Escrito pelo professor de filosofia ANTONIO JAQUES DE MATOS
Porto Alegre, 14 de março de 2010.
À pergunta o que é o amor não valem respostas tais como “é um sentimento
inexplicável” ou “tem razões que a própria razão desconhece”, pois tais respostas não são nem filosóficas, nem científicas, embora a ciência tenha batido martelo em favor de uma explicação hormonal, química ou instintiva (medicina e biologia). A explicação da psicanálise, também, recorre à noção de instinto, mas acrescenta à memória das experiências que a criança vive com o pai e com a mãe, criando complexos bem ou mal resolvidos e, ainda, à posse do pênis e a sua ausência nas mulheres. Todas essas tentativas cientificas de explicar o que é o amor, restringem-no à idéia de instinto e reprodução sexual. A psicanálise comete o erro grosseiro de misturar afeto com sexo. Quando li a obra “Philebo”, de Platão, que trata sobre a melhor vida, na busca de prazer, no distanciamento das dores ou em um terceiro estado, neutro, nem dor, nem prazer. Mas, o que mais me chamou atenção foi uma pergunta que aquele brilhante pensador fez: de onde temos lembrança não da necessidade, mas da completude? Isto é, se buscamos nos afastar da dor, como aprendemos isto? Um instinto posto em nós por uma divindade, como pensou Locke, no século XVII? Ora, a noção de instinto é ridícula, um conhecimento inato? Como entrou em nós? Voltando à pergunta: se não aprendemos a buscar um estado de completude, ausência de necessidade (quando temos fome, queremos voltar a nos sentir saciados, por exemplo), de um suposto instinto, nem de uma outra vida, como pensava Platão, anterior a um corpo, esse conhecimento de sentir-se completo foi aprendido ou durante a gestação ou depois de nascidos. Depois de nascido não nos parece, pois quando o bebê chora pela primeira vez, o calor do corpo da mãe o acalma e isso ninguém lhe ensinou depois que ele nasceu. Então, resta o período intrauterino! É lá que aprendemos o que é sentir-se completo. Cercado pelo líquido amniótico, por uma temperatura constante, vivendo na ausência de quaisquer necessidades. O afeto, o desejo de um abraço, de “calor humano”, tem sua origem lá quando somos cercados pelo líquido amniótico. É claro que a noção de amor é incompleta se o pensarmos apenas como originado da vida fetal. Pois, por que gostamos de alguns rostos, corpos, cheiros, etc e não de outros? Esses são aprendizados secundários, pois, na vida em sociedade conhecemos pessoas que nos provocam reações positivas ou negativas, agradáveis ou desagradáveis e memorizamos tais experiências a ponto de construirmos tipos ideais que se parecem com aquelas pessoas com quem vivemos bons momentos. Em resumo, o amor é um desejo de se sentir completo, de se sentir como nos sentíamos no útero, cercado de líquido amniótico. Nos últimos anos se tem dado mais valor àqueles nove meses e o quanto ele contribui para o resto de nossas vidas. Li que a sensação agradável quando estamos diante do mar, vendo o vai-e-vem de suas ondas que só é agradável porque se assemelha ao movimento do líquido amniótico movendo nossas pelugens (não são ainda pelos) para lá e para cá. E esse é só uma hipótese dentre muitas outras. Agora, o que nos faz quere um tipo de pessoa, um tipo de orientação sexual, isto dependerá das experiências que viveremos em sociedade, portanto, na interação com as outras pessoas. Assim como a busca por alguém que nos complete é chamado de amor, como chamaremos a busca por uma sociedade completa? Ética. E a busca por objetos completos? Estética. Vemos, assim, que tanto o amor, quanto o bem e o belo, embora dirigidos a fins diversos, tem a mesma origem: a vida intrauterina.