Avaliação da Qualidade do Solo em Sucessão Floresta - Pastagem na

Amazônia Ocidental, Acre

.

E.A. ARAÚJO(1), J.C. KER(2), J.C. L.NEVES(2), J.L.LANI(2), E.K. OLIVEIRA(3), RIBEIRO, M.F(3)

RESUMO - O Acre apresenta-se em estágio inicial de

conversão de suas florestas, cerca 10 % de sua área
total encontra-se desflorestada. Deste montante, cerca Introdução
de 80 % são utilizadas com pastagens. A tendência tem
O processo de expansão da pecuária na Amazônia
sido a crescente implantação de pastagens, por colo nos,
tem gerado altos custos e danos ao meio ambiente,
extrativistas, ribeirinhos e pecuaristas. Poucos estudos
assim como às populações rurais, além de contribuir
na Amazônia têm dado ênfase na mensuração da
para o agravamento dos conflitos pela posse da terra
degradação do solo pelo uso com pastagens por
[1]. A área cumulativa desmatada na Amazônia Legal
intermédio da integração de variáveis relacionadas às
atingiu 631.369 km2 em 2002, o correspondente a 15,7
suas propriedades. Com esse intuito, selecionaram-se
% da área total da floresta amazônica brasileira. Em
duas sucessões floresta-pastagem situadas na região
torno de 80 % dessas áreas foram ocupadas com
Sudeste do Acre de modo a se estimar a magnitude
pastagem [2] e cerca da metade encontram-se
dessa deterioração. A primeira sucessão localiza-se no
degradadas ou em processo de degradação [3].
município de Rio Branco e consiste em uma área de
O Acre apresenta-se em estágio inicial de conversão
floresta aberta com taboca e palmeira e duas pastagens
de suas florestas, cerca 10 % (16.422 km2) de sua área
B. brizantha de diferentes idades (3 e 10 anos) em área
total encontra-se desflorestada [4]. Deste montante,
de Argissolo Vermelho-Amarelo plíntico. A segunda
cerca de 81 % (13.352 km2) são utilizadas com
localiza-se no município de Senador Guiomard em uma
pastagens [5]. A tendência tem sido a crescente
área de floresta densa e pastagem de B. brizantha de 20
implantação de pastagens, por colonos, extrativista s,
anos em ambiente de Latossolo Vermelho-Amarelo
ribeirinhos e pecuaristas.
distrófico. Em cada local retiraram-se amostras de solos
Frequentemente tem sido abordado o impacto que a
em três profundidades (0-5, 5-10, 10-20 cm) com trê s
conversão de áreas de floresta em ecossistemas de
repetições. Efetuaram-se análises físicas e química s de
pastagem de gramíneas forrageiras, em sua maioria d e
rotina para as amostras supracitadas. Efetuou-se o
Brachiaria brizantha tem causado ao meio ambiente e
fracionamento das substâncias húmicas (AF, AH e
à biodiversidade do Acre [6]. Vale ressaltar que es tas
HUM). Estimou-se a qualidade do solo para a
informações têm um caráter generalista, superficial e
profundidade de 0-20 cm da superfície por meio do
subjetivo, sem subsídios de estudos aplicados no
índice de deterioração do solo (IDS) em ambientes d e
sentido de quantificar a magnitude dessas alteraçõe s e
pastagem de Brachiaria brizantha de diferentes idades,
monitorá-las ao longo do tempo.
tendo a mata nativa como referência. Para o cálculo do
Alguns estudos sobre pastagens, no Acre, referem-se
índice de qualidade do solo, associado a cada ambie nte,
ao risco de morte de pastagens em solos mal drenados
integraram-se atributos físicos e químicos do solo
[7,8], à ocorrência de alterações físicas e química s com
relacionados à sustentabilidade ambiental. Conclui- se
o tempo de utilização [9,10] ao estoque de carbono
que, em geral, com o tempo de utilização as
[11] e composição isotópica [12] e à respiração do solo
propriedades físicas dos ecossistemas de pastagem
[13]. Entretanto, não têm sido realizados trabalhos no
foram deterioradas, em detrimento do incremento no
sentido de integrar atributos físicos, químicos e
conteúdo de matéria orgânica do solo e nutrientes.
biológicos do solo de modo a possibilitar a avaliaç ão

________________
(1)
Doutorando em Solos e Nutrição de Plantas do Depar tamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa (U FV). Técnico da Secretaria de
Agropecuária do Acre (SEAP). Ex-Bolsista Internacional da Fundação Ford. E-mail: earaujo.ac@gmail.com; (apresentador do trabalho)
(2)
Professor Adjunto do Departamento de Solos, UFV. E-mail: jcker@ufv.br; julio_n2003@yahoo.com.br.
(3)
Discente de Agronomia da UFV. E-mail: erikakaoli@yahoo.com.br

1
da qualidade do solo por intermédio de um índice
quantitativo.
Portanto, esta pesquisa foi idealizada com o
propósito de avaliar a qualidade do solo, em relação à
sustentabilidade ambiental, por intermédio de
indicadores físicos, químicos dos solos, que reflitam
sua utilização e manejo em distintos ecossistemas de
pecuária extensiva do Acre, comparando-os aos de
floresta nativa da região.
Palavras-Chave: indicadores de qualidade do solo,
Brachiaria brizantha e sustentabilidade ambiental.
Material e métodos
Os locais de estudo localizam-se nos municípios de
Rio Branco e Senador Guiomard, região Sudeste do
Acre. No município de Rio Branco, predominam solos
em geral rasos a pouco profundos, com caráter plíntico
e por vezes com argila de atividade alta, em geral,
eutróficos. A vegetação dominante é do tipo floresta
aberta com bambu e palmeira. O relevo varia de suave
ondulado a ondulado. A média anual da precipitação
pluviométrica varia de 1.877 a 1.982 mm e a
temperatura média anual é de 25º C. A sucessão
estudada inclui a floresta original (FA) e duas
pastagens de B. brizantha, implantadas há 3 e 10 anos
(P3A e P10A, respectivamente). A primeira foi
plantada em 2001 após derruba e queima da floresta;
não foi utilizado corretivo ou adubo. A segunda foi
implantada em 1994; não foi utilizado corretivo ou
adubo; a área foi queimada após o desmate (1994) e
novamente em 1999 (cinco anos depois). O Braquiarão
(B. brizantha) foi semeado simultaneamente com a
puerária (Pueraria phaseoloides). Observou-se a
ocorrência de plantas invasoras como o assa-peixe
(Vernonia spp.), jurubeba (Solanum crinitum), malva
(Sida spp.), e tiririca (Cyperus spp.). No município de
Senador Guiomard predominam Latossolos Vermelho-
Amarelos, em geral cauliníticos, profundos, bem
drenados em ambientes de relevo plano a suave
ondulado. A floresta nativa predominante é a do tipo
floresta densa com musácea. A precipitação
pluviométrica e a temperatura média anual são
similares as da área de Rio Branco. As áreas estudadas
incluem a floresta original (FB) e uma pastagem de B.
brizantha de 20 anos (P20B), implantada em 1984; não
foi realizada queima nos últimos 10 anos; não foi
gradeada e não se utilizou corretivo nem adubo. A
mesma apresenta quase nenhuma infestação por
invasoras. Nos ecossistemas de mata nativa (FA e FB)
foram abertos perfis de solo, os quais foram descritos e
coletadas amostras conforme Santos et al. [14]. Em
cada local, foram abertas 3 minitrincheiras e retiradas
amostras de solo nas profundidades de 0-5; 5-10 e 10-
20 cm da superfície. As amostras foram secas ao ar
(TFSA) e depois, submetidas às análises físicas e
químicas de rotina [15]. A densidade do solo foi
determinada por meio do método do anel de Kopeck
[15] com três repetições para cada camada. A extração
e fracionamento dos ácidos húmicos (AH), ácidos
fúlvicos (AF) e humina (HUM), foi realizada conforme
metodologia preconizada pela Sociedade Internacional
de Substâncias Húmicas - IHSS [16]. Na determinação
do carbono orgânico do solo e presente nessas frações
da MOS (AF, AH e HUM), utilizou-se o método da
dicromatometria, com aquecimento, proposto por
Yeomans & Bremner [17]. A qualidade do solo foi
mensurada para a profundidade de 0-20 cm da
superfície por meio do índice de deterioração do solo
(IDS), conforme metodologia preconizada por Islam &
Weil [18]. Partiu-se do pressuposto que as
propriedades físicas e químicas das pastagens foram as
mesmas dos solos adjacentes, sob mata nativa. As
diferenças entre as propriedades dos solos sob
pastagens, comparadas à linha base das propriedades
do solo sob vegetação nativa, foram calculadas e
expressas como a percentagem da média dos valores
individuais de cada propriedade. Essas percentagens
foram agrupadas (em uma média geral), a fim de
compor o índice de deterioração do solo (IDS).
Para a geração do IDS, foram utilizadas as seguintes
propriedades do solo: a) químicas - pH, carbono
orgânico, fração ácido fúlvico, fração ácido húmico,
humina, acidez potencial (H+Al), fósforo disponível,
bases trocáveis (Ca2+, Mg2+ e K+) e alumínio trocável
(Al3+); b) físicas – areia fina, silte; argila dispersa em
água, densidade do solo e porosidade total.
Resultados e Discussão
Os ambientes de floresta estudados (FA e FB)
diferem entre si principalmente quanto ao teor de
carbono, quanto à textura e em termos de fertilidade
(Quadro 1). Quando se analisa os diferentes ambientes
em camadas observa-se que, para o pedoambiente 1
(Quadro 1), os solos foram mais ácidos na floresta
primária do que nas áreas de pastagem. Este fato é
devido à adição de cinzas ao solo, durante o processo
de conversão da floresta em pastagem [10, 19]. Em
ambos os ecossistemas, os teores de carbono, fósforo
(P) e nutrientes concentram-se nos primeiros cinco
centímetros, ligeiramente mais elevados nas pastagens.
Isso sugere que os maiores valores de somas de bases
encontrados sejam provenientes do processo de
ciclagem de nutrientes favorecidos pela serapilheira e
raízes. Chama atenção o teor mais elevado de P no
ambiente P10A. Como essa pastagem encontra-se em
ambiente de solos que ficam encharcados boa parte do
ano, além do processo de compactação, isso cria uma
zona de redução (com cores acinzentadas), podendo
favorecer ao acúmulo de matéria orgânica e a liberação
de P ligado ao ferro [20,21]. A relação Ec/COT tendeu
a decrescer com o tempo de utilização, no
pedoambiente 1, contrariamente ao pedoambiente 2. A
densidade do solo tendeu a aumentar em ambiente de
pastagem, inversamente à porosidade total do solo. Este
2
fato é atribuído aos impactos negativos, ocorridos no
solo após a conversão de floresta em pastagem. Em
muitas situações, tem-se verificado a intensificação
desses processos, com a ocorrência de morte de
pastagem de B. brizantha na região [7]. Este fenômeno
tem sido atribuído à suscetibilidade desta forrageira a
condições de má drenagem do solo, principalmente em
áreas relacionadas ao pedoambiente 1.
No pedoambiente 1, o pedossistema constituído pela
pastagem de B. brizantha de 3 anos é o local onde
incidiu a maior deterioração das propriedades físicas do
solo (53,21%) comparativamente aos ecossistemas de
pastagem com 10 anos (-23,18%) (Quadro 2). Neste
último, as condições químicas foram bastante alteradas,
o que contribui para o incremento no seu IDS total.
Quando se compara a pastagem de 20 anos no
pedoambiente 2, verifica-se que o IDS está próximo à
linha-base da mata nativa de referência. Tal fato sugere
que este ecossistema estaria retornando a um novo
equilíbrio ou tenha uma maior resiliência, em virtude
das propriedades do solo e características atribuídas a
esta classe de solo.
Estes índices demonstram que, durante o processo de
conversão da floresta em ecossistemas de pastagem,
ocorre uma expressiva deterioração do solo, que se
reflete, principalmente, nas propriedades do solo e, por
conseguinte, na redução da capacidade de suporte das
pastagens.
Referências
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35:317-330.
3
 Quadro 1. Propriedades físicas e químicas de solo selecionadas para os diferentes ecossistemas no intervalo de 0-5, 5-10 e 10-20 cm
de profundidade

Prof. pH H2O COT FAF FAH Ec/COT P K+ Mg +2 Ca2+ Al 3+ af s r rN Ds PT

-1 -3 -1 -1 -3
-- cm -- ---------dag.kg ----------- % mg.dm ---------- cmolc.kg ----------- --------- dag kg -------- kg dm m3 m-3
Pedoambiente 1
Mata Nativa (FA)
0-5 5,43 2,14 0,27 0,23 29,2 4,99 0,11 1,55 3,47 0,50 26 51 21 13 1,09 0,45
5-10 5,43 1,39 0,16 0,07 22,9 2,16 0,06 1,23 1,38 0,37 24 55 20 16 1,22 0,45
10-20 5,30 1,19 0,11 0,06 21,9 1,69 0,06 1,26 0,90 0,43 25 53 21 18 1,35 0,49
Pastagem B. brizantha 3 anos (P03A)
0-5 6,0 2,29 0,25 0,24 31,7 3,56 0,27 1,82 6,09 0,30 13 61 25 18 1,17 0,51
5-10 5,7 1,36 0,18 0,16 37,8 2,07 0,14 1,54 3,71 0,40 12 64 23 19 1,37 0,45
10-20 5,4 1,19 0,12 0,13 37,1 1,17 0,14 1,59 2,59 0,93 14 57 28 22 1,38 0,45
Pastagem B. brizantha 10 anos (P10A)
0-5 7,1 3,3 0,3 0,4 20,7 13,4 0,3 1,7 9,9 0,2 30 50 20 12 1,31 0,45
5-10 7,2 1,2 0,1 0,1 11,8 5,8 0,4 1,5 7,0 0,1 31 51 18 12 1,42 0,43
10-20 6,6 1,0 0,1 0,1 25,3 3,4 2,6 2,1 3,5 0,5 30 49 21 18 1,44 0,42
Pedoambiente 2
Mata Nativa (FB)
0-5 4,60 1,65 0,29 0,37 21,5 2,46 0,08 0,53 0,85 0,60 46 17 24 19 1,21 0,60
5-10 4,20 1,94 0,22 0,13 19,7 1,55 0,06 0,37 0,43 1,30 41 17 31 23 1,17 0,51
10-20 4,20 1,62 0,22 0,07 21,6 1,23 0,05 0,00 0,48 1,60 34 17 39 32 1,33 0,46
Pastagem B. brizantha 20 anos (P20B)
0-5 4,6 1,8 0,3 0,5 25,8 2,9 0,1 0,5 1,0 0,9 43 15 29 18 1,40 0,45
5-10 4,4 1,6 0,2 0,2 31,5 1,1 0,0 0,2 0,6 1,2 39 15 35 27 1,43 0,45
10-20 4,4 1,6 0,2 0,1 30,9 0,8 0,0 0,1 0,3 1,4 36 15 40 20 1,30 0,49
COT = carbono orgânico total; FAF = fração ácido fúlvico; FAH = fração ácido húmico; Ec/ COT = relação FAF+FAH/COT; af =
fração areia fina; s = silte; r = argila; rN = argila dispersa em água; Ds = densidadee do solo e PT = porosidade total do solo.

Quadro 2. Índice de deterioração, químico, físico e total (IDSq, IDSf, e IDSt) do solo para diferentes pedoambientes da região
sudeste do Acre

Ecossistemas IDSq IDSf IDSt

Pedoambiente 1 ------------------% -----------------------

Mata Nativa (FA) 0,0 0,0 0,0

Pastagem de B. brizantha 3 anos (P03A) 17,1 53,21 35,2
Pastagem de B. brizantha 10 anos (P10A) 92,5 -23,18 34,6
Pedoambiente 2

Mata Nativa (FB) 0,0 0,0 0,0

Pastagem de B. brizantha 10 anos (P20B) 6,1 -43,5 -18,7