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O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO:


VOTOS PELA CRIAÇÃO DE UMA LEI ESPECIAL DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

RESUMO: O objeto de nosso trabalho foi demonstrar que as relações consumeristas também
estão definitivamente protegidas pelo princípio da dignidade da pessoa humana, estando referida
disposição legal claramente regulamentada em nossa Carta Magna, bem como em nosso Código
de Defesa do Consumidor. Pretendemos demonstrar ainda a premente necessidade de se criar
legislação especial própria para tratar do fenômeno do superendividamento no Brasil, a exemplo
do que foi feito em outros países, demonstrando que a falta de regulamentação específica está
tirando a efetividade da proteção destes consumidores, não lhes garantindo um dos fundamentos
da República Federativa do Brasil, qual seja, a proteção da dignidade da pessoa humana.

PALAVRAS-CHAVE: consumidor, direitos, superendividamento.

ABSTRACT: The object of our work was to demonstrate that the consumeristas relations also
definitively are protected by the beginning of the dignity of the person human being, being related
legal disposal regulated clearly in our Great Letter, as well as in our Code of Defense of the
Consumer. We intend to still demonstrate the pressing necessity of if to create proper special
legislation to deal with the phenomenon of the superindebtedness in Brazil, the example of what it
was made in other countries, demonstrating that the lack of specific regulation is taking off the
effectiveness of the protection of these consumers, not guaranteeing one to them of the beddings
of the Federative Republic of Brazil, which is, the protection of the dignity of the person human
being.

1. Introdução:

O endividamento do consumidor é fato consumado em qualquer tipo de sociedade, seja em


países desenvolvidos seja em países em desenvolvimento é possível encontrar com alguma
facilidade a ocorrência desta figura jurídica. Referido fenômeno, de ocorrência mundial, atinge a
comunidade como um todo, tratando, a solução dos efeitos do superendividamento, de interesse
social de grande monta, não devendo, absolutamente ser tratado de forma individual.
Verifica-se ainda que a falta de legislação para enfrentar referido fenômeno acaba provocando
conseqüências trágicas no ordenamento jurídico dos países que ainda não o fizeram, sendo uma
delas, a total destruição da dignidade do superendividado e de sua família, que já se constatou ter
perfil de pessoa responsável, que tenta manter condições de consumo de sua família, na imensa
maioria das vezes, desinformada quanto as condições do contrato.
Por outro lado, observa-se ainda que no Brasil, apesar do Código de Defesa do Consumidor e o
próprio Código Civil, apresentarem algumas regulamentações que podem ser utilizadas para
tratar dos superendividados, a falta de legislação especial própria para enfrentar as causas do
problema, bem como, equalizar as soluções, demonstra a quase total ineficiência de nosso
ordenamento jurídico para enfrentar referido fenômeno.
Outrossim, observa-se ainda que a falta de referida regulamentação acaba por desrespeitar o
princípio da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República Federativa do
Brasil, além de demonstrar a falta de preocupação da sociedade brasileira, e, principalmente de
seus legisladores, com um fenômeno social de conseqüências graves para os indivíduos
atingidos e para com a sociedade como um todo.
Assim, pretendemos demonstrar neste trabalho à importância de se discutir com seriedade a
necessidade de criação de legislação especial para tratar dos consumidores superendividados no
Brasil, preservando-lhes a dignidade e capacidade de manterem-se, bem como, manterem suas
famílias e continuarem consumindo, que é o combustível do mundo capitalista em que vivemos.

2. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Fábio konder Comparato, com a facilidade que lhe é peculiar, apresenta um conceito do que
representa a dignidade para o ser humano, que será muito útil para nossos estudos:

A dignidade da pessoa não consiste apenas no fato de ser ela, diferentemente das coisas, um ser
considerado e tratado como um fim em si e nunca como um meio para a consecução de
determinado resultado. Ela resulta também do fato de que, pela sua vontade racional, isto é,
como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita (2001, p. 48).

Com esta lição de Comparato, já é possível ficar claro que o homem possui importância a ponto
de ser sempre o fim das ações, jamais, poderá ser usado como meio para consecução das
ações.
Corroborando a lição de Comparato, Sarlet (2006, p. 60) identifica a dignidade da pessoa humana
como:

A qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, nesse sentido,
um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e
qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições
existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação
ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais
seres humanos.

Neste diapasão, quando estudamos o princípio da dignidade da pessoa humana, inevitavelmente


nos vem a mente como referido princípio é desrespeitado e banalizado por nossa sociedade com
tanta facilidade. Na verdade, chegamos a pensar, como a humanidade pôde compactuar com
atitudes tão indignas.
Mais uma vez, utilizando dos ensinamentos do professor Fábio Konder Comparato:

(...) a escravidão acabou sendo universalmente abolida, como instituto jurídico, somente no
século XX. Mas a concepção Kantiana da dignidade da pessoa como um fim em si leva à
condenação de muitas outras práticas de aviltamento da pessoa à condição de coisa, além da
clássica escravidão, tais como o engano de outrem mediante falsas promessas, ou atentados
cometidos contra bens alheios. Ademais, disse o filósofo, se o fim natural de todos os homens é a
realização de sua própria felicidade, não basta agir de modo a não prejudicar ninguém. Isto seria
uma máxima meramente negativa. Tratar a humanidade como um fim em si implica o dever de
favorecer, tanto quanto possível, o fim de outrem. Pois, sendo o sujeito um fim em si mesmo, é
preciso que os fins de outrem sejam por mim considerados como meus (2003, p. 21-22).

Como foi possível a humanidade levar tantos anos para abolir o instituto jurídico da escravidão?,
digo abolir o instituto jurídico, porque, infelizmente, sabemos que a escravidão ainda permeia a
história da humanidade e até mesmo deste nosso país de forma trágica e vergonhosa. Neste
mesmo diapasão, podemos pensar: como um pedófilo é capaz de molestar uma criança? não
pensa, esse monstro, nos estragos físicos e principalmente psíquicos que está causando nesta
ser humano, indefeso.

2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana e as relações de consumo

Como foi possível ver, o princípio da dignidade da pessoa humana, infelizmente é desrespeitado
a todo o momento. Daria para darmos inúmeros exemplos impactantes como os mencionados no
tópico anterior, mas não é o objeto de nosso estudo, de modo que daremos mais um exemplo,
agora relacionado ao direito do consumidor.
Logo, como é possível haver tamanha discrepância na cobrança dos juros que são realizadas
pelas instituições financeiras quando o consumidor necessita tomar um empréstimo (juros de até
10,02% ao mês) , com os juros que são pagos pela mesma instituição financeira, quando o
consumidor resolve depositar seus rendimentos em uma caderneta de poupança, ou em um
contrato de CDC, que podem atingir pouco mais de 1% ao mês.
Alguém em sã consciência seria capaz de negar a absoluta falta de boa fé nesta condição
contratual, bem como, a absoluta falta de dignidade para com o respeito ao consumidor e aos
seus direitos? Na verdade, não há como não reconhecer a absurda condição indigna na relação
comercial existente entre consumidor e instituições financeiras. Não obstante, essa questão dos
juros em si, será objeto de outro estudo.
Nossa Carta Magna eleva o princípio da dignidade da pessoa humana a condição de um dos
fundamentos da República Federativa do Brasil, senão vejamos:

Art. 1° A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios
e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos;
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Ora, se a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil,


como é possível tamanho desrespeito para com o consumidor brasileiro, na questão da cobrança
dos juros, acima exposta? Alguém poderia dizer que referido fundamento não atinge as relações
privadas comerciais, o que, obviamente, seria uma heresia, já que, como fundamento da
república que é, atinge todas as relações, sejam elas públicas ou privadas.
Mesmo porque, no mesmo texto constitucional podemos encontrar no texto do artigo 170 da
Constituição Federal de 1988:

A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios:
I – soberania nacional;
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;
IV – livre concorrência;
V – defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII – redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII – busca do pleno emprego;
IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras
e que tenham sua sede e administração no País (grifo nosso).

Verifica-se desta forma que o legislador constituinte tinha plena noção da importância da
atividade econômica no desenvolvimento do país e na conseqüente necessidade de se proteger o
consumidor, que veio a ser melhor atendido mais tarde com a criação do Código de Defesa do
Consumidor.
Neste sentido, como princípio geral, podemos citar o artigo 4º, III do Código de Defesa do
Consumidor:

“A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades
dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses
econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transferência e harmonia das
relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
...
III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização
da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de
modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição
Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e
fornecedores;”

Observe assim que toda relação de consumo deverá obrigatoriamente buscar a harmonização
dos interesses de seus participantes utilizando-se sempre da boa-fé na finalização dos contratos
e até mesmo na renegociação destes.
O princípio da boa fé é também considerado conceito indeterminado, como podemos observar na
redação do artigo 51, IV do Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos:

“São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de
produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em
desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.

É considerado conceito indeterminado por não ter previsto o legislador de forma clara os casos
em que uma atitude do fornecedor pode ou não ser considerada incompatível com a boa-fé,
cabendo assim referida função ao aplicador do direito em geral.
Mas, apesar de ser norma indeterminada, referido princípio é considerado também uma cláusula
geral de contratos que devem ser seguidas por todas as partes. Assim, quando referido princípio
tratar de comportamentos que devem ser observados pelas partes de um negócio jurídico, a
referida norma indeterminada passa a ser considerada ainda uma cláusula geral.
Isto quer dizer, que apesar de ser considerada norma indeterminada, a observância da boa-fé
pelas partes envolvidas em um contrato é cláusula obrigatória que poderá levar a revisão
contratual ou até mesmo a resolução do contrato. Dessa forma, a imposição deste princípio gera
um dever de cooperação entre os contratantes, obrigando o fornecedor a cooperar para evitar a
ocorrência da ruína financeira do consumidor e conseqüentemente sua morte civil.
Além do princípio da boa fé, poderíamos utilizar o artigo 6º, inciso VI do Código de Defesa do
Consumidor, como forma de obrigar o fornecedor a cooperar com o devedor e renegociar os
contratos, senão vejamos o texto em questão:
“São direitos básicos do consumidor:
...
VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e
difusos”.

A Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Fátima Nancy Andrigui, apresenta lição digna de nota:

Ora, se a dignidade da pessoa humana é um valor em si mesmo, absoluto, conclui-se que nas
relações de consumo, o fornecimento de produtos e serviços não pode se dar em detrimento da
dignidade do homem consumidor, sobretudo de seus direitos da personalidade, como o direito à
honra, a um nome sem mácula, à intimidade, à integridade física, psíquica e à imagem, entre
outros. Esses direitos vêm previstos no Código de Defesa do Consumidor, em particular, nos art.
6°, inc. I, que expressa a proteção da vida, saúde e segurança do consumidor; 8° como
complementação do 6°, 42, 43 e 71, que implicitamente resguardam a honra e a imagem do
consumidor (2008, p. 1.145).

GONDINHO (2000, p.2-19), a respeito do princípio da dignidade humana na ordem constitucional,


também apresenta lição digna de nota, senão vejamos:

(...) nossa ordem constitucional tem como fundamento básico a dignidade da pessoa humana, o
que significa que todo o direito deve ser construído, seja por via legislativa, seja por concreção
judicial, sobre essa noção. O preceito constitucional deve ser uma diretriz ao legislador ordinário,
mas também ao operador que utilizá-lo como normativa para aplicação de regra ordinária, seja
um modelo casuísta, seja uma cláusula geral.

Diante do que foi exposto até aqui, não há como se negar a influência do princípio da dignidade
da pessoa humana, mandamento constitucional, perante as relações comerciais. Poderíamos dar
inúmeros exemplos práticos relacionando referido princípio ao Código de Defesa do Consumidor,
optamos, no entanto, por relacionar referido princípio com a necessidade de se regulamentar no
Brasil forma de proteção para o consumidor superendividade, o que será objeto de nosso próximo
tópico.

3. Do Consumidor superendividado

Inicialmente se faz salutar conceituar a matéria. Segundo a jurista Claudia Lima Marques (2005,
p. 11-52): “o superendividamento é a impossibilidade do devedor, pessoa física, leigo e de boa fé,
pagar suas dívidas de consumo”.1
Referido fenômeno jurídico se materializa de duas formas, ainda aproveitando-se das palavras de
referida jurista: 1) Superendividamento Ativo que é fruto de uma acumulação inconsiderada de
dívidas, desde que de boa fé, conhecido também como endividamento compulsório; 2)
Superendividamento Passivo que é aquele provocado por um imprevisto da vida moderna, ou
seja, a dívida proveniente do desemprego, da doença que acomete uma pessoa da família, pela
separação do casal, entre outros (2005, p. 11-52)2.
Assim, é importante deixar claro que a lei não irá proteger indiscriminadamente qualquer tipo de
insolvência, e sim, apenas aquelas em que o endividado não agiu de má fé, ou seja, não
provocou o endividamento para depois buscar ajuda legal utilizando-se da proteção dada ao
superendividado, e também, o sujeito leigo, ou seja, aquele sujeito que não é leigo, que possui
formação técnica, científica e superior de finanças, por exemplo, não receberá proteção do
ordenamento jurídico já que tinha condições de identificar o possível superendividamento e
prevenir-se em tempo.
Não obstante, quanto a pessoa não leiga, entendo que em alguns casos será possível que esta
também seja defendida pela legislação em questão, já que, é possível ocorrer o endividamento
passivo de uma pessoa, mesmo que esta seja uma sumidade no assunto, na medida em que
qualquer consumidor está sujeito ao endividamento passivo, como veremos a seguir.
É que como já foi dito, existe duas formas de endividamento, o ativo, que muitas vezes se
materializa quando o consumidor tenta manter o padrão de vida que tinha há dez anos e o
passivo, que é a ocorrência de um imprevisto na vida do consumidor, materializando-se através
da sua doença ou da doença de alguém da família. Nestes casos, mesmo que o consumidor não
seja leigo, ele não poderia ter se precavido quanto ao endividamento, merecendo a proteção
jurídica também.
MARQUES (2005, p. 37), leciona que dada a situação econômica complexa atual, seria
necessário estabelecer regras específicas no Brasil para prevenir os fenômeno do
superendividamento, especificando deveres de boa-fé, informação, cuidado e cooperação entre a
o fornecedor do crédito e o consumidor tomador.
Referida autora, apresenta uma sugestão relacionada ao direito comparado de grande relevância:

A lição mais importante do direito comparado é que frente à crise de solvência da pessoa física-
leigo, o consumidor, dois são os caminhos possíveis: “temporizar”, reescalonando, planejando,
dividindo as dívidas a pagar, ou reduzir estas, perdoando os juros, as taxas ou o principal, em
parte ou totalmente, a depender do patrimônio e das possibilidades do devedor, sempre
reservando a ele um mínimo existencial (restre a vivre). Este tempo, em que o consumidor terá
que pagar suas dívidas, conforme o renegociado entre todos os credores, com supervisão do
Estado, pode ser longo. A Alemanha exige 7 (sete) anos de pagamento por parte do consumidor
para chegar ao perdão das dívidas, enquanto na Europa o normal são 4 (quatro) anos
(MARQUES, p. 37-38).

Faz-se necessário destacar que esta lição da Professora Cláudia Lima Marques foi publicada em
2005, quando não se imaginava a crise financeira que iríamos passar, principalmente no final do
ano de 2008 e início do ano de 2009, com a quebra de inúmeras instituições financeiras nos
Estados Unidos da América, que por sua vez provocou uma onda de demissões de escala
mundial.
A lembrança é oportuna porque é possível verificar que países europeus estão muito mais
preparados para enfrentar a crise, resguardando a dignidade dos seus consumidores, do que o
Brasil, na medida em que lá já existem leis que efetivamente regulamentam o fenômeno do
superendividamento, a contrário de nosso pais que não possui referida normatização.
Ora, não há dúvidas que o superendividamento do consumidor acarreta sérios prejuízos a sua
dignidade, quiçá se não a destrói por completo. O primeiro grande efeito do superendividamento é
a “negativação”, ou seja, o consumidor tem seu nome registrado no rol de maus pagadores, esta
ação, por sua vez, desencadeia inúmeras outras ações que levarão o consumidor à sua morte
civil, tais como, a eliminação de crédito, que por sua vez irá impossibilitar a tomada de
empréstimos com juros menores para possibilitar a renegociação de dívidas e assim por diante.
Neste diapasão, no mundo do consumo em que vivemos, uma pessoa sem crédito para consumir,
não possui dignidade, não poderá manter sequer um aceitável padrão de vida para sua família, o
que lhe tirará toda dignidade.
Logo, não há dúvidas de que a criação de legislação própria no Brasil para tratar do fenômeno do
superendividamento é absolutamente necessária.
Para a consecução de uma lei pátria, MARQUES (2005, p. 39) apresenta ainda mais duas
sugestões tiradas do direito comparado, uma relacionada a questão da padronização e fixação,
através de lei especial, de tempo para a recuperação extrajudicial do devedor consumidor de boa-
fé, deixando claro que somente estes, teriam direito ao privilégio; e a outra sugestão, estaria
relacionada também com a fixação, através de lei especial, de formas legais de fiscalizar e
controlar a forma de concessão do crédito, ou seja, se o crédito, quando concedido, foi feito de
forma responsável, mediante esclarecimentos claros ao tomador do crédito, respeitando as
formalidades legais e até mesmo dando ao tomador o direito de arrependimento quanto ao
negócio em si.
Observe que são medidas aparentemente simples, porém que trariam imensos benefícios para o
comércio nacional e para a manutenção da saúde financeira e dignidade dos consumidores de
nosso país, de modo que alertamos para a falta de discussões e reflexões a respeito de formas
de tratar do superendividamento do consumidor de boa fé, com o estabelecimento de diretrizes
legais para enfrentar o assunto, a exemplo do que ocorreu nos países europeus.
Não obstante, logicamente que toda lei deve ser precedida de um cauteloso estudo, neste
sentido, leciona CARPENA (2007, p. 77):

O tratamento do superendividado envolve questões que vão desde a definição de quem é este
consumidor, até os limites da responsabilidade do fornecedor de crédito. É precisamente disso
que se cuida: da atribuição ao credor de uma parcela dos riscos do fracasso na contratação do
crédito. Tutelar o superendividado significa dar efetividade aos princípios da função social do
contrato e da dignidade da pessoa humana, compreendendo a questão em termos amplos, e não
isoladamente, como um fenômeno que atinge de forma pontual este ou aquele consumidor.

Merece especial destaque, a constatação de Heloisa Carpena, Procurador de Justiça do Rio de


Janeiro, de que a tutela do consumidor superendividado trará maior efetividade, principalmente a
proteção da dignidade da pessoa humana, pelo menos, no caso em estudo, dos consumidores de
boa fé superendividados.
Outra lição importante de CARPENA (2007, p. 79), consiste na classificação do
superendividamento como um fenômeno que deve ser estudado no cenário social, no qual,
questões como a educação para o consumo de crédito, o grau de informação a ser exigido do
fornecedor, os prazos de reflexão, o controle da publicidade e mesmo a validade de clausulas
inseridas nesses contratos assumem contornos próprios, a exigir do legislador amparo legal que
seja adequado e suficiente aos direitos desses consumidores.
Neste sentido, diagnosticado que o superendividamento é um fenômeno social de grande
relevância no país, resta estudar forma de enfrentar referido problema de forma eficiente, o que,
necessariamente passara por detalhado estudo do perfil do consumidor superendividado, neste
sentido, foi realizado um estudo na Defensoria Pública do Rio de Janeiro, com os consumidores
que procuraram os serviços daquele órgão para tentar resolver seus problemas financeiros, que
revelou alguns dados dignos de notas:

Quanto à contratação, a maioria dos entrevistados tomou conhecimento do crédito por


correspondência ou e-mail (37%), não recebeu cópia do contrato (63%), não tendo sido solicitada
a comprovação dos rendimentos (61%), nem calculado o valor total a ser pago no final da
contratação, incluindo taxas e encargos (87%), não havido aconselhamento quanto a diferentes
opções de financiamento (70%), nem sido exigido garantia (88%) (...) (CARPENA, 2007, p.87).

Analisando os dados, chama nossa atenção, demasiadamente, o fato do desrespeito ao direito de


informação do consumidor, já que, as pesquisas realizadas na Defensoria do Rio de Janeiro,
demonstrou que a maioria dos consumidores que tiveram problemas não foram devidamente
informados quanto: a) valor total a ser pago no final do contrato; b)aconselhamento quanto a
diferentes opções de contratos; c) não recebimento de cópia do contrato. Observe que, apesar de
termos legislação específica que garanta o direito de informação do consumidor, em nosso
Código de Defesa do Consumidor, referido direito é desrespeitado com absoluta tranqüilidade.
Por fim, CARPENA (2007, p. 88) apresenta conclusões muito relevantes para as nossas
reflexões:

Deixando de analisar detidamente os dados coletados no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul,
ou mesmo generalizar os resultados das pesquisas empíricas, é possível concluir que o
superendividamento no Brasil é um fato social grave, atual e abrangente, para o qual não há
resposta adequada no ordenamento. Definido o perfil do consumidor que se endivida além das
forças de seu patrimônio, para fazer frente a necessidades suas ou de sua família, este se
revelou um cidadão comum, responsável por sua família, que enfrenta tal situação no momento
de maior atividade de sua vida. As pesquisas mostram, por outro lado, que o fornecedor de
crédito oferece serviços sem disponibilizar mínimas informações que permitam ao consumidor
exercer seu direito de escolha de forma consciente e assim reduzir os riscos da contratação.

Logo, chama a atenção o fato de que a maioria dos consumidores superendividados são pessoas
que adquiriram as dívidas de boa-fé, pessoas responsáveis, tentando manter o sustento de suas
famílias. Chama muito a nossa atenção também o fato de que já se constatou que as
normatizações existentes no Código de Defesa do Consumidor, ou no Código Civil, não estão
sendo suficientes para equalizar o problema relacionado ao que já se constatou ser um
fenômeno, o superendividamento, restando apenas, nossos legisladores, darem o próximo passo,
qual seja, a elaboração de lei especial específica para regulamentar o assunto, a exemplo do que
foi feito em países europeus como França, Alemanha, Dinamarca, dentre outros e nos Estados
Unidos da América.

4. Conclusão

Não resta dúvida que o princípio da dignidade da pessoa humana foi amplamente recepcionado
por nosso Código Civil, bem como nosso Código de Defesa do Consumidor, como não poderia
deixar de ser, dada a magnitude da importância dada pelo legislador constituinte que elevou o
princípio da dignidade da pessoa humana à um dos fundamentos da República Federativa do
Brasil.
Não obstante, ficou demonstrando a necessidade premente de se discutir formas de se coibir as
práticas abusivas que estão sendo praticadas pelas instituições financeiras me nosso país, com
oferecimento de crédito farto para o consumidor que é obrigado a firmar referidos contratos sem
um mínimo de informações relevantes e necessárias, tais como: valor total do contrato, valor da
taxa de juros paga ao mês, outras opções de financiamento, dentre outras informações
relevantes.
Foi possível constatar ainda que, apesar do Código de Defesa do Consumidor apresentar
algumas regulamentações que podem ser utilizadas para coibir as práticas abusivas das
instituições financeiras, a falta de legislação especial específica tratando do assunto no Brasil, a
exemplo de países como Alemanha, França, Bélgica, Estados Unidos da América, dentre outros,
acaba por minar totalmente a efetividade da justiça brasileira no combate e prevenção do
fenômeno mundial do superendividamento.
Assim, acreditamos que não se pode mais abrir mão das discussões para se chegar na criação
de uma lei especial de proteção e prevenção quanto ao superendividamento dos consumidores
brasileiros, até mesmo, como forma de preservar-lhes a dignidade, que é um dos fundamentos da
República Federativa do Brasil.

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Autor:
Alessandro Martins Prado
aledocente@yahoo.com.br
Docente no curso de Direito da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul - Unidade
Universitária de Paranaíba/MS, nas disciplinas de Ética Geral e Jurídica e Direito Internacional
Público e Privado. Docente da Faculdade Aldete Maria Alves de Iturama/MG e Mestrando pelo
Centro Universitário Toledo de Araçatuba/SP no programa de Tutela Jurisdicional no Estado
Democrático de Direito.
Fonte: (www.artigos.com)

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