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Narrativas Curriculares: exílio, morte e continuidade do discurso

Jamile Borges da Silva1


Todo pesquisador do acontecimento
vê-se em face do seguinte enigma:
como é possível que alguma coisa de novo
surja na educação?
(Corazza et al., 2004 )
Currículo e processos emancipatórios
Este artigo buscará refletir a partir de um tema proposto, a saber: currículo projeto
que emancipa2 – acerca das múltiplas dimensões do currículo, numa arquitetura conceitual
que comporta três eixos: a condição do Exílio no discurso Curricular, a condição da
Morte e a Continuidade do discurso.
Esses três eixos serão tomados a partir de uma perspectiva arquitetônica presente no
trabalho de D. Libeskind3 que, ao projetar um edifício em memória do povo judeu, ergueu
sua estrutura sobre três pilares (corredores) que se cruzam, mas, apenas um aponta saída.
Os eixos-corredores que ele chamou de “exílio” e “morte” conduzem aos subterrâneos do
Edifício (num movimento de eterno retorno), enquanto o corredor da “continuidade”, leva
para fora do prédio.
A analogia com a arquitetura não é uma coisa nova nas humanidades. Falamos em
edifício teórico, estruturas, empreendimento epistemológico, enfim, o que proponho aqui é
lançar novas lentes sobre o currículo, seu traçado, seus mapas e decalques a fim de produzir
uma outra arquitetura possível que ajude a erguer processos emancipatórios em novos
horizontes de sentido.
De saída, isso nos coloca diante da inexorável condição de pensar um currículo
como propõe Corazza (2003), isto é, um currículo sem a necessidade de qualquer doxa, de
procurar uma verdade ou determinar modos de discurso (P.14).
Um currículo pensado e produzido desse modo exige coragem pra questionar o
projeto iluminista de um pensamento orientado para busca de generalidades, de
regularidades, e, em lugar disto, pensar em devires, linhas de fuga como pensa Deleuze
(1995).
1
Antropóloga, Ms.c. Em educação/ Doutoranda em Educação/UFBA, Professora da UFBA.
jamborges@click21.com.br.
2
Tema da palestra proferida no VI Fórum de Educação do CEAP - Salvador/Ba, 21 a 23 de outubro de 2004.
3
D. Libeskind, arquiteto judeu que projetou o Museu Judaico em Berlim.

1
Exige ainda a fabricação de conceitos (instrumentos para operar sobre a realidade)
que nos ajudem a agir sobre o real transformando-o; conceitos-instrumentos que nos
permitam ler (legere, em latim, colher) nas superfícies do discurso escolar as múltiplas
significações que resultaram na construção dessa sociedade desigual, injusta, patriarcal,
sexista, eurocêntrica e monossêmica.
Um currículo pensado-desejado enquanto estimulador de processos emancipatórios
implica em assumir a luta contra o catatonismo e a hemiplegia da narrativa curricular;
admitir que o grande discurso, as grandes narrativas, nos auxiliam a compreender o mundo,
mas não são a única resposta.
Onde estão as línguas e as vozes dos silenciados, exilados do currículo? Onde estão
as vozes dos índios, dos negros, das mulheres, dos gays, dos sem-terra, dos sem-teto? Pois,
como assinala Corazza (et al.,2004) assim como o pintor não pinta nunca sobre uma tela
virgem, nem o escritor escreve sobre uma pagina em branco, porque tanto a tela como a
pagina estão cobertas de clichês preestabelecidos, também o currículo não se constrói sobre
um zero, um nada, mas sobre a realidade do pensamento curricular repleta de clichês, que
devem ser eliminados.
até que encontrem um espaço vital de
possibilidades, que não é um vazio intocável, mas o que
Deleuze chama de um Deserto, “Saara” (Cf. Deleuze s/d,
p.56): povoado de nômades, ou de uma espécie nômade de
acaso e distribuição espacial – o tipo de acaso cheio de
possibilidades, as quais não podem ser abolidas por
qualquer lançamento de dados (Corazza et al., 2004, p.37).

Estamos falando aqui de um currículo contra a hegemonia do significante, contra a


dominação da língua do mestre. Precisamos nos libertar do decalque, da cópia dos
modismos e das estrepulias pedagógicas que advogam em nome de um professor-
profissional versado em múltiplas atividades, sintonizado com as demandas da sociedade
do conhecimento, que entenda as múltiplas inteligências, que seja criativo, pró-ativo, bom
leitor, inovador, dinâmico, treinado para identificar crianças e adolescentes com
dificuldades de aprendizagem (como se coubesse ao professor fazer diagnósticos dessa
ordem), animador de inteligência coletiva, enfim, o projeto curricular em curso nessas
sociedades da modernidade tardia produziu os novos estrategistas do conhecimento:

2
consultores em tempo integral, especialistas de plantão, têm sempre a resposta para o
porque o aluno não aprende.
Ao final, na topologia do fracasso e do sucesso escolar, os processos
emancipatórios não encontram lugar porque os lugares já foram previamente definidos.
Precisamos reconhecer que esse professor demandado pela sociedade da
informação não responde ao nosso desejo por uma escola que sirva ao desenvolvimento de
projetos emancipatórios. Se queremos professores comprometidos com a busca da
emancipação precisamos ter claro que essa luta passa necessariamente por uma escola
engajada política e eticamente; por professores engajados na luta cotidiana da escola real e
do aluno real. A formação de professores é um ato político-pedagógico.
O currículo como um projeto que sirva à emancipação só produzirá efeitos se
pensado como uma totalidade aberta (no sentido bergsoniano), atualizado e potencializado
pelo cruzamento com outros devires, outros discursos e práticas que ressoem na escola real,
ou seja, naquela que é possível construir dentro das circunstâncias históricas, políticas,
éticas e epistemológicas em que vivemos.
Precisamos ter a compreensão de que formar indivíduos, professores ou não, passa
necessariamente pelo desejo de aprender, pelo desejo de habitar outros tantos campos
semânticos apagados, extirpados e silenciados de nossos discursos e narrativas escolares. É
preciso, entretanto, que o currículo nos permita olhar para fora das janelas e das grades
curriculares, oportunizando novos espaços de produção de sentidos - individuais e coletivos
– em ambientes de aprendizagem em que os indivíduos se reconheçam e sejam capazes de
agir sobre, e a partir dele. Se, como diz Barthes, Ler é encontrar sentidos, precisamos
produzir outros textos, outras narrativas curriculares potentes, vigorosos e seminais onde
cada um de nós se reconheça.

Curriculo como exílio


O filósofo francês M. Serres (1993) lembra-nos que antigamente chamava-se
pedagogo ao escravo que conduzia à escola o filho da nobreza. O pequeno infante deixava a
casa da família; a saída, o segundo nascimento. Uma espécie de exílio, nem sempre

3
voluntário. Uma viagem em direção ao desconhecido, ao inusitado, ao imprevisível. Serres
lembra que todo aprendizado exige essa viagem com o outro em direção à alteridade. E
durante essa passagem muitas coisas mudam. (p.60).
Pensar a condição do exílio nos coloca irremediavelmente diante da situação
instalada no ato de exilar o outro (imaginando um exílio não voluntário !), retirá-lo de seu
ambiente, expulsá-lo do convívio com os seus, enviar o indivíduo a uma terra estrangeira
exigindo um esforço de aprender a falar outras línguas, outros significantes, outras
referências.
Pensar a condição do exílio no discurso curricular implica em assumir o desafio de
aprender a falar em outras línguas num exílio voluntário. Implica na recusa de uma língua
oficial e, em lugar desta, acreditar no convívio com o diferente, com a diversidade, assumir
a polissemia necessária ao ato pedagógico, como ato de convivência. Em lugar da
pedagogia da tolerância, instalar uma Pedagogia da convivência.
Entendo que um currículo emancipatório se constrói como ato discursivo, se
produz num terreno sempre acidentado entre falantes e signos, o que significa que haverá
sempre a violência de um signo que nos força a procurar, que nos rouba a paz . (...) Signo
é, aqui, qualquer coisa que de fora, nos afeta, nos atinge, que faz com que algo em nós se
mexa (Corazza et al.,p.181).
Uma escola, um currículo, uma disciplina, uma
formação social, um quadro, um conto, uma subjetividade,
um grupo compõem: 1) um sistema retilíneo, mas também,
2) um sistema sempre aberto a um plano de consistência
não formado (em toda forma alguma coisa sempre corre,
escorre, foge)...(Corazza et al., p.51).

Curriculo como morte


Todos os que trabalham com educação estão fartos de saber que o discurso
educacional é pródigo em terminologias advindas da área médica: diagnósticos,
anamneses, sintomas do fracasso escolar, transtornos e distúrbios de aprendizagem, enfim,
se não é a educação que está doente, o estudante quase sempre está no lugar de paciente.
Essas analogias talvez nos ajudem a entender aquela dimensão do currículo que
produz a morte de muitos discursos. Quantos discursos matamos, silenciamos, negamos
diariamente em nossas salas de aula, em nossas escolas e em nossos currículos?

4
Quantas vezes na ausência de respostas às nossas angústias, rotulamos e marcamos
nossos alunos como deficientes e atrasados e matamos toda e qualquer possibilidade de
criação, de emancipação decretando a morte do sujeito e o enterro das utopias?
Concordo com Serpa4 quando dizia que os currículos sempre deixaram pouco
espaço para se vivenciar as múltiplas atividades disciplinares ou de outra natureza,
oferecidas pelas universidades, escolas ou em movimentos sociais na dinâmica da
sociedade; e que a arte de ser professor exige que cada um de nós, obedecido um núcleo
geral de atividades centradas na práxis, tenha oportunidade de expressar a sua
singularidade, propondo jogadas próprias. Mais ainda, acredito que os currículos escolares,
enquanto expressão dessas múltiplas singularidades e dos sujeitos que o habitam, precisa se
traduzir na possibilidade de ser um campo de produção de indivíduos leitores, com
autonomia suficiente pra extrapolar a precária condição de habitante dos textos didáticos,
isto é, quando conseguem fazê-lo.
Quem sabe como propõe Ellsworth (2001)
que tal se, da mesma forma que ocorre entre um
filme e seu espectador, a relação de um estudante com o
currículo fosse um evento confuso e imprevisível que
constantemente excedesse tanto a compreensão quanto a
incompreensão? (p.60).

Ellsworth (2001) vale-se da linguagem cinematográfica para falar em modos de


endereçamento, isto é, o modo como a escola e a sociedade endereçam seu discurso ao
aluno através dos currículos. Nesse processo, segundo ela, os textos educacionais (tais
como livros-texto, currículo, vídeos e softwares educacionais) fazem pressuposições sobre
seu público – em termos de suas sensibilidades estéticas, graus de atenção, estratégias de
interpretação, propósitos, desejos, leituras e experiências previas, vieses e preferências.
Muito freqüentemente, essas pressuposições estão baseadas em pressuposições adicionais
sobre a localização de membros do publico no interior da dinâmica de raça, gênero, status
social, idade, ideologia, sexualidade, rendimento educacional etc (p.57).
O desafio que se lança agora é: como produzir com – e não, contra - esses
indivíduos, homens, mulheres, jovens, adultos, negros, brancos, heterossexuais,
homossexuais, espaços de interlocução, de promoção das habilidades de leitura do mundo,

4
SERPA, Luis Fellipe Perret. Esses fragmentos são anotações da autora em conversas colhidas na sala de
aula.

5
de atualização de currículos vivos, moventes, seminais, porquanto fundados em múltiplas
lógicas, múltiplas epistemes, múltiplas vozes, cores, desejos e diferentes estratégias
identitárias?

Curriculo como continuidade


O discurso educacional está impregnado de pré-juízos, pré-conceitos, condenações,
negações e manifestos. Segundo Corazza (2004) o discurso é sempre o mesmo, ou seja, seu
recurso estratégico é o de negar o estado atual do sistema educacional, afirmar que o
sistema é perverso, que a escola é reprodutora, que o currículo é machista, sexista, racista,
enfim, o discurso educacional é sempre o discurso da condenação e da negação. Nesses
casos, o professor é aquele que possui o Juízo de Deus, aquele que precisa manter o
controle da matéria, que não entrega seus segredos e protege a si mesmo e seus alunos do
caos.(...) Vale-se do senso-comum e das idéias dogmáticas para impor seu saber ( p.114).
Sair desse círculo de condenações e diagnósticos estéreis exige uma atitude
explicativa (ex-plicare: dobrar para fora, desenrolar) ou melhor, exige um, desdobramento
de situações educativas que possibilitem o nascimento de processos emancipatórios.
Voltar ao estado zero (aqui onde TUDO ainda é POSSIVEL!!!), a ponto de
condensação/precipitação de novas intensidades desejantes, novos devires educacionais, a
ponto de principiar, lançar-se para fora, pro-jectar, liquefazer as hegemonias e consolidar
afetos.
Fico pensando em quando tempo dispensamos na Universidade e nas escolas a nos
debruçar sobre teorias, escolas de pensamento, modelos, métodos, esquemas, racionalidade
e, não somos sequer afetados, assim como pensa Samira Chalhub5. É preciso construir uma
Pedagogia dos Afetos, isto é, nos deixar tocar pelas lições de solidariedade e de justiça de
que sempre nos falou o nosso mestre Paulo Freire; por um conhecimento engajado ao
desejo dos Sujeitos e à produção de uma sociedade menos desigual.
É preciso pensar as questões educacionais numa perspectiva crítica sem nos
furtarmos ao necessário enfrentamento e à compreensão da seriedade dessa discussão. Num
país com tendência para o surrealismo, como o Brasil, como dizia o escritor Antônio
Olinto, o risco que corremos é de que em breve estaremos abrindo mão do papel social e

5
Samira Chalhub. Semiótica dos afetos. São Paulo : Hacker Editores: Cespuc, 1997, p.08.

6
político do professor para dar lugar a toda sorte de charlatães e experts em marketing
educativo.

Esta advertência é para lembrar que entende-se aqui a dimensão do afeto do mesmo
modo que Chalhub (1997) isto é, afetar enquanto verbo representa o que causa impressão,
seja no organismo, seja no psíquico (tocado por algo que produz efeito, ou seja, relação
afeto-efeito);[...] O afeto está ligado, enquanto significado, à noção de quantidade de
energia pulsional (Affektbertrag = quota de afeto). A relação que existe é tanto da
qualidade subjetiva, como da quantidade de energia pulsional. Ou seja, afeto como
capacidade de afetar, transformar, instigar os indivíduos a promover mudanças e
transformações radicais.
O que nos leva ainda a pensar a relação da quota de afeto com a energia do
investimento: um ato de significação, ‘carregado de afeto’, o quanto ele está investido? O
quanto nós investimos em nossas salas de aula? Em nosso processo de ensinar e aprender?
Em nossa relação com o Outro que nos espia e atravessa? O quanto de afeto / significação
produzimos no e para o currículo?
Concordo com Serres (1993) que aprender é um ato que lança a errância. Implica
em tomar caminhos nem sempre previsíveis, bifurcações, decidir-se por um caminho
transversal que conduz a um lugar ignorado. Sobretudo: jamais tomar a estrada fácil,
melhor atravessar o rio a nado.
Ao atravessar o rio e entregar-se completamente
nu ao domínio da margem à frente, ele acaba de aprender
uma coisa mestiça. O outro lado, os novos costumes, uma
língua estrangeira, é claro. (...) Perceberão os mestres que
só ensinaram, no sentido pleno, aqueles aos quais
contrariaram, ou melhor, completaram, aqueles que
obrigaram a atravessar? (...) De fato, nada aprendi sem que
tenha partido, nem ensinei ninguém sem convidá-lo a
deixar o ninho.(...) Quem não se mexe nada aprende.(p.14).

Um currículo como continuidade requer a ressonância de vozes ancestrais, o


renascimento de línguas mortas, aquelas que foram assassinadas pelo império do canônico;
a celebração da diversidade e o respeito à diferença como fundante de uma nova era, mais
justa e menos intolerante, esperando que as gerações futuras possam ter o direito de, não
apenas sonhar como curriculistas fanáticos, mas poder conviver em uma outra escola e

7
outra sociedade onde o itinerante e a itinerância sejam parte de um caminho mais doce,
mais desejante e mais rico social e culturalmente.

Referência bibliográfica
C., Sandra; S., Tomaz T.; Z., Paola. Linhas de Escrita. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
D., G. Mil Platôs. Capitalismo e esquizofrenia. V. I, Rio de Janeiro:Editora 34, 1995.
E., Elisabeth. Modos de Endereçamento: uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. S., Tomaz
Tadeu. (Org.) Nunca Fomos Humanos. Nos rastros do sujeito. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.
S., Michel. Filosofia Mestiça. Rio de Janeiro:Nova Fronteira, 1993.

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