Uma leitura de A Originalidade das vanguardas, Rossalind Krauss, Cap.
5 Os espaços discursivos da fotografia
No momento atual, vivemos ainda mais um processo de
degradação das imagens através de cada aparelho que as imagens tem de passar até chegar ao espectador, mas em seu a texto a autora possivelmente traz a tona a idéia de que degradar a fotografia, ou a imagem é devolver à fotografia seu mistério, como imagens artísticas que tem seu mistério, seu jogo não revelado ou não solucionado, como num sonho que não se resolve, mas faz sentido pela sua simples e pura existência. E se pensarmos na matéria do sonho como algo viscoso e imatérico, como um éter luminoso, esse éter seria a própria luz que inunda a substancia fotossensivel(seja ela química, ou eletrônica) e traz uma sensação vaga de luminosidade e espaço,em um jogo de preenchimento do espaço vazio, usando esse vazio como forma de composição, muito característica de imagens fotográficas, porem muito distante do fazer de imagens de outros meios, onde principalmente na pintura os espaços são sempre cheios. Outra caracteriza da fotografia que vem a enriquece-la e a torna- la mais enigmática e mais bela se encontra no aplanamento do espaço, no silencio que ela pode gerar, e na distancia que ela cria através desse aplanamento,como se mantivéssemos o primeiro plano (o aqui) e o ultimo plano (até onde podemos enxergar), mas neste aplanamento é como se todos os planos intermediários sumissem, onde o aqui continua a existir com a presença do espectador diante da imagem, e o ultimo com a existência física da imagem, porem todos os outros foram achatados e empilhados sobre esse último no processos fotográfico. Esse processo acaba gerando uma cissão em irreconciliável, um abismo intransponível entre imagem criada (construída mentalmente) e imagem registrada (construída fisicamente, no caso do fotografia, de modo químico e ótico e na pintura, o trabalho manual, tela e tinta). Borris Kossoy fala sobre esse tema da seguinte forma "nesse sentido o assunto não deixa de ser um fruto do imaginário do autor,mas mesmo sendo imaginado anteriormente a presença da imagem não deixa de ser um visível fotográfico" e é nesse abismo que podemos separar a gênese da imagem como um processo legitimado ao longo dos tempos,onde ao lado da imagem criada temos toda uma bagagem de construção de imagem de onde, voluntariamente ou não, partiriam todas as imagens mesmo que ainda indeterminadas em seus objetivos e funções, e de outro lado temos a imagem registrada ,como a fotografia, a pintura e a litografia que vão conversar com o mundo de formas diferentes, estabelecendo discursos diferentes, dentro de objetivos e funções sociais diferentes. Sob esse aspecto da criação da imagem e de sua produção Kossoy fala ainda sobre três etapas que compõem a fotografia, e com alguma extrapolação podemos também falar sobre as obras de arte, que são primeiro a vontade criadora da imagem, a vontade por fotografar (Barthes trata sobre esse assunto), e aqui podemos comparar os processos e identificar grandes semelhanças entre os processos de criação ou imaginação de imagem. Então o que ele chama de corte, o apertar do botão e determinar a imagem ao traze-la para o mundo real, aqui pode-se dizer que tanto o fotografo quanto o pintor chegam a esse corte, porem aqui reside a maior das diferenças, pois o modo como vão trabalhar, a linguagem que vão se utilizar é outra, mesmo ao mesclar linguagens(pintura e fotografia), teríamos então uma linguagem terceira, não idêntica às linguagens originais. E enfim ele vai falar sobre a vida dessa fotografia, onde podemos mais uma vez equipar à outras obras também, pois se torna parte de obra e da fotografia, todos os eventos pelos quais esse objeto passou.
Acredito que a fotografia teve como grande potencialidade no
século XIX a libertação plástica do artista,como visto no caso dos retratistas da época,que se tornam fotógrafos, porem nesse período pode se ver que o modo de vários fotógrafos lidarem com a criação de imagens fotográficas é extremamente vinculado ao modo de fazerem pinturas, como se o discurso estético particular à fotografia apesar de se vestir de uma roupagem nova não se faz totalmente novo. Isso em parte se deve ao fato de muitos fotógrafos serem também pintores, mas há uma aproximação do próprio criar, que em vários momentos podemos cruzar Constable,e quase dizer que suas pinturas são técnicas fotográficas, e O'Sullivan como fotografias de paisagem que são quase pinturas, caráter de fidelização ao real que se agrava ao lançar mão dos retoques litográficos que fez posteriormente. Pode se então falar sobre um olhar fotográfico anterior à fotografia? Boa parte dos estudos, bem como a autora nos leva a pensar sobre isso, pois se a fotografia é usada como forma de representação, foi também usada em larga escala a pintura como forma de representação. E ao olhar para a pintura de Matisse e suas janelas podemos chegar então ao outro ponto de apoio da fotografia que é o corte fotográfico, mas que o pintor já exercia em suas janelas. Vemos também Toulousse-Lautrec trabalhando sua pintura como registro de momentos, e usando cortes de imagem, e disposições diferenciadas dos assuntos no plano da imagem, operações que serão largamente usadas na fotografia. Assim podemos trazer novamente a tona a idéia do abismo, onde subjetivamente todas imagens vão caminhar para um ponto em comum, mas é não objetivação,no tornar real, que elas se diferenciarão. Portanto me parece possível supor um olhar fotográfico anterior à fotografia, ou até mesmo um olhar imagético que atravessa os séculos e vai se lapidando e esculpindo ao longo da exposição a que sofre com o passar do tempo e o aparecimento de novas tecnologias. Assim sendo não me parece absurdo objetificar o olhar e torna-lo concreto, e a partir desse ponto podemos tratar de um instituição do olhar como um modelo que se presta à legitimação de obras de arte através de um condicionamento do olhar, e um olhar que evolui ( do sentido original,se movimenta) podemos supor que uma das formas de legitimação das obras se deu através da legitimação do olhar imagético, que se afirma através de um condicionamento do olhar, forçando a esse olhar objetivos e um discurso previamente criado. Porem se o fazer artístico gravita sobre a criação de uma regra postulada pelo artista onde os jogos e discursos flutuam sob os elementos internos ou derivados da própria obra, ao existir um poder exterior a ela que a batize como obra de arte cria-se uma regra de manutenção da arte criada institucionalmente e de interesse maior da própria instituição que a postulou. Sobre esse assunto, me parece que a autora traz a tona dois momentos em que a imagem passa a ser arte, uma pelo seu atributos internos e conceitos que sustentam a identidade da obra como arte , a estrutura formal interna e seu discurso estético , e um segundo que olhará para as obras mas levando em conta muito de características externas à obra, onde o discurso de legitimação será ainda mais eficiente. A partir disso a discussão pende para onde encontrar arte? Temos primariamente os espaços de exposição, e os espaços para resposta escrita às obras que estarão inseridos no mesmo circuito. Porem temos que a fotografia em seu desenrolar acaba sendo difundida e vista pelo publico de um modo outro, não mais no muro, mas através da estereografia que ao focar à atenção do publico apenas na imagem os levará a uma exploração do espaço da imagem, que como num momento de contemplação da imagem cria uma dilatação ou até mesmo suspensão do tempo, como se nesse momento tudo foi capturado e por um instante esta tudo congelado, e poderíamos nos manter nesse instante para sempre. A estereografia trará também uma experiência cinestésica de apreciação da imagem que através dessa concentração da atenção agisse aproximando o ato de mudar de uma imagem para outra com o ato de fechar e abrir olhos, onde podemos tratar essa experiência como conjuntos de ilusões que acabam por formatar uma ilusão de presencialidade, engatilhada pela ilusão dos sentidos ao serem enganados pelo seu próprio mecanismo desejante. E no outro extremo da produção temos a pintura (em boa parte a pintura de paisagens) e a litografia como produtos do simples registro de imagens, onde detalhes reveladores da perfeição da sombra e das rochas não mais nos leva ao sonho, nem tão pouco nos oferece uma experiência do real, é o duro e frio corte da realidade, onde a própria realidade do muro e do museu invalida sua ilusão de realidade. Mesmo partindo de realidades opostas, existe uma vontade de relacionar fotografia e pintura dentro de um mesmo discurso de imagens, como se tentassem encaixar a fotografia no muro institucionalizado, ao que a autora traz a discussão do uso dos termos vista para a fotografia,e paisagem para a pintura, evidenciando uma separação entre e fotografia e pintura. É também evidente uma preocupação da autora em demostrar através da produção fotográfica que se desenrolou no século 19, a dissolução de alguns conceitos fundamentais na construção de seu pensamento sobre a originalidade das vanguardas, entre eles a dissolução de corpo de obra, autoria e de um discurso estético legitimador das obras que vem a ser substituído por outro modelo estético imposto pelos objetivos das empresas que contratavam tais serviços. A estereoagrafia popularizada por responder aos desejos do prazer, ao gerar simulacro da visão, e o uso do termo vista com objetivos de mercado, contribuíram para a dissolução da autoria do produtor, e ao vincular a imagem ao nome do grupo não ao autor, e tendo o termo vista se consolidando longe da institucionalização sofrida pela arte, acabou formando um discurso coerente sob o termo vista, que longe dos muros e dos nomes do produtores, criou-se como uma arte quase anônima e idealizada que transita primeiramente sobre o discurso estético, sendo inútil então impor as características da galeria ou de moldes artísticos prévios sob a fotografia, gerando assim um grande problema ao se aplicar à fotografia esse discurso estético- enterpretativo. A autora traz para a discussão ainda, dois pontos, carreiras curtas de alguns fotógrafos e acervos de negativos imensos nunca revelados, onde ela vai indicar uma a dissolução da obra. Mas mesmo com o grande numero de negativos não revelados e a autoria do trabalho diluída pelo nome da empresa contratante, pode se ainda encontrar a marca pessoal do artista na fotografia?