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EDITORIAL

SUMÁRIO
Ele está no meio de nós! junho 2005/05

E
stamos vivendo um Ano Eucarístico (outubro de 2004 a
outubro de 2005) que nos ajuda a refletir sobre o mistério
da presença do Senhor Jesus no nosso meio. Um convite
para voltarmos ao centro de nossa fé, isto é, à experiência
do encontro com o Cristo Ressuscitado, vivo e vitorioso em
suas muitas presenças na Igreja e no mundo. É preciso
que nós mesmos voltemos ao centro de nossa espiritualidade cristã:
a presença de Cristo na Eucaristia, para termos fé e coragem de Papa Bento XVI e
testemunhá-lo aos demais. A mais real das presenças do Senhor Ano Eucarístico.
em nosso meio é sua presença na Eucaristia, onde ele quis dar-se Fotos: Divulgação e Jaime C. Patias

e entregar-se na forma de sacramento: “Tomai, comei, isto é o meu


corpo (...) Bebei todos, porque este é o meu sangue da aliança” (Mt  MURAL DO LEITOR--------------------------------------04
26, 26.28). No pão repartido e no sangue partilhado, reconhecemos Cartas
Jesus que fez o dom de si na cruz.  OPINIÃO--------------------------------------------------05
Jesus se faz presente no meio de nós, quando nos reunimos em Bento XVI e as religiões
seu nome para a celebração eucarística, para a oração, para o louvor Henry Sobel / Armando Hussein Saleh
e adoração, para a vida de comunhão fraterna, para partilhar a vida  PRÓ-VOCAÇÕES----------------------------------------07
nas alegrias e sofrimentos. Nos grupos de reflexão, nas reuniões A maior das covardias é dizer "não" à vida
de famílias, nas comunidades de base, nos encontros de oração, Rosa Clara Franzoi
nas celebrações eucarísticas... “Onde há dois ou três reunidos em  VOLTA AO MUNDO-------------------------------------08
meu nome, aí estou eu, no meio deles” (Mt 18, 20). Não se trata Notícias do Mundo
Celam / Fides / Zenit
de uma presença física, que se possa comprovar com os sentidos
corporais ou demonstrar cientificamente com as provas da evidência.  ESPIRITUALIDADE----------------------------------------10
Trata-se de uma presença que se pode sentir e verificar com os Consolação em tempos de medo e aflição
Salvador Medina
sentidos da fé, do coração que dá força, energia e coragem para
seguir o caminho, ainda que enfrentemos adversidades.  CIDADANIA-----------------------------------------------12
A Eucaristia nos conduz a perceber e amar sua presença tam- Bento XVI, cidadão universal
Alfredo J. Gonçalves
bém nos irmãos e irmãs, sobretudo no rosto dos mais necessitados.
“O que fizestes a estes meus irmãos menores, a mim o fizestes”.  testemunho-------------------------------------------13
O sim de uma Oblata
Na partilha do pão, entre nós e com os necessitados, vivemos em Rosimara Maria Zamarchi
união com ele. A Eucaristia é também presença do Senhor na cruz
nossa de cada dia. “Quem quiser me seguir, negue-se a si mes-  testemunho-------------------------------------------14
No duelo, Deus venceu
mo, carregue a sua cruz e Rosita Crippa
Jaime C. Patias

venha” (Mt 16, 24). Seguir


a Jesus no sofrimento, na  FORMAÇÃO MISSIONÁRIA----------------------------15
A Missão dos Leigos (conclusão)
promoção e defesa da vida, Luiz Balsan e Lírio Girardi
enfrentando com coragem
e dignidade as provações,  MISSÃO HOJE-------------------------------------------19
Uma flor no sertão
é um meio de sentir sua Ramón Cazallas Serrano
presença consoladora e en-
 DESTAQUE DO MÊS------------------------------------20
corajadora. Ao final de sua Desafios no caminho de Bento XVI
vida, Jesus prometeu aos Valeriano Paitoni
apóstolos que permane-
 ATUALIDADE----------------------------------------------22
ceria com eles: “eu estarei Eucaristia, memorial do Senhor
convosco sempre, até o fim do mundo” (Mt 28, 20). O cristianismo Antônio Valentini Neto
vive da certeza de que o Senhor permanece para sempre junto de  INFÂNCIA MISSIONÁRIA-------------------------------24
seus seguidores. Diante do mundo conturbado pela violência, pela Que as crianças tenham vida em abundância
exclusão, pelas doenças e catástrofes - provocadas ou naturais - , Roseane de Araújo Silva
pela miséria e pela fome, pela angústia e pela ausência de sentido,  CONEXÃO JOVEM--------------------------------------25
a certeza da presença do Senhor acompanha o cristão na vivência Sexualidade: a expressão do meu eu!
autêntica de sua fé. Vicente de Melo
Em cada celebração eucarística, encontramos com Cristo  ENTREVISTA-----------------------------------------------26
em suas diversas presenças: na partilha do Corpo e Sangue, na Contexto e destinatário da Missão Ad Gentes
Joaquim Gonçalves
Palavra anunciada e vivida, na oração, na assembléia reunida, na
pessoa do próximo, na pessoa do celebrante... nós repetimos por  AMAZÔNIA-----------------------------------------------28
diversas vezes: “Ele está no meio de nós!” É esta afirmação de Adoradoras a serviço de Cristo
Graciete Ayres
fé, entre tantas propostas religiosas, que nós queremos professar
diante dos sedentos e famintos de Deus.   Volta ao Brasil---------------------------------------30
Notícias do Brasil
CNBB / Pascom

Missões - Junho 2005 3


Mural do Leitor
Ano XXXII - no 05 Junho 2005

Diretor: Jaime Carlos Patias

Editor: Maria Emerenciana Raia

Equipe de Redação: Joaquim F.


Gonçalves, Cristina Ribeiro Silva e Rosa
Clara Franzoi

Fotos: Geraldo Labarrére Nascimento


Colaboradores: Alfredo J. Gonçalves,
Vitor Hugo Gerhard, Lírio Girardi, Luiz
Balsan, Salvador Medina, Michelangelo
Piovano, Júlio César, Marinei Ferrari,
Roseane Araujo

Agências: Adital, Adista, CIMI, CNBB,


Dom Hélder, IPS, MISNA, Pulsar, Va-
ticano

Diagramação e Arte: Cleber P. Pires Bispo de São Félix toma posse

E
Jornalista responsável: nquanto o Movimento dos Trabalhadores
Maria Emerenciana Raia (MTB 17532) Rurais Sem-Terra se concentrava em
Goiânia, com o mesmo sonho de vida
Administração: Eugênio Butti e ternura, a Prelazia de São Félix do
Araguaia, MT, se reunia no dia 1º de maio para
Sociedade responsável: acolher o novo pastor, dom Leonardo, irmão
Instituto Missões Consolata franciscano. Foram dois acontecimentos simul-
(CNPJ 60.915.477/0001-29) tâneos e de matiz profética para o nosso país e
para nossa Igreja. Durante o dia inteiro, muita
Impressão: Edições Loyola gente chegando: homens, mulheres, velhos,
(11) 6914.1922 crianças, negros, índios... Todas as raças em
uma só irmandade representando todos aqueles
Colaboração anual: R$ 35,00 e aquelas que acreditam e comungam com a
AG: 545-2 CC: 38163-2 - BRADESCO caminhada da Igreja. Estavam ali também re-
Soc. Missionários de N.S. Consoladora presentantes de vários movimentos populares,
(a publicação anual de Missões é de 10 números)
que partilham fé-vida, testemunho-esperança.
Após a saudação, dom Pedro Casaldáliga en- do batismo e da proclamação das leituras e
Missões é produzida pelos
tregou o anel de tucum, aliança-compromisso do Evangelho, houve a partilha-testemunho
Missionários da Consolata
com as causas dos índios, dos negros, dos de irmãos comprometidos com as causas
Fone: (11) 6256.7599
ribeirinhos e com todos os excluídos ao bispo dos pequenos: bispos, religiosos, pastores,
Leonardo. Este gesto manifesta o desejo de professores de teologia, indígenas, líderes de
Missionários da Consolata
que ele continue sendo a voz e o defensor movimentos, todos reafirmando que a esperança
Rua Josimo de Alencar Macedo, 413
desta gente: como presença evangélica e está em Jesus Cristo, Verbo encarnado no meio
Cx.P. 207 - 69301-970 Boa Vista/RR
profética na Igreja e na sociedade, lutando pela do povo, numa Igreja viva e comprometida com
Fone: (95) 224.4109
justiça, pelos direitos humanos, em busca da a causa do seu Reino.
construção de uma sociedade solidária, numa A alegria de toda a celebração alcançou
Membro da PREMLA (Federação de
Terra-Mãe preservada, acolhendo e valorizando, seu ponto alto nos abraços e beijos, de boas
Imprensa Missionária Latino-Americana)
com espírito crítico, as diferentes culturas e vindas ao bispo Leonardo, e de agradecimento
vivências religiosas, formando comunidades a dom Pedro Casaldáliga por ter feito crescer
Redação participativas, alicerçadas no mistério pascal uma Igreja comprometida com os pobres, tão
Rua Dom Domingos de Silos, 110 e promovendo a vida de todas as pessoas e evangélica, tão católica, tão ecumênica, no
02526-030 - São Paulo da natureza. Dom Leonardo recebeu também Espírito do Cristo Ressuscitado, unida a todos
Fone/Fax: (11) 6256.8820 três chaves, o arquivo-memória, uma história os mártires da caminhada. 
Site: www.revistamissoes.org.br de lutas e sonhos, de poesias e encanto, de
E-mail: redacao@revistamissoes.org.br martírio e profecia, de administração e solida- Antônio Carlos – Tony
riedade. Depois da renovação das promessas São Felix do Araguaia, MT.

4 Junho 2005 - Missões


BENTO XVI e as religiões

OPINIÃO
de Henry Sobel povos, o novo papa vai seguir neste caminho.

Siciliani-Gennari/SIR
Acredito mesmo nisso! Tive a oportunidade de

A
me encontrar duas vezes com o cardeal Rat-
credito que com a eleição do papa zinger: em 1990, no Rio de Janeiro e em Nova
Bento XVI como líder da Igreja Iorque numa reunião entre cardeais e rabinos
Católica, não haverá retrocesso do mundo inteiro. Ele se mostrou um homem
no relacionamento com outras sério, meigo, sensível e bem-intencionado.
reli­giões. Em primeiro lugar ouvi O que nós queremos e esperamos é que
muitos católicos e judeus amigos Bento XVI seja aberto e sensível, tanto quanto
expressando receio no que tange à rigidez foi João Paulo II, principalmente com relação às
doutrinária do cardeal Joseph Ratzinger, hoje questões sociais. O “background” do novo papa,
papa Bento XVI. Creio que não vai haver ou seja, a formação e a vivência que ele teve na
retrocesso, pois o conservadorismo do novo Alemanha, inclusive com o nazismo, vai torná-lo
papa vai se amenizar em seu novo cargo. Na mais sensível com relação ao anti-semitismo. Ele
política, os estadistas da chamada “linha dura”, testemunhou na pele as atrocidades da Segunda
são freqüentemente os que fazem as maiores Guerra Mundial. A sua sensibilidade vai levá-lo a
concessões quando assumem o poder. O rejeitar qualquer tipo de preconceito. Digo isso
mesmo vai acontecer com o novo papa. Em com relação a todos os povos, porque ele viveu
segundo lugar, João Paulo II avançou muito durante a Guerra e também foi uma vítima do
na questão do ecumenismo para que o novo preconceito. As expectativas da comunidade
papa possa voltar atrás. O cardeal Ratzinger judaica são as melhores possíveis. 
sempre esteve muito próximo a João Paulo II.
Assim como este último foi um defensor da paz, Henry Sobel é presidente do rabinato da Congregação
do diálogo inter-religioso e da união entre os Israelita Paulista.

de Armando Hussein Saleh cardeal Joseph Ratzinger. Não o conhecia e


torcia pela eleição do cardeal arcebispo de São

A
Paulo, Cláudio Hummes, que é meu amigo.
gendado muito antes de abril, Não esperava que o conclave elegesse um
houve um simpósio cristão-muçul- papa com a saúde frágil como me pareceu ser
mano promovido pelo movimento a de Bento XVI, porém, pude perceber que ele
dos focolares, na Itália, justamente é uma pessoa muito preparada, um intelectual
no período compreendido entre a que fala vários idiomas. O que esperamos dele?
morte de João Paulo II e a posse Continuidade do trabalho iniciado por João Paulo
do novo papa, Bento XVI. Desta forma, tive II, principalmente na luta pela paz, no diálogo
a oportunidade de participar deste momento inter-religioso e na transparência. Acreditamos
histórico para os nossos irmãos católicos e para que, por ter sido a mão direita do papa anterior,
toda a humanidade. Presentes ao Simpósio Bento XVI dará continuidade a isso tudo. cessidade de mudar de religião, tampouco é
estavam representantes do Vaticano, inclusive A comunidade islâmica quer ter uma relação nosso interesse convencer adeptos das outras
o arcebispo Michael Fitzgerald, grande teólogo, boa com os nossos irmãos católicos, manter duas a se tornarem islâmicos, e acredito que a
que expôs com muita competência a questão os canais de diálogo. Buscamos conscientizar recíproca seja verdadeira. Estamos buscando
do diálogo inter-religioso e reforçou o que pude- os adeptos das duas religiões que somente chegar à paz mundial, levar as pessoas a en-
mos ver na prática: a “cidade” construída pelo a boa conduta, a paz e a igualdade entre as tender que somos irmãos de consangüinidade.
movimento focolarino em Lupiano. O segredo pessoas importam. A abertura proporcionada Descendemos todos de Adão e Eva e queremos
para se entender o simpósio foi visitar este por João Paulo II aproximou ambas as partes, a confraternização e a paz no mundo.
local, onde não existe presidente, nem súditos, ele procurou esclarecer a comunicação entre Esperamos que Bento XVI seja um bom
estrangeiros ou pobres, ricos ou excluídos. O as religiões. Se o novo papa agir contra o que papa, que saiba administrar o Vaticano e a
que existe em Lupiano é uma grande família, o anterior fez, estará cometendo o suicídio Igreja Católica. Esperamos uma posição neutra
com respeito às diferenças. Chiara Lubich, a da Igreja Católica. As religiões têm que ser com relação às outras religiões. João Paulo II
fundadora dos focolarinos criou um modelo abertas. O islamismo é para todo o mundo. abriu caminho para o diálogo inter-religioso.
a ser copiado, pois mostrou ao mundo que As três grandes religiões, a judaica, a cristã e Esperamos que Bento XVI continue trilhando
somos todos irmãos. a islâmica são divinas, descendem da mesma o mesmo caminho. 
Neste clima de simpósio, o Criador me raiz. A falta de diálogo entre elas faz surgir as
deu a oportunidade de presenciar a eleição divergências. Por isso é importante preservar Armando Hussein Saleh é xeique, missionário pela paz mundial
do novo líder dos católicos, o papa Bento XVI, o entendimento e o diálogo. Não temos ne- e pertence à Federação Islâmica do Brasil.

Missões - Junho 2005 5


Missionários e Missionárias da Consolata
realizaram Capítulo Geral em São Paulo

O
s missionários da Consolata realizaram o XI Capítulo tuguês), missionário em Roraima, e Mathew Ouma (queniano),
Geral, no Centro Missionário José Allamano, em São missionário no Quênia, são os outros conselheiros eleitos. É
Paulo, no período de 10 de abril a 15 de maio de 2005. uma Direção Geral internacional, com um conselheiro africano,
As missionárias realizaram o seu IX Capítulo, em sua e pela primeira vez, o Superior Geral não é um italiano. O padre
Casa Regional, também em São Paulo, que terminou Aquileo estudou filosofia em São Paulo e teologia, missiologia
no dia 23 de maio. O Capítulo dos missionários foi o e espiritualidade em Roma. Ultimamente fez a licenciatura em
segundo realizado fora do país de fundação, a Itália, onde em psicologia na universidade Salesiana. Trabalhou em Moçambique
1901, o Bem-aventurado José Allamano, junto ao Santuário da de 1984 a 1987 quando foi chamado ao Brasil para o serviço de
Consolata em Turim, lançou a primeira pedra da fundação, a formação no Seminário de Filosofia em Curitiba, Paraná. Desde
partir de um grupo de jovens sacerdotes diocesanos e alguns 1999 exercia o ministério de Conselheiro Geral para a América.
leigos enviados para o Quênia. Em 1910, o mesmo sacerdote, Além de reler sua identidade à luz dos sinais dos tempos e do
Jaime C. Patias espírito do fundador, o Capítulo Geral aprofundou os desafios
atuais da Missão, os caminhos da Evangelização, e renovou
algumas práticas da vida e da organização missionária. Para
os próximos seis anos, a Missão será articulada em torno de 4
eixos: Missão Ad Gentes, Ad Extra, Ad Vitam e Ad Pauperes.
No dia 21 de maio, festa da Santíssima Trindade, a As-
sembléia capitular das missionárias concluiu a eleição da sua
Direção Geral. Madre Gabriella Bono, italiana, licenciada em
ciências da educação, com experiência de missão na Argentina
foi reeleita Superiora Geral. As novas Conselheiras Gerais são:
Ir. Anair Voltolini, brasileira, com láurea em ciências da educação
e especialização em catequese. Tem experiência de missão em
Moçambique; Ir. Simona Brambilla, italiana, enfermeira e licenciada

Maria Luisa Casiraghi


Padres Antônio, Stefano, Aquileo, Mathew e Francisco.
reitor do Santuário, fundou a Congregação das Irmãs missioná-
rias da Consolata que, habitualmente trabalham nos mesmos
países e obras. O Capítulo das missionárias foi o primeiro fora
da sede geral, na Itália.
Os missionários da Consolata atualmente contam com 987
membros entre padres e Irmãos e as missionárias, com 846.
Os delegados e delegadas representaram os 26 países onde
as Congregações realizam o seu apostolado missionário. Nos
últimos anos, os missionários e as missionárias se orientaram
para novas aberturas em países de minoria cristã: Mongólia na
Ásia e Djibuti, na África.
Irmãs Renata, Jane, Anair, Gabriela Bono e Simona.

Novas Direções Gerais em psicologia, com experiência de missão em Moçam­bique; Ir.


No dia 10 de maio, a Assembléia capitular dos missionários Jane Wambui Muguku, queniana, licenciada em psicologia e com
elegeu a nova Direção Geral para os próximos 6 anos. Padre experiência de missão na Libéria e Ir. Renata Conti, italiana, com
Aquileo Fiorentini, 53, natural do Rio Grande do Sul, foi eleito láurea em filosofia e teologia e licenciada em teologia bíblica.
Superior Geral e padre Stefano Camerlengo, italiano, missionário Tem longa experiência de missão na Colômbia. O tema central
da República Democrática do Congo, eleito seu vice e primeiro do Capítulo das missionárias foi “comunhão e co-responsabi-
conselheiro; os padres Francisco Lopez Vasquez (espanhol), lidade rumo ao centenário do Instituto” a ser celebrado no ano
missionário da Coréia do Sul, Antônio de Jesus Fernandes (por- de 2010. 

6 Junho 2005 - Missões


pró-vocações
a maior das covardias
é dizer "não" à vida
Pensar no futuro às vezes assusta, especialmente

Arquivo MC
quando não se tem perspectivas ou quando o
caminho não é claro. A tentação é procurar saídas
por atalhos pouco recomendáveis.
de Rosa Clara Franzoi

N
estes dias, recebi uma carta de uma jovem de 17
anos, Maria Cândida. Ela me falava com entusiasmo
de muitas coisas referentes à sua vida: estudo, família,
amigos, sonhos para o futuro... e a uma certa altura ela
Jovens em encontro com Ir. Susana Possamai em Monte Santo, BA.
expressava sua preocupação com relação aos jovens.
Contou-me esta cena: “Como tivesse ouvido pessoas lescentes ao uso da droga. A força do grupo somada ao desejo
falando alto, fui à sacada e vi uma jovem da minha idade desmaiada de auto-afirmação, os levam a fazer juntos, o que sozinhos não
em plena rua. O seu “ficante” um tanto assustado, chamava por fariam. As más companhias, aliadas a uma boa dose de curiosi-
socorro pelo celular. Em questão de minutos apareceram vários dade, fazem com que eles entrem por um caminho que leva ao
rapazes. Todos tentavam acalmá-lo dizendo que aquilo não era mundo da ilusão. Assim, a grande maioria busca na rua o que
nada, que eles já tinham passado por aquela situação, alguns até não têm dentro da própria casa: o aconchego de uma família,
haviam entrado em coma alcoólico. Eu me entristeci ouvindo aquele o carinho e a orientação de pais responsáveis... necessidades
tipo de conversa e tentava dar a mim mesma respostas a algumas estas, inerentes a todo ser humano.
perguntas, tão normais para uma jovem da minha idade. Eu me
perguntava: Por que aquela garota estava na rua àquela hora, perto O que tem a ver a droga com a Vocação?
da uma da manhã? E por que a sua consciência lhe permitiu chegar Tem muito a ver, sim, porque o caminho da droga é quase
a este ponto? Como e onde estariam seus pais?” sempre um caminho sem retorno e para aqueles que o percor-
Confesso que fiquei pensando na solidariedade desta jovem rem, a juventude, a bela idade dos sonhos, que deveria ajudar
ao se preocupar com os colegas, e que se entristecia ao ver que a delinear um futuro promissor, simplesmente acabou... Faz-se
eles estavam jogando sua juventude pela janela...O dito popular: então necessário lembrar sempre aos jovens e adolescentes, a
“Dize-me com quem andas e eu te direi quem és”, expressa grande riqueza e força espiritual que eles têm dentro de si, sua
uma das primeiras motivações que levam muitos jovens e ado- capacidade de transformação, seu dinamismo e beleza, como
ser humano e como filho amado de Deus. O jovem vale pelo
que é, pelos ideais que tem e que consegue concretizar, e não
Quer ser um missionário/a? pelo que o grupo quer que ele seja.

Irmãs Missionárias da Consolata - Ir. Dinalva Moratelli A maior das covardias é dizer “não” à vida
Av. Parada Pinto, 3002 - Mandaqui Jovem! Diga “sim” à vida, mesmo qando ela lhe diz “não”. Vá
02611-011 - São Paulo - SP em frente, não fuja, pois esta é a maior das covardias. Lembre-se
Tel. (11) 6231-0500 - E-mail: rebra@uol.com.br que, se alguns param no caminho e desanimam, há outros que
podem se recuperar por verem você prosseguir decidido... Não
Centro Missionário “José Allamano” - Pe. Joaquim Gonçalves se esqueça que na vida só será feliz quem encontrar “o seu lugar”
Rua Itá, 381 - Pedra Branca
02636-030 - São Paulo - SP – a isto chamamos de Vocação. A Vocação é muito preciosa,
Tel. (11) 6232-2383 - E-mail: secretariamissao@imconsolata.org.br e para possuí-la, é preciso abrir mão de alguma coisa... Então,
procure, busque este tesouro, pelo qual vale a pena empenhar
Missionários da Consolata - Pe. César Avellaneda todo o presente para garantir o futuro. Sugiro a leitura do texto
Rua da Igreja, 70-A - CXP 3253 de Mt 13, 44-50. 
69072-970 - Manaus - AM
Tel. (92) 624-3044 - E-mail: imcmanaus@manausnet.com.br Rosa Clara Fanzoi é irmã missionária e animadora vocacional.

Missões - Junho 2005 7


Guiné Bissau
Incerteza e preocupação
A Guiné Bissau, atualmente sob o comando de
um governo provisório, se prepara para as eleições
gerais, programadas para 19 de junho. O ex-presidente
Kumba Yala, deposto por um golpe militar em 2003,
contesta a data das eleições e reivindica o direito de
ser ainda o verdadeiro chefe de Estado. Outro ex-pre-
sidente Nino Vieira, exilado em Portugal, também se
apresenta como concorrente ao cargo. A Comunidade
dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) da qual faz
parte o Brasil, acompanha a situação com grande
preocupação. O Secretário Nacional da Comissão
Brasileira de Justiça e Paz da CNBB, José Carlos
América Latina Moura foi convidado pelo governo para representar
Mensagem de Bento XVI ao CELAM a CPLP na Guiné Bissau. Sua árdua missão vai ser a
de buscar caminhos de diálogo entre as partes para
VOLTA AO MUNDO

“Há 50 anos, meu venerado predecessor Pio XII, que as eleições decorram em paz e os resultados
acolhendo o desejo expressado pela Conferência Geral sejam aceitos com respeito.
dos Bispos Latino-Americanos, reunidos no Rio de
Janeiro de 25 de julho a 4 de agosto de 1955, instituía Índia
o Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), Nova onda de perseguição
com o objetivo de
apoiar o trabalho Uma nova e virulenta campanha de propaganda,
pastoral dos bispos carregada de discriminação religiosa, foi lançada por
e ao mesmo tem- grupos fundamentalistas hinduístas contra os cristãos
po dar respostas a na Índia: no estado de Orissa (Índia oriental), os fun-
alguns dos graves damentalistas do Vishwa Hindu Parishad (“Conselho
problemas da Igreja Mundial Hinduísta”) pedem as demissões imediatas
na América Latina. de todos os cidadãos de fé cristã empregados na
Em meio século de administração pública, na polícia, em todos os escri-
existência, o CE- tórios e cargos civis. Esse movimento tem o aval de
LAM ofereceu seu autoridades de Orissa que justificam a medida sob o
serviço aos episco- pretexto de que os cristãos gozariam de privilégios. Os
pados dos países meios usados são panfletos, publicidade, caminhadas
da América Latina, e mídia em geral. A Igreja indiana comentou a notícia
ajudando a enfren- por meio do porta-voz da Conferência Episcopal,
tar em harmonia padre Babu Joseph: “não aceitamos este ponto de
de esforços e com vista faccioso e discriminante sobre a concepção da
espírito eclesial, desafios do subcontinente latino- sociedade e da administração pública. Estamos muito
americano e empenhando-se dentro da comunhão preocupados que este tipo de mentalidade possa
episcopal a dar vigor ao que no curso dos anos se se difundir. É contrária à Constituição da Índia, aos
chamou de nova evangelização. Consciente de que direitos humanos fundamentais e ao espírito pluralista
Cristo é o centro da fé católica e que a finalidade da da nação indiana”.
nova evangelização é ajudar que cada pessoa en-
contre Cristo vivo, o CELAM animou intensamente o Vaticano
trabalho do Episcopado Latino-Americano para que Beatificação de João Paulo II
dê testemunho do que significa ser fiel discípulo de
Cristo e alimente a própria fé na escuta da Palavra de O Santo Padre Bento XVI anunciou no dia 13 de
Deus. Já desde sua fundação, o CELAM foi chamado maio sua decisão de dispensar do período de cinco
a dar um particular apoio à promoção das vocações anos de espera, estabelecido pelo Direito Canônico,
para que sejam numerosas e santas. Olhando para para dar início à causa de beatificação de João Paulo
o futuro, o CELAM deverá seguir oferecendo sua II. Com este anúncio, Bento XVI, 42 dias depois da
importante contribuição e decidido apoio neste cam- morte de Karol Wojtyla, respondia ao grito que se
po para ensinar a descobrir os sinais do chamado e apoderou da praça de São Pedro, no Vaticano, em
acompanhar na resposta. (...) Com o firme desejo 8 de abril, dia de suas exéquias: “Santo já!”. O papa
de que esta comemoração reavive nos bispos e em escolheu o dia 13 de maio para fazer o anúncio, dia
todas as Igrejas particulares da América Latina um da memória litúrgica da Virgem de Fátima, àquela que
impulso evangelizador cada vez mais vigoroso e que João Paulo II, como reconheceu em seu testemunho,
a graça do Senhor siga fazendo muito fecundo vosso considerava que devia sua segunda vida, após o
trabalho pastoral, encomendo-vos à Nossa Senhora de atentado que sofreu em 13 de maio de 1981. 
Guadalupe, Mãe da América, e lhes envio de coração
a benção apostólica”. Fontes: Celan, Fides, Zenit.
8 Junho 2005 - Missões
INTENÇÃO MISSIONÁRIA
Para que o sacramento da Eucaristia seja

Arquivo
valorizado cada vez mais como o coração
palpitante da vida da igreja
de Vitor Hugo Gerhard

E
stamos passando por um período da história humana em
que o sagrado perdeu um pouco do seu encantamento.
Vivemos mais voltados para o imediato e imanente,
perdendo a perspectiva do eterno e transcendente.
Isso se deve, em grande parte, a uma antropologia
demasiadamente humanista que desconhece a raiz Padres Michelangelo, Rosano Stofella (in memorian), Valeriano.
religiosa da pessoa e a um espírito técnico-científico que se voltados ao centro da nossa fé, a presença real de Jesus Cristo
pretende absoluto e capaz de dar todas as respostas às inquie- no pão consagrado. O Tabernáculo (Sacrário) precisa continuar
tações da humanidade. sendo o centro e a referência da fé e do culto divino.
No âmbito interno da Igreja, o Concílio Vaticano II ajudou Para que isso se realize, algumas práticas são necessárias,
muito a aproximar as pessoas da experiência religiosa. Entretanto, a saber: a) valorizar mais uma vez a celebração diária da missa,
parece que algumas de suas idéias-chave não foram suficien- nas comunidades, nas casas religiosas e na pessoa de cada um
temente entendidas. Por exemplo, o amor de Deus suplantou dos sacerdotes; b) descobrir de novo o valor da adoração ao
o temor a Deus; a religiosidade popular atropelou a doutrina; Santíssimo Sacramento, reabilitando a sua prática em nossas
a misericórdia infinita do Pai relativizou a noção de pecado; o igrejas; c) abrir mais as portas dos nossos templos, para que
esvaziamento simbólico banalizou a sacralidade. Até mesmo a os cristãos, ao passarem diante deles, possam fazer aquela
celebração diária da missa, tão valorizada até há pouco tempo, salutar visita que nos recoloca em sintonia com Deus; d) oferecer
parece ter-se perdido num certo esquecimento pragmático, onde aos nossos catequistas, os subsídios necessários para que a
o mais importante é a pastoral de resultados e não a evangeli- catequese seja sempre centrada na pessoa de Jesus Cristo e
zação como oferta gratuita da graça de Deus. que assim, leve as crianças e jovens a desenvolverem aquele
Neste ano da Eucaristia, muitos são os textos escritos, a co- amor preferencial por Jesus na Eucaristia; e) buscar sempre de
meçar pelas cartas do papa João Paulo II, de saudosa memória. novo a alegria de ser cristão, homens e mulheres centrados em
Conteúdos não nos faltam para refletir sobre a importância e a Cristo e que, por isso, não perdem a esperança e a ternura. 
centralidade da Eucaristia na vida da Igreja e na vida dos cristãos.
Sem ela, corremos o risco de nos tornarmos um bando de beatos Vitor Hugo Gerhard é sacerdote e coordenador de pastoral
a fazer uma montanha de atos de piedade, mas sem estarmos da Diocese de Novo Hamburgo, RS.

Assembléia-geral anual das POM

A
Assembléia-geral anual das Pontifícias encontro. O desejo que todas as crianças do como centros para crianças órfãs, casas de
Obras Missionárias, celebrada em Lyon, mundo pudessem conhecer Jesus e ter uma acolhimento para meninos de rua, assistência
França, concluiu-se em 13 de maio, vida digna, impulsionou Forbin-Janson, a fun- sanitária aos recém-nascidos. Esses subsídios
na festa de Nossa Senhora de Fátima, dar esta Obra em 1843, para que as mesmas foram distribuídos também para projetos que
com uma concelebração eucarística presidida crianças, com suas orações e suas ofertas, têm por objetivo a formação cristã: construção
pelo Secretário adjunto da Congregação para pudessem ajudar as outras crianças em todo de locais para o catecismo, publicação de textos
a Evangelização dos Povos e presidente das o mundo. Durante o ano de 2004, a Pontifícia religiosos e animação missionária. A África
Pontifícias Obras Missionárias, dom Henryk Obra da Infância Missionária entregou contri- recebeu 52% das ofertas, seguida da Ásia, que
Hoser, que agradeceu vivamente aos 120 dire- buições a cerca de 3 mil projetos apresentados recebeu 40%. Para a América Latina, onde a
tores nacionais de todo o mundo pelo espírito por bispos, párocos, congregações religiosas Obra é muito conhecida popularmente com o
de colaboração e comunhão vivido durante a e outras instituições católicas que trabalham nome de “Infância e Adolescência Missionária”,
reunião. O Secretário-geral da Pontifícia Obra da nas missões. As escolas infantis, local privile- foi destinado, com a Oceania, o restante das
Infância Missionária, padre Patrizio Byrne SVD, giado para a evangelização nos países onde ofertas. O Fundo para as Emergências, cons-
foi o último dos secretários-gerais das quatro a Igreja é minoria, receberam a maior parte tituído pela Obra para fazer frente às calami-
Pontifícias Obras Missionárias a apresentar o das ajudas, a fim de construir novos edifícios, dades naturais ou acontecimentos imprevistos,
seu relatório à Assembléia. A constatação de fazer reformas, comprar gêneros alimentícios durante o ano passado enviou ofertas para os
que são as crianças que mais sofrem nos países e material didático. De acordo com o local, as seguintes países: Sudão, Uganda, Haiti, Peru,
de missão foi repetida várias vezes durante este ajudas foram para projetos de proteção da vida, Iraque e Mongólia (Fonte: Fides). 

Missões - Junho 2005 9


Consolação em tempos
espiritualidade

de medo e aflição
Quando a experiência nos alerta
sobre a presença de falsas
consolações neste momento da
história, devemos abrir os olhos para
não sermos enganados e procurar a
verdadeira consolação.

de Salvador Medina

O
ser humano, de todos os tempos, lugares, culturas
e condições sociais, vive momentos ou situações
de tribulação ou aflição. Do mesmo modo, todos
os povos querem e buscam consolar os tristes. Em
todas as culturas podemos encontrar mecanismos e
pessoas orientadas a enfrentar situações de vazio
ou sem sentido, de pecado, sofrimento e desolação provocadas
por ações ou acontecimentos naturais, políticos, sociológicos,
psicológicos ou morais, todos eles promotores de morte. Nem
sempre é fácil encontrar a consolação apropriada e duradoura,
isto é, a verdadeira consolação: aquela que perdoa e reconcilia,
reconstrói e salva, que levanta e liberta não apenas as vítimas,
mas também os culpados. Aliás, uma economia de mercado como
a que rege este mundo globalizado, facilmente se especializa
em vender falsas e efêmeras consolações.

Fontes da consolação
Durante o mês de maio, dedicado às mães e a Maria,
chegou à memória do meu coração o colo generoso da minha
mãe, o fértil solo cultivado pelas mãos laboriosas do meu pai, o
solene culto celebrado na igreja da minha cidade natal. Nesta
minha memória me encontrei com três presenças femininas e
maternais, três fontes geradoras de autêntica consolação: Maria
Esther, minha boa mãe, a Pachamama, “mãe-terra” na língua
e na consciência dos indígenas andinos, e Maria de Nazaré, A Consolata de Turim
a Imaculada mãe da Consolação divina, do Emmanuel, e da A devoção à Nossa Senhora na cidade italiana de Turim
comunidade de fé, católica e apostólica. sob o título de Consolata - nos conta o padre Luiz Balsan na
Celebrando no mês de junho, dia 20, a festa de Maria Con- sua tese de doutorado - está vinculada ao Santuário que leva o
solata, nós, missionários e missionárias, queremos partilhar mesmo nome e ao Bem-aventurado José Allamano, fundador
este dom, fonte de verdadeira consolação e espiritualidade dos missionários (1901) e missionárias (1910) da Consolata: “O
missionária, com todos os leitores de Missões. santuário da Consolata é para Turim o principal centro de devo-

10 Junho 2005 - Missões


ção mariana. Segundo uma pia tradição, quem teria proposto veio de Nossa Senhora”. Maria Consolata é, portanto, a medianeira
ao povo turinense a devoção à Nossa Senhora Consolata seria e inspiradora deste projeto que vem de Deus (pág.136).
São Máximo, bispo de Turim, no final do século IV. O quadro, Para os missionários e missionárias que levam o nome
escondido nos subterrâneos da igreja de Santo André durante da Consolata, o estilo maternal de Maria qualifica e determina
o período iconoclasta (de perseguição e destruição de imagens o estilo, a espiritualidade, o método ou maneira de realizar a
sagradas), teria sido prodigiosamente encontrado pelo cego missão. Ela é modelo e guia, inspiradora e mãe.
de Briançon em 1104. Estudos recentes afirmam que uma tal Segundo a tradição, ainda do mesmo fundador, se trata de
versão dos fatos carece de fundamentação histórica e levantam anunciar a alegria da Boa Nova sem descuidar da dignificação
a hipótese de que o culto à Consolata, sob o originário título de dos ambientes, do bem-estar e da felicidade das pessoas e dos
Nossa Senhora da Consolação, se tenha gradualmente desen- povos, buscando sempre a libertação de todas as tristezas e
volvido junto à igreja de Santo André, a partir da chegada dos sofrimentos, dos medos e das opressões, das injustiças e dis-
monges beneditinos, provindos da abadia de Novalesa, fugidos criminações, do pecado e da morte fatal. Neste novo milênio,
da invasão dos sarracenos” (pág. 80). segundo centenário para os missionários da Consolata, escutando
O Bem-aventurado José Allamano, que enquanto dirigia o o grito de pessoas, povos e continentes inteiros, da terra e toda
Santuário da Consolata de Turim fundou os Institutos dos missio- a criação, a consolação vem sendo refletida, orada, assumida
e concretizada como projeto de justiça e paz e integração da
criação. Está em parceria ou aliança com outras forças vivas,

Jaime C. Patias
civis e religiosas, públicas e privadas, que promovendo os direitos
da pessoa, dos povos e nações, procuram e constróem o Reino
de Deus já aqui na história, abertos à plenitude da consolação,
quando o Criador fará novas todas as coisas: “enxugará toda
lágrima dos olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem
grito, nem dor” (Ap 21,4). Esse mundo novo, sem a presença do
mal será definitivo e integral: “não haverá mais noite: ninguém
mais vai precisar da luz da lâmpada, nem da luz do sol. Por-
que o Senhor Deus vai brilhar sobre eles, e eles reinarão para
sempre” (Ap 22,5).

A Missão como Consolação-Libertação


A consolação estará sempre relacionada com a tribulação,
como a medicina com a enfermidade, a água com a sede ou
a luz com as trevas. Os missionários e missionárias, ministros
da consolação, o sabem de cor: se aproximam, ou melhor, se
tornam próximos de pessoas ou povos em aflição, convivem e
padecem com eles as tribulações, extraem força da sua espiri­
tualidade para resistir solidariamente e infundir ânimo na hora do
sofrimento e esperança no momento da desesperação, celebram
comunitariamente a liturgia da vida e acompanham os passos e
caminhos da libertação com realismo e esperança.
Muitas vezes enfrentam a difamação, a perseguição e até
a morte por amor e fidelidade à Missão. Como testemunhas da
Páscoa, anunciam com a palavra e com a vida as bem-aven-
turanças da consolação-libertação e se fazem discípulos do
Crucificado–Ressuscitado. É o que acontece com os missionários
que acompanham os povos indígenas e afro-descendentes no
nosso continente ou os grupos étnicos e minorias discrimina-
das em qualquer lugar do mundo, os migrantes forçados ou
desterrados, as vítimas das injustiças e da violação dos direitos
fundamentais, os flagelados pelas epidemias contemporâneas
como a fome, o vírus HIV e outras doenças fatais, os pobres
das periferias das grandes cidades e os esquecidos ou aban-
donados do interior ou do campo, os sem-terra e os sem-teto,
as vítimas da natureza depredada e poluída, das catástrofes
Procissão durante missa naturais, das guerras e das diferentes violências, os presos e os
na Paróquia Nossa Sra. torturados, os escravos do pecado, da droga e da prostituição,
da Penha, Jd. Peri, SP. os sem-Deus e sem-amor. 

Salvador Medina é sacerdote missionário e pároco da Paróquia São Brás, Salvador, BA.
nários e missionárias da Consolata, estava convencido que eles
não eram obra sua, mas obra querida por Deus: “chamam-me
fundador, mas não fui eu que fundei: foi a Consolata”. Ainda mais,
Para Refletir
falando aos missionários dizia: “esta casa pertenceu ao Senhor 1. Tentemos identificar, pessoalmente ou em grupo, pessoas ou comunidades que, como Maria,
desde o início, e é mesmo sua como um campo é do proprietário; ao pé da cruz ou nas bodas de Caná, buscam viver a missão de “consolar os que choram”
portanto, não dizei mentiras afirmando que fulano ou sicrano a com a consolação verdadeira, e desmascarar os falsos missionários da economia de mercado,
fundou. Não, não, foi Nossa Senhora que a fundou e o princípio vendedores de ilusórias consolações.

Missões - Junho 2005 11


Bento XVI cidadão universal
cidadania

A Boa Nova de Jesus Cristo é esperança para a humanidade.


É necessário romper fronteiras e combater as injustiças.
de Alfredo J. Gonçalves desrespeito às populações indígenas e negras, a omissão diante
dos ataques a minorias étnicas e ao povo de rua – eis algumas
situações, entre outras, que exigem uma voz firme e vigorosa

E
na preservação da integridade física e da dignidade humana.
ntre a morte de João Paulo II e a eleição de Bento XVI, A Igreja é chamada a ser voz e vez daqueles que têm aviltada
o mundo assistiu a uma extraordinária explosão de fé. sua condição de filhos e filhas de Deus.
O primeiro, ao partir, deixa uma herança de palavras
e gestos marcados pela busca da paz. O segundo, ao Caminho do diálogo
ser eleito, recebe a missão de dar continuidade a esses E ainda, diante dos “mil rostos do outro”, num mundo cada
esforços para construir a cultura da solidariedade. Do vez mais marcado pelo multiculturalismo, impõe-se o caminho do
ponto de vista social, o que esperar da Igreja Católica nestes diálogo. Além do ecumenismo entre os cristãos, é preciso abrir
tempos em que o pluralismo étnico e religioso exige um diálogo espaço para o intercâmbio com as várias religiões. Afinal, como
mais aberto com o outro, o estranho, o diferente? insiste a doutrina do magistério católico, no coração de cada ser
Em primeiro lugar, o mundo e os cristãos esperam que o novo humano e no coração de cada cultura há sementes do Verbo.
papa siga o trabalho de romper fronteiras. As crises da moder- Não basta pregar a unidade na diversidade, não basta a retó-
nidade, hoje vivenciadas rica do discurso! É pre-
por todo o planeta, tendem ciso criar canais onde a

Siciliani-Gennari/sir
a acirrar as barreiras e verdade não seja uma
os ódios entre pessoas, imposição, mas fruto do
re­giões e povos. O pre- diálogo franco e do en-
conceito contra o imigrante contro verdadeiro.
converte-o facilmente em João Paulo II conse-
inimigo e em motivo de guiu fazer da figura do
preocupação. A legislação papa um cidadão uni-
migratória torna-se mais versal. Aí está o maior
rígida, as portas se fecham desafio do novo pontífice:
ao diferente. Crescem as tornar-se, simultanea-
atitudes discriminatórias mente, memória dessa
e os movimentos xenófo- imagem sem fronteiras
bos para com os “de fora”. da solidariedade e da paz
Como dar-se conta de que e profecia no combate
o estrangeiro, longe de a uma ordem mundial
ser um “problema”, pode marcada pela guerra,
ser uma oportunidade de pela miséria e pela fome.
crescimento recíproco? As Trata-se, no fundo, de
diferenças abrem novas potencialidades de enriquecimento. traduzir a Boa Nova de Jesus Cristo em esperança para as
Se é necessário romper fronteiras, é também urgente combater pessoas e povos mais ameaçados pelo império do mercado
as injustiças e as assimetrias que, de ano para ano, aprofundam e total. Levanta-se por todos os lados, especialmente nos porões e
agravam o abismo entre pobres e ricos. O crescimento econômico subterrâneos dos países empobrecidos, o grande imperativo de
e o progresso tecnológico não representam o desenvolvimento uma nova ordem mundial, onde a economia esteja subordinada
integral. O modelo neoliberal revela-se concentrador de riqueza, à vida em suas mais variadas formas.
por um lado, excludente e restritivo, por outro. Desemprego, Em síntese, espera-se do papa que seja um cidadão universal,
violência e migrações em massa são os resultados negativos pavimentando a estrada das relações internacionais, com vistas
desse crescimento viciado e desigual. O desafio aqui é chamar a que todos os seres humanos tenham direito a uma cidadania
os Estados ao seu compromisso com o bem-estar social e com digna na face da terra. E não só os seres humanos, mas todos
a defesa da vida em primeiro lugar. Uma terceira expectativa é os seres vivos, na construção de uma convivência justa, fraterna
quanto à defesa dos direitos humanos. O tráfico internacional e sustentável com o planeta azul. 
de seres humanos com vistas à exploração sexual, o trabalho
infantil e escravo, os conflitos bélicos com suas levas de refugia- Alfredo J. Gonçalves é sacerdote carlista, assessor da
dos, os maus-tratos a presos políticos e prisioneiros comuns, o Comissão para o Serviço da Caridade, Justiça e Paz – CNBB.

12 Junho 2005 - Missões


O sim de uma Oblata

Testemunho
Ir. Rosimara Maria

Arquivo Pessoal
Zamarchi, é formada em
Pedagogia e Teologia.
Dirige o centro educacional
das Irmãs Oblatas em
Cascavel, Paraná.
de Rosimara Maria Zamarchi

S
ou filha de Iracema e Zeferino Zamarchi. Nasci em Sau-
dade do Iguaçu, Paraná, em 30 de setembro de 1971.
Desde muito cedo senti o impulso vocacional, a partir
das missões Redentoristas. Mas, aos 16 anos de idade
fui questionada por uma irmã Oblata de Jesus e Maria:
Ir. Rosimara (2ª esquerda) com colegas de congregação.
“Você não quer ser irmã?” Imediatamente respondi que
não. Mas, ficou uma grande inquietação. Não consegui ser mais a irmãs, mas, já sentiam a grande necessidade da vida ativa, a fim
mesma Rosimara depois daquela pergunta. Falei com minha mãe de atender as crianças da escola. Com a Segunda Guerra Mun-
sobre a possibilidade de ir para o convento. As irmãs moravam dial a Congregação reduziu-se ao número de oito consagradas.
na minha cidade. Comecei a dar catequese e os encontros de Restara apenas a casa. Tudo o mais fora destruído. As irmãs,
formação eram na casa delas. Fui me apaixonando por aquelas movidas pelo Espírito Santo, refundaram a Congregação.
irmãs; me sentia bem ali e quanto mais ficava, mais queria ficar.
Participei de retiros e acompanhamento, e após um ano, decidi Crescimento e expansão
me tornar uma delas. Depois da Guerra, a Congregação se expandiu pela Itália.
Alargou as tendas e chegou ao Brasil em 1985 e em 1995, à
Amadurecimento vocacional periferia de Buenos Aires. Estamos presentes na Itália, Brasil
Não tinha consciência do que era vocação. Após um ano fui e Argentina. O Carisma é fazer a vontade de Deus e a espiri­
transferida para Cascavel e comecei os estudos. Terminado os tualidade é centrada em Cristo e Maria, com especial referência
cinco anos de formação, recebi a missão, junto com outras duas ao aspecto oblativo do “Sim” de Jesus e Maria, vivido no espírito
irmãs, de abrir nossa primeira casa na Argentina. Permaneci lá de doçura de São Francisco de Sales. Missão: escolas e todas
por dois anos. Voltei ao Brasil a fim de preparar a emissão dos as pastorais existentes onde estamos presentes, com dedicação
meus votos perpétuos. Após seis meses, fui transferida para particular à juventude, através da formação humana e cristã.
a Itália a fim de aprofundar o conhecimento da Congregação. Vivemos a missão na total doação expressa na mesma palavra:
Permaneci no país por cinco anos, quando cursei Teologia da oblata. Jesus e Maria foram os primeiros oblatos do Pai. Como
Espiritualidade na Universidade São Tomás de Aquino, em Roma, Jesus e Maria, a Oblata fundamenta a sua missão nas palavras
e fiz experiência apostólica na Sardenha. Em 2001 voltei ao Brasil do Evangelho: “meu alimento é fazer a vontade do Pai que me
e continuo a minha oblação, dirigindo nosso centro educacional enviou e realizar a sua obra” (Jo 4, 34).
em Cascavel, Paraná. Oblação não é uma palavra, mas, uma experiência a ser feita.
Posso dizer com minha vida que é belo ser oblata. Vale a pena.
Quem são as Oblatas É o Senhor que se serve de mim como instrumento para levar
A Congregação das irmãs Oblatas de Jesus e Maria foi fun- outros ao seu conhecimento. Minha missão principal consiste
dada em 1727, por Maria Maggiori em Albano Laziale – Roma. em levar as crianças e jovens ao conhecimento do verdadeiro
Na cidade onde vivia, a maior parte da população era pobre e Mestre, Jesus. Esta é uma missão urgente em nossa sociedade.
trabalhava na roça. Ninguém se preocupava com as crianças A modernidade parece destruir os valores das famílias. Todos
e jovens. Amante da Eucaristia, Maria foi movida pelo Espírito correm em busca de uma posição melhor, mas, se esquecem
Santo a acolher crianças e dar-lhes uma formação, tirando-as de que a melhor posição é a de ser Filho amado de Deus. 
do abandono e da rua. As Congregações que nasciam no século
XVIII, eram de vida contemplativa e assim foram nossas primeiras Ir. Rosimara Maria Zamarchi é irmã Oblata de Maria e Jesus.

Missões - Junho 2005 13


No duelo, Deus venceu
Testemunho

de Rosita Crippa Com 92 anos de idade e 66 de vida


religiosa, Ir. Rosita Crippa testemunha

P
assaram-se os sonhos e as ilusões da adolescência. que o amor é a mola propulsora da
Comecei a sentir forte o apelo e a vontade de partilhar
as riquezas da minha fé cristã, fora do meu país, partir vida e da juventude.
e anunciar a Boa Nova a todos os povos. Procurei e
recebi do meu diretor espiritual informações sobre
vários Institutos. Mas, não me identifiquei com nenhum ambiente onde encontrava segurança e levava uma vida tran-
deles. Finalmente, ele me deu uma revistinha dos missionários qüila? Para aumentar as dúvidas, vozes familiares sussurravam:
da Consolata onde encontrei a resposta que buscava: uma Con- “não nos deixes. Por que ir para tão longe? O que lhe falta?” O
gregação missionária. Iluminação especial do Espírito Santo? duelo íntimo entre o amor natural e o amor de Deus, causou-me
Sem hesitar, fui ao encontro das Irmãs na vizinha cidade de grande sofrimento. Rezei muito. Obtive forças para superar a
Montevecchia. Senti-me tomada de grande alegria. grande batalha na missa diária e nas palavras da Escritura: “Se
alguém vem a mim, sem me preferir a seu pai, sua mãe, sua
Nas lutas e vendavais mulher, seus filhos, seus irmãos, suas irmãs, e até sua própria
Logo em seguida entrei em contato com irmã Nazarena, vida, não pode ser meu discípulo” (Lc 14, 26). Por graça espe-
promotora vocacional, e marquei a data de ingresso no Insti- cial, Deus venceu! Chegou assim o dia 30 de junho de 1936.
tuto das Missionárias da Consolata. Confiei aos meus pais a Acompanhada por meu pai e alguns familiares, fui para Turim.
minha decisão e obtive a almejada resposta: “se essa for a tua Histórica viagem: estranha sensação de alegria e sofrimento
vocação, Deus te abençoe!” Até aqui tudo correra relativamente tomou conta de mim, mas superei também esse momento de
bem. Começaram, no entanto, as tempestades internas, a luta doloroso desapego.
e a dor da separação. Como deixar os pais, a família que tanto
amava? Deixar a paróquia, as amizades? Deixar todo aquele Na aventura de Deus
No Instituto lancei-me logo, sem reservas, na aventura que
Arquivo Pessoal

Deus e eu quisemos. Procurei conhecer os passos a serem feitos


para viver serena e seriamente a nova vida. Nos primeiros anos
de formação lutei também com a frágil saúde que comprometia
minha profissão religiosa. Mas, atingi a meta. Entre temor e
tremor, entreguei-me toda a Deus e à família Consolata. Eram
os anos da Segunda Guerra Mundial. Em meio ao pânico e na
insegurança, concluí o Magistério. O desejo de partir para o Ad
Gentes tornava-se sempre mais forte. Mas, passei anos de ex-
periência em ambientes de pós-guerra: hospital militar, jardim de
infância para filhos de militares, orfanato e campos de refugiados.
Ali recebi o mandato missionário para o Brasil.
Iniciei minha missão como auxiliar na formação do primeiro
grupo de jovens brasileiras que queriam ser missionárias da Con-
solata. Por vários anos permaneci acompanhando os diferentes
estágios, desde as noviças até as jovens vocacionadas. Esse
ambiente de juventude sã, vibrante, em plena florescência, atraída
pelo grande ideal da vocação missionária, me empolgava. Assim,
superei dificuldades como a grande pobreza em que vivíamos e
os limites pessoais frente à tarefa da formação. A esperança nas
novas forças de Evangelização me dava ânimo, coragem e deci-
são para enfrentar, superar momentos críticos. Sempre acreditei
que o coração das pessoas se deixa tocar pelo amor. Amor que
escuta, acolhe, aconselha e transborda na caridade. Amor a Deus
e à sua Palavra, expresso no serviço fraterno. Hoje procuro viver
a missão servindo humilde e atenciosamente às minhas irmãs na
Casa para idosas e doentes em São Miguel Paulista, SP. Faço,
como no nascer de minha vocação, tudo com amor e por amor.
Sinto muita paz, que partilho e desejo a todos. 

Rosita Crippa é irmã missionária da Consolata.

14 Junho 2005 - Missões


Jaime C. Patias

Quem é o leigo hoje?


Qual o seu lugar na
Igreja e no mundo?

A Missão
Silvio Testa, leigo
missionário da Consolata,
fala à Assembléia
capitular IMC reunida em
São Paulo.

dos leigos (conclusão)


de Luiz Balsan e Lírio Girardi

N
os artigos precedentes, procuramos trilhar os caminhos
Vemos ainda um caminho da história, vendo por onde andou a compreensão da
vida leiga e sua efetiva participação na Igreja. Vimos
a percorrer para os como, de uma participação ativa nos primeiros sécu-
los do cristianismo, passou-se a um longo período
leigos e leigas dentro da em que os leigos não receberam o reconhecimento
e valorização que lhes era devido. Novos ares se respiram na
Igreja. Certamente uma Igreja, sobretudo a partir do Concílio Ecumênico Vaticano II. Uma
nova forma de entender a Igreja; uma nova compreensão da
crescente participação em ação do Espírito Santo; uma mais ampla teologia do batismo e
uma nova forma de ver a relação sua com o mundo, são alguns
todos os níveis e setores, dos principais fatores que devolvem ao leigo seu lugar na Igreja.

farão com que sempre Algumas iniciativas de destaque


Na segunda metade do século XX, surgiram comitês internacio-
mais o Corpo de Cristo se nais para o apostolado dos leigos; um pouco mais tarde foi criada
a Associação de Teólogos e Teólogas Leigos (ATTL); em 1976 foi
enriqueça. criado o Conselho Nacional dos Leigos do Brasil, com o objetivo
de buscar a identidade e missão do leigo na Igreja e no mundo;
o Sínodo dos bispos de 1987, além de ter sido dedicado ao leigo
com o tema “Vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo”,
contou com uma qualificada representação de leigos, homens e
mulheres, que deram uma preciosa contribuição aos trabalhos

Missões - Junho 2005 15


Fotos: Jaime C. Patias

Celebração na Paróquia Nossa Senhora da Penha, Jd. Peri, SP.


do Sínodo, como foi publicamente reconhecida na homilia de pécie de intromissão em algo que não seria de sua competência,
encerramento: “Demos graças pelo fato de que, no decorrer um novo clima começava a ser respirado de modo particular a
do Sínodo, pudemos, não só alegrar-nos pela participação partir do Vaticano II. Neste mesmo Sínodo, já mencionado, os
dos leigos, mas, ainda mais porque o desenvolvimento dos bispos, reconheceram, nesta presença ativa e enriquecedora
debates sinodais nos permitiu escutar a voz dos convidados, os dos leigos, uma concreta manifestação do Espírito Santo que
representantes do laicado, provenientes de todas as partes do continuava a rejuvenescer a Igreja, suscitando entre eles novas
mundo, dos diversos países, e nos permitiu aproveitar as suas energias de santidade e novas formas de participação. Como
experiências, os seus conselhos, as sugestões que brotam do prova disto, os bispos mencionavam o novo estilo de colaboração
seu amor pela causa comum” (CL 4). O fruto
deste Sínodo foi a Exortação Apostólica de
João Paulo II sobre os leigos – Christifideles
Laici – que tem como tema a “Vocação e
missão dos leigos no mundo”. Outra iniciati-
va significativa aconteceu em novembro de
2001, quando, por sugestão do cardeal Aluísio
Loscheider, realizou-se a primeira Conferência
dos Leigos Cristãos do Brasil. Esta série de
iniciativas elencadas – e sem dúvida a lista
poderia ser bem maior – mostra como os
leigos, progressivamente, vão tomando parte
ativa na vida da Igreja, seja a nível de partici-
pação no apostolado, seja como contribuição
própria para a reflexão teológica e pastoral.

Frutos da ação do Espírito


Se, como vimos, ainda na primeira parte do
século XX, a vontade dos leigos de participar
mais ativamente e, com certa autonomia, no
apostolado da Igreja, era vista como uma es- Comunidade São José Operário - Heliópolis, SP.

16 Junho 2005 - Missões


entre sacerdotes, religiosos e fiéis leigos; a participação ativa
dos leigos na liturgia, no anúncio da Palavra de Deus e na ca- Missão e ministério dos leigos
tequese; a multiplicidade de serviços e de tarefas confiadas aos “Vemos com alegria e esperança a atuação de inúmeros
leigos e por eles assumidas; o radioso florescimento de grupos, leigos que, com consciência crítica, testemunham o Evangelho
associações e movimentos de espiritualidade e de compromis- no seu ambiente familiar, no trabalho, na política e na parti-
sos laicais; a participação cada vez maior e significativa das cipação firme e eficaz nos mais diversos setores da sociedade
mulheres na vida da Igreja, e o progresso da sociedade (CL 2).
civil. Persistem, porém, parcelas significativas do Povo de Deus
marcadas, ainda, pela dicotomia entre fé e vida e que se dei-
Algumas preocupações
xam facilmente influenciar pelo ambiente e cultura dominantes”
Ao mesmo tempo em que reconheciam este renovado empenho
e participação eclesial do leigo, como uma forma com que o Espírito (CNBB, Missão e ministério dos cristãos leigos e leigas, 130).
continua renovando a Igreja, os bispos demonstraram também
algumas preocupações. A primeira delas é o fato de reconhece- Christifideles Laici
rem, por parte dos leigos, um interesse excessivo pelos serviços “A comunhão eclesial, já presente e operante na ação
e tarefas eclesiais, a tal ponto de esquecerem, ou deixarem em do indivíduo, encontra uma expressão específica no operar
associado dos fiéis leigos, isto é, na
ação solidária que eles desenvolvem
ao participar responsavelmente na vida
e na missão da Igreja.
Nestes tempos mais recentes, o
fenômeno da agregação dos leigos
entre si assumiu formas de particular
variedade e vivacidade. Se na história
da Igreja tal fenômeno representou
sempre uma linha constante, como o
provam até aos nossos dias as várias
confrarias, as ordens terceiras e os
diversos sodalícios, ele recebeu, toda-
via, um notável impulso nos tempos
modernos que têm visto o nascer e o
irradiar de múltiplas formas agregati-
vas: associações, grupos, comunidades,
movimentos. Pode falar-se de uma
nova era agregativa dos fiéis leigos.
Com efeito, ao lado do associativismo
tradicional e, por vezes, nas suas
próprias raízes, brotaram movimentos
e sodalícios novos, com fisionomia e
finalidade específicas: tão grande é
a riqueza e a versatilidade de recur-
sos que o Espírito infunde no tecido
eclesial e tamanha é a capacidade de
iniciativa e a generosidade do nosso
laicado” (CL 29).

por Cristo para toda a humanidade se


torne presente no mundo, através de
estruturas justas, onde todos possam ter
o seu lugar na sociedade e sua dignidade
reconhecida. É lá onde ele vive que está
sua missão primeira. Podemos dizer
que a sociedade está permeada pela
presença de cristãos leigos. É sobretudo
Ministros da Eucaristia, Santuário de Santa Teresinha, São Manuel, SP. através deles que o Evangelho pode
segundo plano, suas responsabilidades específicas no mundo influenciar fortemente nos destinos da sociedade, tornando-se
profissional, social, econômico, cultural e político. Com isto os sal e luz do mundo. A segunda preocupação manifestada pelos
bispos não querem, absolutamente, inibir uma presença ativa e bispos é apresentada por eles como uma indevida separação entre
co-responsável do leigo na Igreja, mas querem lembrar sim que o a fé e a vida, entre a aceitação do Evangelho e a ação concreta,
empenho na comunidade eclesial – nas pastorais ou movimentos nas mais variadas realidades temporais e terrenas. Com isto os
– não deve levar o leigo a se esquecer que o seu empenho pri- bispos querem dizer que nem sempre a fé professada na Igreja
meiro e mais específico é o de fazer com que a salvação trazida está sendo levada suficientemente a sério. A Conferência do

Missões - Junho 2005 17


Fotos: Jaime C. Patias
efetiva participação na
vida e na história da
própria comunidade.
Se todos os batiza-
dos partilham de uma
mesma dignidade e da
co-responsabilidade
pela vida da Igreja e
pela sua missão, certa-
mente terão também o
direito de expressarem
a sua forma de pensar
e de participar ativa-
mente nas decisões
comunitárias. Olhando
para trás, vemos um
caminho percorrido.
Olhando para o pre-
sente, vemos ainda um
caminho a percorrer.
Certamente uma cres-
cente participação dos
leigos em todos os ní-
veis e setores da Igreja:
na liturgia, na pastoral,
na reflexão e nas to-
madas de decisões,
Celebração na comunidade São Marcos, Pedra Branca, SP.
Episcopado Latino-

IMC Coréia
americano falou da ne-
cessidade de uma Nova
evangelização para su-
perar o divórcio entre fé e
vida que leva a existência
de clamorosas situações
de injustiça, desigual-
dade social e violência,
num continente que se
professa cristão (SD).

Alguns desafios
No documento “Mis-
são e ministério dos
cristãos leigos e leigas”
(CNBB no 62), os bispos
do Brasil afirmam que a
noção de Igreja como
Povo de Deus, trazida
pelo Concílio Vaticano II,
leva a reconhecer a pro-
funda unidade, a comum Grupo de leigos com missionários em Seul, Coréia do Sul.
dignidade de todos os batizados e a participação de todos na vida através dos conselhos, farão com que sempre mais o Corpo de
da Igreja e na co-responsabilidade pela missão. Isto nos mostra Cristo se enriqueça com a diversidade de carismas distribuídos
como as coisas evoluíram do ponto de vista da teologia (70). O livremente pelo Espírito a todos os membros do povo de Deus. 
grande desafio agora é fazer com que toda esta nova mentalidade
se torne concreta na vida de cada comunidade. Certamente os Luiz Balsan é missionário, professor de Espiritualidade e doutor em Teologia.
longos séculos em que predominou uma mentalidade clerical na Lírio Girardi é missionário e pároco da Paróquia Santa Margarida, Curitiba, PR.
Igreja ainda pesam nos costumes e nas convicções, conscientes
ou inconscientes de cada um. Encontramo-nos, portanto, diante
da necessidade de criar um novo jeito de ser Igreja. Não há
Para Refletir
dúvidas que foram feitos passos significativos também a nível 1. Como você vê a participação dos leigos na Igreja e na sociedade hoje?
prático. Os Conselhos de Pastoral Paroquial ou comunitários,
2. O que mudou na Igreja e que favorece uma melhor participação dos leigos?
amplamente difundidos nas paróquias do nosso país, sem dúvida
são instrumentos muito eficientes, quando realmente se quer 3. O que ainda precisa mudar na Igreja para que os leigos se sintam realmente partícipes da
levar a sério esta nova proposta de ser Igreja. É uma forma de sua vida e da sua missão?

18 Junho 2005 - Missões


missão
daHoje
Uma flor no sertão

Missão
história
O Ministério da Educação reconheceu em pirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade,
promoção cristã e vivência fraterna.
abril, o Instituto Superior de Teologia e E a flor desabrochou
Pastoral de Bonfim, na Bahia. Transcorridos dois semestres, quarenta alunos e alunas, todas
as semanas, de segunda à sexta-feira, das 19h00 às 22h00, de
inverno a verão, com seca e com chuva, pontualmente participa-
de Ramón Cazallas Serrano ram das aulas. Provenientes de vários municípios e paróquias,
se entusiasmavam em penetrar nos mistérios de Deus, do ser

A
humano e do mundo. A partir disso, nos perguntamos: por que
diocese de Bonfim em pleno semi-árido do Estado da não tentar o reconhecimento civil da nossa Teologia?
Bahia foi constituída há mais de setenta anos, gerando Começamos a preparar toda a papelada, que não foi pou-
do seu antigo território outras tantas, ficando Bonfim ca nem fácil. A persistência teve o seu peso. Em fevereiro do
como uma grande diocese com situações humanas, corrente ano, o Ministério de Educação enviou dois professores
sociais, políticas e religiosas próprias de uma Igreja de para verificar a verdade do nosso projeto e constatar todas as
fronteira. Grandes eram os desafios em todas as áreas,
agravados pelas enormes distâncias e os imensos problemas

Arquivo ISTEPAB
sociais que a Igreja tinha que enfrentar, como o latifúndio, que
excluía o povo. Mas o nordestino não se deixa abater facilmen-
te: resiste às adversidades, tem esperança no futuro e alegria
em todas as situações, é pobre como a terra seca que se torna
grávida de vida quando caem quatro gotas de água e feliz para
dançar sem limites nas suas festas de São João...

Uma bonita flor no sertão


A presença das comunidades eclesiais foi sempre um incentivo
no trabalho pastoral, no saber humano e teológico e na luta pelos
próprios direitos. A diocese investiu muito para formar os seus ani-
madores e animadoras, catequistas, lideranças das comunidades
e agentes de pastoral. Os leigos e leigas são o nosso capital na
evangelização. A Igreja cuidou com carinho e muitas iniciativas
da formação humana, social e religiosa. Mas eles e elas queriam
mais. Não se conformavam com a preparação imediata para as
tarefas ordinárias da evangelização. Queriam saber e conhecer
mais sobre Deus, o homem e o mundo. Existem desafios novos,
desde o trabalho pastoral até a ação transformadora e política,
Aula inaugural do ISTEPAB.
que necessita de mais conhecimentos. Surgiram perguntas e
questionamentos: por que nós, leigos e leigas não podemos condições logísticas, programas e professores. Ficaram entu-
estudar Teologia a nível superior? Por que temos que viajar por siasmados com o projeto e com toda a estrutura. Admirados e
muitos quilômetros para aprofundar mais a nossa fé? Será que entusiastas porque se tratava do primeiro centro de Teologia da
nós, pobres, não temos o direito de ter uma formação superior, Igreja Católica para leigos que era apresentado no Ministério de
só os padres podem estudar Teologia? Estas perguntas eram Educação para ser autorizado. O informe enviado a Brasília foi
feitas por jovens e adultos, pessoas engajadas nas comunida- altamente positivo. No dia 1º de abril de 2005, com Portaria do
des, nas pastorais, nas lutas sociais. Estavam disponíveis para Ministro da Educação, o nosso Instituto Superior de Teologia e
percorrer as estradas do sertão para estudar e viver a Palavra, Pastoral de Bonfim foi autorizado como Faculdade de Teologia
questionar-se sobre a sua vida e atividade... a promover estudos de nível superior.
Bonfim é uma Igreja a caminho. Começamos a ver as pos­ O sertão tem a sua faculdade de teologia para leigos. Mais
sibilidades e experiências existentes. E no ano de 2001 iniciamos uma vitória dos pobres e para os pobres. Não só os padres vão
a caminhada. Nasceu o Instituto Superior de Teologia e Pastoral aprofundar seus estudos, mas também homens e mulheres
de Bonfim (ISTEPAB), com a missão institucional de: poderão sair por estas “caatingas” falando e descobrindo novos
a) formar cristãos com espírito crítico e criativo, capazes de caminhos de teologia que nascem com o povo. O sertão mais
atentar para a realidade em todas as suas dimensões, de inter- uma vez dá uma flor, uma de tantas, mas muito bela, esperando
pretar essa realidade e de contribuir para a sua transformação que outras flores desabrochem até convertê-lo num jardim. 
à luz do Evangelho;
b) contribuir para o desenvolvimento de seus alunos e alunas Ramón Cazallas Serrano é missionário e professor do
nas dimensões humana, intelectual, social, cristã e pastoral, ins- Instituto Superior de Teologia e Pastoral de Bonfim (ISTEPAB).

Missões - Junho 2005 19


Destaque do mês

Desafios no camin
de Valeriano Paitoni segmentos da Igreja e da sociedade. Alguns deles gerando
até conflitos significativos dentro da própria Instituição. Isto
não deve nos assustar, mas, sim ser motivo de incentivo para
continuarmos um sério discernimento e um sincero diálogo com

O
todas as forças da Igreja e da sociedade com o único intento
papa João Paulo II nos deixou uma herança pastoral de buscar a verdade.
marcada, sem dúvida alguma, por uma densa ati- Os Institutos Missionários e os que estão diretamente ligados
vidade missionária com as suas inúmeras viagens, à realidade da missão, nos convencemos cada vez mais que o
mergulhando em culturas tão diferentes e povos que anúncio da Boa Nova significa mergulhar e permanecer na vital
recebiam do sucessor de Pedro a mesma mensagem dinâmica da “novidade” que o mundo vive. Por outro lado, não
do Evangelho de Jesus, o Cristo. devemos ter medo da cristologia que nos apresenta um Senhor
Assim como os Apóstolos, que a partir de Jerusalém se sempre presente e atuante na história da humanidade e que
espalharam pelo mundo afora, João Paulo II, a partir de Roma, nos revela na essência como deve ser o agir missionário, isto
foi pelo mundo afora inaugurando um novo estilo de pontificado, é, ser luz e sal para todas as gerações. Uma luz não estática,
caracterizado por uma dimensão missionária que buscava, antes mas penetrante em todo tecido social do ser humano, das suas
de mais nada, o anúncio explícito da pessoa de Cristo com o culturas, seja nos aspectos que produzem a cultura da vida
objetivo de unir os povos sob a bandeira da paz. como os que geram a cultura da morte. Um sal que não tira os
sabores diferentes que compõem a riqueza da humanidade,
Inculturação mas que acrescenta e corrige quando necessário.
O grande desafio desta missão logo apareceu na sua
complexidade: a inculturação da mensagem evangélica num Pistas para um novo dinamismo
mundo em vertiginosa mudança de culturas, valores humanos Assim como nos impressionou o fenômeno do aglutinamento
e significativas descobertas científicas. ao redor de João Paulo II, devemos agora ter a coragem de
Foram louváveis o esforço, a dedicação e a coerência que analisar calmamente este fenômeno para conhecer os motivos
acompanharam João Paulo II ao longo do seu pastoreio. É com- verdadeiros de tanta movimentação; e despojados do inevitá-
preensível que numa época tão complexa, o seu pontificado deixe vel véu de triunfalismo e sentimentalismo, indicar pistas de um
muitos desafios sem solução, outros velados ou escondidos na novo dinamismo missionário para Bento XVI. O grande desafio
segurança da tradição nem sempre compreendida por alguns ameaçador de uma nova evangelização é, sem dúvida alguma

Arturo Mari / AFP / Getty Images

20 Junho 2005 - Missões


nho de Bento XVI

Filipo Monteforte / AFP / Getty Images


Descentralização, inculturação e
inclusão dos marginalizados são os
maiores desafios para o novo papa.

Vitor Toniolo
a tentação de nos refugiarmos num fundamentalismo estéril e
arcaico, sustentado por inocentes desejos, como o de procurar
qualidade e não quantidade. Se por um lado isto parece um
seguro caminho para a santidade, vocação comum de todo ser
humano, por outro, pode se tornar uma séria ameaça ao diálogo
ecumênico e inter-religioso e sobretudo o diálogo com as mino-
rias, que hoje são as que mais sofrem por se sentirem rejeitadas
ou parcialmente acolhidas pela Igreja, num discurso sofista e
às vezes incoerente. No meio de tantas bandeiras agitadas na
praça de São Pedro, como sinal de comunhão, faltavam as dos
que a sociedade e a Igreja ainda marginalizam, numa clara ou
velada determinação. Com a vontade de despertar e cultivar uma
cultura autenticamente missionária, diríamos que o alvo do novo
ardor missionário, que cada cristão deve assumir, não poderia
mais ser os territórios missionários, mas as novas e gritantes
“situações missionárias” que nem sempre temos a coragem de
enfrentar, pois nos questionam profundamente e quase sempre
exigem de nós novas atitudes e novas respostas. Quando a Igreja
caminha no mundo com os olhos fixos no passado, sempre corre
o risco de tropeçar e permanecer parada no tempo. Talvez isso
seja o maior desafio do pontificado de Bento XVI: olhar para
frente, com a firmeza de quem está construindo mais sobre a
rocha firme, e menos sobre a tradição.
Se queremos que a evangelização caminhe com eficácia
no mundo contemporâneo, necessitamos iniciar um autêntico
caminho de inculturação. Isso exige da Igreja uma corajosa
descentralização, garantindo às conferências episcopais dos
diversos países a possibilidade de definir caminhos e respostas
mais adequadas às diversas situações sem deformar aqueles que
são os princípios fundamentais da nossa fé cristã. É necessário
nos voltarmos mais ao conteúdo do kerigma (primeiro anúncio)
do que formular textos de catequese que às vezes se perdem
em coisas secundárias e leis morais incapazes de dar vitalidade
e gerar entusiasmo nas pessoas. 

Valeriano Paitoni é missionário, pároco da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, Imirim, SP.

Missões - Junho 2005 21


Eucaristia,
atualidade

Um ano especial
para a Eucaristia.

memorial do Senhor
de Antônio Valentini Neto

Jaime C. Patias
N
a festa do Corpo de Deus de
2004 -10 de junho -, o papa
João Paulo II, proclamou um
Ano da Eucaristia, a ser ce-
lebrado pela Igreja Católica,
de outubro de 2004 a outubro
deste ano. O Ano da Eucaristia foi aberto
oficialmente no encerramento do 48° Con-
gresso Eucarístico Internacional (CEI), em
17 de outubro passado, em Guadalajara,
México, cujo tema foi “A Eucaristia, Luz e
Vida do novo milênio”, e será concluído com
o encerramento da XI Assembléia Geral
Ordinária do Sínodo dos Bispos, em 29 de
outubro próximo, cujo tema é “A Eucaris-
tia, fonte e ápice da vida e da missão da
Igreja”. Que desejava João Paulo II com
este Ano da Eucaristia? Que a comunidade
cristã tomasse cons­ciência mais viva do
mistério eucarístico com uma celebração
mais sentida, com uma adoração prolongada e fervorosa, com A ampla riqueza da Eucaristia
um maior compromisso de fraternidade e de serviço aos mais Na mencionada Carta, o papa acentuou três aspectos
necessitados (discurso de abertura do Ano da Eucaristia, dia 17 da Eucaristia: mistério de luz, fonte e epifania de comunhão,
de outubro de 2004, por ocasião do encerramento do 48° CEI). Na princípio e projeto de missão. Isto sempre à luz do ícone dos
Carta Apostólica sobre este Ano, de 7 de outubro de 2004, “Mane discípulos de Emaús, passagem do capítulo 24 do Evangelho
nobiscum Domine – Fica conosco, Senhor”, João Paulo II dizia que de São Lucas, da qual tirou o título e à luz da qual fundamentou
ele teria resultado satisfatório se as comunidades reavivassem sua reflexão. Comentando estes aspectos, referiu-se também
a celebração dominical e intensificassem a adoração eucarística às diversas dimensões da Eucaristia: mistério, memorial, ban-
fora da missa. Mas observava que “é bom apostar alto” (n° 29), quete, sacrifício, ação de graças, anúncio da Ressurreição.
deixando claro que esperava bem mais. Ele desejou que este Ano Apontou para o dia especial da Eucaristia, o domingo, e para
da Eucaristia ajudasse a todos a colocar a missa no centro da os compromissos decorrentes dela: testemunhar a presença
vida cristã, fazendo tudo para que seja celebrada decorosamente, de Deus com coragem, construir uma sociedade mais justa e
segundo as normas estabelecidas e com a participação do povo, igualitária, entre outros.
valendo-se dos diversos ministros no desempenho das atribui-
ções que lhe são previstas, e com uma séria atenção também ao Eucaristia, Memorial do Senhor
aspecto de sacralidade que deve caracterizar o canto e a música Ninguém deixa de honrar o que recebeu em testamento. Um
litúrgica (n° 17); que suscite empenho especial em descobrir e objeto deixado como lembrança por alguém é cuidadosamente
viver plenamente o domingo como dia do Senhor e dia da Igreja conservado. Pode não ter valor monetário, mas tem alto valor
(n° 23); que faça ir ao encontro das muitas pobrezas do nosso histórico, simbólico. Uma recomendação do pai ou da mãe
mundo: o drama da fome de milhões de seres humanos; as doenças para os filhos tomarem determinada providência ou cultivarem
que flagelam os países em vias de desenvolvimento, a solidão princípios fundamentais da vida, normalmente, é observada à
dos idosos, as dificuldades dos desempregados, as desgraças risca, mesmo que não tenha sido feita no leito de morte. “Minha
dos imigrantes. Esta solicitude comprovará a autenticidade das mãe (meu pai) me pediu para realizar isto...”, ouve-se dizer, com
nossas celebrações eucarísticas (n° 28). conotação de que se trata de algo “sagrado”. O poder público

22 Junho 2005 - Missões


e as diversas organizações da sociedade procuram sempre uma delas sobrevém a efusão do Espírito Santo que atualiza
mais preservar ou resgatar tradições, monumentos, prédios, o único mistério” (idem, 1104).
tornando-os “memoriais” ou constróem novos em memória de
pessoas ou acontecimentos. Fazer o que Ele mandou
Jesus Cristo, no final de sua vida, “reunido com os Apóstolos No contexto do seu encontro de despedida com os Apósto-
na última Ceia, para que a memória da cruz salvadora perma- los, segundo os evangelistas Marcos, Mateus e Lucas, Jesus
necesse para sempre, se ofereceu a Deus como cordeiro sem transformou a Ceia pascal com a instituição da Eucaristia, dei-
mancha e foi oferecido como sacrifício de perfeito louvor” (Pre- xando como testamento a ordem de celebrá-la em sua memória.
fácio da Santíssima Eucaristia, II). Instituindo este sacrifício da Segundo o evangelista João, ele lavou os pés dos Apóstolos e
nova Aliança, “mandou que o celebrássemos em sua memória” explicou a exigência do gesto: se Ele, reconhecido como Mestre
(Prefácio da Santíssima Eucaristia, I). e Senhor deles, assim procedera, deveriam fazer o mesmo uns
aos outros. Fazer o que Ele fez e como Ele fez é o sagrado de-
Eis o mistério da fé ver de todo discípulo de Cristo. Celebrar o memorial do Senhor
A natureza de memorial da Eucaristia é insistentemente não é só atualizar o que ele fez por nós, mas também assumir
proclamada em cada celebração pela resposta da assembléia ao sempre melhor o que nós devemos fazer em memória viva e
anúncio de quem a preside: “eis o mistério da fé – anunciamos, testemunhal dele. A transformação do pão e do vinho em seu
Senhor, a vossa morte e proclamamos a vossa ressurreição”. corpo e sangue é o grande milagre da Eucaristia. Mas é também
Também pela oração que lhe dá continuidade: “celebrando agora, grande milagre deixar-nos transformar em Cristo por recebermos,
ó Pai, a memória da nossa redenção...” ou: “celebrando, pois, a em comunhão, seu Corpo e seu Sangue.
memória da paixão do vosso Filho, da sua ressurreição dentre Os gestos de Cristo na sua despedida coroavam os gestos
os mortos e gloriosa ascensão aos céus...” Jesus instituiu a de perdão, de serviço, de doação aos irmãos e irmãs e de obe­
Eucaristia ao celebrar pela última vez a ceia pascal com seus diência, de fidelidade absoluta ao Pai. Eles também antecipavam
discípulos. E ordenou: “fazei isto em memória de mim”. o gesto supremo de sua morte na Cruz. Ele os realizou “na noite
A Páscoa era o memorial da ação libertadora de Deus fazendo em que ia ser entregue...”. A noite da dupla entrega: a dele, por
o povo sair da “casa da opressão”. Celebrada no Templo ou nas amor, e a de Judas, por traição. Mas Judas foi apenas instru-
casas, recordava e atualizava a intervenção divina para conduzir mento. Quem queria acabar com Ele eram os que se sentiam
o povo à liberdade na Terra Prometida. Para o povo, celebrar incomodados por aquilo que disse e fez, especialmente por
a Páscoa não era apenas recordar fatos do passado, mas era sua presença solidária junto aos pobres. A missa celebra, pois,
torná-los presentes e atualizá-los. Assim, celebrar a Páscoa o memorial desta entrega, a de Jesus e a de todos os que se
era também entrar na dinâmica libertadora de Deus, retomar sacrificam pelos que não abrem mão de seus privilégios. Celebrar
a Aliança e conformar a vida a ela, renovando a esperança da a missa é celebrar a Aliança que Ele fez com os sofredores e
realização das promessas messiânicas. A partir de Cristo, o comprometer-se a lutar contra a exclusão e todas as formas de
memorial da Páscoa recebe novo significado. “Quando a Igreja extermínio dos pequenos.
celebra a Eucaristia, faz memória da Páscoa de Cristo, e esta Não basta fazer o rito do memorial do Senhor. É necessário
se torna presente: o sacrifício que Cristo ofereceu uma vez por também realizar os gestos dele até que Ele venha. Nesta dimen-
todas na cruz, torna-se atual” (Catecismo da Igreja Católica, são, a missa não é para “dar alívio”, mas para comprometer. Sua
1364). Isto porque “a liturgia cristã não somente recorda os celebração deverá ser sempre festiva, alegre, dinâmica, mas sem
acontecimentos que nos salvaram, como também os atualiza, esquecer que é memória da Cruz salvadora. Se pode haver “anjos
torna-os presentes. O mistério pascal de Cristo é celebrado, subindo e descendo” no lugar em que é celebrada, há homens e
não repetido. O que se repete são as celebrações; em cada mulheres morrendo em todo lugar porque falta justiça, fraternidade
e partilha que a Eucaristia exige. Da
Arquivo

mesma forma que Ele consagrou


toda sua vida ao Pai a serviço de
todos, nós devemos colocar-nos a
serviço do Reino, construindo no
cotidiano da vida a fraternidade
celebrada na mesa eucarística,
até que sejamos um só corpo e um
só espírito. Celebrar a Eucaristia é
uma questão de amizade e de amor
a Cristo. Se nos sentimos unidos a
ele, não deixaremos de fazer o que
nos pediu. O preceito da Igreja de
participar da missa dominical só
apareceu quando o comodismo
tomou conta de muitos cristãos. Foi
introduzido para ninguém esquecer
o que Cristo havia ordenado. Quem
vive profundamente unido a Cristo,
na sua comunidade, participa da
Eucaristia atendendo ao impulso
do seu coração. 

Antônio Valentini Neto é sacerdote e pároco da


14º Congresso Eucarístico Nacional, Capinas, SP. Catedral São José, Erechim, RS.

Missões - Junho 2005 23


Que as cranças
tenham vida em abundância
“Grita, grita, grita meninada...
Infância nossa história tem que ser mudada!”
Missionária (Zé Vicente)

muitos casos já não nos espanta tanto. Assistimos, muitas vezes,


violências praticadas por nossas crianças e adolescentes e nos
questionamos sobre o que as levam a atitudes agressivas. A raiz
de tudo isso está na atitude de cada um, de cada uma de nós
junto às nossas crianças e adolescentes, desde as do nosso
convívio. Nos fechamos em nosso universo, sem repararmos no
mundo à nossa volta, incapazes de pequenos gestos de carinho.
O que falta ou faltou a tantas dessas crianças e adolescentes?
O que acontecerá quando o seu primeiro relacionamento afetivo
for quebrado?
Arquivo

O Reino de Deus é para todos


No Evangelho de Marcos (Mc 10, 14-16), Jesus nos propõe
uma nova postura de aceitação e respeito às nossas crianças:
“Deixem as crianças vir a mim. Não lhes proíbam, porque o
Reino de Deus pertence a elas” e abraçou-as, abençoando-as.
Queremos lembrar novamente do direito das nossas crianças à
vida, ao direito de serem crianças, de brincar, estudar e serem
amadas. Na sociedade do tempo de Jesus, as crianças não eram
valorizadas e a atitude do Mestre com elas marca um momento
realmente novo. Ao acolher nossas crianças e adolescentes
com amor e acima de tudo com respeito, estaremos fazendo o
caminho contrário da sociedade que segrega e condena muito
cedo, a perder a infância.
Para que todos nós tenhamos vida em abundância, como
de Roseane de Araújo Silva desejou Jesus, é preciso estarmos atentos a tantas formas de
violência contra as nossas crianças e adolescentes em nosso

N
meio. Vamos cuidar delas e amá-las. “A criança é o grande
este mês de junho em que uma boa parte do país tesouro que Deus confiou à humanidade porque é uma vida a
festeja alguns dos santos populares: Santo Antônio, ser desenvolvida. É expressão pura da presença de Deus. É
São João e São Pedro, temos a lembrança também expressão de tudo o que vê e ouve. Quer a paz, o amor, o bem
de duas datas tristes proclamadas internacionalmente: e a fraternidade. É criativa, dinâmica e sincera. Em sua faixa de
a primeira, no dia 4, Dia das Crianças Vítimas de idade, é capaz de ser responsável e de assumir compromissos.
Agressão; e a segunda dia 12, Dia Internacional Ela é cidadã. Como Jesus, ‘cresce em idade, sabedoria e graça’”
Contra o Trabalho Infantil. (Lc 2, 52) (Diretrizes e Orientações da Infância Missionária). Das
Estas datas nos trazem realidades que nunca serão esqueci- crianças do mundo – sempre amigas! 
das ou até mesmo ignoradas. O trabalho infantil nós abordamos
na edição passada, mas é algo que devemos ter sempre em Roseane de Araújo Silva é missionária leiga e pedagoga da rede pública do Paraná.
nossas memórias para ajudar a combater. Quero falar um pouco
da agressão, da violência contra as nossas crianças. Um estudo
do UNICEF (organismo da ONU que cuida da infância) publicado
recentemente, nos mostrou que todos os dias, mais de 18 mil Vamos brincar juntos?
crianças são espancadas no Brasil, seja no campo ou na cidade.
O mais triste é que são meninas as mais afetadas, entre os 7 1 - Quais as brincadeiras prediletas das nossas crianças no cam-
e 14 anos de idade. É um fato realmente vergonhoso. Falamos po? E das nossas crianças na cidade? Quais destas brincadeiras
aqui tanto da agressão física, quanto da psicológica. fazemos coletivamente? Vamos pesquisar juntos?
A realidade que vivemos leva-nos a duas atitudes totalmente 2 - Refletir com as crianças a importância da socialização nos
antagônicas: ou a aceitamos ou a contestamos, em busca de pequenos e grandes grupos, na perspectiva da solidariedade
mudanças. Diariamente, os meios de comunicação nos apre-
e ajuda mútua.
sentam notícias tristes e surpreendentes de violência, que em

24 Junho 2005 - Missões


Sexualidade

conexão jovem
a expressão do meu eu!
Sexualidade não é “sexo”, mas como realidade bela, agradável, digna de ser preservada e va-
lorizada cada vez mais. Mas o medo e o falso moralismo tem
a totalidade do ser humano causado uma série de danos na educação da sociedade para
a sexualidade. A verdade é que, se as instituições sociais não
em expressão. conseguem fazer a formação para a compreensão da sexua-
lidade de crianças e adolescentes, sempre num diálogo sério
com a instituição familiar, o que vai ocorrer é um aprendizado
no “comum do dia-a-dia”, muitas vezes cheio de distorções.
de Vicente de Melo
A sociedade quando traz a sua falsa promessa de prazer em
tudo, a qualquer preço e a qualquer hora, não tem mostrado os

O
seus verdadeiros bastidores. A dura verdade é que os índices
ser humano é um ser de relações. A sexualidade de gravidez precoce sobem a cada dia, e a idade em que essas
é a expressão máxima da vida humana, é o fator meninas se tornam mães, diminui assustadoramente.
primordial de todos os relacionamentos, a com- Muitas vezes, a poesia do namoro vira tragédia em muitas
preensão de si como homem e mulher. Graças à vidas humanas. O tempo juvenil, a idade das fantasias gostosas,
sexualidade, somos impulsionados em direção aos da troca de emoções, do aprendizado e descoberta de si e do
outros de diversos modos: desde os relacionamentos outro, acaba tendo um “gosto amargo no fim”, quando meninos
de companheirismo, fraternidade, amizade, amor, intimidade, e meninas, antes mesmo de serem homem e mulher, se vêem
até os relacionamentos de conflitos e confrontos – é a

Jaime C. Patias
sexualidade em expressão. Nesse contexto, o sexo é a
distinção dessa expressão da sexualidade, quando homem
e mulher no ato sexual se unem na expressão máxima
do amor dos parceiros. Sem uma sexualidade integrada,
o ser humano não conseguirá a expressão máxima de
suas potencialidades.
Sabemos que os maiores conflitos humanos situam-
se na base da sexualidade, da maneira como esta foi se
constituindo, se formando e se desenvolvendo. O modo
como fomos apreendendo o mundo que se nos apresen-
tou desde o nascimento, nos distinguirá uns dos outros
na expressão de nós mesmos. Assim, sexualidade não é
“sexo”, mas a totalidade do ser humano em expressão. Na
masculinidade e na feminilidade, a sexualidade encontra a
sua expressão distinta, não só do ponto de vista do corpo,
mas de tudo o que isso incorpora, o equilíbrio, a agressi-
vidade, a receptividade, o impulso, o amor. No momento
do nascimento, éramos uma possibilidade. Nossos pais
foram falando por nós, antes mesmo que pudéssemos
falar. Muito disseram de nós, antes que pudéssemos nos
dizer. Fomos sendo constituídos e “marcados” por essas Dia Nacional da Juventude 2004, Catedral da Sé, SP.
figuras iniciais, nossa mãe, nosso pai, e todas aquelas experiên­ tendo que assumir a paternidade e a maternidade, quando não,
cias significativas da vida. em muitas outras situações, a doença crônica e a morte preco-
ce. É preciso compreender que a preservação da vida humana
Educação para a sexualidade passa pela valorização integral da pessoa, principalmente, pelo
Mas a vida continuou a se desenvolver. E nesse sentido é resgate responsável de sua sexualidade. A esse serviço, todos
que importa uma necessária e sadia educação para a expres- nós, indistintamente somos chamados. 
são da sexualidade. É saudável ensinar meninos e meninas a
se autovalorizarem naquilo que são, na mais profunda riqueza Vicente de Melo é sacerdote e psicólogo, especialista em
que tem em suas mãos – a expressão de sua própria pessoa, Psicologia Clinica e Aconselhamento.

Missões - Junho 2005 25


Contexto e destinatário
entrevista

da Missão Ad Gentes
Primeiro Congresso Interinstitucional reuniu em São Paulo, de 21 a 23 de abril, delegados
de 70 Congregações e organismos missionários. Nesta entrevista, o professor Paulo Suess
comenta os 40 anos de avanços e dificuldades do decreto Ad Gentes.

de Joaquim Gonçalves ciliar Ad Gentes. Os participantes refletiram sobre os avanços


alcançados pela reflexão teológica e sobre a prática missionária

A
realizada ao longo destes 40 anos.
realização do primeiro Congresso Interinstitucional do Padre Paulo Suess, professor de missiologia, um dos prin-
Brasil nasceu e amadureceu no âmbito de um grupo cipais oradores do Congresso, concedeu entrevista exclusiva
de reflexão do qual faziam parte COMINA, POM, à Missões:
CRB, Centro Cultural Missionário - CNBB (CCM) e
algumas Congregações que têm algum vínculo mais No tempo em que foi elaborado e publicado, o decreto Ad
direto com a imprensa missionária. Uma comissão Gentes era uma novidade. Em termos de reflexão teológica
constituída a partir desse grupo programou e levou a efeito e de prática missionária, há alguns pontos em que se avan-
esse encontro com rosto de universalidade, pois nele estavam çou na linha desse projeto de missão? Gostaria de explicar
representados religiosos e religiosas de vinte e cinco nações e para nós quais foram?
de cinco continentes. O Congresso teve como pano de fundo e Tudo depende da leitura que fazemos do decreto Ad Gentes.
fonte inspiradora a comemoração dos 40 anos do decreto con- Para uma leitura minimalista avançamos bastante, para uma
leitura maximalista ficamos
Jaime C. Patias

muito aquém das intenções do


documento. Devemos distin-
guir dois níveis, o da reflexão
teológica e o da prática mis-
sionária. Creio que na América
Latina avançamos antes na
prática e depois na reflexão
teológica. Onde avançamos?
Avançamos na responsabilida-
de universal das Igrejas locais
e dos Institutos Religiosos. Não
são todas as dioceses, nem
todos os Institutos, mas, em
seu conjunto, há uma presença
missionária latino-americana
considerável em todos os conti-
nentes.Avançamos na reflexão
e na prática do diálogo inter-
religioso e do ecumenismo, e
superamos em grande parte a
dicotomia entre evangelização
explícita e implícita, a partir de
uma compreensão integral da
missão.
O Vaticano II, no Decreto
Ad Gentes, apontou explici-
Sessão plenária do Congresso.

26 Junho 2005 - Missões


Jaime C. Patias
tamente para três ramificações da atividade mis-
sionária: a “pastoral missionária”, o “ecumenismo”
e a “missão Ad Gentes” (AG 6). Na Constituição
Pastoral Gaudium et Spes acrescenta o diálogo com
o ateísmo (GS 21) e na Declaração Nostra Aetate a
dimensão do “diálogo inter-religioso”. Quando hoje
nas Igrejas falamos de “missão” distinguimos - em
vista dos destinatários - pelo menos sete dimensões
diferentes, porém, entre si articuladas. Missão pode
significar “testemunho no mundo”, “pastoral missio-
nária”, “nova evangelização”, “reevangelização”,
“ecumenismo”, “diálogo inter-religioso” e “missão
Ad Gentes”. Todas estas atividades missionárias,
no seu conjunto, configuram “a missão da Igreja
no mundo”.

Depois de 40 anos da publicação do decreto Ad


Gentes sobre a atividade missionária da Igreja,
em que medida podemos reconhecer que as
Igrejas particulares no Brasil assumiram o projeto
missionário, para além do “seu rebanho?”
Ao considerar a possibilidade missionária da Padre Paulo Suess na plenária do Congresso.
América Latina, a III Conferência Geral do Episcopado Lati- religiosos precisam, porém, de uma maneira geral, despojar-se
no-Americano de Puebla (1979), nos exortou a “dar de nossa mais de seu corporativismo e aprender a trabalhar juntos. Isso,
pobreza“, dar aquilo que nos faz falta, como a viúva pobre do às vezes, já é difícil no interior de uma diocese ou Congregação.
Evangelho. Não temos recursos financeiros suficientes, nem voca- Aqui está um vasto campo para praticar, já na partida, o que se
ções em excesso. Mesmo assim, dioceses e Institutos religiosos quer ensinar na chegada: a unidade na diversidade dos dons
enviaram irmãs e irmãos, padres e leigos, não só para Angola, do Espírito Santo. Ele é o pai dos pobres e o protagonista da
Moçambique e Timor Leste, mas para o mundo inteiro, onde missão. Não devemos esquecer que a missão evangelizadora
procuram ser mensageiros da Boa Nova do Reino. A partir deste começa sempre com a própria conversão. “Evangelizadora
envio, a Igreja local revigora-se a si mesma. Um outro avanço como é, a Igreja começa por se evangelizar a si mesma. (...)
é o projeto Igrejas-Irmãs que significa uma prática missionária Ela tem necessidade de ouvir sem cessar aquilo que ela deve
solidária no interior do Brasil. Na mentalidade da cristandade acreditar, as razões da sua esperança e o mandamento novo
coincidiu a missão Ad Gentes com a missão além-fronteiras. do amor” (EN 15). A “missão Ad Intra” (dentro da própria Igreja)
Hoje, com as missões específicas da nova evangelização, da da pastoral missionária exige uma auto-evangelização da Igreja
reevangelização, do ecumenismo e do diálogo inter-religioso, “por uma conversão e uma renovação constantes”. Ela é um
é mais difícil determinar os destinatários da missão Ad Gentes. pressuposto para “evangelizar o mundo com credibilidade” (EN
Os próprios documentos oficiais da Igreja refletem essa dificul- 15, cf. RM 43, cf. Diálogo e anúncio 32). Por outro lado, a “pastoral
dade. O Decreto sobre a Atividade Missionária, do Vaticano II, missionária” confere a todas as atividades pastorais - serviço
considera “missão Ad Gentes” o desdobramento da “missão do (diakonia), diálogo/anúncio (kerygma), testemunho (martyria),
próprio Cristo, enviado a evangelizar os pobres” (AG 4 e 5). Mas celebração (liturgia) - uma dimensão Ad Extra (fora da Igreja).
os “pobres” podem ser paroquianos, “crentes” ou umbandistas Uma “pastoral de manutenção” seria uma pastoral que vive do
em nossa cidade, podem ser hinduístas na Ásia e maometanos “capital pastoral” sem futuro. A dimensão missionária protege
na África. Por conseguinte, a “missão Ad Gentes” não pode ser a pastoral contra a auto-suficiência, a rotina, a introversão e a
identificada com a evangelização dos pobres. auto-relevância.
O Vaticano II fornece mais dois critérios para identificar os
destinatários da missão Ad Gentes: o desconhecimento de Cristo Está disseminado um certo receio no âmbito católico por
e a vivência fora da Igreja. Mas o que significa viver fora da Igreja? causa do crescimento das igrejas pentecostais. Acha que
Num mundo globalizado e cada vez mais “sem-fronteiras”, tam- é possível incutir uma mentalidade ecumênica nas nossas
bém a Igreja amplia fronteiras e abandona fronteiras de ontem. lideranças leigas para que o compromisso missionário não
Com isso a Igreja não perde a sua identidade no mundo. Mas se reduza a recuperar católicos afastados?
ela procura assemelhar-se ao Reino, que é sem-fronteiras. O proselitismo não é ecumenismo. O ecumenismo é uma
tarefa histórica com um horizonte escatológico. A dificuldade do
Em 40 anos o mundo apresenta grandes mudanças com o diálogo não dispensa a tentativa de fazê-lo. Reunir-se em nome
processo de globalização em todos os níveis. As organiza- de Jesus é sempre uma graça para todos os participantes deste
ções missionárias tanto congregacionais como diocesanas diálogo. Precisamos, porém, sempre de novo despojar-nos,
estão correspondendo à hora missionária de hoje? Acha como Jesus, da ânsia de poder, prestígio e privilégio. O serviço
que seria possível e conveniente constituir equipes in­ da unidade na diversidade do Espírito Santo é uma tarefa sem
terinstitucionais para promover uma “cultura” missionária fim. A “missão ecumênica” que visa Ad Intra a unidade dos
atualizada, ampla e solidária nas comunidades? Como se cristãos, Ad Extra pode somar forças nas grandes questões
poderia chegar a isso? não-confessionais que hoje atormentam a humanidade: a paz, a
Entre as dioceses já ocorre que um Regional da CNBB assume justiça, a diversidade cultural, a nova ordem mundial, a ecologia,
uma diocese na Amazônia ou num outro país. Também através as futuras gerações... 
da CRB já está em andamento um projeto interinstitucional em
Timor Leste, por exemplo. Tanto as dioceses como os Institutos Joaquim Gonçalves é sacerdote missionário e membro da Comissão Justiça e Paz.

Missões - Junho 2005 27


Adoradoras
amazônia

a serviço de Cristo
Testemunhando o amor de Deus em terras da Amazônia, as irmãs da
Congregação das Adoradoras de Cristo vivem a serviço dos mais necessitados.

de Graciete Ayres orientou a sua existência para a contemplação da Redenção,


anunciando ao povo as maravilhas deste Mistério, através da

O
catequese, da pregação, da educação. Com este objetivo fun­
testemunho da vida religiosa na tradição cristã tem dou em Acuto, Frosinone, na Itália, em 1834, a Congregação
a ver fundamentalmente com o núcleo da própria das Adoradoras do Sangue de Cristo. A essa ação apostólica,
experiência religiosa do cristianismo: Jesus, o filho Maria De Mattias uniu uma profunda vida de contemplação, até
de Deus, que revela o mistério de Deus Pai que se tornar-se mística. As Adoradoras do Sangue de Cristo, hoje, se­
autotranscende e se autocomunica. Neste núcleo guindo as pegadas de sua fundadora, estão presentes nos cinco
cristológico se fundamenta o carisma e a espiri­ continentes, em 27 países, com cerca de 2000 membros. No
tualidade da Congregação das Adoradoras do Sangue de Cristo Brasil a Congregação chegou em 1947 e trabalha nos Estados
(ASC), fundada por Maria De Mattias, com a missão de “colaborar do Amazonas, Pará e Goiás.
com Cristo na sua obra redentora” (CV 3). Hoje a sociedade contemporânea encontra-se marcada
por inúmeras transformações, as quais têm acirrado a questão
O início social. Percebe-se a retração da presença do Estado e a trans­
Maria De Mattias nasceu em Vallercorsa, Itália, aos 4 de ferência de responsabilidades deste com as políticas públicas
fevereiro de 1805 e ofereceu a sua contribuição à Igreja, com para a sociedade civil. Põe-se valor e centralidade nas ações
uma vida santa e um serviço corajoso e profético à sociedade voluntárias, observa-se também a crescente transferência de
de seu tempo. Radicada na espiritualidade do Sangue de Cristo, responsabilidades do Estado para as organizações sociais, para
as filantropias e o terceiro setor. Diante
desse contexto partilho três experiências,
Fotos: Graciete Ayres

que nasceram impelidas pela realidade e


pelo carisma e espiritualidade do Sangue
de Cristo.

Casa Divina Providência


Em Altamira, Pará, prelazia do Xingu,
as ASC assumem o serviço de com­
paixão, acolhendo e dando um teto às
mulheres gestantes e pobres, que vêm
das grandes vicinais da Transamazônica,
para darem à luz. A casa de acolhimento
chama-se “Divina Providência”. Neste
espaço essas mulheres encontram um
“porto seguro”, onde elas têm uma cama,
alimento, tratamento médico, catequese
e também recebem um breve curso
de alfabetização, costura e normas de
higiene. A fundadora desta casa de aco­
lhimento foi Ir. Serafina Cinque (1913-
1988), que na sua existência procurou
viver as recomendações de Jesus: “Tudo
Casa da Divina Providência, Altamira, PA.

28 Junho 2005 - Missões


não possuem nenhum tipo de esgoto,
despejando seus resíduos diretamente
no Igarapé. Destaca-se também um alto
índice de analfabetismo, o qual perfaz
um total de 179 pessoas. Os segmentos
populacionais: crianças, adolescentes e
idosos, têm apresentado intensa vulne­
rabilidade, constituindo-se, assim, alvo
prioritário das atuais políticas públicas,
os quais se expressam, particularmente,
nos avanços na legislação através da
promulgação do Estatuto da Criança
e do Adolescente (1990) e do Idoso
(2004).
O Projeto Sementes de Esperança
desenvolve um trabalho socioeducativo
voltado para as crianças e adolescentes
da comunidade Pico das Águas, bem
como suas respectivas famílias. Pretende
também contribuir com a organização
Projeto social Reviver, Belém, PA. social, com a melhoria da qualidade de
o quanto desejais que os outros vos façam, fazei-o vós também vida da população envolvida, desenvolvendo práticas que favore­
a eles”; “viu-o e moveu-se de compaixão. Aproximou-se e cuidou çam a autonomia e a capacidade desse público em posicionar-se
dele” (Lc 10,33-34). Ela amou com intensidade o “caro próximo”, diante das questões que interferem em seu cotidiano. Propicia
acolhendo com o coração aberto de mãe, de irmã e de compa­ também espaços onde se desenvolve atividades socioeducativas
nheira o povo simples: mulheres e crianças, uma multidão de que permitem o exercício de seus direitos e deveres políticos,
seres humanos à beira dos caminhos, dos igarapés e rios de sociais e civis, bem como a confiança em suas capacidades
nossa Amazônia. afetiva, física e de inserção social.
“Na casa da Divina Providência, centenas e centenas de A meta para este ano de 2005 é atingir 250 crianças e
mães passaram e continuam a passar. Quantas vidas de mães adolescentes e 80 famílias. As atividades do Projeto estão
de todos os rincões do Xingu com problemas pós-parto foram estruturadas em momentos articulados, como: realização de
e são salvas; quantas crianças recém-nascidas sobrevivem nos oficinas educativas; teatro, música, dança, esporte e trabalhos
braços de suas mães porque alguém cuidou, ajudou, dedicou-se, manuais; excursões; realização de eventos para socialização
amou, deu sua vida, seu tempo”, assim se expressou D. Erwin dos trabalhos desenvolvidos. Testemunhar e ministrar o amor
Krautler, bispo do Xingu.

Projeto Social Reviver


Em Belém, Pará, o serviço de compaixão se faz em parceria
com o Presídio Estadual Metropolitano (PEM), através do
Projeto Social Reviver, assumido pelas ASC e leigos, que
atuam no Hospital Nossa Senhora de Guadalupe. Já o titulo
do Projeto “Reviver”, indica viver de novo, ter uma segunda
chance, ou nova oportunidade.
As ASC, leigos e leigas movidos pela compaixão, acreditam
que a população carcerária do PEM, são criaturas amadas e
lembradas por Deus, e chamadas a uma nova escolha de vida,
a uma nova oportunidade – chamadas a reviver. A fazer um ca­
minho de retorno como um ato de liberdade, de consciência e de
cidadania e, o Hospital Guadalupe quer ser uma mediação neste
processo, ao oferecer uma contribuição à saúde dos internos
através de seus profissionais que voluntariamente se dispõem;
oferecer também luz para o discernimento de uma vida nova,
para que todos possam reviver como cidadãos, integrados na
Símbolo da Congregação das ASC, o Cálice de Jesus sig-
sociedade civil e identificados como filhos de Deus.
nifica o compromisso com o povo da Amazônia.
Projeto Sementes de Esperança misericordioso de Deus exige de nós respeito pela dignidade
Em Manaus, Amazonas, as ASC procuram responder ao grito humana, compromisso com a vida em sua plenitude, sobretudo
do Sangue, contribuindo na construção da cidadania através do com aqueles e aquelas que se encontram em situação de risco,
Projeto Social Sementes de Esperança. O Projeto se realiza como Jesus que derramou Sangue, em conseqüência do seu
na comunidade do Pico das Águas, no bairro de São Geraldo. compromisso ao extremo, profundamente solidário com a cau­
Esta comunidade, segundo dados do IBGE, em 2000, possuía sa da Vida em plenitude. O sangue não se derrama à toa. É a
uma população de aproximadamente 2.298 habitantes, dos fecundação da terra para a continuidade do Projeto do Reino,
quais 574 crianças, 350 adolescentes e 156 idosos. Chama a nesta realidade que nós amamos: a Amazônia. 
atenção também que sendo uma área urbana, a comunidade
apresenta número significativo de domicílios, cerca de 185, que Graciete Ayres é irmã da Congregação das Adoradoras do Sangue de Cristo.

Missões - Junho 2005 29


Guarapari (ES) Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), Ervino Schimidt, e
Mutirão Brasileiro de Comunicação o representante do Conselho Nacional de Bispos do
Brasil (CNBB), Dom Orani João Tempesta.
Comunicação e Responsabilidade Social é o
tema do 4° Mutirão Brasileiro de Comunicação, que Boa Vista (RR)
se realiza de 10 a 15 de julho, em Guarapari, no Nomeação de novo bispo
Espírito Santo.
Com o viés da cultura, da ética e da cidadania, O papa Bento XVI nomeou no dia 18 de maio, o
o primeiro seminário do dia 12 de julho pretende padre Roque Paloschi como bispo da vacante diocese
debater os desafios que o cristianismo enfrenta em de Boa Vista (RR). Atualmente pároco de Nossa Senhora
relação às demandas sociais. Entre os conferencistas da Luz, em Pinheiro Machado, diocese de Bagé (RS),
estará presente Luciano Sathler, vice-presidente da padre Roque nasceu em 5 de novembro de 1950, em
Associação Mundial para a Comunicação Cristã da Lajeado (RS), hoje município de Progresso, Paróquia
América Latina (WACC) e um dos coordenadores da Nossa Senhora Auxiliadora. Ingressou no Seminário,
Campanha CRIS (Communication Rights in the Infor- em Bagé, no ano de 1979, como vocação adulta.
mation Society), que luta pelo direito à comunicação. Cursou teologia na Pontifícia Universidade Católica,
Sathler pretende delimitar a questão da responsa- em Porto Alegre (RS). Foi ordenado presbítero em 7
bilidade social, colocando-a em contraposição ao de dezembro de 1986, em Bagé (RS), pela imposição
marketing social, à filantropia empresarial e às ações das mãos de Dom Laurindo Guizzardi. Depois de
VOLTA AO BRASIL

assistenciais. Deseja, ainda, mostrar como anda essa alguns anos de trabalho como vigário na paróquia
discussão no mundo empresarial, no terceiro setor do Arcanjo São Gabriel, no município de São Gabriel
e até nos órgãos governamentais. De acordo com (RS), foi nomeado em 1995 pároco em Santana do
Luciano Sathler, “a comunicação realizada nas igrejas Livramento (RS). De 1997 a 1999 fez parte da equipe
é uma grande possibilidade de ação para modificar os missionária do Regional Sul 3 da CNBB, que realiza
caminhos atuais de manipulação e exploração”. Além o Projeto Igreja Solidária, em Moçambique. 
do vice-presidente da WACC, estarão presentes no
seminário o secretário-geral do Conselho Nacional de Fontes: CNBB, Pascom

MARCHA PELA REFORMA AGRÁRIA


A segunda marcha pela reforma agrária, realizada em

Marcello Casal Jr.


maio pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra, foi or-
deira, pacífica e, sobretudo, muito consciente.Os lances de
violência, acontecidos nos momentos finais da concentração
na esplanada dos ministérios destoou completamente de
todo o contexto e acabou divulgando uma imagem distorcida
do seu espírito e dos seus objetivos.
A primeira marcha, em 1997, surpreendeu o país pelo
inusitado da proposta e pelo desafio de vencer centenas de
quilômetros, numa convergência para Brasília que ninguém
acreditava pudesse ser levada a bom termo. Daí a aparência
de proeza com que foi saudada pela população da capital MST na esplanada dos ministérios.
federal, que saiu às ruas para receber festivamente os sem- para o diálogo. Mas a surpresa veio na própria audiência.
terra.Desta vez o povo de Brasília não largou seu trabalho Na sua fala ao presidente, os sem-terra demonstraram
para ver os sem-terra passar. Nem eles queriam aplausos. muita competência e conhecimento. Apresentaram suas
Tanto que fizeram questão de nem atrapalhar o trânsito, reivindicações concretas sobre a reforma agrária, ao mesmo
ocupando disciplinadamente só meia pista das ruas. tempo que demonstravam uma ampla visão da realidade
O que eles queriam era o atendimento de suas reivin- brasileira, onde inseriam a importância de uma verdadeira
dicações. Eles também pareciam estar executando o seu reforma agrária. Os ministros, e o próprio presidente, res-
trabalho, com fadiga e suor. Esta diferença de clima entre pondendo a eles, num primeiro momento ficaram nas fáceis
uma marcha e outra faz pensar na diferença real que os explicações genéricas, capazes de prometer tudo e ao
anos vão trazendo. Passou o tempo das utopias fáceis e mesmo tempo não se comprometer com nada. Aí os sem-
generosas, que encantavam só pelo fato de serem expli- terra reagiram. Com coragem e muita lucidez, retomaram
citadas. O que se cobra agora é a realidade, o concreto, o a palavra, e deixaram muito claro que não tinham feito a
possível, o viável. O que ainda continua a surpreender nos marcha para agora ouvir vagas promessas. Eles queriam
sem-terra é a persistência em realizar uma utopia que teria soluções concretas aos problemas bem específicos que
tudo para ser viável, mas que enfrenta resistências histó- tinham apresentado. Concluída a audiência, o presidente
ricas que precisam ser vencidas com tenacidade política, assegurou que continuaria reunido com seus ministros para
com organização popular e com firmeza governamental. O definir as ações do governo. Os sem-terra demonstraram
contraste maior foi na audiência com o presidente. Em 1997 que estão preparados, e o governo percebeu que tem sua
o governo foi encurralado, e teve que receber os sem-terra parte a fazer. Não se fará outra marcha como esta. Agora
a contragosto, enchendo-se de precauções. Resultou um é para fazer reforma agrária. 
clima de desconfiança e de prevenção. Desta vez, era evi-
dente o clima de descontração, assegurando a disposição Dom Demétrio Valentini, bispo de Jales, SP.

30 Junho 2005 - Missões


A caminho de dias melhores

Paula Brenha
O
Conselho Indígena de Roraima – CIR, e todos os
povos indígenas de Roraima, em especial os que
habitam a Terra Indígena Raposa Serra do Sol,
agradecem os esforços dedicados no alcance dessa
mais recente e significante vitória a nosso favor que
é a confirmação do decreto de homologação da
nossa terra, assinado pelo presidente da República, Luiz Inácio tantos outros que terminaram a sua luta a sete palmos do chão,
Lula da Silva, no dia 15 de abril de 2005, selando assim, um mas não sairão da nossa memória como os nossos grandes
ato histórico que marca uma nova fase para 164 comunidades guerreiros. Aqueles que não conseguiram ver o resultado também
indígenas e 16.484 índios. são vitoriosos. Sabemos que as reivindicações pelo exercício de
O reconhecimento de nossa terra é um fruto colhido por nossa liberdade não terminam com o decreto de homologação,
todos que nos ajudaram. De longe ou de perto muitas pessoas por isso, estaremos atentos a quaisquer violações de direitos.
somaram no dia-a-dia da luta da organização indígena, por isso, Há muito que fazer para garantir que de fato possamos ter posse
agradecemos de todo o coração aos que sonharam a Raposa exclusiva sobre a Raposa Serra do Sol. A partir de agora, pas-
Serra do Sol mais digna e homologada. Dizemos muito obrigado saremos então a empregar nossos esforços na gestão desse
aos que passaram horas ou dias trabalhando em campanhas, território, para levar o desenvolvimento sustentável, a proteção
escrevendo cartas, e-mails, telefonando, participando de reuniões, e fiscalização necessária. Para tanto, continuaremos contando
enfim, dedicando sua atenção aos direitos indígenas. Sempre com todos vocês, pois a nossa conquista não terminou no dia
tivemos a dignidade de combater o bom combate, sem atentar 15 de abril. Ela apenas começou.
contra a vida de ninguém, principalmente dos nossos opositores Em Roraima vamos dar as mãos com todos os nossos irmãos
que, por razões históricas ou econômicas, não aceitam a nossa índios ou não-índios e construir um Estado melhor, mais justo,
luta. Por amor aos povos indígenas ou por saber da necessidade fraterno, com desenvolvimento sustentável e sem violentar o
de se construir um mundo em que a diferença seja vista como meio ambiente. Gostaríamos que todas as pessoas de Roraima
valor fundamental para a vida humana, sabemos que muitos aceitassem o nosso abraço de irmãos que todos nós somos. Es-
deixaram seus afazeres pessoais para se engajar nessa causa. A peramos que a sociedade local entenda que todos ganham com a
presença e perseverança de todos os nossos amigos sempre foi homologação da terra dos nossos avós. Em breve vamos festejar!
uma motivação a mais para que nunca desistíssemos de buscar, Mas primeiro, vamos elaborar a nossa programação para que no
na lei ou na pressão política, a garantia dos nossos direitos. Nos momento certo todos possamos comemorar esse ato de justiça
momentos mais difíceis sempre contamos com o abraço amigo, do presidente Lula. Estamos por enquanto trabalhando para que
o consolo para continuarmos olhando para frente. a paz reine neste Estado tão especial do nosso Brasil.
Com a homologação de nossa terra, todos e todas que lutam Finalizamos dizendo que todos que somaram de perto ou
por justiça e paz respiraram aliviados. Infelizmente muitos de de longe com a nossa união e organização sintam-se abraça-
nossos parentes não estão entre nós para também dizer o seu dos e recebam o nosso mais sincero voto de agradecimento.
muito obrigado. Pelo menos 21 de nossos irmãos tombaram Saudações indígenas.
antes da Raposa Serra ser decretada de posse permanente e
usufruto exclusivo dos indígenas que nela vivem. Lembramos Conselho Indígena de Roraima - CIR
de Aldo Mota, Mário Davis, Damião Mendes, Ovelário Tames, e Marinaldo Justino Trajano - Coordenador


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Luciney Martins

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