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O documento discute a relação entre literatura e diversidade étnica, focando na literatura indígena das Américas. Apresenta três histórias de povos indígenas do México como exemplos da riqueza cultural desses povos. Conclui defendendo a importância da literatura indígena para preservar a identidade cultural desses grupos.
O documento discute a relação entre literatura e diversidade étnica, focando na literatura indígena das Américas. Apresenta três histórias de povos indígenas do México como exemplos da riqueza cultural desses povos. Conclui defendendo a importância da literatura indígena para preservar a identidade cultural desses grupos.
O documento discute a relação entre literatura e diversidade étnica, focando na literatura indígena das Américas. Apresenta três histórias de povos indígenas do México como exemplos da riqueza cultural desses povos. Conclui defendendo a importância da literatura indígena para preservar a identidade cultural desses grupos.
Literatura: Diversidade tnica e outras Questes Indgenas
Literature: Ethnic Diversity and other Indigenous Issues
Graa Grana 1
Resumo: O objetivo deste artigo apresentar uma breve reflexo a respeito da relao entre literatura e diversidade tnica. Quando se fala nessa relao, a impresso que se tem que muitos estudiosos j se debruaram em torno do assunto. Porm, nunca demais problematizar noes de diversidade, cultura, resistncia e outras questes que suscitam a presente contribuio ao estudo do texto literrio indgena. Para tanto, abordamos trs histrias que fazem parte da riqueza cultural indgena da Amrica Latina. Para concluir, apresento o poema Um e muitos juntos, que eu apresentei no X Encontro de Escritores e Artistas Indgenas, em 2013, no Rio de Janeiro. Palavras Chaves: Literatura. Diversidade tnica. Resistncia. Abstract: The objective of this paper is to present a brief reflection on the relationship between literature and ethnic diversity. When speaking in this relationship, the impression one gets is that many scholars have pored over the issue. However, it never hurts to question notions of diversity, culture, resistance and other issues of the present contribution to the study of indigenous literary text. To do so, we addressed three stories that are part of the indigenous cultural richness of Latin America. To conclude, I present the poem "One and many together," that I presented at the Tenth Meeting of Indigenous Writers and Artists in 2013, in Rio de Janeiro. Keywords: Literature. Ethnic diversity.Resistance.
Quando se fala em diversidade tnica e a sua relao com a literatura e outras artes, a impresso que se tem que muitos estudiosos j se debruaram em torno do assunto. Se assim parece, por qu e para que, ento, insistir no assunto? Ora, o assunto inesgotvel e exige, por isso mesmo, uma leitura das diferenas; at porque essa diversidade composta de brancos, negros e ndios; homens, mulheres, idosos, jovens e crianas; leitores, estudantes, educadores, poetas, narradores, crticos, pesquisadores; sem teto, sem terra, sem escola e outros segmentos sociais. Neste artigo, o objetivo a abordar as especificidades da literatura amerndia, isto , a literatura de autoria indgena nas Amricas. Pensemos na troca de conhecimentos, na possvel abertura para o dilogo, na aceitao de diferentes pontos de vista; nas
1 Graa Grana: filha do povo potiguara (RN). Escritora, educadora universitria na rea de literatura junto UPE, na Graduao e no Profletras. Doutora em Letras pela UFPE e Ps-Doutorado em educao, literatura e direitos indgenas pela UMESP. Lder do Grupec, grupo de pesquisa junto ao CNPq. Todas as Musas ISSN 2175-1277 Ano 05 Nmero 02 Jan-Jun 2014 53 diferentes capacidades de olhar o mundo; nos diferentes saberes das sociedades tradicionais que falam tambm de um mundo feliz para todos. O mito, por exemplo, um saber profundo; um saber que alimenta diversas culturas e nesta perspectiva que a presente contribuio ao estudo do texto literrio indgena pretende oferecer um pouco da noo acerca de cultura, diversidade, diferena, literaturae resistncia, entre outros aspectos. Em Resistncia e interveno nas literaturas ps-coloniais, a noo de cultura, segundo Thomas Bonici (2009) pode ser associada aos conceitos de diversidade e diferena cultural: o primeiro refere-se a temas e costumes oriundos de duas culturas. O termo diferena cultural, como observa Bonnici (2009, p. 32), foi desenvolvido pela psicanlisee sugere conflituosa relao entre colonizado e colonizador. Isto quer dizer tambm que em meio atrao e repulsa, a relao entre diferentes povos revela sinais de resistncia. Embora no faa referncia direta literatura indgena, Bonnici (2009, p. 339) ressalta que a partir dos primeiros momentos da colonizao at o presente, focaliza-se o tema da resistncia em textos da literatura brasileira, africana e caribenha. Por meio da contao de histrias e dos cantos (considerados sagrados), melhor se compreende o conceito do saber ancestral. Nesta perspectiva, mito no significa mentira; mito realidade, como sugere Mircea Eliade (1972). Essa conscincia em torno da ancestralidade faz da literatura indgena um exerccio do pensamento que pode ser revelado na feitura de um colar, de uma esteira e dos utenslios extrados do barro; na textura da floresta, na plumagem e no canto dos pssaros; no coaxar dos sapos, anunciando a chuva; na convivncia com os animais domsticos; na gua, no ar e outros elementos da natureza. Estes so alguns aspectos que compem a especificidade da literatura indgena. Um bom exemplo vem das narrativas indgenas da Amrica Latina, especificamente de trs grupos tnicos situados no Mxico: o povo Kiliwa, o povo Yaqui e o povo Maia. A respeito desses povos, recebi da Editora FTD o convite para traduzir trs narrativas adaptados por Judy Goldman. Trata-se de O sapo e o deus da chuva, uma narrativa do povo Yaqui ilustrado por Arno Avils. O coelho e a raposa, ilustrado por Ricardo Pelez, uma histria do povo Kiliwa. Baak traz ilustraes de Fabrcio Vanden Broeck; um conto do povo Maia. Em O sapo e o deus da chuva, do povo Yaqui, o cenrio inicial mostra o sol escaldante castigando a terra. No h sinais de chuva. As pessoas da aldeia, incansavelmente, pediam ao deus da chuva para afast-las de tanto sofrimento, mas o Todas as Musas ISSN 2175-1277 Ano 05 Nmero 02 Jan-Jun 2014 54 deus sequer ouvia. Quando o chefe da aldeia anunciou que o povo teria que abandonar o lugar, um mensageiro se apresentou. Qual seria o seu plano? O coelho e a raposa uma das uma das muitas histrias do povo Kiliwa. Os mais velhos contam que uma raposa muito faminta vivia em um lugar rido, com pedras, cactos e escorpies. No gostava de comer gafanhotos porque as pernas dos insetos geralmente ficavam enganchadas em seus dentes. Por sorte, farejou um coelho que no era grande nem gordo, mas era maior do que um rato. A raposa aproximou-se e atacou. Ser que o mais forte sempre sai vencedor? O conto Baak, do povo Maia, traz a histria de um pequeno deus. Ele vivia com a me e os dois raramente tinham o suficiente para comer. Os irmos que moravam nos arredores, sequer ajudavam; quando muito, atiravam-lhes sobras de comida. Baak queria aprender a caar, mas os irmos s zombavam e nunca o ensinavam. Um dia, ao ver a exuberante vegetao da floresta, Baak teve uma ideia que mudou a vida do seu povo. Essas histrias fazem parte da riqueza cultural dos povos indgenas da Amrica Latina: os Yaqui vivem no Estado de Sonora (Mxico), numa regio que faz fronteira com os Estados Unidos; sua populao de aproximadamente trinta e dois mil habitantes. Eles vivem da plantao de trigo e do algodo. Os Kiliwa so um povo ameaado de extino. Sua populao composta de aproximadamente cento e sete indgenas que sobrevivem da agricultura familiar, da caa e da pesca, no Estado da Baixa Califrnia (Mxico). O povo Maia a segunda populao mais numerosa do Mxico, com aproximadamente um milho e meio de indgenas. Apesar do grande ndice de analfabetismo e desemprego, o povo Maia grande conhecedor das ervas medicinais; conhece profundamente vrias espcies de peixes e mantm as suas tradies. Cabe salientar que essa literatura revela em sua diversidade - um jeito de ser e de viver dos povos indgenas. O que os diferencia?Quer seja na Cordilheira dos Andes, na Guatemala, no Brasil, no Mxico, na aldeia, no campo, na cidade e em outras partes do mundo, os povos indgenas devem ser vistos como parte de uma sociedade de tradio oral que no perdeu a sua identidade no contato com os valores dominantes. Pensemos na literatura escrita (no espao virtual ou em papel e tinta);qualquer que seja o seu formato, a literatura de fato uma necessidade; neg-la uma forma de mutilar a nossa humanidade, como diria Antonio Candido (1995), no artigo O direito literatura. Da estreita relao entre literatura e diversidade tnica, sublinhamos: direitos humanos, letramento literrio e etnia. O chamado letramento literrio, por exemplo, torna mais prximos por assim dizer os diferentes mundos de tradio indgena. No Brasil, Todas as Musas ISSN 2175-1277 Ano 05 Nmero 02 Jan-Jun 2014 55 o encontro de escritores e artistas indgenas 2 completou a sua 10 edio em 2013 com o apoio da Fundao Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), entre outras instituies que buscam fortalecer e ampliar os caminhos da leitura atrelados ao ensino fundamental. A cada ano que passa, os desafios se multiplicam; aos desatentos e queles que se vestem de preconceito literrio parece estranho que o elo da literatura indgena com a ancestralidade autorize os (as) autores(as) indgenas a confirmarem na arte literria (oral e escrita) o sagrado vnculo com a Me Natureza, com a Me Terra. Aos poucos, a literatura indgena no Brasil est saindo da invisibilidade. Essa literatura pode ao mesmo tempo alimentar sua resistncia nas favelas ou se fortalecer em meio ao sagrado tor onde quer que acontea. Fruto da experincia com o barro, com as ervas, com as sementes, com as folhas das palmeiras, com os cantares e os lamentos do mundo animal; com o esprito vigilante dos protetores das matas; com a sofreguido das rvores decepadas pela serra eltrica; com as aldeias destroadas pelo agronegcio, a literatura indgena faz parte de um mundo que, infelizmente, muitos desconhecem. Embora seja tambm espao para denunciar a galopante violncia contra os povos de diferentes etnias, a literatura indgena de paz. Porque a palavra indgena sempre existiu, uma de suas especificidades tem tudo a ver com resistncia. Ento, quem quiser ouvir que oua tambm o canto dos guerreiros, o som dos tambores; a voz do vento em sintonia com o voo dos pssaros, o som das guas, o ritmo dos maracs e dos nossos passos na direo do horizonte, como sugere a temtica dos encontros, dos fruns, dos recitais e rodas de conversa no meio indgena. Quem quiser ver que veja a resistncia dos 250 povos indgenas falantes de pelo menos 180 lnguas neste Brasil de tantas diversidades. Fazer parte dessa diversidade vivenciar o aqui e agora em meio aos avanos do Movimento Indgena no Brasil e noutras partes do mundo; um avano perceptvel no campo da Educao e das Artes (Cinema, Literatura, Msica, Dana, Teatro, Filosofia, Astronomia, Pintura entre outros saberes); avano da cincia indgena que por meio da sabedoria ancestral contribui para a construo de um mundo melhor.
2 Com o apoio da Fundao Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), da Fundao C&A, do Instituto Brasileiro de Propriedade Intelectual Indgena (Inbrapi), do Ncleo de Escritores e Artistas Indgenas (Nearin) e de instituies de ensino (pbico e particular, do fundamental ao superior) a cidade do Rio de Janeiro acolheu o 10 Encontro de Escritores e Artistas Indgenas, em 12 de junho de 2013.
Todas as Musas ISSN 2175-1277 Ano 05 Nmero 02 Jan-Jun 2014 56 Em aberto, consideraes finais Porque somos um em muitos, estamos aqui, em meio a grandes transformaes, confiantes de que sonhando juntos, os nossos sonhos se tornem realidade. Estamos atentos aos horizontes. Qualquer que seja o espao e o tempo em que os saberes indgenas se manifestem, esse saber revela sua estreita relao com a vida que se vive na aldeia ou na cidade grande a cada dia; seja no meio acadmico ou na educao do campo. O espao e o tempo indgenas podem se revelar tambm por meio da pintura corporal ou do mergulho nas guas mansas de um igarap ou at mesmo nas (an)danas de amor e guerra que aprendemos a lidar desde a infncia ou nos surpreender tambm com a barra do dia que norteia o jeito de ser e de viver de cada indgena; a cincia indgena ensina que fazer parte da grande teia da vida afirmar o reconhecimento aos ancios; os nossos velhos sbios. Na travessia, somos um e muitos juntos gerando metamorfoses, buscando horizontes para construir e reconstruir a histria, a memria e tudo o que foi arrancado dos povos indgenas ao longo dos mais de 500 anos de colonizao. Das rodas de conversa surgem os Encontros de Literatura (em verso ou em prosa); a cada encontro com a palavra, o indgena mostra para o mundo a luta pela autonomia e no poderia ser diferente, posto que a palavra indgena sempre existiu. Desse modo, em meio a essa metamorfose e na condio de integrante da construo dessa literatura e por vivenciar essa literatura; peo licena aos ancestrais para intuir o que me vem da imensa floresta de saberes indgenas e reiterar que somos um em muitos como sugere o poema Um e muitos juntos 3 , de minha autoria.
I Na travessia: amassar o barro dar tempo ao tempo curar a panela beber do pote a gua da chuva e repartir o que vem da fonte o que vem da terra e as oferendas do mar
II No caminho de volta
3 Escrevi esse poema em abril de 2013 e o declamei em 12 de junho do mesmo ano no X Encontro de Escritores e Artistas Indgenas, junto ao XV Salo da FNLIJ, no Rio de Janeiro. Todas as Musas ISSN 2175-1277 Ano 05 Nmero 02 Jan-Jun 2014 57 no p da Serra do Mar vislumbro uma rvore curvada pelo tempo suas razes abraam a terra e seguem o curso natural das guas onde mil pssaros alimentam seu eterno canto
III Na travessia, s escuto e vou tecendo o colar em meio saudade da minha aldeia
Bibliografia BONNICI, Thomas. Resistncia e interveno nas literaturas ps-coloniais. Maring/Paran: Eduem, 2009. CANDIDO, Antonio. O direito literatura. In: Vrios escritos. So Paulo: Duas Cidades, 1995,p.169-191. ELIADE, Mircea. Mito e realidade. So Paulo: Perspectiva, 1972. GOLDMAN, Judy. Baak: um conto do povo maia. /Traduo: Graa Grana/. So Paulo: FTD, 2013. ______. O coelho e a raposa: um conto do povokiliwa. /Traduo: Graa Grana/. So Paulo: FTD, 2013. ______. O sapo e o deus da chuva: um conto do povoyaqui. /Traduo: Graa Grana/. So Paulo: FTD, 2013. GRANA, Graa. Contrapontos da literatura indgena contempornea no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edies, 2013. ______, Um e muitos juntos. Disponvel em: http://ggrauna.blogspot.com.br/2013/04/um- e-muitos-juntos.html. Acesso em: 20.Abr.2013