SÁBADO
– A correcção fraterna era praticada com frequência entre os primeiros cristãos. Falsas
desculpas para não fazê-la. Ajuda que prestamos.
Um dos maiores bens que podemos prestar àqueles a quem mais queremos
e a todos, é a ajuda, muitas vezes heróica, da correcção fraterna. No convívio
diário, observamos que os nossos familiares, amigos ou conhecidos – como,
aliás, nós mesmos – podem chegar a formar hábitos que destoam de um bom
cristão e que os afastam de Deus. Podem ser faltas de laboriosidade habituais,
de pontualidade, modos de falar que beiram a murmuração ou a difamação,
brusquidões, impaciências... Podem ser também faltas de justiça nas relações
de trabalho, atitudes pouco exemplares no modo de viver a sobriedade ou a
temperança, gula, embriaguez, gastos de pura ostentação, desperdícios de
dinheiro no jogo ou nas lotarias, amizades ou familiaridades que põem em
perigo a fidelidade conjugal ou a castidade... É fácil compreender que uma
correcção fraterna feita a tempo, oportuna, cheia de caridade e de
compreensão, a sós com o interessado, pode evitar muitos males: um
escândalo, um dano irreparável à família...; ou, simplesmente, pode ser um
estímulo eficaz para que a pessoa em questão corrija um defeito e se aproxime
mais de Deus.
Devemos pensar com frequência se não nos omitimos nesta matéria. “Por
que não te decides a fazer uma correcção fraterna? – Sofre-se ao recebê-la,
porque custa humilhar-se, pelo menos no começo. Mas, fazê-la, custa sempre.
Bem o sabem todos. – O exercício da correcção fraterna é a melhor maneira de
ajudar, depois da oração e do bom exemplo”4.
Entre as desculpas que podemos dar no nosso coração para não fazer ou
para adiar a correcção fraterna, está antes de mais nada o medo de entristecer
aquele que a deve receber. É paradoxal que o médico não deixe de dizer ao
paciente que, se quer ser curado, deve sofrer uma dolorosa operação, e que
nós, cristãos, tenhamos relutância às vezes em dizer àqueles que nos rodeiam
que está em jogo a saúde da sua alma. “É grande o número dos que, para não
desagradarem ou para não impressionarem uma pessoa que tenha entrado
nos últimos dias e nos momentos extremos da sua existência terrena, lhe
silenciam o seu estado real, causando-lhe desse modo um mal de dimensões
incalculáveis. Mas é mais elevado o número daqueles que vêem os seus
amigos no erro ou no pecado, ou prestes a cair num ou noutro, e permanecem
mudos, e não mexem um dedo para lhes evitar esses males. Poderíamos
considerar amigo a quem se comportasse connosco desse modo? Certamente
que não. E, no entanto, as pessoas à nossa volta adoptam frequentemente
essa atitude para não nos magoarem”11.
Às vezes, uma certa irritabilidade e falta de paz interior pode levar-nos a ver
nos outros defeitos que na realidade são nossos. “Devemos corrigir, pois, por
amor; não com o desejo de ferir, mas com a intenção carinhosa de conseguir
que a pessoa se emende [...]. Por que a corriges? Porque te irrita teres sido
ofendido por ela? Queira Deus que não. Se o fazes por amor-próprio, nada
fazes. Se é o amor que te move, actuas bem”14.
Quando somos nós que recebemos uma correcção, devemos aceitá-la com
humildade e em silêncio, sem nos desculparmos, reconhecendo a mão do
Senhor nesse bom amigo, que o é pelo menos a partir daquele momento; com
um sentimento de gratidão viva, porque alguém se interessou de verdade por
nós; com a alegria de pensar que não estamos sós no esforço por dirigir
sempre os nossos passos para Deus.
(1) Cfr. 2 Sam 12, 1-17; (2) São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 60, 1; (3) Sl 50;
(4) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 641; (5) cfr. Mt 18, 15; (6) cfr. Didaqué, 15, 13; (7) 2 Tess
3, 14-15; (8) Gál 6, 1; (9) Ti 5, 19-20; (10) Gen 4, 9; (11) S. Canals, Reflexões espirituais, pág.
133; (12) Prov 18, 19; (13) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 455; (14) Santo Agostinho, op. cit.;
(15) São João Crisóstomo, op. cit., 29; (16) Leão XIII, Prática da humildade, 41.