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Mulheres Vítimas de Violência: Entraves e Avanços na

Afetivação dos seus Direitos

Com o advento da Constituição Federal de 1988, sob o ponto de


vista legal, homens e mulheres são iguais o que nos conduz a
acreditar numa proteção legal para ambos os sexos. Contudo, no
que se refere à mulher essa legalidade nem sempre é reconhecida
como legitima permanecendo a violência, nos fazendo entender que
a violência transpassa a questão da transgressão da lei atingindo as
representações da realidade que definem as relações entre as
pessoas. Esta realidade é caracterizada por um conflito de
interesses entre opressores e oprimidos numa relação desigual
marcada pela verticalidade.

Sendo assim, analisaremos de que forma as relações desiguais


entre homens e mulheres influenciam nas denúncias e nos
julgamentos da violência sexual contra as mulheres. Buscando uma
reflexão critica sobre os motivos que favorecem a pratica do crime
sexual contra as mulheres e como é tratada a questão no âmbito da
justiça, considerando os avanços e entraves na legislação brasileira
no que concerne a pratica desses crimes.

Esperamos que de alguma forma as criticas aqui levantadas sirvam


de reflexão acerca da condição feminina na sociedade brasileira
buscando alternativas que visem a igualdade dos sexos na
efetivação dos seus direitos. Entendendo que a desconstrução do
mito de superioridade masculina é fundamental para o
estabelecimento de um Estado de Direito pautado na igualdade
entre os seres humanos.

O fenômeno da violência no seu sentido amplo e estrito é


multifacetado atingindo desde as relações familiares até as relações
entre países. Isto significa dizer que a violência não é uma
característica apenas das classes populares muito menos das
sociedades em desenvolvimento, mas, sobretudo, um problema de
toda a humanidade.

Constatamos que mesmo diante dos progressos da civilização, o


homem não conseguiu, como deveria, assegurar a humanidade
uma existência / convivência digna e pacifica. Portanto, a
inexistência de mecanismos que visem diminuir a distância entre
necessidades e possibilidades são definidoras para mensurar
estados de violência de um povo.

Para Marilena Chauí (1999:26) a violência seria tudo o que se vale


da força para ir contra a natureza de um agente social; todo ato de
força contra a espontaneidade, à vontade e a liberdade de alguém;
todo ato de transgressão contra o que uma sociedade define como
justo e como um direito. É uma circunstância caracterizada pela
opressão e intimidação, pelo medo e terror.

Considerando o aspecto histórico/cultural o Brasil é caracterizado


como uma sociedade patriarcal com ideologia machista que parte
do pressuposto que os homens são superiores às mulheres. Essa
ideologia machista que sustenta o patriarcado decide, na nossa
sociedade, padrões de comportamento para os homens e para as
mulheres.

O machismo enquanto ideologia constitui um sistema de


crenças e valores elaborados pelo homem com a finalidade de
garantir sua própria supremacia através de dois artifícios
básicos: afirmar a superioridade masculina e reforçar a
inferioridade correlata da mulher (AZEVEDO, 1985, p.46).

No que diz respeito à expectativa de comportamento atribuída a


cada sexo resta-nos dizer que ela aprisiona, rótula as pessoas,
devendo estas renegar a si mesmas para viverem segundo critérios
pré-estabelecidos, e quando não atendem esses critérios são
marginalizadas, negligenciadas.

Conceitualmente, podemos definir gênero como uma construção


cultural baseada no biológico, ou seja, a partir das diferenças
biológicas percebidas entre os sexos criou-se uma expectativa de
comportamento atribuída a cada sexo. Essas diferenças de gênero
ocorrem em todas as sociedades, mas por ser uma construção
cultural variam de cultura para cultura. É oportuno, neste momento
utilizar as palavras de Heleieth I.B. Saffioti (1987:143), lembrando
que o conceito de gênero se situa na esfera social, diferente do
conceito de sexo, posicionado no plano biológico, falar sobre
gênero é buscar compreender uma das formas como são
estabelecidas as relações sociais entre os seres humanos.

Os indivíduos não nascem sociais, nós aprendemos, assimilamos,


internalizamos os padrões de comportamento repassados de
geração em geração. Essas diferenças "sexuais", citadas,
possibilitam relações desiguais entre os sexos em que os homens
podem demonstrar a sua superioridade masculina enquanto que as
mulheres devem ser eternas atrizes coadjuvantes.

Entretanto, reduzir seres humanos aos seus órgãos genitais para


avaliação e definição chega a ser degradante quando não
humilhante, é desconsiderar toda subjetividade do ser e torná-lo
escravo de uma artificialidade que se mantém como forma de
sustentação de um poder de dominação masculina.

Considerando esse contexto sócio-cultural, Wânia Izumino


(1998:43), também, faz uma análise singular das construções de
gênero quando diz queas diferenças sexuais, a definição sobre o
que é uma mulher ou o que é um homem e quais são os seus
papéis na sociedade, encontram-se fora de seu corpo físico ou
características anatômicas, situando-se na esfera do simbólico, na
produção cultural de cada sociedade.

Assim, a mulher assume diferentes papéis edesempenha diferentes


funções dentro do grupo de acordo com as regras que regem a
sociedade a que pertence, sendo que a mesma observação é válida
no caso dos homens.

Percebemos com isso que as relações estabelecidas entre homens


e mulheres transpassa a questão meramente biológica penetrando
no subjetivo/objetivo da sociedade que determina o que é certo ou
errado para cada sexo. A partir da internalização dessas idéias por
parte da coletividade será definida toda dinâmica das relações entre
homens e mulheres.

O recorte de gênero implica na oposição dos sexos a partir de


características socialmente estabelecidas, não exclui, no entanto,
os recortes que privilegiam a classe ou outros fatores como o
político ou as características raciais. Ao contrario, a categoria
gênero só faz sentido quando entendida como um recorte que se
aplica transversalmente as outras categorias (IZUMINO, 1998,
p.52).

E isso contribui para a internalização de um estado de dependência


que vive a mulher seja material ou emocional conduzindo para uma
leitura astigmata da realidade possibilitando, freqüentemente, uma
justificativa(?) para a violência sofrida. Como diz H. Saffioti
(1994:153), a violência contra a mulher integra, assim, de forma
intima, a organização social de gênero.

Isso ocorre, geralmente, porque a mulher é submetida e se submete


a condição de segundo sexo. Condição esta que é estimulada
desde quando a mulher, ainda, criança é domesticada para manter
uma reputação ilibada que em primeira instância significa não ter os
mesmos direitos de expressão que os homens. A sua área de
atuação é a casa, o espaço privado, quando sai deste é para
colaborar com o orçamento doméstico sendo uma atividade
relegada, mesmo assim, a segundo plano. Segundo Warshow
(1998:32) assim, constrói-se a representação social do feminino e a
partir dessa internalização a mulher passa a se sentir como
propriedade do homem devendo estar a sua disposição. Isso
dificulta para a mulher, no campo subjetivo, delimitar seus direitos.

Podemos afirmar, então, que as relações sociais são estabelecidas


através da organização social de gênero de determinada sociedade,
isto significa dizer que essas relações são artificiais, criadas pelo
próprio homem e não algo inato, mas uma construção simbólica.

Portanto, a partir do que cada sociedade define o que é ser homem


ou mulher nos moldamos até o ajuste ou não ao modelo
socialmente aceito, construindo homens e mulheres. Isso solidifica
o pensamento de Simone Beauvoir quando diz: não se nasce
mulher torna-se mulher.

A Violência Sexual assim como as demais violências praticadas


contra as mulheres expressam uma construção social que não é
instituída pela natureza. Portanto, a prática de violência sexual não
é algo inato masculino, mas, está imersa em uma construção de
gênero em que as mulheres são compreendidas como seres
inferiores. Assim, como seres inferiores, as mulheres não são
apreciadas como sujeitos de sua própria existência, mas como um
objeto à disposição dos homens.

A violência contra a mulher é uma manifestação das relações de


poder, historicamente desiguais entre homens e mulheres, que
causaram a dominação da mulher pelo homem e sua discriminação
social. È um dos indicadores sociais mais contundentes da
subordinação da mulher em relação ao homem. (Amaral, 2001,
p.24)

Segundo o pensamento de Badinter (1986), isto pode ser


evidenciado com a história da humanidade na qual estava inscrito
no século passado, que ter uma filha não era significativo ou
importante, quando não, doloroso e conflituoso para toda a família,
já que com o casamento posterior dessa filha haveria a renúncia da
família de origem passando esta a pertencer aos ancestrais do seu
marido. Deixava de ser "propriedade" do pai para ser do marido.

Este entendimento perdurou por muitos séculos refletindo uma


relação de dominação e subserviência, arraigada aos sexos
masculino e feminino, respectivamente. Temos o reflexo desse
processo histórico quando essa tradição cultural de desigualdade
entre os sexos torna, justificável, quase sempre, a violência sexual
e outros crimes praticados contra as mulheres, porque mesmo
tendo, em alguns casos, visibilidade, de acordo com o pensamento
de Izumino (1998:33), continua sendo um dos menos julgados e/ou
condenados.

De um modo geral os homens vêem as mulheres como objetos, um


ser passivo que esta a sua disposição. A condição de inferioridade
que a mulher é submetida transpassa a esfera privada repercutindo
nas suas relações na esfera pública. A mulher não é o segundo
sexo somente no espaço doméstico, mas, também, na rua é vista
com um ser a disposição dos homens.

Considerando, ainda, esse aspecto utilizaremos abaixo o


pensamento de Saffioti para explicar o fato que as mulheres são
agredidas fisicamente de forma maciça na residência, tendo como
principal agressor o marido, companheiro, alguém que mantém uma
relação de afeto enquanto que com os homens, freqüentemente, as
ocorrências violentas se dão em lugares públicos.
O domicílio, deste modo, mostra-se o lócus privilegiado do exercício
da violência contra a mulher como forma de controle social e de
reafirmação do poder do macho. As representações sociais a
respeito da violência masculina contra a mulher construíram um
verdadeiro mito, segundo o qual os homens violentos pertencem às
classes subalternas e, ou são monstros anormais ou estão sob o
efeito de forte emoção, portanto, sem domínio de se próprios e das
forças que são capazes de liberar. (SAFFIOTI, 1992, p.163).

No entanto, esses dados não são comprovados pelas estatísticas


oficiais[1], isto porque sendo a residência familiar um local
considerado inviolável incute-se a idéia de que suas mazelas não
deverão ser expostas para apreciação pública. Levando-nos a
inferir que a violência contra a mulher tem um caráter
histórico/cultural, muitas vezes, possibilitando, mesmo nas
entrelinhas, o consentimento dessa violência.

É exatamente na medida que a mulher aceita e se conforma com


sua condição de Cinderela cuja identidade será atribuída e
confirmada pelo príncipe encantado (de quem ela dependerá até
para subsistir), que ela poderá vir a ser não apenas vítima, mas
também cúmplice de violência contra si própria. Vivendo uma
condição de dependência política, econômica e cultural, a mulher
experimenta uma permanente sensação de desamparo que acaba
aprisionando-a num verdadeiro 'circulo de giz caucasiano', feito de
medo e desesperança. Medo da liberdade enquanto exercício de
autonomia. Desesperança quanto a própria capacidade de libertar-
se (AZEVEDO, 1985, p. 46).

Assim sendo, mesmo na atualidade torna-se difícil falar sobre


violência contra a mulher já que em muitos casos significa
desmistificar uma relação familiar que deveria permanecer
intocável. Essa questão é bem esclarecida por Azevedo, quando
diz:
[...] tema maldito, posto que implica desvelar uma instituição que a
sociedade insiste em considerar como instituição modelare
essencial ao desenvolvimento pleno e equilibrado dos seres
humanos – a família. Tratar da violência domestica é tratar da
violência familiar, isto é do uso institucional de práticas opressivas,
agressivas e de dominação exercidas pelo homem contra sua
parceira, na condição de esposa ou companheira, como forma de
conseguir mantê-la submissa, dócil e cordata aos seus propósitos
(AZEVEDO, 1985, p. 17)

Apesar da violência contra as mulheres não ser um fenômeno novo,


com o fortalecimento do feminismo (a segunda onda) favoreceu que
este problema ganhasse visibilidade e fosse tratado com uma
atenção especial numa tentativa significativa de libertar as mulheres
de mais essa agressão. Simultaneamente, a todas essas reflexões
foi criada a Delegacia da Mulher que tinha como proposta prestar
um atendimento diferenciado às mulheres.

Situações anteriormente tidas como normais, que ficavam


encerradas no universo fechado das famílias foram denunciadas.
Desse modo, o problema remeteu-se da esfera privada para a
pública favorecendo intervenções legais, hoje consideradas,
indispensáveis.

Uma das formas que podemos conceituar a violência sexual seria


utilizando o entendimento jurídico sendo conceituada como o ato de
constranger alguém mediante violência ou ameaça (implícita ou
explicita) a praticar ou permitir que pratique a conjunção carnal ou
ato libidinoso.

De acordo com o nosso ordenamento jurídico, a violência sexual é


um crime que deve ser denunciado a uma delegacia de polícia,
podendo o agressor ser responsabilizado civilmente e a vítima obter
possível indenização pelo dano material e moral sofridos.

Considerando o exposto, podemos inferir a violência sexual como


uma das formas possíveis de materialização das relações de poder
estabelecidas socialmente entre os sexos, ou seja, uma
manifestação desencadeada por relações desiguais, verticais entre
homens e mulheres.

No entanto, como já mencionado, este é um dos crimes menos


denunciados, isto se dá, em parte, por ele ter como principal local
de incidência a residência familiar; enquanto os homens em sua
maioria são agredidos nas ruas, as mulheres são vítimas de
violência perpetrada no lar ou na unidade doméstica, geralmente
por um membro da família ou por alguém conhecido. Como afirma
Saffioti (1994, p.163) na esfera privada, todavia, obscurecida pela
invisibilidade, muitos homens comportam-se violentamente
contando com a mudez da companheira.

Devido à pressão do movimento feminista foi criado em São Paulo


na década de 80, o primeiro Conselho Estadual sobre a Condição
Feminina em seguida o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e
depois a criação das Delegacias Especializadas. Vale salientar,
também, a existência da Secretaria Nacional de Direitos humanos,
a Plataforma Estratégica de Igualdade, o Programa Nacional de
Prevenção e Combate à Violência Domestica e Sexual, o Serviço
de Disque-denúncia criado pelo Ministério da Justiça, a TV Escola,
Casas Abrigo, entre outros. De acordo com Izumino (1998:36) a
delegacia de polícia de defesa da mulher foi a primeira tentativa
realizada em institucionalizar o combate a violência contra a mulher
através de um espaço em que se reúne a possibilidade de
denúncia, prevenção e repressão desta forma de violência.
Diante desse contexto, houve uma maior visibilidade dos crimes
contra as mulheres, agora registradas nos boletins de ocorrências
das delegacias. De acordo com pesquisa realizada no período de
1998/1999 por Aquino (2001:154-155) na Delegacia de Proteção a
Mulher de Salvador/Bahia, o maior índice de ocorrência registrada
na delegacia é a agressão física ficando a violência sexual com
números significativamente menores.

Devemos compreender esse fenômeno como um sinal de que a


violência sexual é um tema difuso, complexo em que é tratado
ainda como inaceitável, ao mesmo tempo em que,
contraditoriamente, é mascarado e dissimulado pela própria
sociedade.

Configura-se no imaginário coletivo a crença de que sexo para os


homens é um impulso biológico, depois de ativado fica sem
controle, enquanto que a mulher deve conter seu desejo sexual
para não ser confundida com uma "mulher vulgar". Para ilustrar
essa idéia exemplificaremos a partir do Código Penal Brasileiro
datado de 1940, onde a violência sexual está incorporada aos
crimes contra os costumes, significando dizer que o aspecto
preponderante na avaliação desses casos é a ocorrência de um
gozo ilícito amenizando, dessa forma, o ferimento ilícito.

Esse aspecto implica numa avaliação se a mulher permitiu ou não a


violência sofrida. Diferentemente dos demais crimes, a violência
sexual esta intimamente relacionada com os fatores motivadores.
Como afirmou Vigarello (1998:68) a dificuldade de distinguir entre o
consentimento e o não-consentimento, independentemente do ato
efetuado, a tendência a reduzir a mulher que 'realizou' o ato ao
estado de mulher que consente.

Considerando a citação acima podemos afirmar que a violência


sexual, quase sempre, é analisada de acordo com certos mitos
culturais que invocam explicações distorcidas das mulheres vítimas
de violência sexual, desconsiderando o sofrimento vivenciado pela
vitima, sendo reflexo de um contexto sócio-cultural.[2]

Não é unicamente a existência desses mitos culturais que dificultam


a denúncia da violência, mas também o desconhecimento pelas
próprias mulheres dos seus direitos, inclusive o de deliberar sobre o
próprio corpo. Dessa forma, a ordem falocêntrica coisifica a mulher
negando-se a considerá-la sujeito. Ficando estas mulheres sujeitas
as conveniências masculinas.

A dominação masculina ou o simbólico da figura do macho


poderoso obscurece o direito das mulheres enquanto cidadãs, e
tem trazido muitas dificuldades, tanto na compreensão pelas
mulheres do que vem a ser agressão como a necessidade jurídica
de um encaminhamento de uma ação para julgar os atos criminosos
dos homens. Na sua subjetividade, a mulher tem culturalmente
incorporado uma submissão, reconhecendo, ainda, na figura do
homem (pai, irmão, marido, companheiro, namorado) um ser com
plenos direitos sobre sua vontade e seu corpo. (AMARAL, et al,
2001, p.25).

Durante toda a historia, como podemos observar, a sociedade por


muitas vezes, dificultou a inserção do tema violência sexual no
contexto social, sendo essa postura legitimada através da
culpabilidade da mulher pela ocorrência do crime.[3]

Sabemos que a violência sexual contra a mulher pode ocorrer em


qualquer classe social, o que diferencia sua ocorrência é que as
classes populares, sem ter a quem recorrer, denunciam a agressão;
enquanto que as mulheres oriundas da classe média ou alta
preferem manter o status, não se expor, contratando médicos e/ou
psicólogos particulares para cuidarem dos seus sofrimentos.
A violência sexual transpassa a questão das lesões sofridas no
corpo misturando-se com a vítima, colocando em discussão a sua
dignidade. O "olhar" da sociedade não é direcionado para o crime,
mas para um suposto motivo desencadeador do ato.

As decisões para classificar as queixas de estupro como


'procedentes' isto é validos e possíveis de prossecução) ou 'não-
procedentes' dependem muitas vezes de fatores que não tem nada
a ver com a questão de a mulher ter sido forçada a ter sexo contra a
sua vontade.Mais do que qualquer outra coisa, essas decisões tem
a ver com a questão de os 'porteiros' legais (primeiro a policia e
depois promotores públicos) acharem a vitima aceitável e as
circunstâncias do seu estupro suficientemente parecidas com um
'bom' caso para se acreditar nelas. (WARSHAW, 1996, p.36)

Por parte de nossa sociedade existe uma grande dificuldade no


reconhecimento e validação da violência sexual praticada pelo
marido da vítima. A mulher casada se constitui propriedade do
marido devendo estar disponível sexualmente para ele sempre
quando for solicitada. Conforme Saffioti (1994:43) a violação sexual,
via de regra, só é considerada como ato violento quando praticado
por estranhos ao contrato matrimonial, sendo aceita como normal
quando ocorre no seio do casamento.

Com isso, percebemos a marca de uma ideologia machista que


obscurece a cidadania feminina a partir do momento em que a
liberdade de escolha, de decisão é limitada, obrigando a mulher,
quer queira ou não, a dispor do seu próprio corpo para satisfazer as
"necessidades" sexuais do seu parceiro, tirando da mulher o direito
de estabelecer limites no comportamento sexual. Além de ser uma
violência sexual é uma violência aos Direitos Humanos que tanto
preconizam a idéia de liberdade.
[...] considera-se a mulher apenas como um ser passivo, incapaz de
opinar, escolher, ter vontades. Porém, o problema não está na
pratica sexual da cópula. O problema está na maneira como se
estrutura a ordem das representações sociais geradas a partir da
materialidade desta prática sexual, do sistema de representações
sexo/gênero e na construção cultural da diferença sexual. Assim, na
lógica social falocêntrica, a mulher se 'coisifica' e é tida como objeto
de manipulação. (AMARAL, et al, 2001, p.27).

Crimes de violência sexual praticada por alguém conhecido,


principalmente, pelo marido da vítima, quase sempre são ocultados,
pouco denunciados, pouco julgados e raramente condenados.
Existe uma certa negligência na avaliação desses casos e,
essencialmente, uma falta de reconhecimento dos direitos das
vítimas.

Uma outra observação é que no caso da violência sofrida pela


menina, criança ou adolescente, na maioria dos casos denunciados
o potencial agressor é alguém conhecido, que faz parte do contexto
familiar. Já no caso da mulher adulta o maior índice de denuncia
está relacionada com o agressor desconhecido.

Entendemos isso devido à falta de reconhecimento da mulher de


definir o que é ser vítima de violência sexual por alguém conhecido,
a resistência da sociedade em aceitar que alguém conhecido possa
ter praticado tal crime sem que de alguma forma a mulher tenha
contribuído para isso. Mas uma vez as relações desiguais
estabelecidas entre homens e mulheres que possibilitam uma
análise deturpada da realidade que se sobrepõe a importância da
denúncia.

A mulher quando sofre uma violência sexual é atingida na sua


integridade física e psíquica. Sendo "jogada" no "túnel" da culpa, do
medo, da incerteza, podendo construir suas vidas numa crença
falsa de que não têm valor. É a passagem do estado de sujeito para
o de objeto.

O estupro abala todos os aspectos do ser humano - físico,


emocional, psicológico e espritual. É o contato com a morte que
abala todas as defesas. Devido à incompreensão da sociedade, o
estupro pode comprometer relacionamentos, o trabalho e até a vida
familiar. (ADAMS, 2000, p.171).

Segundo pesquisa de Warshaw (1996), as mulheres relataram que


sentiram medo, raiva, depressão após seus estupros, enquanto os
homens disseram que experienciaram alguns sentimentos de
orgulho.

Com isso não é admissível a aceitação ou o pacto com uma


sociedade silenciosa em torno da violência sexual, "fechando os
olhos" para todas as conseqüências em decorrência desse crime
em prol da manutenção de uma lógica machista.

O sofrimento de uma vítima de violência sexual não se limita ao


momento desse crime. Estudos indicam que essas vítimas ficam
mais vulneráveis ao uso de drogas, as DSTs, distúrbios sexuais,
prostituição, depressão, baixa auto-estima e o suicídio.

A violência sexual deixa marcas que a cirurgia plástica, por


exemplo, não consegue corrigir, embora a lembrança de ter sido
violentada possa ser trabalhada por equipe multidisciplinar, nunca
será apagada, faz parte da história da vítima. Por este motivo a
importância das discussões e reflexões sobre este crime de forma a
propiciar estratégias mais amplas de prevenção e combate contra a
violência sexual, considerando a importância de um atendimento de
qualidade.
Sendo assim, emerge na sociedade brasileira questionamentos,
cobranças para que exista um equilíbrio entre as necessidades das
mulheres e as possibilidades do Estado. Diante disso o Estado
brasileiro apresenta uma "solução": acrescenta ao nosso
ordenamento jurídico a Lei 11.340/06, também denominada Lei
Maria da Penha, que pune a violência doméstica e familiar contra a
mulher suprimindo lacunas na legislação e, com isso, gerando
elogios e criticas dos juristas. Restando-nos verificar se, com a
existência dessa nova lei, teremos concretamente avanços e/ou
entraves na efetivação dos direitos da mulher.

No Brasil podemos observar uma busca de alternativas para


erradicar esse crime embora possamos dizer que a questão é muito
mais complexa envolvendo uma mudança de mentalidade.
Requerendo para isso não apenas discussões sobre o tema mais
ações concretas que de fato proporcionem uma atenção e um
atendimento diferenciado para as mulheres vítimas de violência
sexual.

A análise que segue leva em conta o fato de que no Brasil, mais


importante do que a falência do modelo liberal de justiça é o fato de
que esse modelo nunca chegou a ser implantado, de forma que
continuam a persistir as relações sociais fortemente hierarquizadas,
calcadas em preconceitos, na intolerância com o outro e no uso de
prerrogativas econômicas para garantia de direitos (IZUMINO,
1998, p.58).

A complexidade das circunstâncias que influencia a violência sexual


contra a mulher faz com que se torne necessária uma ação ampla
por parte dos Estadopara que proporcione modificações na maneira
como esse crime é tratado.
Acreditamos que nesse momento devemos nos posicionar, cada
vez mais, na luta pelo crescimento das políticas públicas no
atendimento as mulheres vítimas de violência sexual.
O que de fato as mulheres precisam não são, apenas, discursos
políticos, mas que estes estejam relacionados e/ou atrelados a
ações concretas que propiciem condições dignas de atendimento e
que se promova o reconhecimento da mulher enquanto sujeito de
direitos.

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[1] No que se refere a violência sexualdados estatísticos


revelamquea maioria das queixas prestadas pela mulher adulta tem
como principal agressor alguém desconhecido.

[2] Dados sintetizados a partir da pesquisa realizada por Warshaw


(1996).

[3] Isso se deve ao fato de que falar sobre esse crime,


freqüentemente requer tratar não exclusivamente do agressor
desconhecido, mas também daquele que tem um rosto bem
familiar.

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