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Falar “como com palavras de Deus”‫א‬

Fr. Raniero Cantalamessa, ofmcap‫ב‬


2008-02-29- Quaresma 20088 na Casa Pontifícia
[Traduzido por Zenit]

DE TODA PALAVRA INÚTIL

1. Do Jesus que prega ao Cristo pregado

Na segunda carta aos Coríntios – que é, por excelência, a carta dedi-


cada ao ministério da pregação –, São Paulo escreve estas palavras pro-
gramáticas: “Não pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus como Se-
nhor” (2Cor 4,5). Aos próprios fiéis de Corinto, em uma carta precedente,
havia escrito: “Nós pregamos Cristo crucificado” (1Cor 1,23). Quando o
Apóstolo quer abraçar com uma só palavra o conteúdo da pregação cristã,
esta palavra é sempre a pessoa de Jesus Cristo!
Nestas afirmações, Jesus já não é contemplado – como ocorria nos
evangelhos – em sua qualidade de anunciador, mas em sua qualidade de
anunciado. Paralelamente, vemos que a expressão “Evangelho de Jesus”
adquire um novo significado, sem perder, no entanto, o antigo; do significa-
do de “gozoso anúncio trazido por Jesus (Jesus sujeito!)”, se passa ao sig-
nificado de “gozoso anúncio sobre Jesus” (Jesus objeto!).
Este é o significado que a palavra “evangelho” tem no solene início da
carta aos Romanos. “Paulo, servo de Cristo Jesus, apóstolo por vocação,
escolhido para o Evangelho de Deus, que já havia prometido por meio de
seus profetas nas Escrituras Sagradas, acerca de seu Filho, nascido da li-
nhagem de Davi segundo a carne, constituído Filho de Deus com poder,
segundo o Espírito de santidade, por sua ressurreição dentre os mortos,
Jesus Cristo Senhor nosso” (Rm 1, 1-3).
Nesta meditação, nós nos concentraremos na “Palavra de Deus na
missão da Igreja”. É o tema do qual se ocupa o terceiro capítulo dos Linea-
menta do Sínodo dos Bispos, que evidencia daquele seus diversos aspec-
tos e âmbitos de atuação segundo o seguinte esquema:

‫ א‬http://www.cantalamessa.org/pt/predicheView.php?id=236
‫ ב‬Fr. Raniero Cantalamessa, Franciscano Capuchinho, foi ordenado sacerdote em 1958.
Doutor em teologia e em literatura, foi professor de história das origens cristãs na Uni-
versidade Católica de Milão e diretor do Instituto de Ciências Religiosas. Membro da
Comissão Teológica Internacional de 1975 até 1981. Em 1977 deixou o ensino acadêmi-
co para dedicar-se inteiramente ao serviço da Palavra de Deus.
Em 1980 foi nomeado Pregador da Casa Pontifícia. Por causa dessa missão, todos os
anos pregou em cada semana durante a Quaresma e o Advento na precensa do Papa e
dos cardeais e dos bispos da Cúria Romana e dos superiores das ordens religiosas.
A missão da Igreja é proclamar Cristo, a Palavra de Deus feita carne.
A Palavra de Deus deve estar sempre ao alcance de todos.
A Palavra de Deus, graça de comunhão entre os cristãos.
A Palavra de Deus, luz para o diálogo inter-religioso.
a - Com o povo judeu
b - Com outras religiões
A Palavra de Deus, fermento das culturas modernas.
A Palavra de Deus e a história dos homens.

Limito-me a tratar um ponto particular e bastante concentrado; contudo,


considero que influi na qualidade e na eficácia do anúncio da Igreja em to-
das suas expressões.

2. Palavras “inúteis” e palavras “eficazes”

No evangelho de Mateus, no contexto do discurso sobre as palavras


que revelam o coração, existe uma palavra de Jesus que estremece os lei-
tores do Evangelho de todos os tempos: “Mas eu vos digo que de toda pa-
lavra inútil que falem os homens darão contas no dia do Julgamento” (Mt
12, 36).
Sempre foi difícil explicar o que Jesus entendia por “palavra inútil”. Cer-
ta luz nos chega de outra passagem do evangelho de Mateus (7, 15-20),
onde volta o mesmo tema da árvore que se reconhece pelos frutos e onde
todo o discurso aparece dirigido aos falsos profetas: “Guardai-vos dos fal-
sos profetas, que vêm a vós com disfarces de ovelhas, mas por dentro são
lobos. Por seus frutos os conhecereis...”.
Se o ditado de Jesus tem relação com o dos falsos profetas, então po-
demos talvez descobrir o que significa a palavra “inútil”. O termo original,
traduzido com “inútil”, é argon, que quer dizer “sem efeito” (a – privativo –;
ergos – obra –). Algumas traduções modernas, entre elas a italiana da CEI
(Conferência Episcopal Italiana, N. do T.], vinculam o termo a “infundada”,
portanto, a um valor passivo: palavra que carece de fundamento, ou seja,
calúnia. É uma tentativa de dar um sentido mais tranqüilizador à ameaça
de Jesus. Não há nada, de fato, particularmente inquietante se Jesus diz
que de toda calúnia se deve dar contas a Deus!
Mas o significado de argon é mais ativo; quer dizer: palavra que não
fundamenta nada, que não produz nada: portanto, vazia, estéril, sem eficá-
cia1. Neste sentido, era mais adequada a antiga tradução da Vulgata, ver-
bum otiosum, palavra “ociosa”, inútil, que no demais é a que se adota tam-
bém hoje na maioria das traduções.
Não é difícil intuir o que quer dizer Jesus se compararmos este adjetivo
com o que, na Bíblia, caracteriza constantemente a palavra de Deus: o ad-

1 Cf. M. Zerwick, Analysis philologica Novi Testamenti Graeci, Romae 1953, ad loc.
jetivo energes, eficaz, que atua, que se segue sempre de efeito – ergos (o
mesmo adjetivo do qual deriva a palavra “enérgico”). São Paulo, por
exemplo, escreve aos Tessalonicenses que, tendo recebido a palavra divi-
na da pregação do Apóstolo, eles a acolheram não como palavra de ho-
mens, mas como o que é verdadeiramente, como “palavra de Deus que
permanece operante (energeitai) nos crentes” (cf 1Ts 2,13). A oposição en-
tre palavra de Deus e palavra do homem se apresenta aqui, implicitamen-
te, como a oposição entre a palavra “que atua” e a palavra “que não atua”,
entre a palavra eficaz e a palavra vã e ineficaz.
Também na carta aos Hebreus encontramos este conceito da eficácia
da palavra divina: “a Palavra de Deus é viva e eficaz” (Hb 4,12). Mas é um
conceito que vem de longe; em Isaías, Deus declara que a palavra que sai
de sua boca não volta a Ele jamais “vazia”, sem ter realizado aquilo para o
que foi enviado (v. Is 55,11).
A palavra inútil, da qual os homens terão de dar contas no dia do Juízo,
não é portanto toda e qualquer palavra inútil; é a palavra inútil, vazia, pro-
nunciada por aquele que deveria ao contrário pronunciar a “enérgica” pala-
vra de Deus. É, em resumo, a palavra do falso profeta, que não recebe a
palavra de Deus e, contudo, induz os demais a crerem que seja palavra de
Deus. Ocorre exatamente ao inverso do que dizia São Paulo: tendo recebi-
do uma palavra humana, ele a toma não pelo que é, mas pelo que não é,
ou seja, por palavra divina. De toda palavra inútil sobre Deus o homem
terá que dar contas: eis aqui, portanto, o sentido da grave advertência de
Jesus.
A palavra inútil é a falsificação da palavra de Deus, é o parasita da pa-
lavra de Deus. É reconhecida pelos frutos que não produz, porque, por de-
finição, é estéril, sem eficácia (no bem). Deus “vela por sua palavra” (cf. Jr
1,12), tem ciúmes dela e não pode permitir que o homem se aproprie do po-
der divino nela contido.
O profeta Jeremias nos permite perceber a advertência que se oculta
sob essa palavra de Jesus. Vê-se já claramente que se trata dos falsos
profetas: “Assim diz Javé: Não escuteis as palavras dos profetas que vos
profetizam. Estão vos enganando. Eles vos contam suas próprias fanta-
sias, não coisas da boca de Javé... Profeta que tenha um sonho, conte um
sonho, e o que tenha consigo minha palavra, que fale minha palavra fiel-
mente. O que tem que ver a palha com o grão? – oráculo de Javé. Não é
assim minha palavra, como o fogo, e como um martelo que arrebenta a ro-
cha? Pois bem, aqui estou eu contra os profetas – oráculo de Javé – que
roubam minhas palavras um do outro” (Jr 23, 16.28-31).

3. Quem são os falsos profetas

Mas não estamos aqui para fazer uma disquisição sobre os falsos pro-
fetas na Bíblia. Como sempre, é de nós de quem se fala na Bíblia, e é a
nós que se fala. Essa palavra de Jesus não julga o mundo, mas a Igreja; o
mundo não será julgado sobre as palavras inúteis (todas as suas palavras,
no sentido antes descrito, são palavras inúteis!), mas será julgado, em
todo caso, por não ter acreditado em Jesus (cf. Jo 16, 9). Os “homens que
deverão prestar contas de toda palavra inútil” são os homens da Igreja;
somos nós, os pregadores da palavra de Deus.
Os “falsos profetas” não são somente os que de vez em quando espa-
lham heresias; são também os que “falsificam” a palavra de Deus. É Paulo
quem usa este termo, tirando-o da linguagem cotidiana; literalmente signifi-
ca diluir a Palavra, como fazem os hospedeiros fraudulentos, quanto colo-
cam água no vinho (cf. 2Cor 2,17; 4,2). Os falsos profetas são aqueles que
não apresentam a palavra de Deus em sua pureza, mas que a diluem e a
esgotam em milhares de palavras humanas que saem do seu coração.
O falso profeta também sou eu, Ada vez que não me fio da “fraqueza”,
pobreza e nudez da Palavra e quero revesti-la, e estimo o revestimento
mais que a Palavra, e é maior o tempo que gasto com o revestimento que
o que emprego com a Palavra permanecendo diante dela em oração, ado-
rando-a e começando a vivê-la em mim.
Jesus, em Cana da Galiléia, transformou a água em vinho, isto é, a le-
tra morta no Espírito que vivifica (é assim como os Padres interpretam es-
piritualmente o fato); os falsos profetas são aqueles que fazem todo o con-
trário, ou seja, que convertem o vinho puro da palavra de Deus em água
que não embriaga ninguém, em letra morta, em charlatanaria vã. Eles se
envergonham do Evangelho (cf. Rm 1,16) e das palavras de Jesus, porque
são muito “duras” para o mundo ou muito pobres para os grandes, e então
tentam “temperá-las” com as que Jeremias chamava de “fantasias do seu
coração”.
São Paulo escrevia ao seu discípulo Timóteo: “Procura apresentar-te a
Deus como homem provado, trabalhador que não tem de se envergonhar,
que dispensa com retidão a palavra da verdade. Evita o palavreado vão e
ímpio, já que os que o praticam progredirão na impiedade” (2Tm 2, 15-16). As
palavras profanas são as que não têm pertinência com o projeto de Deus,
que não tema ver com a missão da Igreja. Muitas palavras humanas, mui-
tas palavras inúteis, muitos discursos, muitos documentos. Na era da co-
municação em massa, a Igreja corre o risco de afundar-se também na “pa-
lha” das palavras inúteis, ditas somente por dizer, escritas comente porque
é preciso preencher jornais e revistas.
Desta forma, oferecemos ao mundo um ótimo pretexto para permane-
cer tranqüilo em sua descrença e em seu pecado. Quando escuta a autên-
tica palavra de Deus, não seria tão fácil, para o incrédulo, dar um jeito em
tudo dizendo (como se faz freqüentemente, depois de ter ouvido nossas
pregações): “Palavras, palavras, palavras!”. São Paulo chama as palavras
de Deus de “armas do nosso combate” e diz que só a elas “Deus dá a ca-
pacidade de destruir fortalezas, desfazer raciocínios presunçosos e todo
poder altivo que se levanta contra o conhecimento de Deus, e torna cativo
todo pensamento para levá-lo a obedecer a Cristo” (2Cor 10,3-5).
A humanidade está enferma de barulho, dizia o filósofo Kierkegaard; é
necessário “convocar um jejum”, mas um jejum de palavras; alguém tem
de gritar, como fez um dia Moisés: “Faz silêncio e escuta, ó Israel” (Dt 27,
9
). O Santo Padre nos recordou a necessidade desse jejum de palavras em
seu encontro quaresmal com os párocos de Roma e acho que, como de
costume, seu convite se dirigia à Igreja, antes ainda que ao mundo.

4. “Jesus não veio para contar frivolidades”

Sempre me impressionaram estas palavras de Péguy:

“Jesus Cristo, pequeno meu,


– é a Igreja que se dirige a seus filhos –
não veio para nos contar frivolidades…
Não fez a viagem até a terra
para trazer adivinhações e brincadeiras.
Não houve tempo para divertir-se…
Ele não gastou sua vida…
Para vir nos contar mentiras”.2

A preocupação de distinguir a palavra de Deus de qualquer outra pala-


vra é tal que, enviando seus discípulos em missão, Jesus os manda que
não saúdem ninguém pelo caminho (Lc 10, 4). Experimento em minha pró-
pria carne que às vezes é preciso tomar este mandamento ao pé da letra.
Deter-se a saudar as pessoas e trocar formalidades quando se vai come-
çar uma pregação dispersa inevitavelmente a concentração sobre a pala-
vra que há que anunciar, faz perder o sentido de sua alteridade a respeito
de todo discurso humano. É a mesma exigência que se vive (ou deveria vi-
ver) quando alguém está se revestindo para celebrar a Missa.
A exigência é ainda mais forte quando se trata do conteúdo da prega-
ção. No Evangelho de Marcos, Jesus cita a palavra de Isaías: “Esse povo
vem a mim apenas com palavras e me honra só com os lábios, enquanto
seu coração está longe de mim e o temor que ele me testemunha é con-
vencional e rotineiro” (Is 29, 13); depois acrescenta, dirigindo-se aos escri-
bas e fariseus: “Em vão, pois, me cultuam, porque ensinam doutrinas e
preceitos humanos” (Mc 7, 7-13).
Quando não se chega a propor nunca a simples e crua palavra de
Deus, sem fazer que passe por um filtro de mil distinções e precisões e
acréscimos e explicações, em si mesmas até justas, mas que consomem a
palavra de Deus, faz-se o mesmo que Jesus reprovou, aquele dia, aos es-
2 Ch. Péguy, Il portico del mistero della seconda virtù, in Oeuvres poétiques complètes,
Gallimard 1975, pp. 587 s.
cribas e fariseus: se “anula” a palavra de Deus, se a aprisiona, fazendo-lhe
perder grande parte de sua força de penetração no coração dos homens.
A palavra de Deus não pode ser empregada para discursos de circuns-
tâncias, ou para envolver de autoridade divina discursos já feitos e todos
humanos. Em tempos próximos a nós, se viu aonde leva esta tendência. O
Evangelho foi instrumentalizado para sustentar toda classe de projetos hu-
manos: desde a luta de classes à morte de Deus.
Quando um auditório está tão predeterminado por condicionamentos
psicológicos, sindicais, políticos ou passionais, como para fazer, de parti-
da, impossível não dizer o que se espera e não se dar completamente ra-
zão em tudo, quando não há esperança alguma de poder levar os ouvintes
a esse ponto em que é possível dizer-lhes: “Convertei-vos e crede”, então
está bem não proclamar em absoluto a palavra de Deus, a fim de que não
seja instrumentalizada por fins interessados e, portanto, traída. Em outros
termos, é melhor renunciar a fazer um verdadeiro anúncio, limitando-se, se
acaso, a escutar, a procurar entender e participar das expectativas e sofri-
mentos das pessoas, pregando mais com a presença e com a caridade o
Evangelho do Reino. Jesus, no Evangelho, mostra-se muito atento a não
se deixar instrumentalizar por fins políticos nem partidaristas.
A realidade experiência e, portanto, a palavra humana não está excluí-
da, evidentemente, da pregação da Igreja, mas se deve submeter à pala-
vra de Deus, ao serviço desta. Igual que na Eucaristia é o Corpo de Cristo
o que assimila consigo quem o come, e não o inverso, assim no anúncio
deve ser a palavra de Deus, que é o princípio vital mais forte, a que sub-
mete e assimila consigo a palavra humana, e não o contrário. Por isso é
necessário ter o valor de partir com mais freqüência, ao tratar problemas
doutrinais e disciplinares da Igreja, da palavra de Deus, especialmente do
Novo Testamento, e de permanecer depois ligados a ela, vinculados a ela,
seguros de que assim se chega com maior segurança ao objetivo, que é o
de descobrir, em cada questão, qual é a vontade de Deus.
A mesma necessidade se adverte nas comunidades religiosas. Existe o
perigo de que na formação que se dá aos jovens e no noviciado, nos exer-
cícios espirituais e em todo o resto da vida da comunidade, se empregue
mais tempo nos escritos do próprio fundador (com freqüência bastante po-
bres de conteúdo) do que na palavra de Deus.

5. Falar como que com as palavras de Deus

Dou conta de que o que estou dizendo pode suscitar uma objeção gra-
ve. Então a pregação da Igreja terá que se reduzir a uma seqüência (ou a
uma lufada) de citações bíblicas, com indicações de capítulos e versículos,
à maneira dos Testemunhas de Jeová e de outros grupos fundamentalis-
tas? Não, por certo. Nós somos herdeiros de uma tradição diferente. Expli-
co o que tento dizer por permanecer ligados à palavra de Deus.
Também na segunda carta aos Coríntios, São Paulo escreve: “Não so-
mos nós como a maioria, que negocia com a Palavra de Deus. Por outro
lado, com sinceridade e como que movidos por Deus, e diante de Deus, fa-
lamos em Cristo” (2Cor 2,17), e São Pedro, na primeira carta exorta aos
cristãos dizendo: “Se alguém fala, faça-o como que com as palavras de
Deus” (1Pd 4,11). O que quer dizer “falar em Cristo” ou falar “como que com
as palavras de Deus”? Não quer dizer repetir materialmente e só as pala-
vras pronunciadas por Cristo e por Deus na Escritura. Quer dizer que a
inspiração de fundo, o pensamento que “informa” e sustenta todo o demais
deve vir de Deus, não do homem. O anunciador deve estar “movido por
Deus” e falar como que em sua presença.
Há duas formas de preparar uma pregação ou qualquer anúncio de fé
oral e escrito. Posso primeiro sentar-me na escrivaninha e escolher eu
mesmo a palavra que há que ser anunciada e o tema a desenvolver, bas-
eando-se em meus conhecimentos, minhas preferências etc., e depois,
uma vez preparado o discurso, ajoelhar-me para pedir fortemente a Deus
que abençoe o que escrevi e dê eficácia a minhas palavras. Já é algo bom,
mas não é a via profética. Por outro lado, há que se fazer o contrário. Pri-
meiro colocar-se de joelhos e perguntar a Deus qual é a palavra que quer
dizer; depois, sentar-se na escrivaninha e fazer uso dos próprios conheci-
mentos para dar corpo a essa palavra. Isto muda tudo porque assim não é
Deus que deve fazer sua minha palavra, mas sou eu que faço minha sua
palavra.
Há que se partir da certeza de fé de que, em toda circunstância, o Se-
nhor ressuscitado tem no coração uma palavra sua que deseja fazer che-
gar a seu povo. É a que transforma as coisas e a que tem que ser desco-
berta. E Ele não deixa de revelá-la a seu ministro, se humildemente e com
insistência a pede. No princípio se trata de um movimento quase imper-
ceptível do coração: uma pequena luz que se acende na mente, uma pala-
vra da Bíblia que começa a atrair a atenção e que ilumina uma situação.
Verdadeiramente é “a menor de todas as sementes”, mas a seguir se
percebe que dentro estava tudo; havia um trono como que para abater os
cedros do Líbano. Depois a pessoa se põe na escrivaninha, abre seus li-
vros, consulta seus apontamentos, consulta os Padres da Igreja, os mes-
tres, poetas… Mas tudo já é outra coisa distinta. Já não se trata da Palavra
de Deus a serviço de tua cultura, mas de tua cultura a serviço da Palavra
de Deus.
Orígenes descreve bem o processo que leva a este descobrimento. An-
tes de encontrar na Escritura o alimento – dizia – é necessário suportar
certa “pobreza dos sentidos”; a alma está rodeada de obscuridade por to-
dos os lados, encontra-se em caminhos sem saída. Até que, de repente,
depois de laboriosa busca e oração, eis aqui que ressoa a voz do Verbo e
imediatamente algo se ilumina; aquele que ela buscava, sai a seu encontro
“saltando pelos montes, pulando sobre as colinas” (Cânticos 2, 8), isto é,
abrindo-lhe a mente para que receba uma palavra sua, forte e luminosa3.
Grande é a alegria que acompanha este momento. Fazia Jeremias dizer:
“Ao encontrar tuas palavras, eu as devorava; tua palavra tornou-se meu
gozo, e alegria para o meu coração” (Jr 15, 16).
Habitualmente a respostas de Deus chega sob a forma de uma palavra
da Escritura que, em contrapartida, nesse momento revela sua extraordi-
nária pertinência à situação e ao problema que se deve tratar, como se ti-
vesse sido escrito propositalmente para ele. Às vezes, não é sequer ne-
cessário citar explicitamente tal palavra bíblica ou comentá-la. Basta que
esteja bem presente na mente de quem fala e informe tudo o que expres-
sa. Agindo assim, fala, de fato, “como que com palavras de Deus”. Este
método vale sempre: para os grandes documentos do magistério como
para as lições que o mestre dá a seus noviços, para a douta conferência
como para a humilde homilia dominical.
Todos temos tido a experiência de quanto pode fazer uma só palavra
de Deus profundamente acreditada e vivida, primeiro para quem a pronun-
cia; com freqüência se constata que, entre muitas outras palavras, foi a
que tocou o coração e levou a mais de um ouvinte ao confessionário.
Depois de haver indicado as condições do anúncio cristão (falar de
Cristo, com sinceridade, como que movidos por Deus e sob seu olhar), o
Apóstolo se perguntava: “E quem é capaz para isto?” (2Cor 2, 16). Ninguém
– está claro – está à altura. Levamos este tesouro em vasos de barro (Ib.
4, 7). Mas podemos orar, dizendo: Senhor, tende piedade deste pobre vaso
de barro que deve levar o tesouro de vossa palavra; preservai-nos de pro-
nunciar palavras inúteis quando falamos de vós; fazei-nos experimentar
uma vez o gosto de vossa palavra, para que a saibamos distinguir de qual-
quer outra e para que qualquer outra palavra nos pareça insípida. Difundi,
como prometestes, fome na terra, “não fome de pão, nem sede de água,
mas de ouvir a palavra do Senhor” (Am 8, 11).

3 Cf. Orígenes, In Mt Ser. 38 (GCS, 1933, p. 7); In Cant. 3 (GCS, 1925, p. 202).

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