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atava de 2006 a lembrança mais forte que eu

tinha de Fernando Henrique Cardoso antes


do encontro de março último, do qual re-
sultou a entrevista da página 16 desta edi-
ção. Em uma noite de autógrafos na nossa
antiga unidade no Conjunto Nacional, em
São Paulo, estavam presentes José Mindlin,
Pedro Moreira Salles, Celso Lafer, FHC, eu,
entre outros. O espaço do velho Cine Astor,
onde se encontra atualmente a maior loja
da Cultura, já tinha sido alugado e convidei
todos para conhecer o local. Só havia uma lâmpada para iluminar o enorme galpão
de mais de 4 mil metros quadrados. Estava tudo vazio, parecia um gigantesco caixote
de concreto. Ali, revelei meus planos para eles. O tempo passou, a loja do Conjunto
Nacional foi inaugurada em maio de 2007 e, algum tempo depois, FHC voltou à Cul-
tura, desta vez acompanhado de Dona Ruth. Ao entrar, ele me disse: "Quando você
me mostrou este lugar, não acreditei que realmente faria isso". Pois é, eu também
não acreditei que, quase três anos depois, estaria sentado no sofá do Instituto FHC
fazendo algo relativamente novo para mim, que não sou jornalista e sim, livreiro. No
fim da conversa com FHC, pedi para ele autografar para mim a prova do novo livro,
Relembrando o que escrevi - já tenho uma prova autografada de seu livro anterior,
em inglês, The Accidental President of Brazil. Ele escreveu: "Para o Pedro, de seu
admirador e amigo". Mudando de assunto, mas ainda falando de lembranças, não po-
deria deixar de dizer neste editorial que em abril comemoramos dez anos de abertura
da nossa primeira filial, a do Shopping Villa-Lobos. Minha mãe, Eva, fundadora da
Cultura, estava presente nesse importante passo da empresa e temos dela uma foto
emblemática da ocasião: sentada, linda como era, degustando tranquilamente uma
taça de espumante. Tudo bem, vou compartilhar essa foto com vocês. Entrem no
Blog da Cultura (www.blogdacultura.com.br); ela estará lá. Boa leitura! Pedro Herz
POR THAís ARRUDA
ernando Henrique Cardoso tem aquele ar de velho conhecido, quase um paren-
te. O jeito manso de falar combina com a postura calma e o movimento lento das
mãos. Combina também com o jeito tranquilo de Pedro Herz. Ao chegar ao Insti-
tuto Fernando Henrique Cardoso, onde esta entrevista aconteceu, urna enorme e
moderna porta de vidro fosco se abre para mostrar, do lado de dentro, um espaço
clássico, repleto de memórias. O saguão é decorado com objetos recebidos pelo Instituto, corno
o prato bordado com fios de resina, presente do presidente da África do Sul, Thabo Mbeki. O
silêncio do local, blindado com janelas antirruído, já que fica em pleno centro de São Paulo,
é quebrado a cada 15 minutos pela músic a de um carrilhão. Aliás, FHC certamente gosta de
carrilhões já que, em sua sala, tem mai s dois . E de balas, pois os docinhos ficam à disposi -
ção dos convidados no saguão, na sala de reuniões, na sala do presidente... Fornos recebidos
para esta conversa, em princípio pautada no lançamento de seu novo título, Relembrando
o que escrevi, qu e reúne artigos e entrevistas publicados entre 1972 e 2006, em sua sala no
Instituto, um local amplo , com grandes janelas, poucos, mas belos móveis, muitos livros em
cima das duas mesas de trabalho, alguns quadros, dois relógios - um carrilhão e um de pa-
rede - , água, café e balas. Mas corno verá abaixo, o papo foi bem além das páginas do livro.

Thaís Arruda: Relembrando o que escrevi é um livro de na sociedade brasileira?" que" o que pesa até hoje so-
memória ou uma biografia política? FHC: É um misto. bre nós é a escravidão". Mais de 30 anos depois, gosta-
Na verdade, não é de memória, porque foi feito na hora, com ria de refazer a pergunta. FHC: Joaquim Nabuco disse
entrevistas variadas, mas isso dá um percurso, que não foi que depois da abolição precisaríamos de mui tas décadas
propriamente definido por mim, porque depende dos entre- para que as marcas deixadas desaparecessem. Eu diria que
vistadores. Mas, na montagem, o Miguel [Darcy de Oliveira] essas marcas começam a desa parecer. No fundo, liber ta-
organizou de modo que dá um percurso político. ram-se os escravos e não se deu ed ucação a eles. Nabuco
dizia que tinha de educar e fazer reforma agrária, isso na
TA: Este livro surge para o senhor reafirmar o que falou época da campanha abolicionista. Está sendo um proces -
e colocar uma pedra em cima da frase "esqueçam o que so lento, mas está havend o absorção. Não é só por isso
escrevi", que sempre negou ter dito? FHC: Fiz questão, que nossa sociedade é injusta . Toda sociedade capita lista
até do título, porque invent aram o "esqu eçam tudo o que tem uma diferenciação de ren da forte, e isso vai conti nuar
escrevi". Chega de dizer bob agens. O qu e não quer dizer assim. Aqui, ela é injus ta po rque a probabilidade de você
que não tenha evoluído no meu pensamento, mud ado aqui melhorar na vida, de ter oportunidades, não é equitativa .
e ali. Mas nun ca disse isso, pelo contrário. Aliás, lembrem, Esse é o maior problema . A noção de injustiça não po de
por favor. A maior parte das pessoas que afirma isso nunca estar diretamente ligada ao nível de renda ao nascer, e sim
leu o que escrevi no passado. E às vezes pegam o presente e a poss ibilidade de você mudar de posição. Nós começa-
pensam que estou mud ando de opinião, porque não leram mos a ter mais possibilidades.
o que disse antes, Teriam de ter acompanhado a evolução.
Pedro H er z: A ditadura, depois da escravidão, teve
TA: Em um dos artigos do livro, de 2003, o senhor ex- alguma influência também? FHC: Teve, sim . Isso é
plica o contexto em que esta frase surgiu e diz que vem interessante. O que aco ntece u na época do mil agre, nos
mudando de opinião há 30, 40 anos. FHC: Não penso anos 70 basicamente, foi qu e a econo mia cresce u à mé-
hoje o que pensava há 50 anos, só se fosse uma pessoa des- dia de 7% ao ano, mas isso não se transfor mou em oferta
provida de qualquer espírito intelectual. O mundo mu dou . de serviços sociais. A ed ucação , a saúde, o nível de renda
E como! É impossível não acompanhar o mu ndo. No meu não melhoraram. E mais, como a dita dura, para crescer,
caso, sempre fui mais interessa do na coisa que está nova adotou um procedi me nto que foi com as estatais gran-
do que na que já se sabe. Procuro o temp o todo sublinhar des, que concentram renda, quand o você olha os dados
o que po de acontecer, olhando para a frente. E quem fica hoje percebe que as coisas co meçara m a m udar co m
olhando para a frente, obviamente, está mudan do. a Constituição de 88, qu ando se desenha um país mais
socialdemocrático em qu e o estado te m de dar ed uca-
TA: Em outro artigo selecionado no livro, uma entre- ção e saúde gratuita, acesso à terra, melhorar a aposen-
vista para a IstoÉ em 1978, o senhor responde para a tadoria. Não foi de imediato. Foi a partir do Real qu e
pergunta "quais as marcas profundas da desigualdade esses programas começaram a ser pos tos em marcha.
PH: Acho que todos sofrem com a m á qualidade da educa- PH: Drogas é um assunto que o preocupa. A indústria
ção no Brasil. Os em presári os têm dificuldade de admitir tabagista sofre atualmente com a guerra contra o cigar-
gente. O sen hor acha que existe perspectiva nos próximos ro e é muito poderosa, grande recolhedora de impos-
d ez anos de termos um país com pe ssoas aptas a governar to s. O sen h or acha que ela tem interesse na legalização
ou a dirigir empresas com a educação que oferecemos? d a maconha? FHC: Não sou favorável à legalização em
FH C: Olhando estrategicamente, diria que alguns prob lemas nenhum momento, pois isso nos obrigaria a reconhecer
têm de ser resolvidos: infraestrutura, sistema político e educa- que a droga não faz ma l, e faz. Até preferiria a proibição
ção. Estamos conseguindo certa expansão. Por exemplo, antes do cigarro se fosse possível. Droga causa dano à pessoa
não tinha acesso à escola primária, hoje tem, aumentou tam - e à sociedade. Todas as drogas, a macon ha também . O
bém a escola secun dária . Mas que ensino é esse? A questão é problema é outro. A criminalização resolve? Colocar na
complicada, porque envolve qualidade, o que se ensina. Aí eu cadeia reso lve? Não, aumenta . Como resolver sem legali-
tenho usado uma expressão desgastada, mas não tenho outra: zar nem colocar na cadeia? Terá de penalizar de alguma
é preciso fazer uma revolução. Essa revolução não é somen- forma, mas com penas alternativas e tratamentos ade-
te dar mais recurso. Claro que precisa aumentar os salários quados de saúde. Tem um país que temos de olhar com
dos professores, mas não é isso que resolve. Também não vai atenção: Portugal, q ue descriminalizou. A polícia não
ser suficiente colocar as crianças na escola. Vai ser necessário coloca o us uário na cadeia, e sim o traficante. Isso dimi-
mudar o quê e como se ensina. Isso não estou vendo e não n uiu o consumo e aliviou a cadeia. Aqui a lei já existe e
tenho certeza de que em dez anos será resolvido. Acho que diz que, se você for pego com certa quan tida de de dro-
somos muito tradicionais e isso faz com que a criança e o ado- ga, para uso pessoal, não vai preso. Mas não especifica a
lescente percam interesse no que está sendo ensinado, pois quantidade e, então, a polícia é que arbitra e, em geral,
não corresponde nem à expecta tiva nem à necessidade deles. diz que você tinha mais do que efetivamente tinha para
poder prender. Aí a pessoa é condenada como traficante,
PH: Então, no atual modelo, nosso cre scimento é susten- passa cinco, seis anos na prisão, on de aprende mais crime.
tável ou não? FHC: Acho que um acresce ntamento real de
crescimento, não. Vamos nos arrastando. Quando chegamos TA: A descriminalização no Brasil tem de vir, então,
a um crescimento de 5%, já estamos felizes. Na verdade, já acompanhada da reeducação da polícia? FHC: Evi-
crescemos muito mais. A China cresce o dobro disso. Se olhar denteme nte. Fui recentemente ao Morro Santa Marta,
o tamanho dos pro blemas do Brasil, precisaríamos crescer o no Rio, onde estão fazen do algo interessante . Enviaram
dobro também. Aí, não são só problemas de educação, mas o BOPE, que é a polícia repressiva, expulsaram os tra-
de poupança, de investimento. A nossa taxa de investimen- ficantes, tiraram as armas e enviaram a polícia pacifi-
to cresceu mui to po uco. A de poupança diminuiu. Como é cadora para orientar a comunidade. Pararam de fumar
essa contradição? Porque para investir você toma empresta- maconha no morro? Não, mas não tem tráfico e, con-
do e traz dinheiro de fora. Mesmo diminuindo a poupança sequentemente, não tem vio lê ncia. Naturalmente, tem
doméstica, você po de manter a taxa de investimento, mas a outro problema, pois o tráfico dá emprego e, portanto,
longo prazo isso não se sustenta. E basicamente a po upança você terá de criar emprego . São problemas difíceis de ser
doméstica diminuiu porque o setor público deixou de po upar. resolvidos, mas há caminhos. Falei de Portugal, do Rio,
E deixou de po upar por duas razões. A primeira pela razão in- mas não exis te u ma recei ta e certamente legalizar não é
versa do que disse antes, ou seja, porque a Cons tituição obriga o caminho. Com a liberd ad e geral, po de acontecer de a
a gastar no social e não investe diretam ente na economia. E indústria de tabaco, que não ven de mais cigarro, come -
não é s ó por isso, é porque tem mau uso do gasto. Se quiser çar a vender maconha, o que seria trágico.
realmente ter mais investimento, o governo tem de po upar
mais. Isso, somado à educação, é fundamental, olhando a lon- TA : E o álcool? FHC: É o que mais mata. Mas a sociedade
go prazo. E investime nto em infraestrutura e reforma política regulamenta o uso do álcool informalmente. Se você levanta
porque chegou a um po nto que ning uém aguenta mais. O sis- de manhã e pede uma caipiri nha, está em estado grave. Se
tema político brasileiro não funciona. Ponto final. vai comer uma leitoa e toma uma cachaça antes , é aceitável.

o QUE NÃO LEIO HÁ MUITO TEMPO É POESIA,


CURIOSO ISSO. ACHO QUE POESIA REQUER UMA
DISPONIBILIDADE DE ALMA QUE NÃO TENHO MAIS
VOU ME DEDICAR A COLOCAR EM ORDEM UM
MATERIAL GRAVADO QUE TENHO DA ÉPOCA EM
QUE FUI PRESIDENTE. MAS SÓ QUERO QUE SEJA
PUBLICADO DEPOIS QUE EU MORRER, POIS MEXE
COM MUITA GENTE QUE NÃO QUERO MEXER VIVO

TA : A maconha não en t ra ri a nesse m esmo r aciocínio para ele? Ele é que tem de indicar o que saiu de novo que eu
do álcool? FHC: Aí, depende da sociedade. No caso do não sei (risos)! Acho que a gente deve voltar ao que sempre
álcool , tem até propaganda: faz mal à saúde. No caso da gostou. Eu voltei a ler Joaquim Nabuco . Para minha forma -
maconha, teria de ser a mesma coisa , dizer o tempo todo ção, O abolicionismo é um livro admirável, literariamente
que faz mal. Porque faz. falando, os insights que ele teve... vale a pena reler. E por
causa do Nabuco voltei a ler Tocqueville, só que li um que
PH: Mudando de assunto, pesquisas mo stram que o bra- pouca gente leu, esse o aconselharia a ler, chama-se Lem -
sileiro lê pouco. Qual sua sugestão para melhorar isso? branças de 1848 [esgotado] . Marx escreveu 18 Brumário
FH C: Precisa melhorar o nível cultural no Brasil como um sobre essa revolução. É interessante ler os dois ao mesmo
todo, dar mais acesso à escola e também baratear o custo do tempo, pois são visões diferentes para o mesmo fenômeno.
livro. O governo é o maior comprador de livro escolar, mas
não é esse livro a que nos referimos , e sim ao que se compra TA: O sen hor já tem projeto para um no vo livro? FHC:
por gosto. Aí tem uma discussão complicada, que tem a ver Estou sempre preparando livro. Vou publicar no segundo
com meios eletrônicos de informação. Eu, que vou fazer 80 semestre ensaios mais recentes sobre o que, no fundo, sem-
anos no ano que vem, ganhei um leitor digital para poder pre me preoc upa: como o Brasil vai and ar nesse mundo que
ler livro eletrônico. Esses mecanismo s não são negat ivos, está se globalizando, quais políticas sociais se deve fazer e
eles vão acabar induzindo a leitur a. Dizem que o acesso ao as consequências para a democracia. Depois vou me dedi-
computador vai diminuir a leitura. Até certo ponto. Pode car a colocar em ordem um material gravado que tenho da
dar efeito de encadeamento. A juventude hoje passa a maior época em que fui presidente. Durante os oito ano s, qua se
parte do tempo na internet, nem sempre lendo , mas às ve- todos os dias, ditava em um gravador como se fosse um
zes lê. Agora, como você vai manter a curiosidade intelec- diário . Disso, uns cinco anos já foram transcritos pela chefe
tual de maneira que a pessoa não se contente com o Twitter do meu acervo. Desses transcritos, só trabalhei em cima do
e passe para o livro? Que tipo de livro no futuro vai ser útil primeiro ano. Mas não quero publicar agora. Só quero que
para despertar atenção? O prob lema, a meu ver, do online é seja publicado depois que eu morrer, pois mexe com muita
a fragmentação da informação. O que as pessoas não têm é gente que não quero mexer vivo. Não mexe no mau sentido .
quadro de referência. Um mecanismo para manter o inte - Mas, quando você está anotando, fala de seus momentos,
resse talvez surja quando o livro der quadro de referência . de sua raiva, de sua alegria e o interessante é isso.

TA: Na hora de ler por prazer, que tipo de literatura o se- TA: Para finalizar, gostaria de fazer a pergunta clássica da
nhor prefere? FHC: Leio em geral sobre história, economia, Revista: cultura é...? FH C: São modos de fazer, sentir e pen-
um pouco de filosofia,não muito, pois não tenho competência sar de um povo e de uma pessoa. Isso é cultura no sentido an-
para tanto, e leioalguma literatura. O problema é que meu tem- tropológico. Do ponto de vista erudito, é outra coisa, é como
po é escasso. Gosto do Mia Couto, do Hatoum [Milton], quero você transforma esses modos em alguma coisa reconhecível
ler o novo livro do Chico Buarque [Leite derramado ]. O que por terceiros, mensurável, que tenha de ter sentido às ações.
não leio há muito tempo é poesia, curioso isso. Acho que poe- Isso pode ser feito de forma literária, na qual você imagina e
sia requer uma disponibilidade de alma que não tenho mais. cria um mundo que refletirá seu modo de pensar, sentir e agir,
e de seu ambiente também. Além disso, tem outras expressões
PH: Dissemos que o Brasil consome pouco livro, mas do sentir que não são verbais, como a música. O cinema é fas-
sei que tem gente interessada em ler e não sabe por cinante! Como fui treinado em outra época, tenho dificuldade
onde começar. O que o senhor recomendaria para elas? com algumas formas de arte contemporânea. Bom, até Cildo
FHC: Acho que, se for literatura, deve-se começar pelo Meirelles eu entendo, quer dizer, sinto junto. Tem outros que
mais fácil, Jorge Ama do. Depois, sofistica um pouco com não consigo sentir e é faltaminha, não tenho sensibilidadepara
Graciliano Ramos para ap ren der a escrever. Ou, quem isso,mas é cultura. A sensibilidade varia em cada geração. e
sabe, chega até Machado de Assis, ainda mais sofisticado.

Veja o ensaio fotográfico deste encontro e ouça os trechos


TA : Se tivesse de indicar um livro para o Pedro Herz extras desta entrevista no www.blogdacultura.com.br
ler, qual indicaria? FHC: Como ousaria ind icar um livro

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