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Prosperidade e decadência, as duas faces do

Valongo (1)
Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)
Quem vê o Valongo de agora, tão encardido e decadente, na certa não
imagina que o bairro foi em outros tempos o mais próspero de Santos. O
tradicional Porto do Bispo, que ficava onde é hoje o Largo Marquês de Monte
Alegre, concentrava boa parte do movimento de carga e descarga de
mercadorias dessa Santos que já figurava como um destacado centro
comercial. No começo do século XX, a estreita Rua São Bento vivia
congestionada por carroças puxadas a burro e pelas suas calçadas desfilava a
elite cultural e administrativa.

Mas como as coisas mudaram! Aos poucos, o Valongo sofreu um


esvaziamento financeiro e econômico. As famílias ricas partiram para os
bairros mais distantes do cais e o comércio está mais decadente a cada dia
que passa. Apenas a Farmácia São Bento, do popular seu Clóvis, ganhou
novas instalações: deixou o prédio onde se lia pharmácia e funciona em outro
bem mais amplo, na esquina da Rua São Bento com a Avenida Visconde de
São Leopoldo.

Famílias muito carentes dividem os tradicionais sobradinhos, hoje tristes e


deteriorados, e as crianças só deparam à sua volta com imagens que
lembram abandono e falta de perspectivas. Não dispõem nem mesmo de um
campinho ou parque para brincar, embora pudessem ser feitos em algum
daqueles amplos terrenos abandonados pela Eletropaulo.

O célebre quadro de Benedito Calixto, mostrando barcos ancorados próximo à


Igreja do Valongo, está aí para provar: antigamente, no hoje Largo Marquês
de Monte Alegre, passava o ribeiro de São Bento, que desaguava no mar e
formava o Porto do Bispo. E foi justamente esse porto que contribuiu para
que o Valongo se tornasse um próspero núcleo comercial, muito procurado
por famílias ricas. Hoje, o bairro está abandonado, sujo e esquecido. Virou
depósito de produtos químicos e padece sob o peso de caminhões, que
passam sacudindo tudo e deteriorando conjuntos arquitetônicos
importantíssimos, como aquele formado pela Igreja do Valongo e Capela da
Venerável Ordem 3ª de São Francisco da Penitência.
Hoje decadente, o Valongo foi o bairro mais próspero de Santos

Bons tempos aqueles para moradores e comerciantes do Valongo: o corso


carnavalesco, com sua multidão de reis, príncipes, pierrôs, colombinas e mascarados
de tudo quanto é tipo, seguia entusiasmado, deixando a Rua São Bento coberta de
confetes e serpentinas. Só então levava sua alegria para ruas do Centro. Por último,
depois das 21 horas, os blocos e escolas iam até a praia, onde um areião danado e
quase intransponível os esperava.

Como a Freguesia do Valongo se agitava nos dias de Carnaval! Uma agitação diferente
daquela que se constatava durante a semana, quando a estreita Rua São Bento ficava
congestionada de carroças puxadas a burro. Os poucos caminhões - alemães, de pneus
de borracha maciça -, não faziam concorrência aos carroceiros no transporte de café
da ferrovia para o cais. E nem lhes tirava a preferência na hora de carregar tudo
quanto é tipo de material que vinha das cidades servidas pela então São Paulo
Railway.

A garotada, quando passava entre a estação e a então prefeitura, sempre esticava


olhos arregalados para os lados do chafariz onde os animais matavam a sede antes de
iniciar suas caminhadas. E olha que davam muitas caminhadas por dia nessa Santos,
que se movimentava embalada por um comércio cada vez mais intenso.

A elite cultural e administrativa da Cidade caminhava empertigada, discutindo as


manchetes dos jornais e apontando soluções para os problemas do mundo inteiro.
Entre uma opinião e outra, os homens retiravam o relógio de ouro do bolso e o
guardavam em seguida, embora não estivessem preocupados em saber as horas:
apenas um gesto mecânico.

Mas gente miúda, como se dizia na época, também andava por aqueles lados. Quase
sempre se via pescadores à procura de gêneros alimentícios ou ferramentas nas casas
comerciais das imediações. Moravam em sítios, na outra margem do Estuário, e
atracavam suas embarcações no cais do porto, que podia ser usado livremente.
O quadro de 1965 é considerado um dos melhores que o Barreiros já teve:
entre outros, Costa, Cláudio, Nívio, Negreiros, Tamico e João Enguiça

O bairro chinês de outros tempos e as sessões no São Bento - À medida que


Santos cresceu, o Valongo deixou de ser reduto de gente rica. As famílias de bem não
quiseram mais conviver com as casas comerciais, o cais cada vez mais espichado e os
equipamentos de suporte às suas atividades. As boas casas onde residiam passaram a
ser ocupadas por gente mais simples, que chamava a Freguesia do Valongo de Bairro
Chinês.

Até hoje, muitos santistas costumam dizer que nasceram ou moraram no Bairro
Chinês. A denominação remonta à época em que imigrantes japoneses começaram a
transformar o chamado Capinzal em chácaras: por terem olhos rasgados, foram
confundidos com chineses, daí o aparecimento do nome popular.

Valongo ou Bairro Chinês, o certo é que as pessoas guardam muitas e boas


recordações de lá. Coisas como as concorridas sessões do Cine São Bento, que sempre
mantinha uma programação para agradar a todos os gostos.

A princípio, funcionava em uma sala apertada da Rua São Bento, cheia de bancos de
madeira. Como o chão era todo no mesmo nível, quem se sentava atrás não conseguia
ver nada e ainda saía com dor no pescoço. Mesmo assim, as matinês de domingo
ficavam repletas; os moleques adoravam fazer bagunça batendo com seus tamancos
contra o chão. A barulheira durava exatamente das 13 às 19 horas, período durante o
qual eram apresentados dois seriados, desenhos e dois longas-metragens.

Mais tarde, o cinema ganhou novas instalações e se destacou como o primeiro de


Santos a ter o piso irregular, de modo a permitir que a platéia visse a tela. O filme O
Petróleo é Nosso, com Violeta Ferraz, fez o maior sucesso quando apresentado lá. E foi
naquele cinema que o jornalista Áureo de Carvalho (e tantos outros santistas)
assistiram pela primeira vez a um filme colorido: Ramona.
Tão famosa quanto o cinema era a casa Amado, a primeira loja de armas de Santos.
Quando acontecia algum crime, a polícia corria lá para ver se descobria alguma pista.
A partir disso, quase sempre ficava mais fácil desvendar o caso.

E, em cima da Casa Amado, por muitos anos funcionou a Vassourinha, gafieira


daquelas bem animadas. O pessoal varava noites dançando, sem perceber que as
horas avançavam e a madrugada se aproximava. Quantas saudades não deixou...

A primeira televisão e o Barreiros, time varzeano como poucos - Quem


conheceu o Valongo de outros tempos, na certa também se lembra da Alfaiataria do
seu Alvarez, que vestia os elegantes do bairro. E a Padaria União Paulista, com suas
quilométricas filas para a compra de pão, durante a época de escassez determinada
pela II Guerra?

Mas a padaria que durante muito tempo serviu ao bairro foi a São Bento, que ficava na
Avenida Martins Fontes, no local hoje ocupado por um posto de gasolina. No meio da
tarde, o padeiro percorria as ruas com seu triciclo cheio de bengalas ou pães de meio
quilo. Passava, tocava a buzina e logo estava cercado por moleques com o dinheiro
enroladinho na mão ou cadernetas de capas encardidas e folhas cheias de orelhas.

E qual não foi o espanto daquela gente de vidinha simples quando deparou com um
aparelho muito estranho no bar do pai da Maria Ignês. A coisa tinha imagem feito um
cinema e emitia sons como um rádio. Não deu outra: a primeira televisão do Valongo
chegou cercada de um sucesso danado.

O dono do bar, esperto como ele só, não deixou por menos: estabeleceu consumação
obrigatória, como um jeito de faturar aproveitando o interesse que o aparelhinho
despertava. Mas os moleques, que de bobos não tinham nada, sentavam-se em uma
mesa, pediam um guaraná e espichavam o olho para a telinha não muito nítida.
Bebiam o refrigerante aos poucos para fazer hora e o proprietário não encontrava
argumentos para mandá-los embora.

O pessoal também se divertia acompanhando o movimento de carros na Rua Visconde


de Embaré, que durante muito tempo concentrou todo o trânsito proveniente de São
Paulo. Tudo complicava por causa do Bonde 1: quando fazia suas paradas, em frente
ao açougue da Laura, formava-se uma fila de carros atrás. Os meninos aproveitavam-
se disso para criar uma brincadeira: o primeiro carro que parava atrás do bonde
pertencia a um deles, o segundo a outro e assim por diante. As brigas começavam
quando algum só ganhava calhambeques, enquanto outros se fartavam de bons
carros.

Os rapazes, de sua parte, se entusiasmavam todos quando viam as moças bonitas do


bairro, como a Nena, a Magnólia e a Trola. Não desgrudavam os olhos até que elas
desapareciam numa curva qualquer ou ali para os lados do gasômetro, perto da hoje
Praça Lions. Só mesmo grandes craques do Barreiros, entre eles Clodoaldo, Babi,
Cláudio e Socó, conseguiam fazer a moçada vibrar tanto. Ah, o Barreiros! Poucos times
de várzea em Santos ficaram famosos como ele. Até hoje alegra a torcida e é
conhecido como Barreiros do Bairro Chinês.
No prédio, funcionaram Câmara e Prefeitura

Prosperidade e decadência, as duas faces do


Valongo (2)
Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)

Quadro de Benedito Calixto mostra o famoso Porto do Bispo, tradição do Valongo de outros tempos

No largo, um ancoradouro de canoas

Vejam se pode uma coisa dessas: moradores de diferentes bairros serem rivais a
ponto de saírem aos tapas pelo meio da rua.

Pois isso acontecia em Santos, entre o pessoal do Quartéis e do Valongo. A princípio,


tudo não passava de bate-bocas entre quarteleiros e valongueiros. Mas as hostilidades
evoluíram a ponto de, quando uns e outros se encontravam, armarem sérias lutas
corporais. À noite, sentinelas se postavam entre os bairros para evitar supresas.

Para se entender por que isso ocorria, é bom recordar um pouco da história de Santos.
A Cidade começou lá para os lados do Outeirinho de Santa Catarina, onde Brás Cubas
lançou, em 1543, os fundamentos de uma nova povoação. Com o tempo, se estendeu
para o Ocidente, ou seja, para os lados do que viria a ser o Valongo.

No núcleo antigo, ficou residindo gente da terra, ocupada em pescaria e corte do


mangue. No novo, passaram a viver famílias abastadas, geralmente portuguesas. E
este se consolidou definitivamente quando os franciscanos resolveram instalar em
Santos o seu convento. Em 1640, começaram as obras, que incluíram a famosa e
ricamente ornamentada Igreja de Santo Antônio do Valongo.

Um porto que contribuiu para o progresso social e comercial do bairro - O


Valongo pode ser considerado, efetivamente, um dos núcleos formadores da Vila de
Santos. Era cortado por um riacho que corria na altura da atual Rua São Bento e se
alargava no final, servindo como um ancoradouro de canoas. E Porto das Canoas ficou
sendo, até que os populares começaram a chamá-lo de Porto do Bispo, por motivos
que saberemos adiante.

Desse ancoradouro, as embarcações partiam para o oceano ou demandavam para


Cubatão, Piaçaguera e Raiz da Serra. Não existia estrada para o planalto e largos
trechos da planície santista se constituíam em verdadeiros mangues, tomados por rios.

Como não havia cais, mas apenas rústicos trapiches de madeira, as águas do portinho
invadiam a área hoje ocupada pelo Largo Marquês de Monte Alegre e estação
ferroviária. Não raro, alagavam o Convento de São Francisco (que ficava pegado à
igreja e foi demolido), causando transtornos daqueles.

Além das mercadorias lá descarregadas e carregadas, muita gente importante se


serviu do Porto das Canoas. Inclusive um bispo. Daí a denominação Porto do Bispo.

Dom Mateus de Abreu Pereira chegou em 1797, em meio a consagradoras


homenagens da população católica da pequenina Santos. Veio para suceder a dom
Manuel da Ressurreição no bispado da Província e permaneceu quase um mês na
região, em visita a capelas e fiéis. Acabou conquistando o coração dos santistas.
Quando partiu para São Paulo, uma grande comitiva fez questão de acompanhá-lo até
lá.

A Igreja de Santo Antônio quase foi destruída pela Inglesa,


mas o santo fez um milagre e a população se uniu para impedir a destruição

Santo Antônio faz milagres e rivais se unem para salvar sua igreja - Sem
dúvida nenhuma, o Porto do Bispo muito contribuiu para o Valongo se tornar um bairro
de invejável progresso comercial. E, com o crescimento do Valongo, surgiu a rivalidade
histórica que já deu tanto o que falar.
O bairro denominado Quartéis ficava para os lados da atual Rua Xavier da Silveira e
espaços periféricos, inclusive a atual Praça da República. Os quarteleiros não admitiam
a hegemonia social e econômica dos valongueiros e, em conseqüência, surgiram os
contantes confitos e as ruidosas intervenções da polícia. A luta contínua só teve trégua
no histórico episódio de Santo Antônio.

Essa história merece ser contada: em 1860, a empresa britânica concessionária do


transporte ferroviário entre Santos e São Paulo adquiria toda a área ocupada pelo
convento e pela igreja para construir seu terminal. Logo a notícia tomou conta da
Cidade: o templo de Santo Antônio do Valongo ia ser atacado pelos operários da
Inglesa e demolido para fins industriais.

Apesar dos protestos, as obras começaram e o convento veio abaixo. Mas, quando as
picaretas alcançaram o altar onde reinava Santo Antônio, não houve jeito de se retirar
a pequena imagem. Leve e solta, ao ser agarrada pelos operários tornou-se
pesadíssima e não havia quem a retirasse do seu nicho. Os próprios engenheiros
ingleses acompanharam o fenômeno e o Visconde de Embaré decidiu perpetuar o ato
colocando ao lado do santo uma bengala.

Não demorou muito para a população inteira saber do milagre. E foi aí que os
valongueiros decidiram pedir ajuda aos rivais. Afixaram na parede da Matriz de Santos,
que era a igreja oficial dos quarteleiros, um apelo: "Quarteleiros - gente brava como
nós! Querem destruir Santo Antônio! Estrangeiros pretendem pisar as nossas tradições
e os nossos brios! Santo Antônio acaba de fazer um milagre! Façamos uma trégua em
nossas diferenças! Somos todos santistas! Armados das nossas armas e da nossa
coragem, marchemos contra os profanadores! Eia! Os homens do Valongo os esperam
para o cumprimento do dever comum. Os Valongueiros".

Essas palavras bastaram. Logo depois da afixação do recado, um exército armado de


paus, pedras, bodoques, enxadas, picaretas, foices e muitas espingardas saía da Praça
da Matriz e seguia - entre gritos, vivas e expressões de revolta - para a Igreja de
Santo Antônio. Essa gente toda se juntou com a do Valongo, igualmente armada, e os
operários da Inglesa não tiveram outra alternativa senão deixar de lado a relíquia
santista.

A igreja permaneceu intacta, porque os populares mantinham guarda para evitar a


aproximação dos destruidores. Enquanto isso, a mesa da Irmandade de São Francisco
da Penitência pedia a intervenção do imperador Dom Pedro II.

A situação perdurou até novembro de 1861, quando chegou a Santos um aviso do


Império, dando conta de que Dom Pedro atendeu aos apelos do irmão ministro da
Ordem de São Francisco. Determinou aos ingleses que respeitassem a relíquia santista
e entregou a igreja, seus pertences e dependências à guarda e à propriedade da
Ordem.

Tratou-se, sem dúvida, de uma grande vitória da população organizada. Só que, no dia
seguinte à chegada do aviso, eram declaradas reabertas as rivalidades entre
valongueiros e quarteleiros...

O prédio já foi o maior do Brasil, mas continua esquecido e abandonado -


Brigas e interesses à parte, o certo é que por muito tempo Valongo e Quartéis se
constituíram nos limites de Santos. E, por pelo menos dois séculos, a Igreja do
Valongo e o Mosteiro de São Bento dominavam soberanos a paisagem daqueles lados
onde se situam. Falava-se até na existência de um túnel ligando a igreja ao mosteiro.
E não deve ser mera coincidência o fato de, há uns cinco anos, os operários terem
deparado com um túnel misterioso, quando executavam as obras de alargamento da
Rua São Leopoldo.

No século XIX, o Valongo ganhou outras edificações de grande porte. Uma delas é o
famoso prédio da estação ferroviária, inaugurado a 16 de fevereiro de 1867.

Em frente dele ficam os não menos famosos sobradões da Marquês de Monte Alegre:
são dois edifícios de construção idêntica, datados de 1867 e 1872, que formam um só,
compsto de dois pavimentos monumentais que se completam.

Manoel Joaquim Ferreira Neto o construiu para abrigar o governo da Província, que
seria transferido para Santos... Era considerado o maior prédio do Brasil na época e
abrigou a Câmara e a Prefeitura até a construção do Paço, em 1939.

Como um reflexo evidente do que é o Valongo hoje, a grandiosa edificação toda


azulejada de matizes azul e branco, ornamentada com artístico gradeado, se encontra
no mais completo abandono. Abriga bares e vários hotéis e perdeu muitos detalhes da
arquitetura original.

Mas continua imponente, apesar de tudo, e à espera de mais atenção por parte dos
poderes púlicos.

A estação ganhou de volta a cobertura do século XIX


Prosperidade e decadência, as duas faces do
Valongo (3)
Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)
Nos sobrados úmidos e insalubres, muitas famílias e crianças

Esquecido, triste e sem a fama de outros tempos


Dá pena ver o Valongo desse jeito, tão decadente, mais parecendo um enorme
parque de estacionamento de caminhões. Merece tal fim ese bairro tão antigo e de
tantas tradições?

Desde que sofreu esvaziamento financeiro e econômico, o Valongo ficou jogado às


traças. O comércio está cada vez mais decadente, ninguém reforma ou constrói
edifícios, os tradicionais sobradinhos enfileirados ao longo da calçada se tornaram
feios, encardidos e tristes.

A cor cinza, característica do abandono e da sujeira, tomou conta de todos os cantos.


Os armazéns e as comissárias de café, que fizeram a riqueza de muitos santistas e
projetaram o nome da Cidade no exterior, perderam importância e cederam suas
instalações para borracharias e oficinas mecânicas, hotéis de rotatividade, bares e
restaurantes de baixa freqüência.

Nem os comerciantes antigos, desses bem apegados ao ponto, quiseram ficar. Entre
eles, restou o sapateiro Fernando, da Rua São Bento, que faz sandálias e sapatos com
sola de borracha de pneu, apropriados para os trabalhadores do cais.

"Ninguém agüentou. Só eu fiquei aqui de Cristo", diz ele, reclamando dos caminhões
que passam estremecendo tudo e largando adubo no meio da rua. Os calçados - que
vende a preços variando entre Cr$ 2 mil e Cr$ 2.800,00 - vivem encobertos pelos
produtos químicos que invadem o ar.

Os problemas são tantos, que só quem não tem outra opção continua lá - Não
é à toa que a população do Valongo caiu sensivelmente nos últimos anos e hoje se
resume a cerca de mil moradores. Quem quer morar num bairro mal iluminado, sujo,
com trânsito completamente desordenado e tomado por marginais, que se aproveitam
da falta de policiamento para agir?

As poucas famílias existentes resistem por falta de opção: em troca de aluguéis menos
elevados, oito, 10, 15 delas se sujeitam a conviver em sobrados úmidos, com seus
amplos porões subdivididos em dezenas de minúsculos quartos.

As condições de moradia são muito precárias, porque os donos dos imóveis só estão
interessados em receber o aluguel no final do mês. Não se importam se a casa precisa
de reforma, se alguma instalação sofreu avaria e coisas do tipo. Os inquilinos que
agüentem, se quiserem.

Na casa de número 182 da Rua Marquês de Herval fica evidente o pouco caso da
proprietária: as duas famílias, que já vivem ali há sete e 11 anos, estão sem água há
mais de um mês. Apareceu um vazamento grande no porão (transformado em vários
quartos e alugado para outras pessoas) e a conta da água chegou a Cr$ 150 mil.
Conclusão: ninguém pôde pagar e a Sabesp cortou o fornecimento.

"A dona não podia deixar a gente nessa situação", comenta a moradora Maria
Aparecida Batista, lembrando que nos 11 anos que mora ali sempre arcou com seus
compromissos pontualmente; Creusa Filomena da Silva, locatária há seis anos,
também não se conforma, mas não vê outra opção se não agüentar.
Elas pagam Cr$ 15.800,00 e Cr$ 17 mil, respectivamente, por dois quartos, cozinha e
banheiro. O sobrado se encontra no mais completo abandono, principalmente o porão,
que volta e meia é invadido por desocupados. Ninguém tem sossego e segurança, e as
crianças são obrigadas a crescer naquele meio tão insalubre.

E olha que crianças não faltam! O Gledistônio conta que em sua casa há 10. Como não
é possível todos dormirem no chão ou em camas, no único quarto, a maioria se ajeita
nas redes penduradas no teto. Precisa dizer mais alguma coisa?

O tradicional largo passou por melhorias, mas está novamente abandonado e


sujo - Desde que a Rua São Bento foi alargada, em 1940, o Valongo só passou por
melhorias na administração do ex-prefeito Antônio Manoel de Carvalho. Ele falava em
transformar o Largo Marquês de Monte Alegre em um terminal intermodal, ligando
diversas modalidades de transporte. Ou seja, fazer uma integração rodoviária,
ferroviária e hidroviária.

Pretendia-se garantir ao Valongo um retorno ao passado, mas com a comodidade do


presente. Houve remanejamento de guias e passeios, regularização da pavimentação
em paralelepípedos, iluminação, sinalização, arborização e instalação de canteiros
centrais. Mais, a relocação do antigo abrigo construído por volta de 1890 e
desmontado em 1960, defronte ao prédio da estação ferroviária. A resposição da
antiga cobertura garantiu a devolução ao edifício do seu aspecto original.

Apesar da urbanização, que custou aos cofres públicos uma boa soma, o Largo
Marquês de Monte Alegre parece mais abandonado do que nunca. As luminárias
antigas e as árvores que enfeitvam o canteiro central foram danificadas pelos
caminhoneiros, que cometem todo tipo de abuso e fazem do Valongo um inferno. A
Prefeitura, ao invés de providenciar a fiscalização e o policiamento adequados, achou
mais fácil arrancar de vez os postes e não plantou novas árvores. E era uma vez um
projeto muito bonito no papel...

O ponto de atracação para as barcas que trafegam entre Santos e Vicente de Carvalho
e vice-versa não passou de uma idéia e o transporte ferroviário continua sem o devido
incentivo. No final das contas, o Valongo não readquiriu sua importância enquanto
ponto central do movimento de passageiros que utilizam os diferentes meios de
transporte.

Coisas do passado estão esquecidas, mas bem que poderiam ser recuperadas
- Bem que esse projeto para o Valongo poderia ser levado a sério e adiante. Afinal, é
um dos núcleos fundadores da Vila de Santos e apresenta em seu conjunto
arquitetônico testemunhos de edifícios do século XVII (Igreja de Santo Antônio e
capela da Venerável Ordem 3ª de São Francisco da Penitência), XIX (estação
ferroviária e antiga Prefeitura) e primeira metade do século XX. Algo que não pode ser,
efetivamente, negligenciado.

Mas as autoridades não parecem nem um pouco preocupadas com a deterioração física
da área e a poluição ambiental. Não percebem que o Valongo poderia se transformar
em importante ponto de atração turística e representar uma alternativa de passeios
para os santistas.
Muitas queixas contra caminhões e seus abusos

Prosperidade e decadência, as duas faces do


Valongo (4)
Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)
As crianças não têm onde brincar

As crianças que sonham com um parquinho e um campo

O garoto se entusiasma todo, arregala os olhos e pergunta com o ar mais


esperançoso do mundo: "A Prefeitura vai fazer um campo de futebol para nós?"

Outros se aproximam com o mesmo ar de esperança, aguardando uma resposta


positiva. "É só limpar o terreno e colocar a trave", sugere um, enquanto os outros à
volta começam a sonhar mais alto: falam em um parquinho de diversão, uma quadra
de vôlei e uma piscina.

A ansiedade e a expectativa das crianças da Rua Marquês de Herval evidenciam o


quanto sentem falta de uma área de lazer. São meninos e meninas que ficam sozinhos
enquanto os pais trabalham, não sabem o que é uma praia, não têm dinheiro para ir
ao cinema e nem quintais decentes para brincar. A sociedade lhes nega até o direito ao
lazer e ao prazer.

A principal diversão deles é subir nos caminhões que invadem as ruas e olhar o mundo
pelo ângulo dos adultos. Pegam carona nas carroçarias, se arriscam, e fazem das
jamantas os substitutos dos carrinhos que não possuem.

Quando não fogem para áreas da estação ferroviária, pulam de vagão em vagão e se
metem nas águas podres que ficam acumuladas sob eles para pegar rãs. O William faz
questão de demonstrar como é bom no estilingue: com essa arma, ele e os
amiguinhos matam as pombinhas que voam pelo cais em busca de restos de
alimentos. Não liquidam as avezinhas por serem perversos ou por pura diversão: é
para comer mesmo.
Se as coisas andam difíceis para quem pode, imaginem para aqueles sem
oportunidades, obrigados a ganhar salário mínimo, viver à custa de subempregos ou
biscates. Por isso mesmo, até a criançada da Rua Marquês de Herval se vira para
ajudar a família: entre uma brincadeira e outra, ajudam a descarregar caminhões ou
vendem os sorvetes preparados pela Sônia ou pela Marli. Se faturam pouco, entregam
tudo para a mãe; se conseguem um pouquinho a mais, guardam uns trocados para o
lanche na escola ou para satisfazer um desejo qualquer.

Conhecem cada palmo da imunda via onde moram (um borracheiro instalado nela há
vários anos a considera a mais suja de Santos) e não percebem o perigo dos restos de
produtos químicos deixados nos cantos das ruas sem saída e nos enormes terrenos
baldios da Eletropaulo. A empresa deixa os terrenos no mais completo abandono, e
caminhoneiros e outros elementos que não residem no bairro (os moradores respeitam
o lugar onde vivem e tentam preservá-lo) se aproveitam disso para jogar entulhos e
tudo quanto é tipo de porcaria.

Numa dessas áreas ociosas, a garotada gostaria de ter um campinho de futebol e


outros equipamento de lazer. E todos são obrigados a admitir que não pedem muito
essas crianças que, apesar de viverem numa área decadente e suja, conseguem sorrir
de felicidade. Crianças que conservam o bom humor e a capacidade de dar carinho e
ficariam satisfeitas ao verem seus nomes ou apelidos estampados nos jornais.

Aí vai: Renato ou Maguila, Cláudia ou Chica, Alberto ou Testão, Hélio ou Desdentado,


William ou Testa de Arrombar Navio (ganhou o apelido porque cortou o cabelo e ficou
com a testa de fora, brilhando), Gledistônio ou Charles Chaplin. E mais: Beto, Douglas,
Feridento, Vampiro do Meio-Dia, Pinóquio, Rabicó (é gordinho e usa sempre um shorts
vermelho), Suquito, Colombo, Siri, Diano Biquini, Zé Luís, Nilcéia, Marquito e um
último de apelido impublicável.

Elas pedem a transformnação dos abandonados terrenos da Eletropaulo em áreas de lazer

Origem do nome gera dúvidas entre estudiosos


Que o bairro chama-se Valongo há muito tempo, ninguém duvida. Os pesquisadores
apenas divergem quanto à origem do nome.

Segundo Francisco Martins dos Santos, a denominação teria surgido das palavras vae
ao longo, usadas pelos portugueses quando se referiam ao caminho que servia à
antiga vila, ao longo das águas do estuário. Com o correr do tempo, o o termo virou
simplesmente Vallongo (depois, Valongo) e passou a designar o canto da Cidade para
os lados da Estrada de Ferro Inglesa.

O mesmo pesquisador apresenta outra hipótese: desde os tempos da colonização, os


genoveses João Adorno e Francisco Adorno usariam a expressão "la estrada que va al
lungo del mare" para designar a viela que servia os primeiros sítios coloniais, "pelo
lado de fora" (junto ao estuário). E como José Adorno morou por aqueles lados, muitos
defendem a idéia de transformação de "va al lungo" em Vallungo e depois Valongo.

Mas há estudiosos que excluem tais origens, levando em conta que no Rio de Janeiro
também existe um Valongo, que teria recebido esse nome devido à semelhança com
um local da cidade do Porto, em Portugal. Lá, o termo, surgiu das palavras vale e
longo, que significam planície à beira do rio. Daí os portugueses batizaram o lugar de
acordo com a configuração, como fizeram em sua terra

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