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HEINER MULLER A MISSAO e outras pecas Organlzagdo, tradugo © posfécio é ANABELA MENDES lustragdes @ capa do JOSE CASTANHEIRA apaginastantas TEATRO Lisboa 1982 A MAQUINA- HAMLET A MAQUINA-HAMLET L ALBUM DE FAMILIA 4) Bu eta Hamlet. Encontravame a beitemar e falava com a reben: tagio/—blabld, Por detrés de mim as ruinas da Europa. Os sinos anunciavam 0 funeral dé Estado, assassino ¢ viva um par, em ppasso de ganso atrés da uma do eminente cadéver/ os conselheizos lamentando-se num luto mal remunerado QUEM E © CADAVER NO CARRO FUNERARIO / POR QUEM SE OUVEM TAN: TOS GRITOS E QUEIXAS / 0 CADAVER E O DE UM HO- MEM / GRANDE DADOR DE ESMOLAS entre as fileiras da populacio, obra da sua arte de estadista ERA UM HOMEM QUE $6 TIRAVA TUDO DE TODOS. Fiz parar o cottejo fiinebre, enfiei a espada no caixdo, partindose a lémina. Com o que dela restou consegui abrilo e dividi o proctiador falecido CARNE VAI BEM COM CARNE pelas figuras de miséria que por ali se encon- travam, O luto transformou-se em jtibilo, o jubilo em voracidade, sobre 0 caixio vazio 0 assassino atirou-se a vitvas{QUERES QUE TE AJUDE A TREPAR, TIO? ABRE AS PERNAS/ MAMA. Deitei-me no chio € escutei o mundo a girar ao passo cadenciedo da_putrefaccao. "M GOOD HAMLET GIME A CAUSE FOR GRIEF AH THE WHOLE GLOBE FOR A REAL SORROW RICHARD THE THIRD I THE PRINCEKILLING KING OH MY PEOPLE WHAT HAVE I DONE UNTO THEE B (> CEREBRO COMO UMA CORCUNDA EU ARRASTO O MEU PESADO SEGUNDO PALHAGO NA PRIMAVERA COMUNISTA SOMETHING IS ROTTEN IN THIS AGE OF HOPE LETS DELVE IN EARTH AND BLOW HER AT _THE MOON is que vem 0 fantasma que me fez, 0 machado ainda no exinio. Podes guardar o teu chapéa, sei que tens um buraco a mais. Quis que a minha mie tivesse tido um a menos, quando tu eras de carne: eu teria sido poupado. Dever-se-iam coser as mulheres, um_ ‘mundo sem mies. Poder-nosfamos massacrar tranquilamente uns 0s outros,¢ com alguma confianga, quando a vida se nos toma demasiado longa ou a garganta demasiado apertada para os n0ssos gritos. Que queres ide mim? Nao te basta um funeral de Estado? | Velho tratante! Nao tens éangue nos sapatos? Que me importa 0 teu cadéverf Contenta-te que o laco esti desenfiedo, talvez vas na mesma parar ao céu. Porque esperas? Os galos foram mortos, A ma- no ‘TENHO DE PORQUE E COSTUME ENFIAR UM PEDAGO DE FERRO NA CARNE MAIS PROXIMA OU NA SEGUINTE PARA Af ME AGARRAR PORQUE O MUNDO GIRA SENHOR PARTE-ME O PESCOGO FAZENDO-ME CAIR DE UM BANCO DE TABERNA Entra Horicio. Ciimplice dos meus pensamentos, que estio cheios de sangue, desde que a manha se cobriu com 0 oft vazio, CHE- GAS DEMASIADO TARDE, MEU AMIGO/ PARA O TEU SOLDO / NAO HA LUGAR PARA TI NA MINHA TRA- GEDIA. Horfcio, conheces-mef Es meu amigo, Horécio# Se me { /eonheces, como podes ser meu amigo?” Queres representar Pol6nio, que quer dormir ao pé de sua filha, a encantadora Ofélia, ela entra com a sua deixa, olha como ela mexe as ances, um papel srigico, Hordeio/Polénio. Eu sabia que és um actor. Também ex 0 sot Fogo de Hamlet. A Dinamarca é uma prisio, entre n6s cresce uma |Olha © que cresce da parede. Exit Polénio. (A minha mae “a noiva, Os seus peitos um canteiro de rosas, o ventre a fossa “4 25 das sempentes, Esqueceste 0 teu texto, mama, Eu fago de ponto. LAVA DO ROSTO O ASSASSINIO/MEU PRINCIPE / E FAZ OLHOS BONITOS A NOVA DINAMARCA. Vou outra vez transformar-te em virgem, mie, pari que o teu rei tenha uma mipcias sangrentas. O VENTRE DA MAE NAO & UMA RUA DE SENTIDO UNICO. Ato te agora az mios atrée das costas, porque me repugna o teu abrago com o véu de noiva. Rasgo agora 60 vestido de noiva, Agora teas de gritar. Agora sujo os farrapos do teu vestido de noiva com a terra em que o meu pai se trans- formou, com estes farrapos 0 teu rosto, 0 teu ventre, 08 teus peitos. ‘Agora pego em ti, minha mile, e condhzo-te pelo seu rasto invisivel, 0 de meu pai. O teu grito sufoco-o com os meus libios. Reconheces 6 fruto do teu corpo? Agora vai is tuas niipcias, puta, aberta 0 01 dinamarqués, que brilha sobre vivos € mortos. Quero enfiar 0 cadaver nas Iatrinas que 0 palicio sufoque em merda real.|Em se- guida, Ofdlia, deixame comer 0 teu coracio que chora as minhas Mgrimas. ai A EUROPA DA MULHER Enormous room, Ofélia. O seu coraao é um relégio. OFELIA (CORO/HAMLET): Eu sou Ofélia. Que o rio no guardoc. A muther na forca a mulher com as veias cortadas a mulher com uma dose-(de nanaéticos)-em. excess SOBRE OS LABIOS NEVE a mulher com a cabera no fogio de gés. Ontem deixei de me natar. Estou sé com os meus peitos, a8 minhas coxas, 0 meu ventre. Dou cabo dos instrumentos do meu cativeiro —a cadeira, a mesa, a cama, Destruo 0 campo de batalha que foi o meu lar. Rebento as portas para que o vento entre € © grito do mundo. Despedago a janela. Com as minhas imiios sangrentas rasgo as fotografias dos homens que amei € que de mim se serviram ma cama, sobre a mesa, na cadetta no chao. ego fogo & minha prisio, Atiro as minbas roupas ao fogo. Desen- we ero do meu peito o relégio que foi o meu coragio, Vou para a rua, vestida com 0 meu sangue. 3 SCHERZO Universidade dos mortos. Sussurros ¢ murmtrios. Das suas pedras tumulares (cétedras) os fildsofos mortos atiram os seus livros sobre Hoarilet. Galeria (bailado) das mulheres mortes, A mulher na forca « mulber com as veias cortedas, etc. Hamlet contempla-as como se fosse um visitante de museu (um espectador de teatro). As mullbe- res mortas rasgantbe as roupes do corpo. De um caixdo colocado 420 alto com a epigrafe HAMLET 1 saem Claudio ¢, vestida e carac terizada de puta, Ofélia. Strip-tease de Ofélia OFELIA: Queres comer © meu coragio, Hamlet? (Ri) HAMLET (as maos diante do rosto): Quero ser uma mulher. Hamlet veste as roupas de Ofélia. Ofélie caracteriza-se con uma ‘méscara de puta, Cliudio, agora pai de Hamlet, ri sem som, Ofélia tira a Hanllet um beijo com a miao e volta a entrar com Cléudio 1 pai de Hamlet no caixéo. Hamlet em pose de puta. Um anjo 0 rosto sobre a nuca: Horécio. Danga com Hamlet. VOZ(ES) do caixao: Aquilo que mataste, tens também de amar. A danca torna-se mais répida e mais selvagem. Saem gargathadas do caisio, Numa cadeira de baloico « madona com um cancro no peito. Horécio abre um chapéu de chuva, abreca Hamlet. Imobili- zam-se no abraco debaixo do chapéu de chuwa. O cancro no peito brilba como um ‘sol it PESTE EM BUDA / BATALHA PELA GRONELANDIA. 46 wo Espaco 2, destrutdo por Ofélia. Armadura vazia, machalo no ca: acete, HAMLET: © fomo fomega nesse Outubro agitado A BAD COLD HE HAD OF IT JUST THE WORST TIME JUST THE WORST TIME OF THE YEAR FOR A REVOLUTION Através dos arrabaldes cimento em flor passa doutor fivago chora pelos. seus lobos NO INVERNO VINHAM AS VEZES A ALDEIA REDUZIAM A PEDACOS UM CAMPONES, (lira a méicara e 0 feto) INTERPRETE DE HAMLET: Nao sou Hamlet. Nao represento mais nenhum papel. As minhas palavras nfo tm mais nada a dizer-me. Os meus pensamentos sugam © sangue das imagens. © meu drama jé nfo se realiza, Atrés de mim montise a cena, De pessoas a quem o meu drama nao inte- ressa, para pessoas a quem ele nfo diz respeito. A mim também le jf nfo interessa. Jé nifo vou nisso. (Os gjudantes de paleo, sem que 0 intérprete de Hamlet se aperceba, instalam um frigorifico e rés aparethos de televisio, Ruido do frigorifico. Trés programas sem som.) A montagem cénica é um monumento. Apresenta, cem ‘vezes aumentado, um homem que fez hist6ria. A petrificagio de uma eperanga. O seu nome é insubstitufvel. A esperanga no se concretizoc. .O.monumento encontrese por terra, dem anos depois do funeral do estado, esse que foi odiado e ven ppelos seus sucessores no poder. A pedra esté habitada. Nos espa- cos0s orificios do nariz e das orclhas, pregas da pele e do uniforme da estétua demolida anicha-se a popalacio miserével da metrépole. ‘A essa queda do monomento, depois de um tempo conveniente, seguese a revolta, © meu drama, se ainda rivesse lugar, _-seia na época da revolta. A revolta comega como passeio. Contra a7 as normas de trénsito durante o tempo de trabalho. A rua pertence 208 pedes. Aqui e ali um carro é voltedo, Pesadelo de um atirador de facas: travessia lenta de uma rua de sentido tinico em direccio a ‘uma praca de estacionamento irrevogfvel que estd cercada de pedes armados. Policias, quando se encontram atravessados no caminho, sin atirados para 9s hermas da sua. Quando o cortejo se aproxima da sede do governo, um cordio de policia fazihe frente, Formam- -se grupos de onde emergem oradores. A varanda de um edificio governamental aparece um homem de frague que lhe assenta mal © comeca igualmente a falar. Mal a primeira pedra Ihe acerta, tam- bém ele se atira para trés da porta de dois batentes em vidro a prova de bala. O pedido por mais liberdade transforma-se em grito pela queda do governo. Comeca-se a desarmar os policias, toma-se de assalto dois ou trés edificios, uma prisio, um posto de polfcia, ‘um departamento da policia secreta, pendura-se pelos pés uma diizia de homens fortes do poder, o govemo faz intervir as tropas, blin: dados. © meu lugar, caso_o meu drama se tivesse realizado, seria dos dois Iados-da frente, entre.as_frentes, por cima, Encontro-me no odor da transpiragéo da multidao e atiro pedras a policias, sol- dados, blindados, vidtos & prova de bala. Olho através da porta de dois batentes em vidro & prova de bala a multidio que aflui e cheiro fo meu suor frio, Sufocado pelo vmite, agito o meu punho contra mim mesmo, eu que estou por detris do vido a prova de bala ‘Vejome, agitado pelo medo ¢ pelo desprezo, na multidio que se aproxima, a minha boca espumando, a agitar 0 meu punho contra mim mesmo. Penduro pelos pés a mitha came em uniferme. Sou © soldado na torre do blindado, a minha cabega estd vazia debaixo do capacete, 0 grito sufocado sob as cadeias. Sou a méquina de escrever. Faco 0 n6 do laco, quando os cabecilhas forem enforcados, retito 0 escabelo, parto © meu pescogo. Sou o meu prisioneiro. mento com os meus dados os computadores. Os meus papéis so saliva © escarrador, faca e ferida, dente e goela, pescoco e corda, Eu sou 0 banco de dados. Sangrando na multidio, Respirando por detrés da porta de dois batentes. Segregando uma baba de palavras no ureu bulio 2 prov de sum sobre a baralha, O meu drama nio teve lugar. O manuscrito perdeu-se. Os actores penduraram as caras 48 45 sy no gancho no vestidrio, Na sua caixa 0 ponto apodrece. Os cadive- res de doentes de peste empalhados na sala nfo mexem s mos. ‘Vou para casa € mato o tempo, de acordo / com 0 meu eu no dividido. Televisio A néusea quotidiana Néusea Pela verborreia preparada Pelo bom humor prescrito Como se escreve ACONCHEGO Daisnos hoje 0 nosso assassinio quotidiano Pois teu ¢ o Nada Néusea elas mentiras em que acreditam Os mentirosos € mais ninguém Néusea Pelas mentiras em que se acredita Néusea Pelos tostos marcados dos hipScrites Pela fata pelos postos votos contas no banco Néusea Um carro de assalto que faisca com as suas gracas Atravesso ruas atmazéns rostos Com as cicatrizes da batalha de consumo Miséria Sem dignidade Miséria sem a dignidade Da faca do punho americano do punho Os corpos humilhados das mulheres Esperanca das geragSes Sufocadas em sangue cobardia estupidez isos saindo de ventres mottos Viva @ COCA-COLA Um teino Para um assassino EU ERA MACBETH O REI TINHA-ME OFERECIDO A SUA |TERCEIRA MULHER CANCEROSA EU CONHECIA TODOS | OS SINAIS DAS SUAS ANCAS RASKOLNIKOV NO CORA- | GAO DEBAIXO DO UNICO CASACO O MACHADO PARA © / UNICO / CRANIO DA USURARIA Na solidéo dos acroportos Eu respiro Eu sou Um privilegiado A minha néusea # um privilégio Protegido por muro_ 49 20 Arame farpado prisio (fotografia do autor) Nunca mais quero comer beber respitar amar uma mulher um hhomem uma crianga um animal, Nunca mais quero motrer, Nunca mais quero matar. (a fotografia do autor em pedacos) [Abco por arrombamento a minha came selada. Quero habitar nas rminhas veias, na medula dos meus ossos, no Iabirinto do meu cra nio, Retito-me para as minhas entranhas. Sento-mo na minha merda, ‘no meu sangue. Algures os corpos so destrufdos para que eu possi habitar na minha merda, Algures os compos sio abertos para que eu possa estar sozinho com o meu sangue. Os meus pensamentos so chagas no meu cérebro. O meu cérebro é uma cicatriz, Quero ser uma maquina. Bragos para agarrar pernas para andar nenhuma dor ‘nenhum pensamento. (éerans sem imagem. Sangue saindo do frigorifico. Trés mulberes nuas: Marx Lenine Mao. Dizem ao mesmo tempo, cada uma na sua lingua o texto & PRECISO TRANSFORMAR TODAS AS SITUAGOES EM QUE O HOMEM... O intérprete de Hamlet este 0 fato e pie a méscara.) HAMLET O PRINCIPE DINAMARQUES E ALIMENTO DE IVERMES TROPECANDO DE BURACO EM BURACO ATE AO ULTIMO BURACO SEM [PRAZER AS COSTAS O FANTASMA QUE © FEZ VERDE COMO A CARNE DE OFELIA NA CAMA DE PARTO E POUCO ANTES DO TERCEIRO GRITO DO GALO UM [Louco DESPEDACA O FATO DE GUISOS DO FILOSOFO UM MASTIM CORPULENTO RASTEJA PARA DENTRO DA [COURACA (entra na armadura, racha com 0 machado as cabecas de Marx Lenine Mao. Neve. Epoca glaciar.) 50 5. ESPERANDO FURIOSAMENTE / NA ARMADURA TERRI- VEL / MILENIOS (Mar profundo. Ofélia em cadeira de baloico. Passam peixes rutnas cadéveres e pedacos de cadéveres.) OFELIA: (enquanto dois homens com bates de mélico a envolvem e a ca deira em ligaduras de gaze debaixo para cima.) ‘Aqui fala Electra, No coracio da obscuridade. Sob o sol da tortura As metrépoles do mundo, Em nome das vitimas. Rejeito todo o sémen, que recebi. Transformo 0 leite dos meus peitos em veneno mortal, Renego o mando a que dei origem. Sufoco entre as minhas coxas 0 mundo que pari. Enterreo no meu sexo. Abaixo a felici- dade da submissio. Viva 0 édio, 0 desprezo, a revolta, a morte. Quando ela atravessar 0s vossos quartos de dormir com facas de camniceiro, conhecereis a verdade. (os bomens saem. Ofélia fica em cena, imével na embalagem branca.) 51

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