Mudança
Projeto de Livro
13 de setembro de 2009
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1. Desafios da Mudança
Os participantes daquela reunião estavam agora passando por uma experiência de
“colonização”, pois a empresa em que trabalhavam tinha sido recentemente comprada por
uma grande multinacional conhecida pela sua rigidez na política de administração de
pessoas. Percebi que, para aquelas pessoas, nenhuma crise anterior se comparava à que
estavam vivenciando nas últimas semanas, pois a expectativa das mudanças estava
afetando a todos de maneira drástica e lhes faltavam mecanismos que orientassem
diálogos interiores e ajudassem a manter uma conversa equilibrada..
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Fica difícil imaginar as transformações que irão ocorrer na sociedade quando
todos, realmente todos, puderem se comunicar através de meios digitais, podendo em
qualquer lugar, a qualquer momento terem a possibilidade de acesso instantâneo a
todos os tipos de informação. Quando chegarmos nesse nível de desenvolvimento,
inovar e empreender estarão ao alcance de todos aqueles que tenham disposição para
criar algo de valor. Isto porque a inovação depende da rapidez com que acessamos
conhecimento, e o empreendedorismo depende das possibilidades de acesso às
informações que sinalizam as mudanças. Devemos considerar também que a inovação
e o empreendedorismo aumentam a chance de tirar proveito do poder das quatro
forças transformadoras do ambiente: aceleração das mudanças, complexidades
crescentes, competitividade acirrada e inexorável evolução tecnológica. Se por um
lado podemos conseguir maior poder pela inovação e empreendedorismo, por outro
lado o efeito combinado das forças transformadoras faz com que hoje as mudanças
sejam mais desafiantes do que em outras épocas.
Mudança baseada em aprimoramentos pode não ser suficiente, pois enquanto
aprimoramos rotinas, o concorrente pode estar inovando algum processo, visando
permitir ligação direta com o cliente. As mudanças exigem uma atitude cada vez mais
criativa e ousada, sem perder o equilíbrio entre a coragem e a prudência. É com esta
atitude que poderemos fazer as mudanças necessárias para acompanhar as
transformações que já ocorrem e as que estão por acontecer quando formos uma
aldeia global e nos comunicarmos instantaneamente com todos e com tudo.
Mudanças de segunda e terceira ordem
Cada vez mais, ocorrem situações em que uma simples mudança de
comportamento da “máquina” não satisfaz. Situações em que é necessário produzir
uma mudança no modo da “máquina” se comportar. Situações em que se precisa
©Sérgio Lins em 13/9/2009 09:27 39 (21)8167-0444 vslins@uol.com.br
Aprendendo com a Mudança
Situações de mudança
Mudanças podem ser decorrentes da prática da inovação de produtos, ou do
exercício do empreendedorismo, podendo acontecer também como conseqüência da
inovação de processos, ou até mesmo do aprimoramento de rotinas. Mudanças podem
ser disparadas por fortes pressões da concorrência que obrigam à empresa a não só
instalar novas tecnologias, como também redefinir sua estratégia e estrutura
organizacional.[01] Mudanças podem acontecer em função de novas exigências dos
clientes, ou devido às transformações do mercado. Mudanças muitas vezes são feitas
para melhorar o relacionamento com fornecedores. Mudanças podem ser provocadas
por empresas recém entradas no ramo de negócio e que usa todo o seu poder para
ganhar espaço no mercado. Mudanças podem ser provocadas pela evolução
tecnológica que pode favorecer a criação de algo que surpreendentemente substitui
uma linha completa de produtos.[06] O que se sabe, é que seja qual for a situação de
mudança, temos que nos prevenir com medidas que provoquem transformações
internas compensadoras e sejam forças de propulsão dos objetivos da empresa.
seguinte, de volta à realidade, ele começou a perceber que não era bem assim. Nos
primeiros meses parecia que nada ia dar certo, ele só comprava mercadoria, tinha
despesa com aluguel, pagava os empregados e o faturamento não compensava.
Felizmente, após certo tempo, tudo começou a dar certo e por algum motivo os
clientes preferiam comprar em sua loja do que em qualquer outra, mesmo que tivesse
os mesmos produtos. Foi ai que ele percebeu que havia certo produto que era
responsável por mais de 80% do seu faturamento. Por motivos não explicáveis pela
excelente pesquisa de mercado que havia sido feita, as pessoas preferiam comprar
jeans na sua loja.
Tendo descoberto o jeans como sua fórmula de sucesso, ele adquiriu outras
lojas e reaplicou a fórmula de sucesso, continuando a crescer de vento em popa,
acreditando que aquele vento seria favorável para sempre. Entretanto, num dado
momento percebeu que já não estava crescendo tanto quanto antes e algo precisava
ser feito. Antes de tudo, ele cuidou de aprimorar as rotinas da sua formula de sucesso,
criando assim uma sobrevida e continuidade para o seu negócio que voltou a crescer
bastante. Entretanto, pouco tempo depois percebeu que tinha que rever mais uma vez
a fórmula de sucesso, pois os negócios voltaram a andar mais lentos.
Como não dava mais para aprimorar rotinas, ele tinha que dar um salto em
busca de outras fórmulas. Foi aí que ele provocou uma mudança de 2a ordem,
agregando serviços de outra natureza ao criar em cada loja um ambiente descontraído
onde as pessoas além de comprar, também liam revistas, ouviam música, faziam
pequenos lanches e conversavam livremente. A loja passou a ser para alguns um
ponto de encontro, ou até mesmo de pequenas comemorações. O sucesso desse
esquema de lojas foi tão grande que ele resolveu multiplicá-lo pelas outras lojas já
instaladas. Este esquema de loja delicatessen continuou a dar certo por uns tempos até
que ele percebeu que precisava ir em busca de mais uma fórmula transformadora,
pois seus concorrentes o estavam copiando. O questionamento sobre o produto com
que gostaria de continuar atuando no mercado, provocou uma mudança de 3a ordem.
O pequeno empresário mudou o conceito de produto e de clientes. Seu produto agora
passaria a ser os Capitais de Conhecimento. Abriu um sistema de franquias, onde ele
já não mais administrava as lojas e sim os capitais de conhecimento e o conjunto geral
dos franquiados. Suas idéias agora poderiam ser aplicadas em número grande de lojas
e o efeito poderia ser compensado entre elas.
A miopia com relação às mudanças
No caso do castelo sitiado, dos produtos hospitalares e da loja de roupas, as
mudanças em suas diversas ordens crescentes, foram provocadas pela entidade
afetada pela ameaça da continuidade. O senhor do castelo foi quem decidiu lançar o
boi com o saco de farinha castelo abaixo; partiu do fornecedor a instalação de
terminais nos hospitais; assim como coube ao dono da loja a iniciativa de evoluir até a
oferta de franquias. Já no caso da indústria do gelo, as transformações aconteceram na
indústria como um todo, afetando negativamente quem mantinha os processos
tradicionais de produção de gelo pela extração dos lagos congelados. Este é o grande
risco de insistir numa mesma fórmula de sucesso, acreditando que ela vai durar para
sempre. Os produtores de gelo natural foram superados sem chance de entrar para o
Continuidade e Mudança
Quando ouvimos o dito popular “deixe como está para ver como fica”,
estamos constatando uma atitude comum que muitas pessoas assumem diante de uma
situação sobre a qual elas têm poder de mudar. Este tipo de atitude parece indicar uma
tendência em se aceitar a Mudança apenas quando é algo fora do nosso controle e a
adotar a Continuidade como algo que faz parte da nossa forma natural de decidir e
agir. Ou seja, “só vamos mudar se não tiver outro jeito”. Para reforçar esta possível
tendência, existe o provérbio de origem francesa: “quanto mais alguma coisa muda
tanto mais inalterada permanece”.1 Tanto o dito popular quanto o provérbio francês
parecem acusar a existência de uma relação intrigante entre a Continuidade e a
Mudança. Se por um lado somos induzidos a continuar mantendo tudo constante, por
outro lado recebemos um reforço quando nos dizem que não adianta mudar, pois algo
permanece inalterado. Em outras palavras, os métodos convencionais de alterar as
coisas, não provocam nenhuma mudança que dispense a necessidade de continuar na
tentativa de mudar para melhor.
No caso do castelo medieval, qualquer Mudança em termos da distribuição
dos víveres restantes não mudaria a Continuidade do exército em manter o castelo
sitiado. Foi necessária uma mudança que eliminou a crença de que restavam poucos
víveres, que era o fator que mantinha a continuidade do cerco. No caso do material
hospitalar, o aprimoramento de rotinas não mudaria a Continuidade do risco dos
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Plus ça change, plus c’est la même chose
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Desafios da Mudança
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Texto de autor desconhecido que circulou nas décadas de 70 e 80 em muitas organizações.
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Desafios da Mudança
caso termina contando a passagem triunfante de Noé em sua arca enquanto todos se
afogam como castigo de suas protelações por falta de objetividade.
Projeção
Esta variação da síndrome da utopia tem como ingrediente básico o
posicionamento moral, e a convicção de que seu objetivo conduz a uma realização
universal. Tendo esta convicção em mente, o indivíduo sente-se com a
responsabilidade missionária de mudar o mundo. Ele usa várias formas de persuasão e
confiando que se fizer uma exposição clara, todos os indivíduos, inteligentes e de boa
vontade, poderão enxergar as vantagens de trabalhar em prol da sua fantástica
empreitada. Com conseqüência, quem não quiser colaborar, ou não tem inteligência
suficiente ou está agindo de má fé e, portanto, merece ser penalizado por isto.
Esta atitude utópica leva o indivíduo em seu diálogo interior a pensar: “se
apesar de todos os meus esforços o projeto não está andando bem, é porque existe
algo que foge ao meu controle. Podem ser as restrições organizacionais, ou a baixa
proatividade dos meus colaboradores. Em qualquer caso, a liberdade necessária à
realização de projetos tão criativos quanto o meu fica tolhida.” Na filosofia Zen, esta
atitude é retratada com o caso de um discípulo que sempre voltava ao seu mestre
falando da aranha que o impedia de meditar. Quando o mestre sugeriu que ele
pintasse um X na barriga da aranha, ele apareceu com um X na sua própria barriga,
demonstrando então, que a maior dificuldade estava dentro dele mesmo.
Semelhanças entre as formas de utopia
Seja qual for a atitude utópica o indivíduo considera a premissa para a
realização de sua empreitada mais real que a realidade. Ou seja, ao ver falhar a
tentativa de organizar as coisas de conformidade com sua premissa, o indivíduo não a
questiona em busca de qualquer incoerência ou afastamento da realidade. No lugar
disto ele atribui as falhas a fatores externos ou a sua própria incapacidade. Como para
ele a premissa é a realidade, admitir qualquer chance de que a falha esteja na premissa
é para ele negar a realidade. Por isto é que ainda se defende o marxismo,
argumentando que a doutrina não deu certo na Rússia por ter caído em mãos impuras,
jamais porque haja algo errado com o ela. O mesmo acontece em projetos de pesquisa
improdutivos, quando o pesquisador pede mais dinheiro para um projeto maior, em
nenhum momento ele cogita uma revisão das premissas básicas do projeto.
Impasses entre problema e solução
A distinção entre a realidade e as premissas sobre a realidade é fundamental
para a determinação dos problemas relativos à continuidade e aos desafios da
mudança. Esta distinção é muitas vezes prejudicada pelas atitudes utópicas que criam
impasses, dificultando a identificação clara de um problema e de como ele se
distingue da solução. Isto é o que acontece com a impossibilidade de concretizar um
sonho utópico que constitui um pseudoproblema. Realizar uma utopia é um problema
falso, mas o desgaste que acarreta é real, e por isto a situação como um todo é
caracterizada como problema. Este é o caso da armadilha criada pelo aforismo "O
difícil fazemos logo, o impossível demora um pouco mais". Estes impasses, os
paradoxos e outros conflitos inerentes aos processos de mudança, já eram alvo de
preocupação de doutrinas antigas,[03] dentre as quais destaca-se a doutrina Sufis.
Referências
Livros
[01] DAVENPORT, Thomas H. Process Innovation. Boston, MA: Harvard Business School Press,. <067>
1993
[02] EARL, Michael J. Management Strategies for Information Technology. New York: Prentice <080>
Hall. 1989.
[03] FERGUSON, Marilyn. A Conspiração Aquariana. Rio de Janeiro: Editora Record, 1980. <013>
[04] GRILLO, Nícia Q. Histórias da Tradição Sufis. Rio de Janeiro: Edições Dervish, 1993. <039>
[05] LINS, Sérgio. Sinergia Fator de Sucesso nas Realizações Humanas. Rio de Janeiro: Editora <999>
Elsevier-Campus, 2006.
[06] PORTER, Michael. Vantagem Competitiva. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1985. <079>
[07] SENGE, Peter. The Fifth Discipline. New York: Doubleday, 1990. <090>
[08] SHAH, Idries. Os Sufis. São Paulo: Editora Cultrix, 1977. <040>
[09] SILBIGER, Steven. MBA em 10 Lições. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1993. <038>
[10] UTTERBACK, James. Dominando a Dinâmica da Inovação. Rio de Janeiro: Quality Mark, <087>
1994.
[11] WATZLAWICK, Paul & WEAKLAND, John & FISH, Richard. Mudança: princípio de <033>
formação e resolução de problema. São Paulo: São Paulo, 1977.
Artigos, recortes e anotações
[12] American Hospital Supply. Boston, MA: Harvard Business School Case Study. Number 9- <085>
681-038
[13] HARRIS, Catherine L. Information Power: how companies are using new technologies to gain <096>
competitive edge. Business Week/October 14,1985.