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27
abril
2010
ano III
ficina
Cães e Homens
SAMIZDAT 27
abril de 2010
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expressa dos colaboradores da revista.
Sumário
Por que Samizdat? 6
Henry Alfred Bugalho
MICROCONTOS
Caio Rudá de Oliveira 11
CONTOS
A Beata 12
Ju Blasina
Carta II 21
Maria de Fátima Santos
O mergulho 26
José Guilherme Vereza
A repulsa 28
Léo Borges
TRADUÇÃO
Cães 38
G. K. Chesterton
TEORIA LITERÁRIA
Enigma Archinov 42
Leandro da Silva
CRÔNICA
A Vingança de Zeus 46
Joaquim Bispo
Apenas uma mulher 50
Ju Blasina
Nossas falsas necessidades cotidianas 52
Henry Alfred Bugalho
POESIA
Sobre mulheres e flores 54
Caio Rudá de Oliveira
Blavinos 56
Ju Blasina
Concisos 58
Wellington Souza
Poemas 59
Mariana Valle
Dez de março 60
Polyana de Almeida
ficina
5
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Por que Samizdat?
“Eu mesmo crio, edito, censuro, publico,
distribuo e posso ser preso por causa disto”
Vladimir Bukovsky
6
E por que Samizdat? revistas, jornais - onde ele des tiragens que substituam
possa divulgar seu trabalho. o prazer de ouvir o respal-
O único aspecto que conta é do de leitores sinceros, que
A indústria cultural - e o
o prazer que a obra causa no não estão atrás de grandes
mercado literário faz parte
leitor. autores populares, que não
dela - também realiza um
perseguem ansiosos os 10
processo de exclusão, base- Enquanto que este é um mais vendidos.
ado no que se julga não ter trabalho difícil, por outro
valor mercadológico. Inex- lado, concede ao criador uma Os autores que compõem
plicavelmente, estabeleceu-se liberdade e uma autonomia este projeto não fazem parte
que contos, poemas, autores total: ele é dono de sua pala- de nenhum movimento
desconhecidos não podem vra, é o responsável pelo que literário organizado, não
ser comercializados, que não diz, o culpado por seus erros, são modernistas, pós-
vale a pena investir neles, é quem recebe os louros por modernistas, vanguardistas
pois os gastos seriam maio- seus acertos. ou q ualquer outra definição
res do que o lucro. que vise rotular e definir a
E, com a internet, os au- orientação dum grupo. São
A indústria deseja o pro- tores possuem acesso direto apenas escritores interessados
duto pronto e com consumi- e imediato a seus leitores. A em trocar experiências e
dores. Não basta qualidade, repercussão do que escreve sofisticarem suas escritas. A
não basta competência; se (quando há) surge em ques- qualidade deles não é uma
houver quem compre, mes- tão de minutos. orientação de estilo, mas sim
mo o lixo possui prioridades
a heterogeneidade.
na hora de ser absorvido A serem obrigados a
pelo mercado. burlar a indústria cultural, Enfim, “Samizdat” porque a
os autores conquistaram algo internet é um meio de auto-
E a autopublicação, como que jamais conseguiriam de publicação, mas “Samizdat”
em qualquer regime exclu- outro modo, o contato qua- porque também é um modo
dente, torna-se a via para se pessoal com os leitores, de contornar um processo
produtores culturais atingi- od iálogo capaz de tornar a de exclusão e de atingir o
rem o público. obra melhor, a rede de conta- objetivo fundamental da
tos que, se não é tão influen- escrita: ser lido por alguém.
Este é um processo soli-
te quanto a da grande mídia,
tário e gradativo. O autor
faz do leitor um colaborador,
precisa conquistar leitor a
um co-autor da obra que lê.
leitor. Não há grandes apa-
Não há sucesso, não há gran-
ratos midiáticos - como TV,
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Autor em Língua Portugesa
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Emílio de Menezes,
o sátiro
Os textos a seguir foram ontem: — Que houve aqui?
transcritos da seção "Colmeia" "A história registra diaria- — Nada. Uns tirozinhos
do jornal A Imprensa, onde o mente fatos interessantes no à-toa...
autor mantinha periodicamen- que diz respeito às crenças
te uma coluna literária. — Mas vocês prenderam?
de cada um."
— Sim, decerto. Prendemos
Ahn! ... Palavra que não este revólver.
sabia que a história fizesse
semelhante asneira. ***
Cartaz de ontem, à porta
de uma redação: *** Impressão de rua.
"O sr. senador... não com- Isto é um país sui generis. O pobre petiz, no largo
parecerá hoje ao Senado." Está bem assentado que o do Paço, vende uma droga
analfabetismo nos flagela e qualquer para tirar nódoas;
Se começam a noticiar comprime-o um largo cír-
tudo que não vai acontecer, que os que sabem ler não o
fazem. Entretanto morre um culo de basbaques. "Se as
vão ter um noticiário supim- nódoas não saírem, devolve-
pa! homem que nunca fez outra
coisa senão vender livros e se a importância!" cameloteia
*** deixa ... uma fortuna de mais o pequeno.
Temos, graças a Deus! um de sete mil contos. Palavra Mas eis que surge um
Instituto Poliartístico. que não percebo! guarda municipal; o vende-
Agora, só nos fica faltan- *** dor não tem licença e o de-
do... a Arte. fensor dos interesses do fisco
A nossa inefável polícia: leva-o ao primeiro posto a
*** Há um conflito. Dão-se explicar-se.
De um jornal da tarde de tiros de revólver- Chegam os Bobo de camelo! que tão
repórteres.
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Emílio de Meneses
Autor de versos mordazes, eivados de críticas das cia. Não muda, entretanto, seus hábitos. Continua
quais não escapavam os políticos da época, mestre o mesmo boêmio de sempre, a povoar os jornais da
dos sonetos, Emílio de Meneses é portador de uma época com suas percucientes anedotas.
tradição - iniciada com o Brasil, em Gregório de
Matos. Apesar de preterido pelo silogeu nacional, Emílio
veio finalmente a ser eleito (15 de agosto de 1914)
Tendo sido nomeado para o recenseamento, como segundo ocupante da cadeira 20, cujo patrono é
Escriturário do Departamento da Inspetoria Geral Joaquim Manuel de Macedo, e na qual jamais veio a
de Terras e Colonização, em 1890, Emílio aposta na tomar assento, falecendo em 1918. Seria saudado por
especulação da falácia econõmica do Encilhamento, Luís Murat.
criada pelo Ministro da Fazenda Ruy Barbosa: como
muitos, fez rápida fortuna, esbanja e, terminada a Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Em%C3%ADlio_
farsa, como todos os outros investidores, vai à falên- de_Meneses
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O lugar onde
a boa Literatura
é fabricada
ficina
10 SAMIZDAT abril de 2010
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Microcontos
Minimalismo insólito
Caio Rudá de Oliveira
Somatizou
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A gravidez era psicológi-
ca, mas nasceram dois guris
saudáveis. Necrofilia
Gastronomia aplicada IV
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12
Contos
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Beth aparentava a típica seus mínimos detalhes. E
beata: os cabelos longos, já pecava, a noite toda, toda Henry Alfred Bugalho
A
sem corte, geralmente guar- a noite... As demais beatas, GUI
dados em trança, tocavam-
lhe as coxas cobertas por
saias que terminavam junto
na tentativa de proteger o
padre daquela monopolista
religiosa, faziam fila à porta
Nova York
aos joelhos, sempre marca-
dos pelas tantas horas em
do confessionário. Mas Beth
era abençoada pelo dom da para Mãos-de-VAca
devoção. Usava camisas lar- paciência e não esmorecia
gas, na tentativa frustrada jamais!
de esconder os seios far-
O Guia do Viajante Inteligente
Só o padre sabia o por-
tos. Sempre abotoava até a quê de tanta oração, dos www.maosdevaca.com
última casa, sempre rezava cabelos tão longos e bem
até a última conta. O terço cuidados, do corpo tão es-
de madrepérola que carre- condido nas roupas com-
ga no pulso e o crucifixo portadas. O padre e o belo
do pescoço eram as únicas marido sadomasoquista. O
jóias que exibia com orgu- último gostava de puxar-
lho. Percebendo isso, rezava lhe os cabelos enquanto a
para afastar tal sentimento penetrava. O primeiro não
egoísta. confessava, mas gostava de
Rezava também para imaginar a cena. O sexo
atrair a aprovação dos céus, violento, que tanto agradava
para perdoar aqueles que a ambos, tinha seu preço
lhe caçoavam, para casti- nas marcas deixadas no
gar os que blasfemavam, corpo e na alma da beata.
para acordar e para dormir. Sorte que, para os pecados
Rezava para tudo! Antes de havia as orações, e para os
cada refeição, antes de cada hematomas, pomada. A reza
relação — rezava muito era a pomada de sua alma
para satisfazer ao marido, e o padre, o doutor que a
tão exigente. E tendo as pre- prescrevia. E todo dia ela
ces atendidas, rezava ainda precisa de uma nova dose.
mais depois. Não falhava uma missa
Era a primeira a chegar sequer, para desespero do
à igreja e a última a sair. padre, desgosto das outras
Não se misturava as outras beatas e principalmente,
beatas que lhe invejavam a satisfação do marido — o
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Contos
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Contos
Fátima Romani
Saudade
16 SAMIZDAT abril de 2010
Acordou em uma cama de alguém que possa vir mento
de hospital, sem entender buscá-la.” É pior do que se entrevar...
direito ainda o que havia “Depois... Porque não me
acontecido. Só se lembrava Ela e Paulo sempre
diz logo? Estão em estado tinham sido como duas
da derrapagem, da chuva, grave?”
da dor quando fora jogada metades, é muito difícil
para fora do carro, quebran- “Infelizmente, só vai po- encontrar alguém como ele,
do as costelas e mais nada. der saber depois que o mé- alguém com quem se en-
Onde estavam os outros? dico que a atendeu chegar.” contra paz, só de olhar, olho
Ela estava a sós naquele Quando o médico, um no olho, coração pra cora-
quarto. Desespero, solidão... ortopedista, chegou, não ção. E Carlinhos, também
veio só, estavam com ele seu filho tinha ido embora.
Estava muito longe de Uma mãe não foi feita para
casa, era uma viagem de uma assistente social e um
psiquiatra. A notícia era perder um filho. O contrá-
férias, estavam a caminho rio sempre acontece, é a
de uma praia distante, um mais séria do que ela pen-
sava. Em primeiro lugar lhe lei natural, os mais velhos
acampamento, gostavam vão primeiro. Enterrar um
tanto disso, principalmente deram um tranquilizante
forte, depois, foram lhe con- filho é enterrar um pedaço
Carlinhos, que levava tudo da gente, que foi tirada de
na brincadeira. Seu filho, tando todos os detalhes.
dentro da gente, cresceu ali,
um menino lindo de dez O carro tinha capotado, nove meses, e depois ain-
anos que amava a natureza rolado pelo barranco, ficado da continua ligada a nós...
e aventuras. completamente destruído, Outro trecho da mesma
E Paulo? Sempre fora um Paulo e Carlinhos presos canção:
bom motorista e a veloci- nas ferragens, ela só escapa-
ra por ter sido jogada para Que a saudade é o revés
dade nem estava tão alta, de um parto
mas a estrada mal cuidada fora. Estar dopada salvou-a
e a chuva forte e inesperada de novo, o choque não a A saudade é arrumar o
não lhe haviam dado chan- matou ali mesmo, naque- quarto
ce de escapar da derrapa- le momento, ao saber da Do filho que já morreu...
gem. notícia.
Eles foram embora e ela
Olhou para si mesma, Teria que voltar à sua ficou...Não poderia segui-los
as costelas enfaixadas, por casa, rever tudo, não pode- agora, tinha muito ain-
causa da fratura, com certe- ria abandonar tudo o que da que viver, pessoas que
za. Ainda sentia dores, mas seu marido e ela haviam poderiam precisar dela.
parecia que estava tudo no construido juntos, desde Precisaria retrabalhar esse
lugar. Apertou a campainha namorados. Agora, não esta- luto, transformá-lo em algo
ao lado cama, precisava ur- va mais inteira, haviam-lhe que lhe permitisse viver.
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Contos
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Henry Alfred Bugalho
Seda Branca
Exausto, larguei armas e agrisalhados, descendo em Já ouviu algo a respeito do
chapéu e meti a cara no rio. direção ao rio. “Homem de Branco”?
Caminhava há dias, após Saudei-o e recebi a Neguei.
haver sido destacado para resposta de que vinha em
as fronteiras do Norte. O O nome de nascimento
paz. O viajante se sentou dele era Bai Hong-nu, fi-
Imperador Qinzong temia ao meu lado e acendeu
os revoltosos que se proli- lho duma família humilde,
uma fogueira. Anoitecia e educado para ser soldado,
feravam na região e concla- compartilhamos um jantar
mara guerreiros de todos os assim como vejo que você
improvisado. é. Lutou em muitas guerras
rincões do mundo.
Decorridas horas de si- e caiu nas graças do Im-
Ouvi som de flauta e me lêncio, o senhor falou: perador. Foi promovido a
pus em alerta, espalhava- general, senhor de muitos
se o rumor de que bandos Estou cansado, vivi mui-
tas dificuldades nestes guerreiros, e venceu todas
de ladrões e assassinos se as batalhas na quais pe-
escondiam na floresta, mas últimos meses e não encon-
tro pouso em lugar algum. lejou. Porém, numa noite,
avistei um senhor, cabelos quando o Imperador aden-
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Contos
Mas o ano em que escrevo, esse, sei: mil Tu, minha Matilde, a mostrares-te nua, e
novecentos e sessenta e oito eu de olhos piscos como se os entonteces-
sem luzes de meio-dia em Agosto.
Eu já fiz vinte anos e tu farás dezoito.
Ai Matilde, minha doce Matilde, que na-
Matilde bem amada
quela tarde cheiravas a sargaço e a limos.
Consolação da minha alma triste. Can- Ou seria de estarmos na maré vaza e o
ção que me cantam os anjos quando ando cheiro vinha dos caranguejos que por ali
de arma em punho a catar sei lá eu bem se passeavam, e das lapas, curiosas, a solta-
que inimigo. rem-se das rochas?
Tão calmos que eram os teus abraços. Seria o cheiro que tu tinhas, ou seria a
Neles me aninho em sonhos doces, como maresia, minha doce amante, minha queri-
doce é o teu regaço onde irei deitar-me da?
todos os dias que me restarem depois deste
Mas que importa saber a que cheiravas,
degredo.
se eu sei que o teu perfume é o dos lírios
No teu colo macio é onde durmo quan- no altar de todas as Nossas Senhoras que
do tenho a bênção de um recolhimento. E há por esse mundo?!
revivo-te.
Minha adorada Matilde!
Meu querubim, minha alfazema, meu
Deste lugar de sangue e ódio, deste local
tesouro ignoto de preciosas pedras. Minha
tão longe, envio-te mãos cheias, cordões e
abelha rainha, imensamente nua daquele
mais cordões de letras a dizerem: Amo-te.
pano.
Que a palavra se repita, que reverbere dela
Tu a unires as sobrancelhas, a franzir os o ar dos locais onde respires.
teus olhos mais verdes do que os muitos
Este que será teu para toda a eternidade
verdes por onde me caminho.
Tiago
Tu a dizer-me: a capulana, deixa estar,
Tiago, que ela há-de soltar-se.
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la a alma desde há tantas noites.
Não lhes perdi o conto.
Aponto-as, uma após a outra, tal como as
manhãs e as tardes.
Com giz da cor do fogo, faço um traço
em cruz como me ensinaste, numa folha de
calendário que pendurei na parede. Aquela
parede branca da cozinha.
Um dia olhaste para ela de cima abaixo, e
pediste, mais ou menos com estas palavras,
e os teus olhos luziam com a luz que lhes
era de costume, aquela que me alumia hoje
apenas de recordá-la:
Não pendures nada neste muro.
Nada que não seja, um dia que aconteça,
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Contos
Simplício Aroeira
descobre o que é a Morte
Cirilo S. Lemos
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urubus assustados e um Um avião passa fazendo são de luz e fogos verme-
céu de chumbo brotando sombra no meu rosto. lhos por todo o universo.
do chão e preenchendo Não posso ouvi-lo, ape- Então só resta escuridão e
todo o fundo. Alguma nas preencher com a ima- um banquete.
coisa está muito errada. ginação seus movimentos
O céu não deveria sair do mudos. Três sonhos a me ocu-
chão nem o lixo formar
É outro devaneio, penso. par nessa letargia monó-
uma parede vertical. Isso
Mas vejo que não: é um tona.
só se explicaria se eu esti-
vesse deitado com o lado lagarto gigantesco acima Uma moça da minha
esquerdo no solo. Acho de minha cabeça. juventude, que se abaixa
que é isso, então. Não Não, nem lagarto, nem graciosa para apreciar
dá para saber ao certo, a avião. Consigo distinguir o um desenho feito a giz na
visão vai e volta e eu não bico nojento, a pele sar- calçada, os cabelos de um
consigo perceber nenhum nenta debaixo das penas castanho escuro que reful-
outro sentido funcionando. escuras e fedorentas. Seu ge um brilho prateado. Ela
Olfato, paladar, audição, olho a me observar tal sorri para mim depois de
nada disso é acessível qual um planeta imenso falar de alguém querido
agora. pairando nas alturas. Em que sofrera morte fortuita.
algum lugar abaixo do Um sorriso de pura tris-
pescoço, meu corpo deve teza, e ainda assim o mais
Quanto tempo se pas- belo que eu já vi.
estar tendo calafrios de
sou desde que saltei do
pavor. Um livro de Nietzs-
barranco?
A primeira bicada ar- che me cuspindo na cara
Agora que não passo que Cristo era um idiota,
ranca-me o lábio superior.
de uma cabeça confusa assombrando-me com
Posso senti-lo descarnado,
presa a um corpo evanes- palavras hereges e sujas,
deixando à mostra parte
cente, o tempo se desfez até ser usado por minha
das gengivas roxas e dos
num único e interminável tia para alimentar uma pe-
dentes. O urubu ergue a
agora. No final das contas, quena fogueira nos fundos
cabeça para engolir a car-
morrer não é exatamen- do quintal.
ne. O movimento de sua
te como eu imaginei. A
garganta empurrando meu A visita a uma casa de
mesma monotonia de estar
lábio para seu estômago é repouso próxima à Cen-
vivo, mas não se pode cha-
engraçado. Dou-me conta tral do Brasil. Por fora
tear ninguém com recla-
de que nunca vi um bicho a beleza da arquitetura,
mações.
desses tão de perto. Ele por dentro os corredores
Sonho: uma ruiva gri- abre suas asas e arranca de cerâmica ensebada,
tando comigo na porta de mais um naco da minha abarrotado de espectros
um bar, nós dois bêbados boca, esculpindo-me um humanos revolvendo-se
o suficiente para discu- sorriso perpétuo. Mais na própria sujeira. Uma
tir nossa vida sexual em urubus se aproximam, os celebração ao que somos
público. Ela não é minha bicos escancarados. Quan- lá no fundo.
mulher, não tenho idéia de do um deles estoura meu Imagino, abrigado den-
quem possa ter sido. olho, é como uma explo- tro da treva profunda, que
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Contos
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Que coragem que nada. doer o pescoço. Fez sinal tecendo em volta. Tentou
Bastou Maria Neuza ouvir da cruz, pegou o elevador - movimentar pernas e bra-
dizer da maior atração do uma gaiola que subia ran- ços, mas percebeu que não
novo parque de diversões gendo e deixando a cidade tinha controle sobre nada.
da cidade, um bungee jump em miniatura. Lá em cima, Era um crucifixo estático
de 130 metros de altura, deixou-se amarrar. E nem voando de cabeça para bai-
para despertar sua inquieta pestanejou. xo. Enfim, o nada.
curiosidade pelo desconhe- A primeira sensação foi Os ares de uma liberda-
cido. Decidiu pelo mer- o vento cortando o rosto, de jamais provada foram
gulho e pronto, ninguém criando rugas e pregas com batendo no seu corpo, numa
precisou saber disso. sobras de pele. Os olhos velocidade fria e vertical.
Foi num dia comum, foram obrigados pela ob- Veio também a certeza
logo que o parque abriu viedade da física a ficarem plena e incontestável de que
suas portas, entre dez e bem fechados,o que im- não podia deixar escapar a
onze da manhã.Olhou a pedia qualquer espiadela única chance na vida de se
lonjura do topo da torre até para ver o que estava acon- sentir dona absoluta de si
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Contos
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teriam um impacto arrasa- se imediatamente da imensa Espichou uma das mãos e,
dor no convívio familiar. barriga da mãe e do que o com singeleza, alcançou o
“Desenhei um bebê, mas médico falara: “não se colo- inseto, que ficou estático. O
minhas amigas enxergaram que em situações de grande carinho, embora socialmente
uma barata. Fizeram cara de impacto emocional”. Ver grotesco, era sinceramente
nojo, como minha mãe tam- aquela cena foi uma coisa afetuoso. Mas, um súbito
bém já fez. Sentem repulsa que lhe encheu de prazer, e aterrorizante grito pôs
de meus trabalhos. Eu detes- porém, chamar a mãe para fim àquela aliança. Com
to as pessoas, seres cruéis e compartilhar do seu deleite violentas contrações, Fergô-
nojentos. Seria bom se todos poderia ser de uma nefas- nia – que surgira após ser
fossem como os insetos, que ta imprudência. Ou talvez chamada pela filha – caía
vivem sem arrogância. Se o não. Quem sabe não seria tonta, entrando em trabalho
que criei foi feio, que tenha esta a grande oportunidade de parto.
sido apenas para os outros. para Fergônia se reconciliar Os vizinhos, assustados
O bebê de minha mãe, ao com a verdadeira humilda- com o que ouviram, arrom-
contrário, não é horrível de, aquela que só os bichos baram a porta e foram pres-
para ninguém, só pra mim”. repulsivos possuem? tar auxílio. A indiferença de
Ana, enquanto escrevia, – Mãe! Ana diante da cena só foi
percebeu o pequeno vulto O espetáculo fez a meni- menos perturbadora que a
na sua casinha de bonecas. na imaginar a mãe parin- aparência inumana daquele
As compridas e finas an- do uma barata gigantesca: bebê, cuja pele possuía uma
tenas oscilantes não dei- primeiro as indefectíveis repugnante textura.
xavam dúvidas: era uma antenas aparecendo pela va- – Nasceu prematuro – foi
barata! Sem ser apenas mais gina, logo a robusta carcaça a explicação inventada por
uma entre as inúmeras que áspera e, por fim, as longas uma perplexa socorrista ao
existiam pelos cômodos, e inquietas patas emergindo ter em mãos a massa amar-
esta parecia mais íntima e com suas inúmeras micros- ronzada que emitia os pri-
provava isso, andando livre serras afiadas. O obstetra, meiros grunhidos de choro.
do comportamento arisco primeira testemunha do ex- Levaram mãe e filhos
que caracteriza a espécie. traordinário acontecimento, para o hospital. Com os
O coraçãozinho da menina usaria de ácida frieza para olhos esbugalhados, uma das
pulsou forte pela alegria comunicar o nascimento da mulheres, acuada no canto
do encontro. A barata, cuja criatura: “é bastante saudá- da sala, não saiu do lugar
sombra aumentava à medida vel, dona Fergônia...”, diria, – possivelmente paralisada
que se contrapunha à luz com o horror escapando-lhe pelo medo de acompanhar
do abajur, transitava com sob a forma de suor, contro- aquilo a que chamavam de
mansidão entre as canetas lado apenas pelo interesse criança. Para que sua pre-
de colorir. Já a menina, que sombrio que certos eventos sença ali fosse de alguma
curtia o farfalhar típico, de- causam, “esta não veio pelo forma útil, limpou o quarto
sejou que sua mãe também esgoto, veio mesmo por seu às pressas. Esqueceu-se ape-
viesse apreciar a casinha útero...”. nas de certo papel largado
de plástico servindo como Ao se desgrudar do no chão. Nele, listras malfei-
palco para o desfile de tão ventre sintético, a barata tas lembravam uma barata,
rejeitado ser. continuou com o passeio mas as lágrimas e o sangue
Estacionada perto de um errante, monitorada pelo da placenta que o man-
dos brinquedos, a barata, de olhar maravilhado de Ana. chavam, destruíam a sua já
súbito, se espremeu e entrou Passou por cima do desenho pouca clareza.
pela roupinha de uma bone- que seria seu espelho, até
ca sem braço, inchando-a e encontrar restos de biscoi-
causando-lhe a impressão de tos. Feliz, Ana rastejou-se
estar gestante. Ana lembrou- vagarosamente para perto.
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Contos
Fragmentos:
III. O Alimento
Marcia Szajnbok
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Contos
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Maristela Scheuer Deves
Sempre há
uma verdade....
(Parte 3)
http://guisalla.files.wordpress.com/2008/09/machado1.jpg
A situação se repetiu
conseguiu fazer com que
nos dias seguintes: eu
eu tomasse mais chá. Eu
acordava e, embora não
nunca fora muito fã de
tivesse febre (ao contrá-
alho, mas naquele dia
rio, minha temperatura
ele decididamente me
parecia estar até mes-
embrulhava o estômago.
mo mais baixa do que o
Na verdade, era pior: a
normal), ficava mal assim
simples visão do chá me
que botava os pés para
fazia suar ainda mais, ao
fora do quarto. Só con-
mesmo tempo em que
seguia comer carnes mal
sentia o frio se apossando
passadas e me recusava
do meu corpo.
terminantemente a ir ao
Achei melhor voltar médico — não por medo,
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
para a cama, até porque mas porque sair ao sol
a claridade do sol pare- me deixava quase cega de
cia ferir meus olhos. A dor.
cabeça doía com a luz,
O pior, no entanto,
e eu só queria o escuro
eram os sonhos. Ou
do meu quarto, com as
pesadelos, talvez eu deva
janelas fechadas e a ca-
dizer. Neles, eu andava
beça sob as cobertas. O
nas ruas, no meio da noi-
mal estar continuou o dia
te, escondendo-me furti-
todo, e não quis sequer
vamente nas sombras. Era
almoçar. À noite, minha
uma caçada, mas dessa
mãe conseguiu me con-
vez eu não era eu a caça:
vencer a sair da cama,
eu era a caçadora. E que-
prometendo fazer o que
ria sangue.
eu quisesse para jantar.
http://www.flickr.com/photos/trashd/533370323/sizes/l/
35
Contos
Ínfimo brilho
Giselle Sato
http://www.flickr.com/photos/robertpaulyoung/2770018939/sizes/l/
www.revistasamizdat.com 37
Tradução
Cães G. K. Chesterton
trad.: Henry Alfred Bugalho
responsável por um estimado reiras. De algum modo, esta visões da biologia são excên-
animal, naquele momen- criatura completou a mi- tricas e efêmeras. Os livros
to abre-se um abismo tão nha humanidade; de algum não importam; a noite está
vasto quanto o mundo entre modo, não consigo explicar o chegando e está escuro de-
crueldade e a coerção neces- porquê, um homem precisa mais para ler livros. Contra
sária de animais. Há algumas ter um cachorro. Um homem a luz da lareira que se apaga,
pessoas que falam daquilo precisa ter seis pernas; aque- obscuramente pode-se traçar
que chamam de “punição las outras quatro patas são os contornos do homem pré-
corporal”, e classificam sob partes dele. Nossa aliança é histórico e do cão.
este título a tortura medonha mais antiga do que as passa-
infligida a cidadãos desafor- geiras e pedantes explicações (Este ensaio foi extraído
tunados em nossas prisões e que são oferecidas sobre nós de um artigo do Daily News,
fábricas, e também ao pe- dois; antes de haver evolução, mais tarde reunido como
teleco que alguém dá a um existíamos nós. Você pode “On Keeping a Dog” em Lu-
menino travesso, ou à chico- encontrar escrito num livro nacy and Letters).
tada num terrier intolerável. que eu sou mero sobreviven-
Você até pode inventar uma te de um embate de macacos http://www.cse.dmu.
expressão chamada “concus- antropóides; e talvez eu seja. ac.uk/~mward/gkc/books/
são recíproca” e deixá-la para Estou certo que não tenho dogs.html
entender que você inclui sob objeção. Mas meu cão sabe
este título beijar, chutar, a que sou um homem, e você
www.revistasamizdat.com 39
40 SAMIZDAT abril de 2010
Gilbert Keith Chesterton, co- “Assim como se pode conside-
nhecido como G. K. Chester- rar São Francisco o protótipo
ton, (Londres, 29 de maio de dos aspectos romanescos e
1874 — Beaconsfield, 14 de emotivos da vida, assim Santo
junho de 1936) foi um escritor, Tomás é o protótipo do seu
poeta, narrador, ensaísta, jor- aspecto racional, razão por
nalista, historiador, biógrafo, que, em muitos aspectos, estes
teólogo, filósofo, desenhista e dois santos se completam. Um
conferencista britânico. dos paradoxos da história é
que cada geração é converti-
da pelo santo que se encontra
Era o segundo de três irmãos. mais em contradição com ela.
Filho de Edward Chesterton E, assim como São Francisco
e de Marie Louise Grosjean. se dirigia ao século XIX pro-
Casou-se com Frances Blogg. saico, assim São Tomás tem
Concluiu os estudos secundá- mensagem especial que dirigir
rios no colégio de São Paulo à nossa geração um tanto
Hammersmith onde rece- inclinada a descrer do valor
beu prêmio literário por um da razão.”
poema sobre São Francisco
Xavier. Ingressa na escola de
arte Slade School de Londres Em uma de suas principais
(1893) onde inicia a carrei- obras, “Ortodoxia”, defende
ra de pintura que vai depois os valores cristãos contra os
abandonar para se dedicar ao chamados valores moder-
jornalismo e à literatura. Es- nos, a saber, o cientificismo
creveu no Daily News. Nasci- reducionista e determinista.
do de família anglicana, mais Dono de uma retórica exem-
tarde converteu-se ao catoli- plar, coloca em debate crítico
cismo em 1922 por influência idéias como as de Mark Twain
do escritor católico Hilaire e Nietzsche.
Belloc, com quem desde 1900
manteve uma amizade muito
próxima.
http://www.platypusinnovation.com/static/eif/image/chesterton.jpg
www.revistasamizdat.com 41
Teoria Literária
Enigma Archinov
Leandro da Silva
www.revistasamizdat.com 43
Errico Malatesta, foi um dos Pouco depois, durante a Archinov fez algo extraordi-
que rejeitaram as ideias de purga stalinista, em 1937, nário.
Makhno e Archinov. Archinov some. Ninguém “Há uma escola de pen-
Isolados e frustrados, os sabe o que aconteceu, poucos samento que crê que Ar-
anos 20 passaram-se vendo se manifestam. Após alguns shinov colocou seu repúdio
da França o stalinismo frear anos e depois com a queda ao anarquismo como uma
as conquistas da revolução do stalinismo, é revelado seu cortina de fumaça para que
e eliminar a oposição socia- paradeiro e o registro do seu ele pudesse retornar à Rús-
lista brutalmente na nova sumiço aparece: “Deportado sia para ajudar a organizar
União Soviética. por acusação de restaurar o o movimento anarquista
anarquismo na Rússia So- clandestino lá. Nós sabemos
Foi quando numa opor- viética”. Parece que ele foi
tunidade, Archinov quis que o grupo Dielo Trouda
filmado em 1937 na depor- manteve contato com esse
reverter toda sua frustração, tação. Mas, mal se sabe ao
pois na França ainda perse- movimento, e Ante Ciliga no
certo para onde foi e aonde Enigma Russo se refere a ele
guiam os sobreviventes do foi enterrado.
Exército Insurrecional Makh- como extremamente bem or-
novista, aproveitou o fato de Como assim? ganizado. Nós não podemos
ser expulso da França, para Décadas após décadas, ter a certeza de uma forma
gerar uma condição e dar as gestões do Estado seja ou de outra, até que todos
realidade a um antigo plano: na antiga União Soviética os registros mantidos pelas
retornar para a Rússia. quanto na nova Federação autoridades russas sejam
Russa, desde o tempo de olhados pelos pesquisadores.
Lançou panfletos que Esperamos que algum pes-
negam a importância do Lenin e Trotsky, escondem
os arquivos das atrocidades quisador faça em breve.”
anarquismo, rejeitou a cor-
rente libertária e defendeu o cometidas como crimes pró- Ed, em Libcom no artigo
stalinismo, fazendo saudações prios de Estado. Uma gestão Biográfico sobre Archinov,
à política da União Soviética após outra, foi apagando tais http://libcom.org/history/
do momento. Em considera- arquivos, de acordo com o arshinov-peter-1887-1937
ção com a enorme importân- que era bom ou ruim para o Por fim, aí está uma parte
cia de Archinov para a re- regime. Assim foi com toda da construção moderna do
volução e até mesmo para a a produção literária e ainda direitos fundamentais do
formação dos primeiros anos está sendo, mal se sabe se cidadão, esquecida, provavel-
do bolchevismo, anteriores a uma obra da época foi ou mente em forma de ossos nos
sua adesão ao anarquismo, não forjada, ou se uma foto antigos campos siberianos de
Stalin “perdoou” Archinov foi ou não remontada. A cul- trabalho forçado, cemitérios
e aceitou sua repatriação e tura sujeita a uma dimensão enevados do stalinismo.
filiação no Partido Comunis- que reduz as manifestações
ta. Ferido e doente, Makhno individuais e coletivas, sem-
ficou surpreso com a atitude pre estará propícia a encon-
trar meios paralelos para se
Fontes:
de Archinov, e o considerou
não só um traidor, mas al- propagar, pois são as pessoas
que a fazem, o que precisam *Arquivo Público Históri-
guém que renegou o que ele co de Moscou
viveu, após ter feita a famosa e o que sentem.
“autocrítica soviética”. Archinov, não pôde ir *História da Makhnovis-
ao enterro de Makhno e se china, de Archinov
De volta a sua terra natal,
Archinov em pleno stali- esclarecer. Makhno morreu *www.libcom.org
nismo, ocupou funções do pensando que fora totalmen- *www.nestormakhno.info
Partido Comunista, e atuou te repudiado, pelos anarquis-
como revisor em Moscou. Os tas espalhados pelo mundo a
anarquistas do mundo intei- fora, e por seu velho compa-
ro o consideraram como a nheiro, Archinov.
decepção dos anos 30. Há quem acredite que
http://www.abcgallery.com/I/ingres/ingres20.JPG
Joaquim Bispo
A Vingança de Zeus
www.revistasamizdat.com 47
humanizada, sem ter de recor- assiduamente, mas a senhora estaca zero, ou antes, à estaca
rer a impessoais burocracias e não engravidava. A eficiên- um, e, provavelmente, tenta
frios procedimentos laborato- cia do copulador contratado lembrar-se onde é que viu um
riais. Mas, pode-se especular não merecia reparos, mas, ao outro homem parecido com o
que o facto de saber quem fim de seis meses e setenta e marido; este, dada a ausência
era o pai poderia vir a ser de duas jornadas de trabalho, o de resultados do contrato em
enorme utilidade, se fosse casal começou a duvidar da que tanto investiu, sente-se o
necessário apontar a paterni- sua eficácia para terminar a mais manso dos herbívoros e,
dade biológica, em caso de obra dentro do prazo previsto para readquirir alguma dig-
futuras carências económicas e intimaram-no a provar as nidade, lançou um processo
da criança – que estas contas habilitações. Mais uma vez, judicial contra o vizinho, para
não se pensam, mas estão a resposta laboratorial foi de- tentar recuperar, ao menos, os
sempre presentes na contabili- soladora – também o vizinho 2000 euros. Além disso, deve
dade genética inconsciente de era infértil – só que, desta precisar deles para o próximo
cada um – que os genes não vez, com consequências mais contrato.
brincam na hora de garantir a devastadoras.
O vizinho, que também
preservação.
O alegre copulador passou, pode vir a precisar, foi quem
Foi neste ínterim que Zeus repentinamente, de o mais mais perdeu, apesar das be-
– quem mais? – interveio, feliz dos homens para um dos nesses. Não quer devolvê-los,
para gorar os planos deste gru- mais castigados pela sorte: argumentando que forneceu
po tão bem conluiado. Talvez não só a mulher o tinha traído, a mão-de-obra – salvo seja
se tenha apiedado da posição como os filhos não eram seus – conforme combinado, mas
humilhada do seu infértil e – supremo golpe – não po- nunca garantiu a consecução
compatriota, talvez tenha deria vir a tê-los. do projecto.
querido mostrar a Odin qual
Ela, quando confrontada O caso está para ser decidi-
o panteão mais poderoso, ou
sobre a origem da prole, ainda do pelo tribunal de Estugarda,
talvez tenha ficado invejoso
tentou desculpar-se com Odin, e é por isso que dele tomámos
da sorte olímpica do vizinho
disfarçado de padeiro, uma conhecimento, através do
– que ele, apesar de Zeus, tem
vez, e de técnico de televisão jornal Bild – que pela boca de
de tomar formas de cisne, de
por cabo, da outra, mas o ma- Zeus jamais o saberíamos.
touro, ou outras, para conse-
rido já não vai em mitologias
guir unir-se à mulher ou até à
e exigiu o divórcio.
deusa que deseja.
Do casal de soluções
Bem que o vizinho ale-
criativas, a mulher voltou à
mão se esforçava, pontual e
ficina
seguras (rsrs) um nome teclando com amigos so-
mostrava como um fatal tos a sucumbir,
turnos e escrevendo apontava-
contos tos autores,
lembrar quenacionais
estava eme
artístico. Como é o seu
cumprir a vontade de Deus
enome
irresistível convite ao
de batismo, e por
lhe seus
cruéis na terríveis olhos
Tinta Rubra. estrangeiros,
harmonia comabordando
a música
o vampirismo, é possível
além-túmulo.
que a opção pela adoção ausentes. E como todos os inacabada de Bach. Ter-
fugir de certos clichês
deQuase
um pseudônimo? Você
um ano após o outros,
SAMIZDAT também— OsMozart
vampi- minando,
do gênero,viu ou que a perna
ao fazê-lo
publica textos como “você paralisou-se.
ros são um dos Junto à ima-
temas
www.oficinaeditora.com
que, já estava olivre.
corre-se riscoCorreu
de desca-o
início das mortes, passava
mesma”, diferentes dos de tempos em sentiu
tempos,o racterizar o tema?
pela região umcomo
viajante gem macabra, mais rápido que pôde,
textos escritos Giu- voltam a ser moda. A que
austríaco,
lia Moon? excepcional cheiro da putrefação. As sem
GIULIA olhar paranão
— Bem, trás.existe
O
você atribui este fascínio
http://www.flickr.com/photos/erzs/1357413280/sizes/o/
náuseas dominaram-no, uma lei que diga
som de sua composição que tais
estudante
GIULIA — de música,
O meu nome que temos por estas cria- e tais características são
real é SueliWolfgang
chamado Tsumori. “Giu-Ama- o que o fez libertar-se da servia de trilha sonora
turas? obrigatórias para um perso-
lia Moon”
deus é umQuando
Mozart. nickname paralisia, caindo
GIULIA — Acho que as de joe- para
nagema vampiro.
fuga, enquanto
Acho que
que adotei quando entrei lhos a largos
pessoas gostamvômitos. Em ele
de vampiros pensava
depende como,
do bom até de
senso o
soube da maldição, não
na Tinta Rubra. Ao in- porquea são, em primeiro cada autor. aquela
Um bom senso
se meio engasgos, tosses e momento, música
vésalarmou, disse
de escolher, comoapenas
os lugar, vilões com um bom que o faça reconhecer que,
que gostaria de
outros, um nome romenoouvir o ânsias, ouviu a frase mor- nunca havia lhe parecido
layout. São parecidos com sem algumas características
vampiresco
tal concertocom títulose de
fúnebre de tal: “Termine a música”. tão viva e tão mórbida.
os seres humanos, têm as básicas, o seu personagem
nobreza como “condessa”
conhecer o seu autor. Foi Confuso,
vantagens dadesnorte-
juventude Prometeu não mais
não é um vampiro, mastocá-
e “lady”, reuni dois nomes eterna, imortalidade, la.
alertado de que a história
curtos que tivessem algum
ado, Mozart tentou dons
se alguma outra criatura. Os
psíquicos, força física. É vampiros do meu livro
era
tipo verdadeira,
de significado de para
que as levantar apoiando-se No dia seguinte, o
um monstro que tem um Kaori são os vampiros clás-
pessoas
mim. Eu já não queriam
sempre gostei do no órgão,
arsenal de que
armas sua mão
variado: jovem Mozart já bebem
sicos: predadores, não se
mais estudar música,soava
nome “Giulia”, porque e atravessou
a força, o poder como se nadaa
psíquico, encontrava
sangue (e só pela cidade.
sangue), não
sensual, gracioso e fácil de sedução, a esperteza. Pode andamum a luz do dia,pelo
têm
ele poderia ser o próxi- ali estivesse. Caiu sobre “Mais levado
ser pronunciado. E “Moon”,
mo,
porquee osou
diaumafatalapaixo-
estava o vômito, começando a ou
agir com a “mão pesada” Canto da Sereia de Bach”,de
muita força e capacidade
com sutileza, dependendo se regenerar de ferimentos.
se
nadaaproximando...
pela lua, adoroNada ficar recobrar a razão e ten- diziam. Contudo, soube-
da situação. Mas também Mas já escrevi contos em
devaneando
disso sob uma lua
o espantou. tando
pode ser afastar-se
sentimental, daquele
frágil, se
quenaoshospedaria
vampiros são que ele
seres
cheia ou ler histórias que prenúncio
enfim, pode da
ter morte.
todas as fra- havia partido durante
microscópicos, por exem- a
Dia vinte
envolvam e oito,
noites “Toca-
de luar – quezas
De da mente
bruços sobrehumana,
a terra, plo. Os clichês
madrugada, ruins
são são
e salvo,
ta e Fuga
além em Ré
de achar Menor”,
a grafia de pois já foram humanos um apenas aqueles que são mal
tudo
“moon” como
muitohaviam dito,os sentiu
legal, com algo prendendo-o
dia. Para o autor, é um per-
após o sinistro concerto.
trabalhados pelo autor.
e“o”s
lá lado a lado,
estava lembrando
Mozart pelo
den-Bugalho
sonagempé. Não
muitoteve cora-
estimulante, No cemitério, ao invés do
Henry Alfred
dois olhos arregalados de
tro do cemitério. Com os gem http://www.lostseed.com/extras/free-graphics/images/jesus-pictures/jesus-crucified.jpg
e issodefazolhar
com que parao ver o
produ- esperado músico morto,
O Rei dos
espanto. Quando lancei o SAMIZDAT — Muitos
olhos fechados, deixava-se que
to daera. E novamente
criação a
tenha grandes foi encontrada apenas
primeiro livro, não havia chances de suplicou:
ficar bom.“Ter-E, autores da nova geração
extasiar
razão para com as compo-
assinar de outra
voz suave uma inscrição com
encantaram-se na terra,
os
para o leitor, é aquele vilão
forma, já
sições deque a maioria
Johann Sebas-dos mine a música”. Fazendo parecida
vampiros com o trecho
por causa dos de
Judeus
(ou vilã) bonitão, sacana
meusBach,
tian leitores
numme estado
conhe- uma desesperada
e malvado que adoramosoração jogos departitura.
alguma RPG, especial-
Desde
cia como “Giulia Moon”. E mental, tateou
odiar. Vilões o solo
assim até
sempre mente “Vampiro: a Más-
então, não se noticiou
de euforia sobrenatural. cara” (publicado no Brasil
assim ficou. Nunca publi- fizeram sucesso,
Subitamente, o som encontrar uma pois pedraadora- mais vítimas do “Canto
quei nada como Sueli,se
pois mos esses contrastes: beleza pela Devir). Você perten-
extinguiu. O jovem
Giulia continua sendo,des-
pelo pontiaguda. Com ela, da
ce aSereia de Bach”.
este grupo ou seu
com maldade, delicadeza
menos para
pertou mim, oemeu
do transe dirigiu começou a desenhar no
com crueldade, e assim por interesse é anterior? Qual
do www.revistasamizdat.com 49
w
gr nl
át
oa
is d
Crônica
http://faculty.umf.maine.edu/~walters/web%20104/ww1%20women%20RR%20mechanics.jpg
www.revistasamizdat.com 51
Crônica
Nossas falsas
Foto: Henry Alfred Bugalho
necessidades cotidianas
52 SAMIZDAT abril de 2010
O lugar onde
Não gosto de telefones sem TV, computador, carros, a boa Literatura
celulares. Nunca gostei. energia elétrica, internet.
Quando todo mundo já Acostumamo-nos e nos é fabricada
carregava um celular no acomodamos com falsas
necessidades.
http://guisalla.files.wordpress.com/2008/09/machado1.jpg
cinto, ostentando o novo
clamor da modernidade, eu As inovações parecem se
relutava. Já era adepto da apegar ao nosso ser de tal
internet, mas do celular - maneira que o humano se
Deus me livre! confunde com elas.
Mas não dá para lutar A realidade do homem
contra o óbvio. primitivo, caçando com lan-
Enquanto que, alguns ça, residindo em cavernas
anos atrás, quando duas e descobrindo o fogo, é tão
pessoas iam se encontrar, alienígena para nós quanto
era preciso marcar data, um suposto marciano verde
local e hora exatos, senão em sua nave espacial.
o desencontro era inevitá- As falsas necessidades
vel, hoje as pessoas andam, são tão poderosas que em-
falam e perguntam: “onde burrecemos e nos atrofia-
você está? Ah, sim, estou te mos. Se, por acaso, há uma
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
vendo!” queda de luz no prédio
Antes, se não se encon- numa noite de tempestade,
travam, era assunto encer- desesperamo-nos, tateando
rado; cada um ia para sua no breu, e não sossegamos
casa e fim. até ver a lâmpada se acen-
dendo mais uma vez.
Rendi-me e também te-
nho meu telefone celular... E Ao sermos libertados
me indago como conseguí- de certas restrições pela
amos viver sem ele antes. modernidade, tornamo-nos
Há 15 anos, praticamente enfim seus escravos.
ninguém tinha; há 25 anos, Temos acesso a todas as
até telefone fixo era rarida- informações do mundo, po-
de. Minha mãe era uma das demos nos comunicar com
poucas a ter telefone em pessoas do outro lado do
casa no quarteirão, por isto, planeta, tudo instantânea e
as vizinhas passavam o nos- imediatamente, mas somos
so número e anotávamos mutilados. Arranque-nos
o recado para elas quando deste acomodamento e en-
alguém ligava. colheremos, até sumirmos
Há 150 anos, que parece diante da nossa insignifi-
ser muito tempo, mas para cância.
o curso da História é me- Temos tudo à mão, ape-
nos que um segundo, nem nas para mascarar o nada
sequer existia o telefone. que nos tornamos.
E hoje mal conseguíamos O futuro aniquilou a
conceber como seria a vida
sem ele, assim como é difí-
cil pensarmos num mundo
nossa humanidade.
ficina
www.oficinaeditora.org
53
Poesia
querias-me donzela
lamento, não a pude ser
ganhaste-me cheia de máculas
porém o amor é redentor, tu sabias
cultivaste-me assim mesmo
como fez o jardineiro
que a ti vendeu essas flores
www.revistasamizdat.com 55
Poesia
Blavinos Ju Blasina
BLAVINO 20 — Tic-tac
Tic
Tac-tic
Já são doze
Badaladas horas
Em dias seguidos por
Noites em claro. Ouço eu
Sem ti até
O tic-tac
Dói
Ilusão
Serei eu
Miniatura
Singular nos
Delírios do além
Ou imaginária criatura
http://www.flickr.com/photos/judepics/190101132/sizes/o/
Serei eu marionete de
Deuses, destino
Ou sorte? Só
Não serei
Na morte
Ilusão
www.revistasamizdat.com 57
Poesia
ACORDAR
AMOR VIRTUAL
DESATANDO-NOS
http://www.flickr.com/photos/trojanguy/2880085384/sizes/l/
as botas machadianas. PARAFRASEANDO ALGUÉM
Depois de ti,
hasteei bandeira
branca
e pedi paz.
TEMPO
http://www.flickr.com/photos/thomashawk/2442371176/sizes/l/
Tudo na vida passa.
Não há desgraça
que não se abrande,
não há ferida
que não cicatrize,
não há dor
que se eternize.
Quão divino remédio
é o tempo,
senhor dos mistérios,
maravilha de invento!
QUEM
www.revistasamizdat.com 59
Poesia
Dez de março
Polyana de Almeida
Trilha centelha
navalha sentidos.
Estraçalhados.
Eu cativa.
Março não chega.
Eu conto um.
Eu conto dois.
Eu conto infinitos,
meses destinos.
Uma lança à espreita enfia,
rasga a carne,
peito arreganhado:
vê como bate,
como deseja
um coração desesperado?
Até março.
Luz exígua
instiga futuros.
Mundos.
Eu vida.
Dez de Março...
Eu conto um.
Eu conto dois.
Eu conto vazios
dias vestígios.
Esvaziados,
me esvaindo em pedaços.
E sinto esvoaçar,
sinto fugir a pele,
carne etérea,
não sou nem mesmo mais corpo:
http://www.flickr.com/photos/19799714@N00/1672201975/sizes/o/
vê como transcendo o tempo,
como me espalho
sobre o tempo,
quando não há mais corpo?
www.revistasamizdat.com 61
SOBRE OS AUTORES DA
SAMIZDAT
Edição, diagramação e capa
Revisão
Maria de Fátima Brisola Romani
Nasceu em SP em 1957 mas mudou-se para Salvador
em 1984 onde reside até hoje. É arquiteta e artista plás-
tica, além de tradutora (inglês e italiano) e revisora de
textos. Escreve poesias esporadicamente desde adoles-
cente e há cerca de um ano começou a escrever contos.
Pretende concorrer ao mestrado em Artes Cênicas na
Escola de Teatro da Ufba.
62
62 SAMIZDAT abril de 2010
Colaboração
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
Maria de Fátima Santos
Nasceu em Lagos, Algarve, Portugla em 1948. Vi-
veu a adolescência em Angola e reside em Lagos.
Licenciada em Física, é aposentada de professora do
Ensino Secundário. Já participou na SAMIZDAT e por
afazeres de vida afastou-se. Tem poemas em diversas
antologias, e publicou em Janeiro de 2009 um livri-
nho com pequenas histórias, aquelas que lhe voam
no teclado: Papoilas de Janeiro é o título, com ilus-
trações de TCA do blogue http://abstractoconcreto.
blogspot.com/ Muito material está publicado nos
blogues e www.intervalos.blogspot.com e http://tris-
teabsurda.blogspot.com/ Escreve pelo gosto de deixar
que as palavras vão fazendo vida. Escreve pelo gozo.
Mariana Valle
Por um amor não correspondido, a carioca de
Copacabana começou a poetar aos 12 anos. Veio o
beijo e o príncipe virou sapo. Mas a poesia virou sua
amante. Fez oficina literária e deu pra encharcar o
papel com erotismo. E também com seu choro. Em
reação à hipocrisia e ao machismo da sociedade.
Atuou como jornalista em várias empresas, mas foi
na TV Globo onde aprimorou as técnicas de reda-
ção e ficção. E hoje as usa para contar suas próprias
histórias. Algumas publicadas em seu primeiro livro
e outras divulgadas nos links listados em seu blog
pessoal: www.marianavalle.com
Léo Borges
Nasceu em setembro de 1974, é carioca, servidor
público e amante da literatura. Formado em Comu-
nicação Social pela FACHA - Faculdades Integradas
Hélio Alonso, participou da antologia de crônicas
“Retratos Urbanos” em 2008 pela Editora Andross.
www.revistasamizdat.com 63
Giselle Sato
Autora de Meninas Malvadas, A Pequena Baila-
rina e Contos de Terror Selecionados. Se autodefine
apenas como uma contadora de histórias carioca.
Estudou Belas Artes, Psicologia e foi comissária de
bordo. Gosta de retratar a realidade, dedicando-se
a textos fortes que chegam a chocar pelos detalhes,
funcionando como um eficiente panorama da socie-
dade em que vivemos.
Jú Blasina
Gaúcha de Porto Alegre. Não gosta de mensurar
a vida em números (idade, peso, altura, salário). Não
se julga muito sã e coleciona papéis - alguns afir-
mam que é bióloga, mestre em fisiologia animal e
etc, mas ela os nega dizendo-se escritora e ponto fi-
nal. Disso não resta dúvida, mas como nem sempre
uma palavra sincera basta, voltou à faculdade como
estudante de letras, de onde obterá mais papéis para
aumentar a sua pilha. É cronista do Caderno Mulher
(Jornal Agora - Rio Grande - RS), mantém atualiza-
do seu blog “P+ 2 T” e participa de fóruns e oficinas
virtuais, além de projetos secretos sustentados à base
de chocolate e vinho, nas madrugadas da vida.
Leandro da Silva
Pampeano, gaúcho das tecnologias “rústicas” dos
ancestrais indígenas. Estudante de espanhol. Escreve
para complementar a realidade, crendo que todos
podem escrever e, que isso não é profissão e sim,
humanização. Relacionando sociedade, ideologia e
memória coletiva, principalmente. Sobre o pampa,
literatura de ficção científica e africanismo, unindo-
os ou não,.
64
64 SAMIZDAT abril de 2010
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
Joaquim Bispo
Ex-técnico de televisão, xadrezista e pintor ama-
dor, licenciado recente em História da Arte, experi-
menta agora o prazer da escrita, em Lisboa.
episcopum@hotmail.com
Caio Rudá
Bahiano do interior, hoje mora na capital. Estuda
Psicologia na Universidade Federal da Bahia e espera
um dia entender o ser humano. Enquanto isso não
acontece, vai escrevendo a vida, decodificando o enig-
ma da existência. Não tem livro publicado, prêmio,
reconhecimento e sequer duas décadas de vida. Mas
como consolo, um potencial asseverado pela mãe.
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Marcia Szajnbok
Médica formada pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo, trabalha como psiquiatra
e psicanalista. Apaixonada por literatura e línguas
estrangeiras, lê sempre que pode e brinca de es-
crever de vez em quando. Paulistana convicta, vive
desde sempre em São Paulo.
Wellington Souza
Paulistano, mas morou também em Ribeirão
Preto, onde cursou economia na Universidade de São
Paulo. Hoje, reside novamente no bairro em que nas-
ceu. Participou das antologias do concurso Nacional
de Contos da Cidade de Porto Seguro e do Poetas
de Gaveta/USP. Escreve poemas, contos, crônicas e
ensaios literáios em um blog (Hiper-link), na revista
digital SAMIZDAT e no portal Sociedade Literária.
“Escrever é um modo de ser outro ser”.
Cirilo S. Lemos
Nasceu em Nova Iguaçu, Baixada Fluminense,
em 1982, nove anos antes do antológico Ten, do
Pearl Jam. Foi ajudante de marceneiro, de pedreiro,
de sorveteiro, de marmorista e mais um monte de
coisas. Fritou hambúrgueres, vendeu flores, criou
peixes briguentos. Chorou pela avó, chorou por seus
cachorros. Então cansou dessa vida e foi estudar
História. Desde então se dedica a escrever, trabalhar
como voluntário numa escola municipal e fazer feliz
a moça ingênua que aceitou ser mãe dos seus filhos.
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e do cotidiano, contempla o mundo e questiona: “há
vida sem arte?” No meio do caminho, trôpega, em
desalinho, ela vai se perdendo, caindo, decaindo, a
responder: “sem arte, para mim, vida não há.” E le-
vanta: palavras, palavras, palavras. Corpo. E o sangue
a pulsar.
SAMIZDAT fevereiro de 2010
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