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PRÓLOGO PARA O CÉU

“In the beginning the Universe was created. This has


made a lot of people very angry and has been widely
regarded as a bad move.” – Douglas Addams

O deserto. Não aquele deserto saahariano que deve ter


vindo a sua mente, mas um deserto estéril e abandonado até
mesmo pela areia da ficção. Nada em um raio de milhas e milhas
senão terra seca e rachada, carcaças de animais
esporadicamente e um incessante vento noroeste que carregava
partículas pó e areia tão finas, mas não o bastante para passar
sem arranhar uma pele delicada e não acostumada aquele
mundo árido.

Todos têm a sua verdade, sem exceção. Governos, religiões,


grupos étnicos, você, até mesmo eu, todos temos nossas
verdades. Alguns sabem que suas verdades não são verdades
realmente, mas isso não significa muita coisa diante dos
resultados. E como eu disse, eu própria possuo a minha verdade?
A morte não é tão grande coisa assim.

Você sabe disso e eu posso provar.

A única cena realmente destoante nesse cenário era o


rastro, a trilha deixada por alguém que obviamente não era um
elfo ranger da floresta (sobretudo pq elfos não existem e aquilo
não era uma floresta). Pela trilha podia se deduzir que uma
criatura de três pernas vagava pelo deserto com passos
desproporcionais (editado após assistir um episódio de CSI:
alguém vagava pelo deserto arrastando a perna enquanto se
apoiava em uma espécie de muleta)

No ano de 2011, a humanidade gastou aproximadamente


dois trilhões de dólares em entretenimento. Deixe-me colocar de
uma forma mais simples de entender: U$ 2.000.000.000.000,00
em entretenimento. E como entretenimento entenda como
televisão, internet, música, cinema, games, livros, revistas,
jornais e qualquer outra tralha que não muda em nada a vida de
ninguém. Eu poderia fazer um discurso sobre prioridades,
dizendo como esse dinheiro poderia ajudar tantas pessoas
necessitadas, mas honestamente eu não ligo à mínima. Não é
esse o meu ponto, aonde eu quero realmente chegar é: por quê?
De todas as palavras de todas as línguas conhecidas,
nenhuma expressão é tão importante. Nenhuma derrubou tantos
reis, deuses e grilhões quanto esta: por quê?

Acompanhando a trilha por alguns metros logo se encontra o


que ao longe poderia ser entendido como um saco de batatas
fugitivo, mas como sacos de batata não fogem (não os meus pelo
menos, já que a dispensa tem dois cadeados), aproximando-se dá
para perceber claramente que se trata de uma pessoa embaixo
do que parece um cobertor de mendigo improvisado como capa.
Sim, definitivamente era uma pessoa. Ou fora até um momento
próximo...

Por que no ano de 2011 a humanidade gastou dois trilhões


de dólares para se esquecer por alguns minutos sobre como sua
vida é medíocre e sem sentido? A pergunta é retórica, é claro.

O homem convencional trabalha no mesmo troço o dia


todo, todos os dias. Não tem garantia nenhuma de sua vida, mas
tem certeza de sua morte. Pensa, logo existe; mas não sabe
quem é, onde está, nem para onde vai... Há um momento em
que ele precisa esquecer-se da sua vida medíocre – caso
contrário estará propenso a uma depressão, aí não vai trabalhar
e isso não é bom para o mundo – e é aí que ele precisa se
entreter.
Esse homem convencional é você.
Então você paga por uma TV, um rádio, um livro, revista, filme,
jornal...

Embaixo do cobertor imundo improvisado como capa, uma


figura esguia e humana que deveria ter sido bela outrora. Sob o
semi-putrefato capuz, alguns fios de cabelo ruivo escorriam até a
altura do peito (infelizmente quase tão imundos e maltratados
quanto o pano que os ocultava). Do que se podia perceber do
rosto (alguma coisa do queixo, lábios e nariz), a pele estava
ressecada e severamente desidratada, com rachaduras e bolhas
nos lábios e podia se notar uma cicatriz na face esquerda. A
respiração pesada e extenuada. A mão direita, envolta em
bandagens segurava o “manto” fazendo às vezes de broche a
altura do pescoço. Pelas pontas dos dedos finos, podia-se
observar que se tratava de uma mulher apesar do vento e sabe-
se lá o que mais ter acabado com o estado delas...

Fora das telas, a vida não é tão glamorosa. Para cada rei
Leônidas e sua história de proporções épicas, existem 50, 100,
200 mil, milhões que morrem sem propósito nenhum. Você já
passou um dia no pronto socorro de um grande hospital de uma
grande capital? Pessoas morrem o tempo todo simplesmente por
estarem no lugar errado, na hora errada. Se você acha que a vida
tem um propósito, um sentido, então tente reagir a um assalto e
você vai ter cerca de 20 segundos antes do seu cérebro para de
funcionar para ver o “propósito da sua vida” se espalhar pela
calçada e fim.

A muleta em que se apoiava não era propriamente uma


muleta e sim uma armação metálica que parecia ter sido
arrancada de um leito de hospital. Ok, esta é uma conclusão
bastante influenciada pelo fato dessa figura estar vestindo
clássicas roupas verdes hospitalares manchadas com muito
sangue seco, sobretudo na região do baixo ventre e das pernas. O
fato da grade que usava como muleta estar algemada ao seu
pulso também era deveras influenciante a qualquer conclusão...

Embora seja bonito e comovente ouvir como o propósito


divino curou a vida da sua tia Gertrudes (que caiu no mesmo
percentual de cura espontânea não-explicada dos que
simplesmente ficaram em casa assistindo TV), não tão bonito é
lembrar como o mesmo propósito divino simplesmente
“esqueceu” os outros 200 mil doentes.

Seu ritmo era inconstante e trôpego, se fosse um filme você


poderia concluir que acabava de ser baleada e que iria desabar a
qualquer momento, entretanto ela não desabou. Nem naquele
instante, nem no seguinte, nem no próximo, nem no outro.
Seguiu em silencio pelo deserto, o único som que emitia era
quando tentava inconscientemente umedecer os lábios
ressecados com a língua, mas essa já esta quase tão seca e
severamente inchada devido as sede...

Então, a vida é isso. Ela acontece, desacontece, acontece de


novo... Sem nenhum propósito, objetivo, mágica ou razão. Como
eu disse a morte não é tão grande coisa assim... Já dizia aquela
musica que não sai da minha cabeça agora... “life sucks then you
die”. Odeio essa música.

Então finalmente seus joelhos se renderam e colapsou no


deserto. Ainda sim não olhou para trás ou tentou se levantar, já
que não conseguiria fazê-lo de qq forma: apenas se arrastou mais
alguns metros adiante pelo solo morto com as mãos antes de
perder os sentidos. Apenas mais uma vida consumida pelo Sol
apinho do deserto, brusca e estupidamente...

Que merda, essas são as piores ultimas palavras que alguém


poderia pensar...
E pensado isso, levou a mão ao baixo ventre uma ultima vez
na tentativa de proteger algo que não mais existia e então
simplesmente apagou. Tudo ficou escuro e sua vida terminou ali.
ATO 1 – UM CADAVER OUVE RÁDIO

Início da gravação. 23 de outubro de 2157. 10:58AM.


- [ “Você perdeu sua vida meu irmão, você perdeu sua vida
meu irmão… Essas palavras vão entrar no coração e eu vou
sofrer as conseqüências como um cão"...]

- [Naya, não cante, por favor, estamos fazendo uma coisa


séria aqui…]

- [Nyaaah, sim doutora, eu sinto muito…]

- [Tudo bem, Naya, tudo bem… Iniciando gravação... Doutora


Yulia Kanzac, médica residente em-chefe do cruzador
Leviathan a serviço do Conselho iniciando necropsia na
amostra recolhida em um NCW pela tripulação em curso de
retorno a capital. Agora são 10h59min pelo horário oficial
de Nova Judah, estou sendo assistida pela primeira oficial
de enfermagem da tripulação Naya... vocês nunca acharam
que ter sobrenomes poderia ser prático?]

- [Nya-nya, por quê?]

- [Esquece... continuando... o espécime trata-se de uma


fêmea humana idade estimada em [neste instante, um
chiado agudo e cortante inunda tudo por alguns segundos]
27 anos, 1,71m, 59,7kg, pele caucasiana, olhos escuros e
cabelos escuros, alguma espécie de tintura foi perdida no
processo de esterilização quando do embarque na
Leviathan...]

- [Eu achei bonita, doutora...]

- [Obrigada por nos agraciar com seus comentários técnicos,


Naya, a espé...]

- [Obrigada - nyaah!]

- [...cime apresenta lacerações cutâneas, possivelmente de


origem animal... humana mais precisamente... aqui, aqui e
... Naya aproxime a câmera por favor, obrigada... e aqui. A
pele apresenta sinais severos de esfoliações de origem
climática, devendo-se observar que a espécime foi
recolhida em ambiente desértico, assim como desidratação
confirmada como a causa mortis... vê o estado dessas
mucosas, Naya? E aqui também...]

- [ Nyaaah, Naya não quer morrer de sede doutora,


totalmente não-bonito, nyaah...]

- [Definitivamente não é Naya... definitivamente não é... o


espécime possui uma inscrição no pulso direito, caracteres
não reconhecidos, alguma espécie de inscrição tribal,
gravou isso Naya? Aqui são as marcas da algema que ela
arrastou pelo deserto por vários quilômetros. Essa saliência
acima da rótula caracteriza uma lesão óssea...]

- [Nyaah, ela caminhou pelo deserto com a perna quebrada?


Por quê? Dói nyaah e Naya não gosta de dor...]

- [Eu não faço idéia Naya e acho que só ela mesma poderia
responder essa pergunta... Continuemos... uma cicatrização
prévia na face direita... a dentição possui um primitivo
complemento metálico... vou tentar chegar mais fundo... ]

Plam.

- [NYAAH! DOUTORA!!!]

- [Naya não derrube nada e não grite, estamos gravando um


documento cientific...]

- [MAS DOUTORA! DOUTORA! ELA MEXEU]

- [Acalme-se, isso é impossível Naya, ela não pode estar


contaminada, todos que sobem abordo são esterilizados, vc
sabe disso e se bem me lembro detesta...

- [Nyaaa... sim doutora... Naya detesta água gelada...]

- [Não é água exatamente, mas vc entendeu o ponto. Agora


vamos continuar o trabalho, filma aqui, isso é interessante,
humanos não possuem uma dentição assim,
normalmente...]

- [Dentes bonitos, nyaa... mas tome cuidado doutora...]

- [Naya, ela esta morta, não tem com o tomar cuidado. Mas
concordo com vc, a dentição dela seria perfeita... se ela
fosse uma Isiana como você... isso não faz sentido...]

- [NYAH-DOUTORA NAYA VIU ELA MEXER DE NOVO! NAYA


VIU!]
- [... ela não tem como... alcance-me este... obrigada... eu
devo ter esbarrado na maca, apenas aperte as amarras
mais firme]

Riiiip.

- [MAS NAYA VIU! NAYA JURA QUE VIU! ELA PISCOU PARA
NAYA!]

- [Sério Naya, isso está começando a ficar chato. Cadáveres


não reagem à luz, logo ela não piscou para você... agora
me alcance... isso. Pode filmar aqui? Os dentes delas estão
perfeitos... perfeitos demais na verdade, não tem o menor
sinal de desgaste, como se...]

- [Doutora, por favor, Naya tem um mau-pressentimento


sobre isso, nyaah... não podemos fazer isso quando
chegarmos à capital, atrás de tipos nyah fortões?]

- [Eu gostaria realmente Naya, mas são ordens diretas do


conselho... eles querem essa necropsia concluída antes de
desembarcarmos.]

- [PQ NYAAH? ISSO É PERIGOSO! NAYA SENTE ISSO!]

- [Se eu fosse alguém para quem o conselho explica o


porquê das coisas com certeza eu não estaria aqui abrindo
cadáveres alíens, Naya. Alem disso não é perigoso, não é
como se ela fosse me morder...]

- [Nyah... ta... mas apenas tome cuidado doutora... Examine


outra parte menos perigosa, sim nyaah?]

- [Naya, eu vou te provar que não tem perigo nenhum.


Alcance-me aquela lanterna ali, essa, obrigada. Agora,
como enfermeira vc deve saber que se ela possui qualquer
vestígio de atividade cerebral, o que é garantido que ela
não tem, quando eu coloco o feixe de luz sobre a pupila
desse jeito, ela não...]

- [Nyaah... isso não é bom, não é doutora?]

- [Isso não pode estar certo... as pupilas reagem à luz, mas


isso... isso não... Leviathan, ligação direta para a sala do
conselho... Naya pare a gravação.]

- [Nyaah, ufa...]

Fim da gravação. 23 de outubro de 2157. 11:15AM


Re-inicio da gravação. 23 de outubro de 2157. 11:43
AM.
– [Naya não entende, doutora...]

– [Ordens são ordens Naya, eu sinto muito. Apenas aperte as


amarras mais firmes e saia de perto dessa coisa. Vamos
terminar isso o quanto antes, a serra, por favor... aperte mais
firme, cuidado para não voar nenhuma lasca de osso nos seus
olhos, ponha os óculos... iniciando incisão frontal na caixa
torácica. Caixa torácica seccionada, abrindo agora...]

Som de serra circular cortando. Plosh.

- [NYAAAH!]

- [Ah meu Deus, o que é isso... esse cheiro...]

- [Naya não consegue manter seus olhos abertos doutora!]

- [Que cheiro horrível... Meu Deus, isso é nojento, eu nunca


havia aberto uma dessas coisas assim...]

- [Naya sente dor, doutora, nariz de Naya derretendo...


fede...]

- [Cof, cof... que coisa horrível... apenas para registro, cof,


minha assistente é de uma espécie de olfato particularmente
sensível... ao ser aberto a espécime emitiu um odor acentuado
putrefato e o estado dos órgãos internos é... algo que eu nunca
havia visto antes. O estado de decomposição indica que o óbito
ocorreu há vários meses, o que contrária complemente a
aparência externa. Observação que esse fenômeno não se deve a
nenhuma condição de preservação especial. Sinais da causa
mortis podem ser encontrados aqui, aqui e aqui, confirmada
morte por desidratação, parada renal, infecção interna... o
aparelho reprodutor foi grosseiramente removido, a julgar por isto
aqui... não, aqui Naya, isso... é um milagre que ela apenas não
tenha morrido devido à perda de sangue. Na verdade é quase
medicamente impossível que ela tivesse sobrevivido a remoção
... definitivamente essa não foi uma pessoa comum...
continuando, a espécime apresenta um grau elevadíssimo de
contaminação. Ok, recolhendo amostra agora, muito cuidado
agora... Deus isso é nojento... muita calma nessa hora, coletando
amostra da contaminação nos órgãos internos...]

– [NYAAH! DOUTORA CUIDADO!]

Silêncio.
– [Não me assuste assim, Naya. Ufa, não grite assim de novo,
ok?]

– [Ãh... ok doutora, Naya vai ser uma boa gatinha, Naya


promete nyaah...]

– [Bem, acho que não tem nenhum perigo afinal... esta estrutura
está... SOLTA O MEU BRAÇO! O QUE É ISSO?!? ME LARGA!
NÃO! NÃO!]

– [NYAAH! SOCORRO! NYAAAH!]

– [NÃO! PARA! ME LAR... AAAAAAH! AAAAAAAAAAAAH!


AAAAAAAAH! NAYA SOCORRO!]

– [NYAAAAH! SOCORRO! SOCORRO!]

Bacia com objetos cirúrgicos cai sobre o chão metálico.

– [AAAAAAAAAH! AAAAAAAH! SOCORRO! PARA! SAI! ME


LARGA!]

– [NYAAAH!!!]

Porta hidráulica abre e fecha logo em seguida.

– [Que confusão é essa, o que é que está acontecendo aq... AH


MERDA CARALHO! FODEU!!!]

Tata-ratata, tata-ratata.

– [NÃAAAAAAAAO! AÍ NÃAAAAAAO AAAARRRRGGGHH !!!!]

Gorgolejo.

Tata-ratata, tata-ratata

– [COMANDANTE! ESTAMOS TENDO PROBLEMAS NA


ENFERMARIA! MANDA PRA CÁ A F... FODEU! PRA TRÁS! PRA
TRÁS! GATA SAI DAÍ! PARA TRÁS! AAAAAARRRGGGHHH! PARE!
PARE AAAAAAARRRRGGGGHHHHHHH!!! MEU BRAÇO! MEU
BRAÇO AAAAAAAARRRRRRRGGHHHHH... NÃO, NÃO, MINHA
PERNA NÃO AAAAARRRRRRRRGGGGGGGGGHHHH!!!!
AAAAAARRRRGGGGHHHHH!!! NOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!
NOOOOOOO!!! AAAAAAAAARRRRRRRGGGGGGHHHHHHH!!!
MEU DEUS O QUE É ESSA COISA?!?]

Tata-ratata, tata-ratata

– [COMO SE PARA ESSA COISA?!? AAAAARRRRRGGGGHHH!!!


PORQUE NÃO MORRE?!? PORQUE NÃO MORRE!!! OH GOD
PLEASE MAKE IT STOP OH GOD!!!]
Tata-ratata, tata-ratata

– [NYAAAAAAH! SOCORRO NYAAAAAAAH!]

Tata-ratata, tata-ratata

– [NÃO! OH DEUS NÃO!! PARE! PARE! DEUS NÃO POR FAVOR


DEUS NÃO! HOLY SHIT NO! HOLY SHIT SHIT
SHIT AAAAAAAAARRRRRRRRRRRRGGGGGGGGHHHHH!! PLEASE
NOOOOOOOOOOO!!! AAAAAAARRRRRRGGGHHHHH”.]

Porta hidráulica abre e fecha logo em seguida.

– [ENFERMEIRA PARA O CANTO, SAIA DA FRENTE! QUE MERDA!


EU DISSE PARA NÃO... MERDA!]

– [NYAAAAH CUIDADO! NYAAH!]

Tata-ratata.

– [MERDA MERDA MERDA! COMANDANTE PRECISAMOS DE


REFORÇO AQUI EMBAIXO URGENTE! ESSA COISA PEGOU A
DOUTORA E O RIGGS! REPEAT: WE NEED SOME FAITH DOWN
HERE!!! MERDA! NÃO! MERDA! NÃO!!!]

Batidas desesperadas na porta.

– [NYAAAH SOCORRO!! ABRE! ABRE! NAYA QUER SAIR DAQUI!


NYAH!]

Arma cai no chão e os disparos cessam.

– [OH GOD!!! NO!!! IT'S HERE! OH MY GOD!!! SOMEONE HELP!!


HELP!! WHAT CAN I DO!! OH GOD OH GOD!! OH GOD! PLEASE
HELP!! PLEASE PLEASE PLEASE PLEASE!!! HELP!!
NOOOOOOOOOOO!!! THE PAIN! THE PAIN! IM GONNA DIE!
GOD NO! NOOOOOOOOOOO! HELP PLEASE SOMEONE PLEASE
HELP!!! OH GOD IM GONNA DIE! NOOO! OH GOD! OH GOD!
NO! NO! OH JESUS! OH GOD AND JESUS!! NOOOO!! IM GONNA
DDDD....]
Sons viscosos.
Silêncio bruto. Maciço.
Choro miado tentando ser sufocado no canto da sala.
Silêncio.

A porta hidráulica se abre. Mais tiros e gritos.

Fim da gravação. 23 de janeiro de 2157. 11:51AM.


Rewind. Playback amplificado. 237%. Filtrado. 23 de
outubro de 2157. 11:45AM.
– Ereh eno ylno eth m'i, Sdog ruoy rof llac uoy od yhw...
ATO 2 – GHOST IN THE SHELL

“.... this is not a drill, repeat: this is not a drill. There is a ghost in the shell,
evacuate imediatelly. Repeat: this is not a drill...”

- Andando, andando, não parem, não parem, andando!

Por baixo do uniforme militar, por debaixo da expressão séria de quem sabia o
que estava fazendo, por debaixo do militar que gesticulava para as pessoas
circularem havia apenas um homem. Um homem como eu e você que a estas horas
pensava nos seus dois filhos em Eredor e tinha medo.

- Eu disse andando, circulando gente não parem!

Por detrás do rígido treinamento militar que lhe conferia serenidade e liderança
sobre as pessoas “comuns”, havia a duvida, o medo e a hesitação de quem não
fazia idéia do que estava acontecendo e muito menos do que ia acontecer. A dúvida
que só aqueles que podem perder tudo sentem na alma. A encubação do
desespero.

Então ele se agarrava ao que tinha de sólido, real e concreto: suas ordens. Fora
ordenado para ajudar os civis a evacuar o compartimento H da Leviathan e era isso
que ele estava fazendo. Embora soubesse tanto quanto eles o que estava
acontecendo e estivesse talvez tão assustado quanto eles, era uma pessoa
diferenciada que tinha missão diferenciada. Ali ele não era um mero mortal que
poderia ser destroçado pelo fantasma que vagava pelos corredores da Leviathan,
ele não era apenas alguém como os outros. Ele era diferente, ele era especial, ele
era uma referencia na multidão, uma autoridade.

“.... this is not a drill, repeat: this is not a drill. There is a ghost in the shell,
evacuate imediatelly. Repeat: this is not a drill...”

- Senhor, senhor, o que está acontecendo?

- Não há tempo para explicações, senhora. Apenas continue andando com os


outros até o próximo compartimento.

Não raramente um civil parava de caminhar para lhe perguntar o que estava
acontecendo, completamente perdido e assustado. Ele sabia tanto quanto o civil,
entretanto como já foi dito ali ele era uma autoridade, um bastião da ordem em
micro-cosmo inundado pelo caos. E isso o fazia se sentir bem.

Ele não era mais apenas aquele garoto mirrado que sofria bullying na escola e
que se alistou nas forças militares da Federação apenas para aprender a se
defender. Agora ele um baluarte da esperança, um paladino da ordem. Mesmo que
apenas tivesse que gesticular e ordenar as pessoas que se deslocavam como gado,
mesmo apesar do medo e da possibilidade real de morrer a qualquer momento e
nunca mais voltar a ver seus filhos, aquele foi o momento mais alto de sua vida até
então, o momento pelo qual esperou a vida inteira, o momento do qual ele se
orgulharia de contar aos amigos, filhos, vizinhos e netos sobre como permaneceu
calmo. Provavelmente aumentaria a história um pouco. Depois que se
aposentasse, ele seria apontado como alguém que encarou um fantasma de frente e
sobreviveu. Sua vida, sua própria existência, naquele exato instante, in that very
moment, se justificava.

Era um homem realizado e...

Disparos. A multidão passando por ele entrou em pânico como uma manada de
gnus que fareja um predador do outro lado do rio onde bebia. Não havia mais
ordem, as pessoas se empurravam, gritavam, pisoteavam os que caiam em direção
a saída.

Ao fundo, o barulho de tiros aumentava proporcionalmente ao que aumentava o


pânico da multidão e a cada novo som alto desmoronava um pouco do seu mundo.
Não havia nada que ele ou qualquer um pudesse fazer agora para manter a ordem
ou ajudar alguém, a turba era uma entidade com vida própria e fora de qualquer
controle.

O som de combate se intensificou e já estava na próxima “esquina”, do corredor,


fazendo com que o pânico se instaurasse por completo. Vendo seu poder diminuir
progressivamente naquele micro-cosmo, fez a única coisa que seria humanamente
imaginável: restaurar seu tentar poder. Cego pela sede daqueles poucos instantes
de poder, pois o poder vicia mais do que um Amish que tomou Coca-Cola pela
primeira vez...

Mas não, não era só isso. Não era tão simples assim.
Como certo personagem disse uma vez: “humanos são... interessantes”

Ele também queria ajudar, queria fazer a diferença e não ser só mais um na
multidão. Quando lhe perguntassem o que ele fez quando ele se deparou com um
fantasma, o que ele diria? Que seguiu a multidão? Todo ser no fundo se acha
especial (exceto os que não se acham claro) e pensa que quando a verdade chegar
vai ter uma chance, com ele vai ser diferente do que aconteceria com um anônimo
aleatório qualquer. Porque nós sempre achamos que a nossa morte não vai ser
bruta e gratuita e sim cheia de propósito e melodrama.

Obviamente, as leis da física não a mínima para o que você acha que só acontece
com os outros, como esse vídeo comprova:

http://www.youtube.com/watch?v=WgFj9Q8vVjo

Mas aí é que está a questão realmente interessante: até que ponto vai o altruísmo
pelo próximo e em que momento começa o puro hedonismo por si mesmo? Até
que ponto ele queria ajudar e até que ponto ele queria apenas ser especial? É
possível traçar essa linha? Humanos são de fato... Interessantes.
Fosse como fosse, a multidão havia passado e ele estava parado na junção entre
os corredores, na esquina. A frente dele, seus colegas parados em posição de tiro
como se fosse fuzilá-lo, mas isso não faria sentido o que só podia significar que
aquele perfilhamento para atirar não era para ele e sim... atrás dele... oh dear...

Engoliu em seco uma ultima vez, e olhou para seus colegas. Sabia o nome de
cada um deles, estavam a meses dormindo no mesmo alojamento e almoçando
juntos. Sabia de suas histórias, sonhos e problemas. Eles não eram apenas
soldados genéricos de um filme, cada um era um ser humano único e
insubstituível, eram seres humanos como ele. Ouve um segundo de tensão
silenciosa, aquele meio instante depois do seu time tomar um gol e você espera
que o juiz anule ou qualquer coisa aconteça e desfaça aquela coisa horrível, mas
nada acontece. Ele não queria estar ali, parado de frente para seus colegas e de
costas para algo terrível. Seus colegas não queriam que ele estivesse ali, gostavam
dele, era um bom sujeito e bom amigo. Mas não havia nada que ninguém podia
fazer e todos sabiam o que aconteceria nos segundos seguintes não havia força ou
fé nesse mundo que poderia salvar sua vida.

Dizem que quando você é decapitado seu cérebro funciona por


aproximadamente 15 segundos ainda e você pode viver o horror de saber que sua
cabeça foi cortada e que você vai morrer em poucos segundos. Se você só tivesse
poucos segundos de vida, qual seria seu ultimo pensamento?

Virou-se, tentar fugir era inútil. Você simplesmente não “corre” de um fantasma,
não a essa distancia. Estava morto e sabia disso. Fez então a única coisa que seria
humanamente possível de ser realizada ou mesmo pensada naquele momento: se
virar e ver o seu algoz.

Uma garota nua, ou que um dia fora uma, um pouco mais baixa do que ele
pálida como o gelo aterrorizante como a morte. Entretanto seu aspecto não era
atraente mesmo que seja uma regra sagrada para os homens que toda mulher por
volta do peso ideal é atraente haja o que acontecer, esta não era. Possuía dentes
terríveis (no sentido de malignos e não de feios) e seu peito estava aberto
literalmente. O tórax havia sido aberto como um armário de cozinha e dentro
pulsava alguma coisa não menos terrível. Olhando para os peitos dela (embora não
no sentido que a expressão é comumente usada), não teve tempo de ver seus olhos
(isso também acontece muito comumente com os homens, mas novamente não
nesse tipo de situação especifica). Tudo que viu foram os dentes terríveis tomando
todo seu campo de visão e então estava no chão.
- Pots ti ekam esaelp...

Embora não tenha conseguido entender ou mesmo ouvir direito o sussurro, a


próxima coisa que percebeu é que estava no chão caído de costas. Curiosamente,
não sentia dor alguma e para ser honesto não sentia muita coisa, além disso, senão
frio... hm, então morrer não era tão ruim assim, só era frio...

De onde estava não conseguia mover nenhuma parte do corpo logo não podia
escolher o que via, pois estava como um espectador de uma câmera que caíra de
lado no chão. Tudo que via não era muito a não ser o próprio piso metálico do
compartimento H da Leviathan, onde sua cabeça se encontrava. Via também uma
poça carmim ir tomando proporções cada vez maiores, era uma poça com o seu
sangue que ia se espalhando pelo deck.

Não viu quem ou o que o atingiu, mas viu um pé feminino pálido, desnudo (que
outrora deveria ter sido macio e delicado, mas agora era simplesmente... terrível)
passar por ele pisando no seu sangue e seguir em direção aos militares. Aquilo
meio que representava alguma coisa simbolicamente, mas não conseguia pensar
em nada agora, pensava apenas que estava muito frio e que gostaria de uma
coberta...

Se lembrou de quando era uma criança, e de tudo que viveu até ali. Ao contrário
do que imaginava seus últimos pensamentos não foram para seus filhos ou sua
esposa e nem para o seu time do coração. Seus últimos pensamentos foram...

“Eu tinha 13. Era um dia da escola. Oitava classe.

Alguém me acordou no segundo andar, não recordo quem. Eu me apressei e


comecei a me vestir, descia as escadas para não perder o ônibus para a escola
quando ouvi a voz da minha mãe. Soou diferente, infantil. Porque eu aproximei do
seu leito ouvi suas palavras, "mas eu não quero levantar, mamãe!". Olhei a minha
esquerda e percebi que ela falava com a minha avó que estava parada na entrada.
Minha mãe em sua cama olhava para cima.

Era a última vez onde eu a vi viva.

Eu não soube o que fazer. Eu corri pela porta da frente e me apressei para não
perder o ônibus.

Por essa idade, eu já tinha visto e lido as coisas que se relacionam à morte e
diziam que as pessoas às vezes regressavam à infância imediatamente antes de
morrer. Eu soube que era o que estava acontecendo com a minha mãe.

Eu soube que estava morrendo.

Não recordo muito mais sobre a caminhada até a parada de ônibus, mas eu
recordo de ver a ambulância passando por nós no ônibus após a minha rua. "Eu
quero saber onde aquela ambulância está indo...” alguém perguntou
inocentemente. Eu soube, naturalmente.
Assim eu fui à escola e esperei. Eu soube que, mais logo ou mais tarde, alguém
viria até mim e diria "necessitam vê-lo na diretoria." Eu soube que eu andaria a
diretoria e alguém estaria lá para me dizer que minha mãe havia falecido.

Recreio. Eu estava no playground. Um dos professores andou até mim e disse,


"necessitam vê-lo na diretoria.". Depois de uma caminhada que pareceu durar
horas, vi meu pai e meu tio Melvin do lado de fora da diretoria. Papai gritou
debaixo de um lenço: "faleceu," disse. "sua mãe faleceu"

Eu estava anestesiado. Tinha estado anestesiado o dia inteiro. Minha mente


não podia absorver a verdade toda. Eu tinha ido à escola porque era o que eu
tinha sido dito para fazer, mas estava apenas andando através do mundo, porque
eu sabia que estava perder a que eu mais amei --- a única pessoa no mundo que
me amou.

Não tinha nenhuma idéia de onde ir depois daquilo, do que fazer senão
continuar. Na verdade, ninguém mais soube o que fazer qualquer um. Nada no
mundo fez o menor raio de sentido.

Levou anos para aceitar a situação e para sentir totalmente sua morte. Para
gritar. Para sentir a perda extraordinária.

Eu não gritei no funeral --- nem meu pai, o bastardo que era, me havia sido
apresentado uma única vez antes disso. Naturalmente, a respeito disso ele me
disse que talvez eu era feliz porque estava ausente dele. O mundo revolveu sempre
em torno dele, suponho.

Mas a verdade era que eu não poderia gritar porque a perda estava oprimida
em demasia. Havia demasiada emoção para que um menino de treze anos de
idade compreenda, ajuste-a. Eu estava ferido. Não somente minha mãe morreu,
mas uma parte de mim, também.

Nos dias que se seguiram ao funeral, eu tive um sonho. Minha mãe veio-me,
cercada na luz mais bonita do que eu jamais a tinha visto sempre antes. "não se
preocupe, filho," disse. "eu estou bem"

Qualquer um poderia pensar que era um truque do meu subconsciente, a


imaginação de um menino pequeno. Mas eu senti, e sinto ainda, que era realmente
ela. Ajudou-me imensamente. Eu soube que me amava ainda, me muito ainda me
mesmo após a morte.

Eu sinto uma falta terrível dela. Há muitas coisas na minha vida que eu
gostaria de ter compartilhado com ela. Havia muito dos meus planos, das minhas
conquistas e até dos meus erros que eu gostaria que ela testemunhasse.

Dia 08 de junho seria seu 52º aniversário.

Eu te amo, mãe.”
Havia muito pouco sangue no seu corpo aquela altura e poucas funções do seu
cérebro ainda funcionavam. Os sons ao fundo eram borrões indistintos e não
saberia dizer o que estava acontecendo ou quem estava vencendo. Na verdade
mesmo que soubesse seu cérebro não conseguia ordenar uma simples linha de
pensamento aponto de compreender que significava estar vencendo, era apenas
uma vela que tentava permanecer acesa enquanto a cera estava acabando.

Entretanto um último pico de adrenalina fez com seus sentidos captassem uma
ultima imagem, uma ultima cena. Um vulto saltou sobre seu corpo muito
rapidamente e então ele ouviu gritos. Mas não como antes, estes eram diferentes.

Não gritos, mas sim verdadeiros urros vindos de seus colegas. Diferentes de
todos os anteriores, não eram gritos de dor, de desespero ou de agonia. Era um
grito de esperança. Um urro repleto de alívio, de exultação, de alma lavada, de
justiça. Era o grito do gol da virada aos 47 do segundo tempo, era o grito de ter
derrotado o ultimo chefe do jogo, era o grito de ir à forra com valentão do colégio.
Era o som da mais densa e tenebrosa treva sendo desmantelada pela singela chama
de uma vela. O que quer que houvesse passado por ele, foi o ultimo raio de sol
desmoronando o ultimo muro do ultimo inferno.

Alguns instantes depois um baque pesado e a menos de um palmo de sua


cabeça fora jogada outra cabeça (se com corpo anexado ou não, isso ele não
conseguia ver). Era a garota pálida, havia sido atirada perto dele. Daquela
distancia podia ver o quanto a pele clara dela estava esfoliada e desgastada, mas
sobretudo, o quanto os olhos negros dela eram profundos, cansados e tristes.
Metade do rosto dela estava afundado na poça de sangue dele, que não por acaso
ela mesma causara, mas ele tinha uma boa visão da outra metade.

Só então ele percebeu que ela chorava.


Por sua face maltratada escorriam lágrimas de sangue.

- Que bom – ele sussurrou a ela, cansado, com suas ultimas forças – Ainda há
esperança... still there is... faith...

Quem é ele?
Isso não é importante. Ele foi alguém cuja vida pode não ter significado nada para
mim ou você e tantos outros, mas ainda sim ele fez o que pode e o que achava
certo. Ele se esforçou, se empenhou, suou, sangrou e amou, e no fim pouco disso
ou quase nada na verdade vez qualquer diferença. Ele foi alguém que nasceu,
viveu e morreu, e que logo seu legado será consumido pelo tempo. Ele foi alguém
comum.

Quem é ele? Ele é o carteiro, ele é aquele colega que você não lembra o nome,
ele é a pessoa que levanta e você pega o lugar dele no ônibus. Ele é todas as
pessoas que desaparecem todos os dias e que não serão lembradas pelo mundo
todo. Ele é aquela pessoa que é atropelada e você diz “que barbaridade”, antes de
esquecer e seguir com a sua vida. Ele é apenas mais alguém e justamente por esse
motivo ele é a pessoa mais importante do mundo.
Porque o mundo pode existir sem atores, astros do rock ou jogadores de futebol.
Mas não pode existir sem pessoas como ele.

Quando uma chama nasce, todo universo rejubila em alegria.


Quando uma chama se apaga, todo universo lamenta com grande pesar.

Uma vida que se perde não pode ser substituída ou continuada. É o maior
crime de todos, e ao mesmo tempo sim a maior beleza que existe, pois faz de cada
vida única, especial.

Quem é ele?

Ele é minha mãe.


Ele sou eu.

Agora ele está morto e sua história termina aqui.


Entretanto este não é o fim dessa história, é apenas o começo.

Life is just a dream, you know


that's never-ending

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