Alan Dias *
PROCESSO CIVIL
1- Introdução.
O direito constitucional da liberdade do homem, na República Federativa do Brasil, é assegurado pelo art.5º
da Constituição Federal de 1988, ápice do Ordenamento Jurídico Brasileiro.
A prisão, quer seja prevista na área civil ou penal, deve respeitar os princípios constitucionais do processo,
pois, não ocorrendo, haverá a infração dos fundamentos basilares da jurisdição brasileira, além de atingir o
Estado Democrático de Direito, visto que o magistrado, no exercício de suas funções, estará exercendo sob
o aspecto ditatorial sem qualquer embasamento jurídico.
"Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;"
A Carta Magna/88 apresenta a maioria dos princípios constitucionais, explícitos no art.5º, norteando o
ordenamento jurídico pátrio. A supremacia do ápice legal não apresenta derrogações condicionadas ao bem
querer da comunidade política e jurídica, visto que, além da impossibilidade de ser objeto de emenda,
conforme vedação constitucional prevista no art.60, tais princípios, assim como a isonomia, o devido
processo legal, a ampla defesa e o contraditório, constituem em fundamentos basilares da jurisdição
brasileira.
Constata-se que a prisão, relacionada ao tema, é explicita quando prevê no art.5º, inciso LXVII que "não
haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de
obrigação alimentícia"; logo não admite-se interpretação extensiva, pois que haveria o suprimento da
garantia constitucional do direito da liberdade do homem. Verifica-se, também, que fora dessa hipótese
constitucional, o decreto judiciário configurará uma inconstitucionalidade ao confrontar os princípios do
devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa previstos no art.5º e incisos LIV e LV, além de
atingir o princípio do Estado Democrático de Direito previsto no caput do art.1º.
§ Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-à a prisão pelo prazo de um ( 1 ) a
três ( 3 ) meses.
Analisando sistematicamente este artigo do Código de Processo Civil com o art.5º, inciso LXVII da C.F./88,
constata-se que o procedimento prevê a possibilidade de prisão civil alimentar, quando na hipótese de
inadimplemento voluntário e inescusável. Logo, o art.733 garante o princípio da ampla defesa antes da
decretação do mandado de prisão.
I-A Constituição e a lei processual civil exigem que a prisão do devedor de pensão alimentícia
promane de decisão fundamentada, não podendo decorrer de mero despacho ordenando o
pagamento, sob pena de prisão.
A ação de Habeas Corpus constitui no melhor meio processual possibilitando a correção do procedimento
com o conseqüente saneamento da prisão ilegal ou a sua possibilidade. Deve-se atentar a manifestação do
ilustre Doutrinador, Mestre e Desembargador ARAKEN DE ASSIS ( 2):
"...De limite angusto, a cognição judicial neste remédio jamais desce à planície valorativa do
error in iudicando, da injustiça do ato e da valoração da prova.. Exemplificativamente, se afiguram
compatíveis com os lindes escassos da impetração as seguintes matérias: a) incompetência do
juízo; b) falta de pedido; c) falta de indicação ou de ilíquida da dívida; d) ausência de chamado para
o devedor se manifestar sobre o cálculo de liquidação; e) omissão de prazo para defesa; f) recusa
imotivada de abertura da fase instrutória; g) desobediência ordem preferencial dos meios
executórios; h) decisão carcerária prematura, expedida antes da determinação para que sejam
efetuados descontos de diferenças de reajustamentos da pensão alimentícia; i) inexistência ou
insuficiência da motivação do ato decisório; j) extinção da dívida por causa superveniente à defesa."
Com o advento da Lei n.9099/95, o ordenamento jurídico processual brasileiro ganhou um novo dinamismo
nas situações jurídicas que comportam a utilização do procedimento especial.
Não obstante a possibilidade de conciliação versando sobre matérias de competência material vedada pelo
art.3º da Lei n.9099/95, em face da incidência do art.58 da mesma lei, na hipótese de alimentos destinados
a INCAPAZES, é mister a necessidade de pelo menos a intimação do parquet, sob pena de nulidade
absoluta, em face da previsão normativa do art.11 da lei especial combinado com o art.82, 84 e 246 do
C.P.C.. Constata-se, também, que não obstante interpretando o termo "causas" previsto no art.58 da lei
especial relacionado à competência em razão da matéria, há a vedação absoluta relacionada ao incapaz,
impedindo que este seja parte na ação de alimentos proposta no Juizado Especial, em virtude do art.8º
caput, todavia a possibilidade de conciliação ( art.22 e 23 ) , sob a hipótese prevista no art.58, salientando
que esta concretiza se mediante o prévio ajuizamento de ação judicial, atendendo aos pressupostos legais e
às condições da ação. Logo, em face desses aspectos legais, constata-se, sob um conceito jurídico mais
preciso, que a sentença de homologação propalada é inexistente ( ou absolutamente nula, pois este é o
posicionamento de alguns doutrinadores ) , visto que não há o interesse de agir do autor e configura-se a
incompetência absoluta em razão da matéria ( falta de pressuposto processual ) , além da vedação
normativa insanável prevista no art. 8º da lei n. 9099/95, revelando a inexistência do exercício do direito de
ação e da relação processual. Deve-se atentar o posicionamento dos eminentes e ilustres, doutores Teresa
Arruda Alvim Pinto ( 3 ) e Humberto Theodoro Júnior ( 4 ) :
... Tendo sido movida uma ação, estando ausentes uma ( ou mais ) de suas condições, terá sido
exercido direito de petição, e não direito de ação.
Ora, inexistente a ação, o mesmo se poderá dizer do processo e, por conseguinte, da sentença.
Liebman diz que: "A ação tem por garantia constitucional o genérico poder de agir, mas em si
mesma não é absolutamente genérica..."
"Se, num determinado caso, faltam as condições de ação, ou mesmo só uma delas, haverá
carência de ação, devendo o juiz abster-se quanto a um juízo sobre o mérito e limitar-se a declarar
inadmissível a demanda."
A ação é o "direito ao processo e ao julgamento do mérito", diz Liebman. Logo, parece autorizado
concluir-se que quem não tem este direito, por não estarem satisfeitas as condições da ação, não
terá exercido, propriamente, o direito de ação, mas um outro direito ligado à genérica garantia
constitucional, o direito de petição.
... Diz Liebman textualmente que "as condições da ação são requisitos constitutivos da ação" ( grifo
nossos ). Somente se existem, pode considerar-se existente a ação." ...
... "A sentença é nula ipso iure quando a relação processual em que se apóia acha-se contaminada
de igual vício. Para reconhecê-lo não se reclama a ação rescisória, posto que dita ação pressupõe
coisa julgada que, por sua vez, reclama, para sua configuração, a formação e existência de uma
relação processual válida.
... Embora não haja necessidade de se valer da ação rescisória para obter a parte prejudicada o
reconhecimento da nulidade ou inexistência do julgado, no caso ora apreciado, não será correto
omitir-se o tribunal de apreciar a questão, se a parte lançar mão da ação do art.485 do Código de
Processo Civil. É que as nulidades ipso iure devem ser conhecidas e declaradas
independentemente de procedimento especial para esse fim, e podem sê-lo até mesmo
incidentalmente em qualquer juízo ou grau de jurisdição, até mesmo de ofício segundo o princípio
contido no art.146 e seu parágrafo, do Código Civil." ...
Analisando-se sob o aspecto econômico, social e jurídico, constata-se que os autores pertencem a um baixo
nível social sem que haja condições financeiras para arcar com despesas de custas processuais, honorários
advocatícios, além da celeridade peculiar dos Juizados Especiais; visto que, quando ajuizada a ação de
alimentos, a audiência de conciliação é determinada, no mesmo ato, com a média de 15 a 20 vinte dias,
salientando que a parte pode comparecer sozinha, além da segurança da rápida prestação jurisdicional,
quer seja favorável ou não.
Não obstante a existência do grande contingente social exigindo uma prestação jurídica condizente, deve-se
seguir o procedimento legal, visto que, não o fazendo, o autor, no futuro, terá grandes prejuízos com
repercussões sociais negativas. O procedimento apresenta o embasamento normativo que, na prática, deve
ser aplicado com o devido equilíbrio.
Tendo em vista a previsão legal explanada, quando na hipótese do não cumprimento do acordo de
alimentos, possibilitando a execução e em face da inexistência normativa que veda a execução do suposto
título executivo no juizado especial, deve-se ajuizar a ação executiva declinando a competência a uma das
varas de família.
Contudo, na hipótese da inexistência ou da nulidade absoluta e insanável da Sentença de Homologação,
deve-se argüi-la na oportunidade da defesa, sob o aspecto da inexigibilidade do título, visto que, admitindo-
se a ação executiva, haverá a infração do devido processo legal, possibilitando o ajuizamento do Habeas
Corpus preventivo ou liberatório, quando na hipótese do procedimento do art.733 do C.P.C.. Deve-se
constatar o interessante posicionamento do STJ:
Deve-se, ainda, atentar que havendo sentenças homologatórias ( inexistentes ou nulas de pleno direito ) de
conciliação, constitui em um entrave jurídico, visto que a Lei n.9099/95, veda a possibilidade de recurso e
ação rescisória conforme o art.41 e 59. Constata-se, também, que não se aplica o art.486 do C.P.C., visto
que a sentença não homologa um mero acordo, como ocorre com a separação consensual que apresenta o
crivo jurídico relacionado à composição de vontades, salientando que nesta não há partes e nem litígio e
que o procedimento especial não prevê a ação anulatória.
"...Não é esta, por certo, a melhor solução, porque na verdade as quantias referentes aos
débitos atrasados, só pelo fato do atraso não perdem o caráter de prestação alimentar. Se assim
fosse, ninguém mais estaria obrigado a pensionar ninguém. O atraso, atribuível ao devedor, não
despe as parcelas da natureza da causa de que emanam. O débito continua sendo alimentar.
Exatamente por isso, por sempre conservarem essa índole os débitos pretéritos, nenhuma eiva de
nulidade pode ser vista no decreto prisional do devedor, já que providência é legalmente prevista
para o descumpridor em hipóteses que tais. Se tinha motivos para embasar pedido de exoneração,
ao alimentante cumpria tomar essa providência, que seria idônea para obviar sua prisão. Não o
fazendo, porém, oportunamente, e sendo vedado ao devedor beneficiar-se de sua própria relapsia,
se não postulou a liberação do encargo, legítima é a sua custódia civil, ainda mais quando não
justificada a impossibilidade de prestar os alimentos devidos..."
6- Conclusão.
Tendo em vista o exposto, verifica-se que as garantias do devido processo legal e demais princípios
correlatos devem ser respeitados, sob pena da nulidade absoluta e do favorecimento a alguns (executados )
que, sob o aspecto moral, não apresentam qualquer direito.
Todo e qualquer procedimento deve ser respeitado, não importando a exigência social, conforme dito no n.4,
parágrafos 3º e 4º, sob pena de haver o entrave jurídico através da impetração do Habeas Corpus, visto
que, quando o Magistrado ultrapassa os parâmetros e limites legais, este atua sem a sua autoridade peculiar
ao exercício da função jurisdicional e sim com o autoritarismo ditatorial de um monarca jurídico, podendo ser
corrigido pelo writ constitucional.