processo produtivo e devem ser contabilizados, tanto no gerenciamento quanto no
planejamento. Um dos efeitos mais comuns dessa dificuldade é a inobservância de
procedimentos necessários à preservação do capital de giro, que termina por dissipar-
se à medida que se lança mão das economias disponíveis para despesas correntes
que não geram retorno. Noções como “fundo de reserva” nem sempre são assimiladas
e menos ainda visualizadas no planejamento de maior prazo, senão no que se refere
ao montante destinado para pagar créditos já contraídos.
Respondendo a esse critério, a Associação Linha Terceira exerce cada uma de suas
atividades sob uma personalidade jurídica diferente, de sorte a individualizar os
resultados de cada investimento. As cooperativas e associações dos assentamentos
realizam igualmente um controle contábil discriminado, valendo-se de um sistema
informatizado desenvolvido pela cooperativa estadual para esse fim. A cooperativa de
serviços COOPSERV utiliza uma planilha de custos coerente com o objetivo de
remunerar seus sócios acima do mercado, contabilizando-se retornos monetários
mediatos e imediatos, e com o objetivo de alcançar a auto-sustentação do
empreendimento.
Os fatores de êxito elencados nos cap. 7 e 8 evocam uma questão de fundo que
conviria ter em vista: as relações entre a economia solidária, no seu todo e na esfera
de cada empreendimento, com o mercado. Nos dias atuais, é pertinente afirmar que a
necessidade de atender as regras do mercado constitui um fato essencialmente
degenerador do solidarismo, de caráter passageiro e a ser superado com o próprio
crescimento desse novo segmento econômico?
A réplica mais profunda a essa tese certamente nos é oferecida pelo importante
historiador Fernand Braudel, que demonstrou ser a formação do capitalismo fortemente
dependente do poder estatal e ter-se contraposto sistemicamente à economia de
mercado.30 Ainda que não a desenvolvamos agora, importa perceber que, ao municiar-
nos valoricamente contra o mercado, um fato essencial nos escapa: nas sociedades
contemporâneas, há muita vida econômica fundada no intercâmbio e na troca, sem por
isso diluir-se na racionalidade mercantil capitalista. Historicamente, o capitalismo não
29
No mesmo sentido, vale acrescentar que “a crítica ao discurso neoliberal usualmente toma os conceitos de
mercado, economia de mercado e capitalismo como se fossem mais ou menos a mesma coisa, em relação a quem os
interesses dos movimentos sociais estariam em oposição.” (Kraychete, 1997: 47).
30
Consultar, deste autor: Os jogos das trocas. Lisboa - Rio de Janeiro: Cosmos, 1985; O tempo do mundo. São
Paulo: Martins Fontes, 1996; Civilisation matérielle, économie et capitalisme. Paris: Armand Colin, 1980.
49
explica a origem do mercado; nos dias atuais, não esgota o seu sentido. Conforme se
afirmava em outra ocasião:
“ Todo esse processo exige uma cultura de empresa que atualmente não está o bastante
presente na economia popular, mas as condições para alcançá-la estão reunidas. [...]
Pouco a pouco, caem certos preconceitos: que os pobres não podem aceder ao crédito
como produtores ou pequenos empreendedores, que os produtores associados não
podem desenvolver estratégias de mercado para sobreviver e fazer concorrência, que a
economia popular não pode ter projeto de acumulação para reinvestir de forma
associativa seus ganhos ou não pode competir suficientemente com a economia
50
Como, à luz dos dados levantados, a formação de uma economia solidária, apresenta-
se na região focalizada pela pesquisa? Em que medida e direção, no interior do espaço
sócio-econômico do RS, pode-se visualizar um novo horizonte, viável e alternativo,
para aqueles que vivem do seu trabalho? Quais são os seus sinais promissores e os
seus desafios? Essas últimas reflexões serão dedicadas a esse tema.
O setor cooperativo em geral tem tradição no Estado. Considera-se hoje que envolve
800 mil pessoas, cerca de 8% da população. Os últimos dados oficiais disponíveis,
ficam bem aquém da realidade, cujo dinamismo mostra-se surpreendente. No Brasil,
970 cooperativas novas foram contabilizadas em 1998, podendo-se supor um número
importante do qual não se tem registro. No RS, 261 cooperativas foram registradas em
1997, uma cifra 75% superior a do ano anterior.31 Em termos absolutos e no
comparativo com o país, os totais por categoria, em 1998 (tabela abaixo), evidenciam o
peso do RS nesse setor.32 Sabe-se, ademais, que a preponderância das cooperativas
31
Dados do Jornal do Comércio. Porto Alegre, 09 set. 1998.
52
32
Um indicador geral da concentração de cooperativas no RS poderia tomar como referência a participação desse
Estado na população do país, equivalente a 6%.
53
33
Fonte: Informativo Ana Terra (Porto Alegre), n.14, nov./dez. 1998 e n.16, jan. 1999.
34
Segundo o Jornal Portosol (Porto Alegre, dez. 1996), no primeiro ano de funcionamento não se registraram
atrasos superiores a 30 dias, para os clientes financiados com base em garantias solidárias.
54
A noção de que esse segmento econômico apenas se sustenta mediante uma política
de subsídios paternalista, não se justifica. Não obstante os pontos vulneráveis das
microexperiências, as constatações da pesquisa fornecem a essa altura razões
suficientes para admitir que sua presença no cenário econômico não é
necessariamente efêmera. Uma vez assumido plenamente o seu caráter cooperativo,
de modo a explorar todo o novo potencial adquirido pelo fator trabalho, os
empreendimentos não somente geram benefícios sociais adicionais, mas ganhos reais
em eficiência e, por conseguinte, condições de assegurarem sua própria reprodução.
de pequena escala, é uma via possível para potencializar soluções alternativas. Grande
parte das necessidades pode ser satisfeita por um trabalho produtivo local que empregue
tecnologia apropriada (isto é, aquela que conserva os recursos, não agride o ambiente,
ajuda no trabalho e cria produtos socialmente úteis), com a vantagem adicional de
dispensar o deslocamento das pessoas.” (Idem ibidem)
Nesse contexto, a economia solidária pode não apenas subsistir, mas encontrar o
impulso necessário à sua expansão. Isoladamente, cada empreendimento
permanecerá limitado pelos efeitos da concorrência, da sua baixa escala de produção
e da ausência de mecanismos que confiram racionalidade a todo o circuito econômico
em que se insere, dada sua segmentação e fragmentação. A solidariedade deve,
portanto, estender-se entre os EES e destes com os demais agentes que circundam e
se relacionam com esse campo: centros de assessoria e pesquisa, agências de
fomento, órgãos governamentais, etc.
Tem-se pela frente importantes desafios. Nas atuais condições econômicas e políticas,
os protagonistas diretos da economia solidária, de certo modo, estão fazendo o que
56
Para isso, importa trabalhar em prol de maior coesão do campo popular, de modo a
conferir maior abrangência à atuação dos movimentos sociais e tornar prioritária a
tarefa de dar visibilidade e consistência à economia solidária. Somente assim, será
possível sustentar sua legitimidade e viabilidade, constituindo-a em argumento na luta
política. Difundindo-se pela sociedade, envolvendo e renovando conselhos, comissões
e demais estruturas de participação civil, agregando entidades, esse movimento estaria
dinamizando um espaço vital de ações, de caráter social e público, cujo protagonismo
é indispensável à implementação de um novo projeto de desenvolvimento.
Não se quer com isso subestimar a intervenção do Estado, cujas prerrogativas e raio
de ação o tornam uma peça primordial. Apenas o Estado detém a capacidade de ativar
políticas abrangentes, captar e redirecionar recursos de vulto, materiais e humanos,
visando a reprodução e expansão de novas estruturas econômicas, vulneráveis
perante a força destrutiva do atual sistema de produção de mercadorias. Interagindo
57
BIBLIOGRAFIA
ABREU, R. P., JORGE, A.F., SORJ, B. Projetos de geração de renda para mulheres de
baixa renda: reflexões a partir de estudos de caso no Rio de Janeiro. Proposta, n.
72, p. 62-72, 1997.
DEFOURNY, J., FRAVEAU, L., LAVILLE, J.L. (Orgs.) Inserción y nueva economia
social: un balance internacional. Valencia: CIRIEC, 1998.
GAIGER, L. A segurança alimentar no contexto das lutas pela terra no RS. São
Leopoldo: Centro de Documentação e Pesquisa – UNISINOS, 1995.
LISBOA, A. A economia popular como horizonte para as sociedades sem rumo. Tempo
e Presença, n. 288, p. 14-17, 1996.
PUPE, Mauro G. Wabner. Trabalho solidário: o bem sucedido case COOMEC. Porto
Alegre: Palomas, 1996.
VOIGT, L. O fomento aos famiempresários: uma nova forma de política social. In:
GAIGER, L. (Org.) Formas de combate e de resistência à pobreza. São Leopoldo:
UNISINOS, 1996, p. 127-156.
63
ANEXO 2
DESCRIÇÃO DAS EXPERIÊNCIAS VISITADAS
Associação Pôr-do-Sol
A associação Pôr-do-Sol é uma experiência coletiva de produção agrícola, localizada no
Assentamento Eldorado do Sul. Os integrantes da associação são provenientes do acampamento do MST em
Cruz Alta, no ano de 1989. Foram assentados em 1991, juntamente com outras 70 famílias, recebendo cada
uma 11 ha de terras. A associação, enquanto tal, iniciou suas atividades no ano de 1994, com 10 famílias, e
permanece com este mesmo número de integrantes.
As casas e outras benfeitorias foram construídas em regime de mutirão. A terra que o grupo possui é
trabalhada de forma coletiva e existe uma divisão técnica do trabalho, separando-se os associados em grupos.
Cada grupo é responsável por uma atividade: lavoura de arroz, horta, criação do gado e construção. Esta
divisão é, no entanto, bastante flexível, podendo-se concentrar mais o trabalho, quando necessário, em uma ou
outra atividade. A principal atividade comercial é a lavoura de arroz, sendo que a horta, cultivada em parte de
forma ecológica, também gera bons resultados.
O grupo é associado à Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre
(COOTAP), que lhe presta alguns serviços, como aluguel de máquinas e intermediação na obtenção de
recursos financeiros. A assessoria técnica à produção é prestada pelo Projeto Lumiar e pelo GAIA, este último
na produção ecológica.
64
ocorridos dentro do grupo. Os sócios são pequenos produtores rurais do Município, que prosseguem com a sua
produção agrícola individual.
No plano econômico, a associação tem várias atividades. No que diz respeito a grãos, a associação faz
colheita, transporte, secagem, armazenagem, moagem e comercialização. Além disso, intermedia a
comercialização de suínos, opera uma serraria e uma fábrica de móveis e ainda trabalha no ramo de construção
civil, construindo casas.
Os sócios têm vantagens em relação aos não sócios em todas as atividades da associação. No que diz
respeito à produção individual de cada associado, não há nenhuma interferência, só auxílio na obtenção de
subsídios e fornecimento de assessorias, via CETAP e EMATER.
A associação trabalha com 12 funcionários remunerados, sendo que alguns também são sócios. Os
administradores são técnicos com formação superior. Cada atividade da associação tem uma personalidade
jurídica diferente, e há um controle da lucratividade de cada atividade específica.
Os recursos necessários para a consolidação da associação foram obtidos em diversas fontes, dentre
elas Cáritas, Banco do Brasil e BNDES. O ativo está estimado em US$ 280 mil, para um passivo de US$ 150
mil.
Quanto a resultados, a associação trabalha em uma escala que lhe permite influir nos preços, além de
possibilitar o acesso a recursos financeiros que, sozinhos, os associados não obteriam. Além disso, a
associação é um dos importantes atores políticos do Município, fazendo oposição aos setores mais
conservadores.
67
Vida e Sabor
A experiência Vida e Sabor localiza-se na zona urbana do Município de Passo Fundo. O grupo é
formado desde o seu início, em 1996, pelas mesmas 4 mulheres, ativistas das pastorais da Igreja Católica no
Município. As participantes já trabalhavam juntas, eventualmente, em projetos comunitários de entre-ajuda, e
resolveram tentar obter um financiamento da Cáritas para iniciarem conjuntamente uma atividade remunerada.
O financiamento foi obtido, e o ramo escolhido pelo grupo foi o de alimentação, produzindo pães, massas e
lanches. A atividade foi escolhida devido ao fato de uma das integrantes já exercê-la, e de todas já terem algum
conhecimento de cozinha.
O trabalho é realizado na garagem de uma das sócias, adaptada para a atividade, mediante pagamento
de aluguel. Todas as participantes executam todas as tarefas, mas há uma certa divisão de responsabilidades.
Há uma coordenadora, uma chefe de cozinha, uma vendedora e uma secretária. Algumas trabalham meio turno
por dia, outras, turno integral, e a remuneração é feita de acordo com os turnos trabalhados.
O grupo produz, dentre outros produtos, pães, cucas, pastéis, risoles, coxinhas, pés-de-moleque,
massas, lasanhas e capeleti. O principal meio de comercialização é a venda de lanches para os funcionários de
uma empresa das redondezas. Uma das integrantes do grupo, antes da sua formação, já tinha um acordo de
exclusividade para vender lanches nessa empresa; esse privilégio foi incorporado pelo grupo. Vendem também
para o público em geral, no próprio local da produção e sob encomenda. As vendas para fins comunitários são
feitas a preços de custo.
A remuneração média obtida pelas participantes é de cerca de R$ 100,00 por mês, valor que tenderá a
aumentar depois de terminada a devolução dos recursos financiados junto à Cáritas.
A COONALTER é uma cooperativa localizada na zona urbana do Município de Passo Fundo. Iniciou
suas atividades no ano de 1992, ligada à Cáritas Diocesana de Passo Fundo. Tinha na época dois principais
objetivos: gerar recursos para sustentar esta entidade e difundir o consumo de produtos naturais, através do
funcionamento de um mercado e um restaurante ecológicos. Em 1993, a COONALTER ganhou autonomia em
relação à Cáritas, pois percebeu-se que a cooperativa não conseguia gerar recursos para repassar à entidade, de
acordo com um dos seus objetivos iniciais.
As duas atividades da cooperativa, mercado e restaurante, funcionam no mesmo prédio, alugado junto
à Cáritas. O abastecimento do mercado e do restaurante é feito por grupos apoiados pela Cáritas e por
68
produtores individuais de alimentos naturais. Os produtos coloniais são buscados pela cooperativa, por meio
de rotas pelo interior.
A cooperativa iniciou suas atividades com 24 sócios, e atualmente está com 38. Dentre os sócios da
cooperativa, existem muitos integrantes de grupos apoiados pela Cáritas. Trabalham nas duas atividades da
cooperativa 8 pessoas, sendo que todos são funcionários remunerados, incluindo o presidente da cooperativa e
o gerente. No futuro, a COONALTER pretende transformar-se também em cooperativa de trabalho.
O restaurante da cooperativa tem uma clientela bastante fiel, que demanda cerca de 100 refeições
diárias. O mercado obtém boas vendas no que diz respeito aos produtos coloniais. Há uma certa dificuldade de
avaliar os resultados das duas atividades separadamente, pois o controle das vendas e custos é feito em
conjunto. A individualização das contas das duas atividades está nos planos para o futuro.
A experiência Massas Caseiras Delícia é uma padaria, localizada na zona urbana do Município de
Passo Fundo. Iniciou suas atividades no ano de 1995, quando recebeu financiamento da Cáritas para compra
de equipamentos. O grupo é composto por três sócias, sendo que duas são mãe e filha, e são as idealizadoras
do projeto. A terceira trabalhava no projeto como funcionária, e posteriormente foi transformada em sócia.
A padaria funciona nos fundos da casa de uma das sócias. Produzem diversos tipos de massas,
bolachas, salgadinhos, pães e cucas, além de diversos pratos prontos, como lasanhas e raviolis. Mantêm
também um ponto de vendas, num espaço alugado, onde, além de comercializarem a produção, também
servem almoços.
As três sócias atuam na produção, mas duas delas têm também outras atribuições. Uma é responsável
pelo ponto de vendas e pela contabilidade do empreendimento; a outra é responsável pelas entregas. Os
ganhos são divididos entre as três, mas em parcelas diferentes, que levam em consideração o capital investido
e os gastos que cada uma assume, como, por exemplo, as despesas com a casa e com o carro utilizados pelo
projeto, que são de propriedade de uma das sócias.
Apesar de trabalharem num ritmo bastante forte, as três sócias não dão conta de todo o trabalho.
Envolvem-se também outras cinco mulheres, remuneradas mensalmente ou por hora trabalhada. Dessas cinco,
três atuam na produção, uma no atendimento no ponto de vendas e a outra faz a limpeza.
A experiência Massas Delícia, além de gerar bons resultados econômicos para as sócias, é uma
referência para os demais grupos da região, assessorando-os eventualmente no trabalho de panificação. Além
disso, uma das sócias faz parte do Conselho de Projetos da Cáritas Diocesana de Passo Fundo, que seleciona
aqueles que recebem financiamento.
Doce Sabor
A experiência Doce Sabor fabrica tortas e doces decorativos para festas. Iniciou suas atividades no
ano de 1997, na zona urbana do Município de Passo Fundo. O grupo é formado por quatro pessoas, todas
mulheres. A coordenadora do grupo já trabalhava no ramo anteriormente, de forma individual; vendo que sua
atividade crescia e demandava cada vez mais trabalho, tomou a iniciativa de formar o grupo, possibilitando o
aumento da produção.
O espaço físico utilizado pelo grupo na produção é a garagem da casa da coordenadora, mediante
pagamento de aluguel. Alguns equipamentos utilizados na produção também são de propriedade da
coordenadora, mas os equipamentos de maior valor foram comprados com os recursos financiados pela
Cáritas.
Os doces e tortas produzidos pelo grupo têm um caráter bastante artístico e decorativo, e demandam
um trabalho manual bastante qualificado. A atividade de montagem e modelagem dos doces é exercida por
todas, e há uma divisão de tarefas no que diz respeito a outras atividades, como a produção das massas, as
compras, os pedidos e a contabilidade. As participantes envolvem-se na Doce Sabor em média 4 horas por dia,
no período da noite, pois todas têm outras atividades.
Muitas das vendas são feitas diretamente aos consumidores, através de encomendas para festas e
comemorações, mas os produtos são também procurados por revendedores, como sorveterias e lojas de
conveniência.
Os ganhos são divididos da seguinte forma: uma parcela é retida como poupança para pagamento do
financiamento, outra parcela fica para a coordenadora, por conta do uso dos equipamentos e por ser quem
69
iniciou a atividade e abriu às demais integrantes; o restante é dividido entre as quatro participantes,
ponderando-se pelas horas trabalhadas por cada uma. A atividade proporciona uma remuneração por hora
trabalhada de cerca de R$ 1,70.
A COANOL surgiu, no ano de 1990, com dois objetivos principais: o primeiro seria aglutinar a
produção dos assentados da região, proporcionando a estes melhores condições de comercialização; o
segundo objetivo era apoiar o MST no plano político, na luta por novos assentamentos. A sede da cooperativa
está localizada na área conhecida por Granja do Holandês, na região da antiga Fazenda Anoni.
Na sua fundação, a COANOL contava com 171 sócios. No ano de 1997, já contava com 682, dentre
os quais existem assentados e pequenos produtores rurais. Para ser sócio da cooperativa é necessário possuir
menos de 40 hectares de terra, pertencer a algum tipo de grupo ou associação de produtores e ter o aval de
outros associados, além de pagar o valor da jóia, fixado em 10 sacas de milho. A cooperativa tem na sua base
cerca de 50 núcleos (cooperativas, grupos, associações). Existe um conselho fiscal, a coordenação e a direção.
Anualmente, é realizada a assembléia geral.
Os serviços oferecidos aos sócios são a comercialização da produção, a venda de insumos, assistência
técnica, fornecimento de máquinas e crédito. Quanto à comercialização, a cooperativa trabalha com soja,
milho, leite, suínos e erva-mate, sendo que esta última é industrializada e vendida pronta para consumo final.
A cooperativa oferece aos associados assistência técnica para máquinas, produção e preservação do meio
ambiente. Procura-se incentivar a agricultura alternativa e a produção de subsistência, através de mecanismos
como a exigência de que uma parcela dos financiamentos obtidos junto à cooperativa seja utilizada para
investimento em produção de subsistência.
A COANOL é atualmente uma cooperativa com uma estrutura de grande porte, e as suas atividades
abrangem 5 municípios da região. Proporciona aos sócios, além de outros benefícios, condições de
viabilizarem sua produção.
A COMARA nasceu em 1994, de uma fusão entre duas outras cooperativas: a UNACA, que atuava
junto aos produtores de grãos, e a antiga COMARA, que atuava junto aos produtores de leite. Seus sócios são
70
pequenos agricultores da região de Ronda Alta, Município onde se localiza a sede da cooperativa. São cerca de
220 sócios integralizados, com poder de decisão, e mais um número de produtores que recebem o mesmo
tratamento dos sócios, mas sem direito a voto, por não terem entrado com a quota-parte. Ao todo participam
cerca de 350 produtores.
As funções exercidas pela cooperativa são: organização e comercialização da produção,
comercialização de insumos, assistência técnica, assessoria em tecnologia e intermediação de recursos. Possui
uma considerável estrutura física, dispondo de silos de armazenagem e moinho, para os grãos, e uma indústria
de leite e derivados. A comercialização de grãos movimenta maiores valores, mas a atividade que dá melhores
resultados é a comercialização de leite.
A COMARA procura incentivar a produção de subsistência dos seus sócios e promover as alternativas
ecológicas de produção, passando assim para uma estrutura produtiva mais favorável aos pequenos produtores.
Trabalha articulada a outras cooperativas, sindicatos e prefeituras, procurando desenvolver um projeto de
desenvolvimento regional.
Os recursos para a estruturação da COMARA são provenientes de várias fontes como o BNDES, a
Cáritas, e entidades internacionais como a Manos Unidas, que já disponibilizou à cooperativa uma
significativa quantia, a fundo perdido. No que diz respeito a assessorias em tecnologia, contam com o CETAP
e com a COCEARGS.
A COMARA exerce um importante papel na região onde se localiza, fazendo frente às cooperativas
tradicionais. Sua atuação tem incentivado a produção de leite da região e aumentado os rendimentos dos
produtores.
A COOPERLAISA localiza-se na zona urbana do Município de Ronda Alta e iniciou suas atividades
no ano de 1991. A cooperativa é uma articulação de alguns grupos de costura, organizados a partir das CEBs.
O grupo é formado por 22 sócias, todas esposas e filhas de agricultores, organizadas em grupos de 4 e 5
mulheres.
Na sede da cooperativa são realizadas as primeiras fases do processo de produção: o corte e a
modelagem, atividades realizadas pela coordenadora do grupo. As peças cortadas são enviadas para as
costureiras, que realizam, em suas casas, o trabalho de montagem das peças. As roupas prontas são enviadas
novamente para a sede da cooperativa, onde está localizada também a loja, que vende a produção para o
público em geral. As vendas na loja correspondem a apenas 30% do total da produção. A maior parte das
vendas é feita sob encomenda, geralmente em grandes lotes.
Os recursos para compra das máquinas de costura foram financiados junto à Cáritas e ao fundo
rotativo da paróquia. Já os recursos para a compra da casa que abriga a sede da cooperativa foram
disponibilizados por uma entidade internacional, com a qual a cooperativa ainda encontra-se em débito.
Algumas das sócias trazem de casa o conhecimento da atividade de costura, mas algumas recorreram
a cursos rápidos do SENAI e SEBRAE. Somente a coordenadora fez um curso particular mais demorado, de
cerca de 8 meses.
As costureiras trabalham em média 3 a 4 horas por dia e conciliam o trabalho de costura com as
atividades rurais. O pagamento é de acordo com o número de peças produzidas e corresponde em média a
cerca de R$ 100,00 por mês. Somente a coordenadora e a vendedora trabalham em tempo integral. A primeira
recebe um salário mensal fixo de R$ 180,00 e a vendedora, uma comissão de 10% sobre as vendas, o que lhe
proporciona cerca de R$ 150,00 por mês.
A associação está localizada na zona rural do Município de Nova Boa Vista. Tem sua origem no ano
de 1992. Foi criada com o intuito de formar, nos seus membros, uma consciência coletiva para o trabalho e
teve como primeiros objetivos específicos a criação de uma lavoura coletiva para produção de sementes e a
busca de recursos para compra de
equipamentos. Participam da associação 16 pessoas, entre agricultores e filhos, de 9 famílias diferentes.
O projeto da lavoura comunitária foi viabilizado com assistência técnica do CETAP. Com ela, a
associação conseguia produzir internamente as sementes que os associados utilizavam nas suas lavouras
individuais, o que diminuía os custos com este insumo em cerca de 50%. Obtiveram um financiamento da
71
Cáritas para a compra de um equipamento de adubação que utiliza esterco, que também deu excelentes
resultados.
A lavoura comunitária foi, no entanto, deixada de lado, quando montaram um condomínio de
produção de leite tipo B, de acordo com um projeto apresentado pela EMATER e com recursos oferecidos
pelo Banrisul. A associação concentrou então todos os seus esforços neste condomínio, até que, depois de 18
meses, perceberam que só estavam tendo prejuízos e o desativaram. Um dos aspectos determinantes dessa
inviabilidade do condomínio foi a impossibilidade de vender o leite produzido a preços de leite tipo B, sendo a
associação obrigada a vender sua produção a preços menores.
Atualmente, os integrantes da associação produzem principalmente soja e leite, mas individualmente
e nas formas tradicionais. A comercialização da produção é feita através de uma cooperativa da região. Visto
que o condomínio de leite nunca deu os resultados previstos, a associação não conseguiu pagar o
financiamento, e encontra-se em débito com o Banrisul. O caso está sendo investigado, para determinar-se se
houve ou não falha da EMATER no projeto.
A APRORAM localiza-se no Município de Cerro Branco, tendo surgido no ano de 1989, com o
objetivo de diversificar a produção rural dos seus associados, rompendo assim com a cultura do fumo,
tradicional na região. A associação é composta por 10 sócios, de 4 diferentes famílias de pequenos
proprietários rurais.
O grupo atua em praticamente toda a cadeia produtiva do setor de suínos, produzindo desde a ração
até os produtos finais, como salames, lingüiças e torresmo. Apenas três sócios atuam permanentemente na
associação, dois deles tratando os animais e o outro cuidando das vendas na sede da associação. Há ainda uma
quarta função, na qual os associados se revezam, que é o atendimento no ponto de vendas que possuem, na
sede do Município. Eventualmente, quando o trabalho aumenta, todos os associados se envolvem, em regime
de mutirão. Há um envolvimento de todos também na tomada das decisões mais importantes, quanto ao
planejamento e aos investimentos.
Os recursos investidos na APRORAM foram financiados pela Cáritas e pelo Governo do Estado.
Quanto a aportes técnicos, a EMATER propiciou cursos de gerenciamento e manejo em suinocultura; o
SENAR, sobre produção de embutidos. Há também aporte de técnicos voluntários da UFSM, auxiliando na
gestão do projeto.
Quanto à remuneração, os quatro sócios que trabalham no projeto dividem 3 salários mínimos. Todas
as sobras são reinvestidas no projeto. A APRORAM parece conseguir alcançar seus objetivos, visto que seus
associados já deixaram a cultura do fumo em segundo plano, ainda que alguns ainda mantenham suas
lavouras. O grupo tornou-se uma referência na região e tem articulações bastante amplas com outros grupos,
através do Projeto Esperança. Além disso, marcam presença nos Conselhos Municipais de Saúde, Agricultura
e Bem-Estar do Município.
A história da experiência APROMACOM é intimamente ligada à da APRORAM. Suas três sócias são
também sócias desta outra associação, que não demanda a mão-de-obra de todos os seus participantes. Dessa
forma, em 1993, cria-se a APROMACOM, com o mesmo objetivo da APRORAM: buscar alternativas à
cultura do fumo, típica na região.
A atividade exercida pela APROMACOM é a de confecções, escolhida porque não havia atividade do
gênero no Município, e também porque as participantes já tinham algum conhecimento de costura. Produzem
roupas para homens, mulheres e crianças, e também fazem reformas.
As participantes trabalham em tempo integral, mas o trabalho ainda não esgota a capacidade
produtiva. Todas exercem a atividade de costura, e existe uma certa divisão de tarefas no que diz respeito a
outras atividades como as compras e a comercialização. Para a compra de matérias-primas, viajam à Santa
Catarina, em excursões financiadas pelas indústrias deste Estado, e conseguem assim reduzir custos.
A associação possui um ponto de vendas da sua produção, na sede do Município, em parceria com a
APRORAM. Parte do trabalho de confecção também foi transferido para este local. Além do ponto de vendas,
comercializam também na COOESPERANÇA e em feiras organizadas na cidade de Santa Maria.
Os recursos investidos na APRORAM foram financiados pela Cáritas e pela Prefeitura do Município
de Cerro Branco. Recorreram também a empréstimos bancários para formação de capital de giro.
72
A remuneração para cada participante fica em torno de R$ 100,00 por mês. Já realizam alguns
investimentos importantes, como a compra de uma linha telefônica, em parceria com a APRORAM
A Associação Pega Bem está localizada na zona urbana do Município de Faxinal do Soturno. Quando
iniciou suas atividades, no ano de 1995, era uma microempresa nos moldes tradicionais, na qual trabalhava
apenas um casal. Em 1996, aderiram ao Projeto Esperança, de Santa Maria, e transformaram a microempresa
em associação, ampliando o grupo para 9 pessoas, de 6 famílias diferentes.
O grupo produz roupas íntimas, masculinas, femininas e infantis, de variados tamanhos e modelos.
Atende também a pedidos sob medida. Estão ligadas diretamente à produção 7 pessoas, que dividem o
trabalho de acordo com a especialidade. O trabalho é realizado em tempo integral, e a remuneração obedece o
número de peças produzidas por cada um. Além das sete pessoas ligadas à produção, participam ainda mais
duas, como vendedoras externas.
Os produtos da associação são comercializados no próprio Município e em outros da região. Cerca de
80% da produção é vendida para outros comerciantes, mas vendem também diretamente ao consumidor.
Participam de feiras em Santa Maria, organizadas pela COOESPERANÇA, da qual são associados.
Os recursos para compra de máquinas e equipamentos foram financiados pela Cáritas. O grupo recebe
acompanhamento do Projeto Esperança (Cáritas de Santa Maria), que também viabiliza as articulações da
associação com outros grupos, visando a troca de experiências.
A associação proporciona uma remuneração de cerca de R$ 150,00 mensais para cada participante.
Apenas um dos integrantes ganha mais, por fornecer o espaço físico para o funcionamento da associação e por
ser o proprietário da microempresa que deu origem à experiência atual.
A AMME está localizada na zona urbana do Município de Santa Maria. Teve seu início no ano de
1989, quando seus participantes conheceram o Projeto Esperança, de Santa Maria, e resolveram criar uma
experiência de geração de renda, procurando alternativas para a situação de desemprego que enfrentavam.
A associação trabalha no ramo de confecções. Participam do projeto 6 pessoas, sendo que três
trabalham diretamente com a produção e três atuam como vendedoras. Não há um horário de trabalho
definido; os participantes trabalham o tempo que for necessário. As decisões são tomadas prioritariamente
73
pelos integrantes que atuam na produção, mas as vendedoras têm um papel importante na definição das linhas
básicas de confecção, trazendo as sugestões e encomendas do público consumidor. Uma vez por mês há uma
reunião com todos os participantes.
A comercialização é feita em diversos pontos da cidade, através das vendedoras, e também no próprio
local da produção e nas feiras organizadas pela COOESPERANÇA. As feiras, além de momentos de
comercialização da produção, são também momentos de trocas de produtos e integração com os demais
grupos.
Os recursos para compra de equipamentos de costura foram financiados pela Cáritas. Quanto a
assessorias, recebem acompanhamento técnico na área de gestão e contabilidade, por parte de professores da
Universidade Federal de Santa Maria.
A renda gerada pelo projeto é dividida entre os três participantes que trabalham na produção, e
representa cerca de R$ 350,00 mensais para cada um. As vendedoras recebem de acordo com as peças
vendidas. O principal problema enfrentado pela Associação é o esgotamento do capital de giro.
A experiência tem suas origens na ocupação da Fazenda Santa Marta, no Município de Santa Maria,
em 1991. Na época, cerca de 3600 famílias ocuparam a área, pertencente ao governo do Estado, e nos anos
seguintes lutaram por melhorias no local. Para combater o problema da falta de emprego, 6 famílias iniciaram
o projeto de uma padaria comunitária, atividade na época inexistente no local, e deram origem à GESMA.
Na fase atual, trabalham no GESMA 7 pessoas, de 4 famílias diferentes. Todos são moradores do
assentamento, com alguma qualificação profissional, que se encontravam desempregados. Das sete pessoas,
cinco trabalham na produção e venda no local da padaria e as outras duas atuam na distribuição e venda para
outros comerciantes. Trabalham com escalas variáveis de horário, visto que a produção e venda de pães exige
trabalho nas mais variadas horas do dia e da noite.
O grupo procura manter sua posição no assentamento, concorrendo com outras padarias de fora. Para
isso, mantém os dois vendedores dando atendimento constante aos pequenos estabelecimentos próximos.
Outras formas de comercialização realizadas pelo grupo são a venda no local da produção, onde há um espaço
especialmente para isso, o fornecimento de lanches para entidades, como sindicatos e pastorais, e a
participação nas feiras organizadas pela COOESPERANÇA. É através desta, inclusive, que se articulam com
outros grupos para troca de experiências.
Os recursos para compra de equipamentos e construção do prédio foram financiados pela Cáritas
Regional e pelo Projeto Esperança de Santa Maria, sendo que este último proporcionou aos participantes
também um curso de panificação.
A remuneração dos participantes que trabalham na produção representa em média R$ 200,00 mensais;
dos vendedores, cerca de R$ 400,00.
A COOESPERANÇA foi criada no ano de 1989, por iniciativa do Projeto Esperança, da Diocese de
Santa Maria. Nos seus primeiros anos, a cooperativa enfrentou uma série de dificuldades, permanecendo um
período desativada, em 1990, e reabrindo em 1991, quando então conseguiu viabilizar-se, permanecendo em
funcionamento até os dias atuais.
Todos os grupos que recebem financiamento do Projeto Esperança, automaticamente, fazem parte da
cooperativa; além destes, são associados também alguns que não receberam financiamento, mas são
vinculados à diocese. Ao todo, a COOESPERANÇA reúne cerca de 50 grupos de produtores e prestadores de
serviços rurais e urbanos.
A cooperativa comercializa a produção dos seus associados diariamente, no entreposto localizado no
Bairro Medianeira, em Santa Maria. Neste mesmo local, são realizadas feiras todos os sábados, sendo que a
principal ocorre no primeiro sábado de cada mês, quando cerca de 40 grupos comercializam sua produção.
Nos demais sábados, as feiras contam com a participação de cerca de 15 grupos. São comercializados os mais
variados produtos como hortigranjeiros, carne (gado, suínos e frango), embutidos, confecções, artesanato,
produtos de limpeza, pães, biscoitos, cucas, dentre outros. Organizam também, anualmente, a Feira do
Cooperativismo, com a participação de grupos de todo o Estado.
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Os financiamentos para viabilização da cooperativa foram obtidos junto ao próprio Projeto Esperança
e à Cáritas Regional. As assessorias são prestadas por técnicos da EMATER e da Universidade Federal de
Santa Maria.
A COOESPERANÇA proporciona aos seus participantes um importante espaço de comercialização
dos seus produtos. No entanto, há um resultado talvez ainda mais importante, que é a oportunidade que os
grupos têm de divulgarem seu trabalho e articularem-se com os demais, trocando produtos e experiências, na
construção de uma rede solidária.
Grupo de Produção 1A
O grupo está localizado no Assentamento Rondinha, no Município de Jóia. Iniciou suas atividades no
ano de 1995, sendo integrado na época por 26 famílias. Em 1997, o grupo sofre um rompimento, passando a
contar com apenas 6 famílias. Todos os participantes são filhos de pequenos agricultores, que deixaram a casa
dos pais para juntarem-se aos acampamentos do MST.
O Assentamento Rondinha localiza-se numa área de terras que já possuía alguma estrutura, como
casas e galpões. As casas onde moram os participantes foram construídas em regime de mutirão. Com a
diminuição do número de integrantes do grupo, ficaram impossibilitados de realizar o projeto que tinham em
mente, por falta de mão-de-obra e de terra suficiente. Mesmo assim, continuam produzindo, organizados pelo
sistema de setores de produção. A maior parte dos artigos produzidos é utilizada internamente, na alimentação
do grupo e dos animais que criam. O principais produtos para venda externa são os embutidos à base de carne
suína, comercializados principalmente nas feiras da COOESPERANÇA.
Os primeiros recursos para viabilização da produção foram financiados via PROCERA. O grupo
recebeu, em certo momento, assessoria técnica da EMATER, mas atualmente é o Projeto Lumiar que vem
dando a assistência. Recebem também alguma orientação da UNIJUÍ. O grupo participou ainda de uma série
de cursos promovidos pela COCEARGS, sobre gado leiteiro, agricultura, piscicultura e horta.
Mesmo passando por uma fase de certa indefinição, devido à diminuição do número de integrantes, o
grupo alcançou alguns resultados significativos. Garantem com a produção interna a própria auto-sustentação,
com uma alimentação sadia, e encontram-se em melhor situação do que os assentados que optaram pela
produção individual.
O Grupo Alto Uruguai n°4 é uma experiência de produção agrícola, organizada no interior do
Assentamento Rondinha, no Município de Jóia. O grupo iniciou suas atividades no ano de 1995, contando com
24 famílias. Com o passar do tempo, alguns integrantes foram deixando o grupo, optando na sua maioria pelo
sistema individual de produção, e em 1997 o grupo era composto por 14 famílias.
Cada família integrante do grupo dispõe de um lote de 500 m², onde foram construídas as casas e
organizadas pequenas hortas, pomares e criações de animais, de caráter individual. Todo o restante é
coletivizado: 250 ha de terra, cerca de 50 cabeças de gado, ordenha mecânica, resfriadores de leite e um trator.
O grupo possui ainda outras máquinas, como plantadeira, empilhadeira e roçadeira, compradas em conjunto
com outros grupos do assentamento. Os recursos investidos no projeto foram financiados via PROCERA.
A produção é organizada em áreas de produção: hortas, lavoura, pecuária e infra-estrutura, havendo
um rodízio de trabalhadores entre as áreas. Há um controle das horas trabalhadas, para a divisão dos
resultados. Produzem soja, milho e aipim, utilizados para subsistência ou na criação do gado leiteiro. A
produção de leite é a principal atividade com rendimentos monetários. Realizam reuniões entre os setores,
reuniões de coordenação e assembléias gerais mensais.
A principal assessoria técnica é prestada pelo Projeto Lumiar. A COCEARGS também proporciona ao
grupo alguns cursos. Quanto aos resultados, mesmo tendo enfrentado estiagens que prejudicaram bastante
duas safras, o grupo obteve importantes progressos. Garantem a própria subsistência, realizam alguns
investimentos e conseguiram apropriar-se de tecnologias que em outra situação não teriam acesso.
A COOPAN iniciou suas atividades no ano de 1994, sendo integrada por 58 famílias. Após a saída de
alguns participantes, que não se adaptaram ao sistema cooperativista proposto, o número se reduziu a 40
famílias. A cooperativa está localizada no Assentamento Capela, no Município de Nova Santa Rita, composto
por cerca de 100 famílias.
A área de terras de propriedade das 40 famílias da COOPAN totaliza 820 hectares, totalmente
coletivizada. As casas onde moram os sócios foram construídas em regime de mutirão, sorteando-se a ordem
de construção. Os recursos investidos na cooperativa foram financiados junto ao PROCERA, em ordem
superior a R$ 400 mil.
A produção, bastante diversificada, é organizada pelo sistema de divisão em setores: horta, lavoura,
animais, baraços e infra-estrutura. A lavoura de arroz é a principal atividade da cooperativa, ocupando uma
área de 160 ha. Produzem ainda, para comercialização, brócolis, couve, espinafre, melões, leite, aves, suínos e
bovinos de corte, além de diversos outros produtos para autoconsumo e alimentação dos animais. A assistência
técnica à produção é prestada pelo Projeto Lumiar. A COCEARGS tem participação no sistema de
contabilidade.
Além dos setores de produção, existem os núcleos de discussão dos problemas gerais do
empreendimento. Os núcleos e os setores elegem suas coordenações, que reúnem-se periodicamente. A cada
21 dias há também uma assembléia para discussão do plano de trabalho. A direção da cooperativa é composta
por cinco membros, eleitos anualmente.
Os resultados alcançados são bastante significativos. A cooperativa produz quase que totalmente o
que necessita para a alimentação dos sócios, e tem conseguido pagar os financiamentos que lhe
proporcionaram um alto grau de capitalização. Cada associado recebe cerca de R$ 50 mensais, livres de
despesas com água, luz e alimentação.
O grupo é composto por 6 famílias que desligaram-se da COOPAN (quadro acima) em 1996. Assim
como esta cooperativa, o grupo está localizado no Assentamento Capela, no Município de Nova Santa Rita.
Cada família pertencente ao grupo possui 20 ha de terras, sendo 15 ha propícios para o plantio de
arroz e o restante “terras secas”. A idéia do grupo é manter a parte das terras propícias para o plantio do arroz
em regime coletivo e individualizar os lotes secos.
A lavoura de arroz é trabalhada em conjunto e ocupa 48 hectares. O grupo tem diversos planos, como
criação de peixes, aves e abelhas, além da produção de frutas. A viabilização dessas atividades dependem, no
entanto, de obter recursos para investimento. Os equipamentos utilizados para o trabalho na lavoura foram
adquiridos mediante a venda do gado que o grupo recebeu quando da saída da cooperativa. Cada família
procura fazer sua horta individual, para consumo próprio. No entanto, não conseguem produzir muito do que
consomem. As compras externas são feitas de forma conjunta.
Há uma reunião para planejamento das atividades de 15 em 15 dias. Quanto a articulações e aportes
externos, o grupo é associado à Cooperativa Regional, que integra os assentados da região da Grande Porto
Alegre. Recebe assistência técnica do Projeto Lumiar, além de algum apoio da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul.
Quanto a resultados, o grupo considera que, ao sair da COOPAN, garantiu maior independência e
liberdade de ação. No entanto, naquele momento o grupo ainda não tinha conseguido viabilizar-se
economicamente, tendo até que recorrer à venda de algumas cabeças de gado para garantir a alimentação de
seus membros. O grupo visualiza boas perspectivas, porém num quadro de incertezas.
A cooperativa está localizada no Bairro Sarandi, na Zona Norte da cidade de Porto Alegre, e iniciou
suas atividades no ano de 1996. O grupo é composto por 26 mulheres, cuja maioria encontrava-se
desempregada.
A cooperativa divide-se em dois grupos de trabalho distintos. Apenas duas participantes trabalham
nos dois grupos. Um deles, composto por 8 pessoas, fabrica a multimistura, um preparado que contém, dentre
outros ingredientes: casca de ovo, sementes, farinha de milho, pó de aipim e de arroz. O produto é vendido ao
Hospital Conceição. O outro grupo trabalha com confecções, e participam 20 pessoas. São produzidos guarda-
pós, uniformes para empresas e camisetas. Dividem o trabalho em três atividades: corte (4 pessoas),
montagem (12) e bainhas (4). A atividade de corte é realizada na capela da paróquia, e as demais atividades
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são realizadas nas casas das participantes. A remuneração é de acordo com as peças produzidas. A cooperativa
vende suas confecções para empresas, sindicatos, partidos políticos e outras entidades, normalmente sob
encomenda. Procuram também participar de licitações públicas. São realizadas reuniões quinzenais com os
dois grupos juntos, para prestação de contas, apresentação de resultados e planejamento.
A cooperativa insere-se no Projeto Ações Coletivas da SMIC/POA, que promove cursos profissionais
e, em breve, fornecerá o espaço físico e infra-estrutura (telefone, fax, secretaria, etc.) na Incubadora de
Economia Popular. Além da SMIC, a IOCHPE, o CAMP e a Cáritas também proporcionaram recursos para
investimento na cooperativa.
A cooperativa tem uma inserção comunitária bastante ampla na zona onde se localiza, participando
ativamente do Orçamento Participativo e articulando-se com o movimento sindical. Quanto a resultados
econômicos, a cooperativa proporciona uma renda complementar entre R$ 50,00 e R$ 100,00 mensais para as
famílias envolvidas.
assistência é dada pelo Projeto Lumiar. A grande maioria dos recursos investidos na cooperativa foram
financiados junto ao PROCERA.
No que diz respeito aos resultados, o depoimento dos associados revela que houve significativa
evolução no nível de consciência, além de melhoras nas condições sociais e materiais de vida. A remuneração
dos sócios fica em torno de R$ 250,00 mensais por família, entre dinheiro e alimentação.
A experiência Dikasa localiza-se no Bairro Fragata, zona urbana do Município de Pelotas. Iniciou
suas atividades no ano de 1992, buscando alternativas de trabalho para os seus participantes. No decorrer dos
anos, a experiência passou por mudanças de local, de membros e de atividade, e recebeu diversos aportes de
capital.
Dentre as 4 pessoas que iniciaram a Dikasa, apenas um casal ainda permanece na atividade.
Atualmente são os únicos participantes. Já participaram, além deste casal, outras quatro pessoas, que saíram
devido a conflitos internos.
No início das suas atividades, a Dikasa produzia e comercializava massas, cucas e pães. Pararam com
a produção um ano e meio depois, por esgotamento do capital de giro. Numa segunda fase, o grupo já tinha
uma formação diferente, e alugou um ponto comercial para instalar uma lancheria, que venderia bebidas,
sorvetes, almoços e lanches. Os resultados não foram os esperados e a lancheria foi fechada. Numa terceira
fase, com o grupo novamente modificado, mudaram de local e prosseguiram com o fornecimento de almoços,
entregues em viandas.
Quanto aos aportes de capital recebidos, a Cáritas já forneceu recursos por duas vezes, e uma entidade
internacional também disponibilizou à Dikasa uma significativa soma a fundo perdido. Ao todo, a experiência
recebeu cerca de R$ 30 mil, e não conseguiu fazer a devolução prevista à Cáritas. Segundo seus integrantes, a
experiência é carente de assessorias em termos de produção e gerenciamento. A Cáritas da Diocese de Pelotas
realiza um trabalho de assistência junto aos participantes, mas nada em termos de assessoria técnica.
A Dikasa nunca conseguiu viabilizar-se economicamente. Garantiu a sobrevivência da família do
casal participante ao longo dos anos, mas sempre mediante descapitalização da experiência e novos aportes
financeiros.
Pé no Chão Calçados
Seriplast
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A experiência iniciou suas atividades no ano de 1996, em função da situação de desemprego em que
se encontravam seus participantes. O grupo é formado por 4 pessoas de 3 famílias diferentes, que se
conheciam por serem vizinhos no bairro onde moram, no Município de Pelotas.
A Seriplast funciona na casa de uma das famílias participantes. O grupo dispõe de máquinas de
costura e equipamentos básicos de serigrafia. São produzidos diversos artigos em plástico, como pastas
escolares, pequenas bolsas e acessórios para bicicletas.
Eventualmente as mulheres do grupo se encarregam mais do trabalho de costura, mas em geral todos
os participantes exercem todas as atividades, com exceção da serigrafia e das vendas, que são atividades das
quais apenas um dos integrantes é encarregado. Não existe um horário de trabalho definido. Trabalham o
tempo necessário para dar conta das encomendas. Não há tampouco um registro contábil, existindo uma certa
confusão no cálculo dos preços de venda e da remuneração do trabalho.
Os produtos da Seriplast são normalmente comercializados com pequenas lojas e estabelecimentos
comerciais da cidade de Pelotas, sendo bastante procurados. No entanto, a falta de capital de giro impede que
o grupo atenda a encomendas grandes, por não conseguir comprar maiores quantidades de matéria-prima. Os
recursos para compra de máquinas e de matéria-prima para iniciar a atividade foram financiados junto à
Cáritas.
A Seriplast proporciona a cada um dos seus participantes uma remuneração mensal de, em média, R$
250,00. No entanto, o projeto não se expande, por falta de um capital de giro que dê ao grupo condições de
aumentar a produção.
LC Jansen
A LC Jansen é uma padaria e lancheria, localizada próxima ao centro da cidade de Pelotas. Iniciou
suas atividades em 1995, quando as suas participantes ficaram conhecendo o trabalho da Cáritas com
experiências de geração de renda. Após muito medo e resistência, elaboraram o projeto, obtiveram o
financiamento e iniciaram o trabalho.
A LC Jansen tem três sócias, sendo duas irmãs e uma prima, que trabalham todos os dias, das 7 da
manhã às 9 da noite, revezando-se nas tarefas. A padaria é praticamente a casa da família, pois fazem as
refeições no local e ficam ali reunidas a maior parte do tempo.
Além das três sócias, envolvem-se no trabalho outros familiares, cada um colaborando de acordo com
seus conhecimentos e possibilidades. O marido de uma das sócias obtém empréstimos junto à empresa onde
trabalha e repassa-os ao projeto. O marido de outra é técnico e encarrega-se de fazer a manutenção dos
equipamentos da padaria. As filhas da terceira sócia colaboram dormindo no local da padaria, por questão de
segurança, e fazendo o pão pela manhã.
A padaria funciona num prédio alugado, próximo ao centro de Pelotas. Consideram o ponto como
estratégico, pois fica entre uma zona de baixo poder aquisitivo, que consome pães e refeições, e uma zona de
moradores de maior renda, que consomem tortas e salgados.
Como a sobrevivência é garantida pela renda dos maridos, optaram por não receber valores
monetários nesta fase do empreendimento. Todos os recursos são canalizados para novos investimentos, como
o prédio próprio, que estão construindo e que possibilitará a ampliação da atividade para um mini-mercado.
Pretendem começar a remunerar o trabalho quando não precisarem mais pagar aluguel, e quando os recursos
da Cáritas tiverem sido devolvidos.
A ARPA reúne 70 famílias de pequenos produtores rurais dos municípios de Canguçu, Pelotas e São
Lourenço. A associação foi criada no ano de 1995, inspirada na COOLMÉIA, de Porto Alegre, contando na
época com 42 famílias.
Todos os sábados a associação realiza uma feira na cidade de Pelotas, na qual apenas são vendidos
alimentos produzidos ecologicamente. As famílias integrantes da ARPA dividem-se em sete grupos e cada
grupo expõe seus produtos em uma banca.
O depoimento dos produtores indica que a produção dos alimentos agroecológicos demanda mais
mão-de-obra, mas requer menores custos monetários, ficando a produtividade pouco menor em relação à da
agricultura convencional.
A ARPA mantém um importante intercâmbio com a COOLMÉIA. A cooperativa de Porto Alegre
expõe seus produtos na feira de Pelotas e a ARPA também expõe os seus em Porto Alegre. A COOLMÉIA
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contribui ainda vendendo os produtos que sobram da feira da ARPA no seu entreposto na cidade de Pelotas,
que funciona durante toda a semana.
A associação adquiriu todo o material para a realização da feira, como as lonas e as caixas de
transporte dos produtos, com recursos financiados junto à Cáritas, já devolvidos. A assessoria técnica aos
produtores é prestada pelo CAPA (Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor) e pela Pastoral Rural, além da
colaboração da COOLMÉIA.
Os produtores da ARPA estão convencidos de que a produção de hortifrutigranjeiros de forma
ecológica é mais vantajosa do que a lavoura comercial tradicional, em diversos aspectos: condições de saúde
dos produtores, aproveitamento da produção para a própria subsistência e até mesmo em termos de um maior
retorno econômico. Os preços alcançados pelos produtores vendendo seus produtos na feira são 100% maiores
do que os pagos pelos intermediários.
A UNAIC nasceu no ano de 1988, com o objetivo de integrar as diversas associações de produtores
rurais surgidas no Município de Canguçu num período anterior. No ano de 1992 foi criado o departamento de
comercialização, atendendo a uma demanda dos associados.
A UNAIC reúne 49 associações de produtores, que envolvem cerca de 1.000 famílias. A criação das
associações foi estimulada pela EMATER, em período anterior à existência da UNAIC. São associações
bastante diferentes umas das outras, em aspectos como organização, necessidades e tipo de produção. O
Município de Canguçu é considerado a maior zona de minifúndio da América Latina, com cerca de 11.500
propriedades rurais e uma produção muito diversificada.
São dois os principais objetivos da UNAIC: viabilizar economicamente a produção dos seus
associados e formar a consciência dos sócios para o trabalho comunitário. Para isso, trabalham na UNAIC
apenas três pessoas: o presidente, o tesoureiro e o motorista. De dois em dois anos, a UNAIC realiza um
congresso de dois dias de trabalho, no qual procura-se levantar diretrizes e linhas de ação, para posterior
aprovação da assembléia geral.
O departamento de comercialização procura agenciar a venda da produção dos associados,
recolhendo os produtos e oferecendo aos compradores, cobrando uma taxa apenas para cobrir os custos. O
departamento também fornece sementes e outros insumos aos associados. Da mesma forma que na
comercialização, cobra uma taxa para cobrir os custos, e esta taxa é menor para as compras conjuntas, como
forma de incentivar os associados a procederem dessa forma.
A principal articulação externa é o CAPA (Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor), que além de
prestar assessoria técnica, regularmente também disponibiliza recursos para cobrir os custos de funcionamento
da UNAIC.
ANEXO 3
SIGLAS UTILIZADAS