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O documento discute a situação da dramaturgia portuguesa contemporânea, afirmando que Portugal não desenvolveu uma forte tradição de escrita teatral. Apesar de vários prémios terem sido criados para incentivar a dramaturgia, eles têm sido atribuídos irregularmente e não contribuíram para aumentar a qualidade ou quantidade de peças originais. Além disso, falta apoio consistente à formação de dramaturgos e à produção de suas obras nos principais teatros nacionais. No entanto, alguns grupos e teatros têm promov
O documento discute a situação da dramaturgia portuguesa contemporânea, afirmando que Portugal não desenvolveu uma forte tradição de escrita teatral. Apesar de vários prémios terem sido criados para incentivar a dramaturgia, eles têm sido atribuídos irregularmente e não contribuíram para aumentar a qualidade ou quantidade de peças originais. Além disso, falta apoio consistente à formação de dramaturgos e à produção de suas obras nos principais teatros nacionais. No entanto, alguns grupos e teatros têm promov
O documento discute a situação da dramaturgia portuguesa contemporânea, afirmando que Portugal não desenvolveu uma forte tradição de escrita teatral. Apesar de vários prémios terem sido criados para incentivar a dramaturgia, eles têm sido atribuídos irregularmente e não contribuíram para aumentar a qualidade ou quantidade de peças originais. Além disso, falta apoio consistente à formação de dramaturgos e à produção de suas obras nos principais teatros nacionais. No entanto, alguns grupos e teatros têm promov
Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo
Dramaturgia portuguesa contempornea: sim e no
Por Jorge Lourao Figueira
No: nem temos um teatro material, nem um drama, nem um
actor. Os Autos de Gil Vicente e as peras do infeliz Antnio Jos foram as nossas nicas produes dramticas verdadeiramente nacionais., afirmou Almeida Garrett em 1841. E continuou: a formao de um repertrio nacional a mais urgente das trs grandes necessidades do nosso teatro. Mais de cem anos depois, porm, em 1964, Joo Gaspar Simes, crtico literrio, repetia a ideia: Portugal uma nao que em cinco sculos de tentativas teatrais no chegou a criar uma tradio teatral que se veja. A literatura portuguesa dos ltimos duzentos anos tem autores da craveira de Ea de Queiroz, de Fernando Pessoa ou do prmio Nobel Jos Saramago, mas no gerou dramaturgos que se possam comparar a estes escritores. No tero os portugueses veia dramtica? Maria Helena Serdio, do Centro de Estudos de Teatro, afirmou h poucos anos que se por um lado o dramaturgo portugus tem pouca ocasio de se confrontar com a experincia do palco, por outro, e a ttulo de exemplo, nos anos noventa, um curto ciclo de peas originais apresentado na sala estdio do Teatro Nacional de D. Maria II no teve qualidade de nvel suficiente para convencer espectadores e gente de teatro das vantagens da dramaturgia portuguesa. O que fazer?
Revista Crioula n 10 Novembro de 2011
A intermitncia dos prmios e a ausncia de candidatos
A reaco habitual a este panorama a tentativa de aumentar a quantidade de peas disponveis, criando prmios a que os dramaturgos possam concorrer enviando as suas obras. Garrett foi o primeiro a fazlo, em pleno sculo dezanove. Actualmente h uma srie de prmios. Os principais so o SPA / Novo Grupo, que garante edio, traduo e encenao, alm de um prmio monetrio; e os prmios INATEL/Novos Textos e Miguel Rovisco (para autores de idade inferior a 25 anos), agora apenas para associados do INATEL. A Associao Portuguesa de Escritores tem um prmio de dramaturgia desde 1993, mas que raramente atribudo, e desde h quatro anos h um Prmio Albufeira de Dramaturgia / APE, bienal, tambm monetrio. Durante dois anos houve o Prmio Novas Dramaturgias, do Dramat (atribudo apenas uma nica vez). Finalmente existe um prmio da Sociedade Portuguesa de Autores para a melhor pea original levada cena est na segunda edio. Nem a Associao Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos, nem a Associao Portuguesa de Crtica Teatral tm algo semelhante. A APAD atribuiu uma nica vez o prmio anual para o melhor texto editado e levado cena. Muito recentemente foi anunciado o Prmio Maria Matos, tambm monetrio, cujo objectivo, segundo o director do Teatro homnimo, combater a dificuldade de colocar em cena textos portugueses, por serem geralmente de pouca qualidade e em baixa quantidade. Durou duas edies. O prmio luso-brasileiro Antnio Jos da Silva vai agora na quinta edio, tendo premiado j Jos Maria Vieira Mendes e Abel Neves. A autarquia de Santarm premiou tambm j por duas vezes textos originais, entre os quais um de Armando Nascimento Rosa. Como vo estes prmios fazer o que em cento e cinquenta anos ningum fez impossvel saber. A rapidez com que so criados e extintos tais competies de tal ordem que este pargrafo perde a validade a cada trimestre. A atribuio de prmios, raramente culminando na leitura ou encenao dos textos, no tem contribudo para aumentar o nmero ou qualidade de peas de teatro portuguesas. Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo
Revista Crioula n 10 Novembro de 2011
A irregularidade da atribuio revela que no h candidatos em nmero
ou qualidade suficiente? A intermitncia de apoios e edies e a ausncia de formao Em Portugal no h uma tradio de escrita teatral, nem uma tradio de montagem de peas originais. Por isso muito dificilmente haver bons dramaturgos por descobrir e boas peas escondidas em gavetas. Se por falta de qualidade, deve apostar-se em medidas que aumentem a qualidade das peas. E o que se poder fazer para mudar esta fraqueza da nossa dramaturgia? Um dramaturgo faz-se pelo contacto, maior ou menor, com os palcos, vendo as suas peas serem feitas, dizem alguns, ou trabalhando com encenadores, dizem outros. Sendo assim, fazia todo o sentido o programa da Fundao Calouste Gulbenkian de apoio contratao de dramaturgos residentes, que fomentou
durante
algum
tempo
trabalho
dos
escritores
em
colaborao com encenadores e companhias. Por muito bom que fosse,
o programa foi extinto h dois anos. No mbito estatal, houve at 2002 Bolsas de Criao Literria na rea da dramaturgia, cujas obras resultantes se encontram na maioria por encenar e/ou publicar. No campo da edio os apoios concedidos pelo IPLB at 2004 encontram-se suspensos. Finalmente, e talvez o mais importante, no h formao nem nas escolas superiores nem nos teatros: o ensino da escrita teatral em Portugal continua a ser feito de modo demasiado informal e espordico. A ausncia da dramaturgia nacional dos Teatros Nacionais desencorajador. No entanto, as obrigaes do Estado mantmse. O incentivo pblico dramaturgia portuguesa to antigo quanto a criao do Teatro Nacional, para a qual foi fundado, e decorre do projecto cultural de Almeida Garrett. A Lei Orgnica do TNDMII obriga aquela entidade a fazer a defesa e divulgao dos grandes textos da Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo
Revista Crioula n 10 Novembro de 2011
dramaturgia nacional, a par da promoo da criao e da produo de
dramaturgias de autores nacionais (); os Estatutos do por objecto do Teatro Nacional a promoo da criao e da produo de dramaturgias contemporneas, nomeadamente de autores nacionais, contribuindo, atravs da divulgao e valorizao dos criadores e suas expresses artsticas, para a continuidade e vitalidade da produo teatral nacional e para o enriquecimento do patrimnio cultural portugus. E a Lei Orgnica do segundo principal teatro, o Teatro Nacional de S. Joo diferente na forma, mas semelhante no esprito: Defender e difundir a cultura teatral portuguesa, quer pela produo regular das obras mais relevantes dos seus vrios perodos histricos, quer pela apresentao de novos originais portugueses e, alnea d, Estimular a formao e promoo de novas geraes de dramaturgos, tradutores, actores, encenadores, cengrafos, tcnicos e demais profissionais do teatro. Estar isto a ser feito? Um clculo a partir dos registos electrnicos do Centro de Estudos de Teatro revela que entre Janeiro de 1999 e Junho de 2006, em 86 produes, o TNSJ estreou 15 peas originais, escritas para teatro e no encenadas pelos prprios autores, de 12 dramaturgos portugueses diferentes, ou seja 17%; e o TNDMII [com um hiato entre Maro de 2000 e Maro de 2002] estreou 3 peas, de 4 dramaturgos portugueses, em 51 produes 6%, se incluirmos Conferncia de imprensa e outras aldrabices, dos Artistas Unidos, que continha sketches de dois autores portugueses; e Madame, de Maria Velho da Costa, uma co-produo com TNSJ). pouco, muito? Que nmero ser razovel? Teramos de comparar com Teatros Nacionais de outros pases, onde o fomento da dramaturgia nacional comeou h cinquenta anos (no Reino Unido) ou h vinte (em Espanha), mas que hoje exportam peas e dramaturgos, e projectam a sua cultura em todo o mundo.
Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo
Revista Crioula n 10 Novembro de 2011
Sim, salva-se alguma coisa: o Teatro da Trindade, os Artistas Unidos, a
Comuna, e o TNSJ (enquanto houve o centro de dramaturgia DRAMAT) tm promovido a escrita e forjado novos autores, atravs de aces de formao e da encomenda de peas. Jorge Silva Melo, autor e encenador, o principal
promotor de dramaturgos portugueses, seja atravs de leituras e
encenaes, seja atravs da edio da coleco Livrinhos de Teatro e da Revista dos Artistas Unidos. Estes teatros e grupos acolheram e formaram uma mo-cheia de autores. Uma parte deste esforo certamente inglria dado o panorama geral acima retratado. Mas os autores ligados a estes e outros projectos devem ser apoiados para que desenvolvam as suas obras. H uma grande receptividade a textos originais, em portugus, nos palcos por parte dos espectadores, pelo menos, e isso deve encorajar os artistas e os servidores pblicos. Em Coimbra vai ser criado um centro de dramaturgia, ligado ao Teatro Acadmico Gil Vicente e aos cursos de Estudos Artsticos, com dramaturgos residentes. No Porto, as Leituras no Mosteiro deram destaque desde o ano passado a alguns autores nacionais. O Teatro Artimagem promoveu j trs edies de uma Mostra Anual de Dramaturgia, que deu a conhecer textos inditos e chegou a encomendar alguns originais.
Dois casos tm apresentado uma dramaturgia da identidade local e/ou
regional, com textos originais de Abel Neves e Jos Lus Peixoto ou dramaturgia de Natlia Luiza: o Teatro Meridional e o Teatro Regional da Serra do Montemuro. Grupos mais novos como os Primeiros Sintomas (com peas de Miguel Castro Caldas) e o Teatro Praga (com textos de Pedro Penim, Andr e. Teodsio e Jos Maria Vieira Mendes) so a face mais urbana, ou lisboeta, da escrita teatral contempornea, a que se devem somar Patrcia Portela (Prado) e Tiago Rodrigues (Mundo Perfeito), autores ainda mais universais. No Porto, devem destacar-se, por um lado, mais concreto e realista, os espectculos do Teatro da Palmilha Dentada, com o humor verbal alegrico de Ricardo Alves; a Panmixia, sempre com Jos Carretas, um autor de dilogos precisos e versos preciosos; e o Teatro Artimagem, que apresentou j textos de Pedro Eiras, Jorge Marmelo, Jorge Palinhos e, Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo
Revista Crioula n 10 Novembro de 2011
sobretudo, Fernando Moreira (agora tambm com O Astro Fingido); e
por outro, mais abstracto e simblico, os Vises teis, que alternam entre textos de autores estrangeiros e peas com dramaturgia prpria; e o Teatro Bruto, que tem produzido textos de vrios autores, entre os quais Regina Guimares, Valter Hugo Me, Gonalo M. Tavares, Daniel Jonas, e Marta Freitas.
Especial: Panorama do Teatro Portugus Contemporneo