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Marcelo Cattoni eine Caneat(y | JURISDICAO 3 | HERMENEUTICA \GONSTITUCIONAL ALEXANDRE DE CASTRO COURA ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA CASSIUS GUIMARAES CHAI CINTIA GARABINI LAGES FRANCISCO DE CASTILHO PRATES HELOISA HELENA NASCIMENTO ROCHA JOSE EMILIO MEDAUAR OMMATI LUCIO ANTONIO CHAMON JUNIOR MENELICK DE CARVALHO NETTO CATALOGACAO NA FONTE DA BIBLIOTECA DA FACULDADE DE DIREITO DA UFMG ISBN DEPARTAMENTO NACIONAL DO LIVRO Se Jurisdi¢do ¢ hermenéutica constitucional no Estado Demacratico 195 de Direito/Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira (coordena- a0}. ~ Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, Inclui Bibliografia, 15,5 x 22,5 ~ 592 paginas ISBN: 85-7604-072.7 1. Direito constitucional, 2. Hermenéutica (Direito). 3. Jarisidicao (Direito constitucional). 1, Oliveira, Marcelo Andrade Cattoni de. CDU py 342.4:340.132.6 340.132.6:342.4 Se EDITOR: ARNALDO OLIVEIRA JUNIOR Producao grafica: Alexandre Cardoso COPYRIGHT © 2004 BY DECALOGO LIVRARIA E EDITORA Rua Espirito Santo, 1.025 ~ Loja H Centro — CEP 30160-031 - BH - MG Telefax: (31) 3226 7717 E-mail: editora®mandamentos.com.br LIVRARIA MANDAMENTOS. Rua Goitacases, 82 - Centro — CEP 30190-050 - BH - MG Telefax: (31) 3213 2777 E-mail: livraria@mandamentos.com.br Nenhuma parte desta edicao pode ser reproduzida, sejam quais forem os meios ou formas, sem a expressa autorizacao da editora. IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL “TEMOS UM ADVOGADO JUNTO AO PAI, JESUS CRISTO, 0 JUSTO.” (10 2:1) ig) A INTERPRETACAO JURIDICA NO ESTADO DEMOCRATICO DE DIREITO: CONTRIBUICAO A PARTIR DA TEORIA DO DISCURSO DE JURGEN HABERMAS ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA. Sumario 1. Introducao. 2. Do Estado Liberal ao Estado Democratico de Direito. 2.1. © Estado Liberal e as Escolas da Exegese, Historica e Positivista. 2.2. Estado de Bem-Estar Social. O quadro de intérpretes de Hans Kelsen. 2.3. O Estado De- mocratico de Direito. 3. A Teoria do Discurso de Jiirgen Habermas: por uma nova compreenséo da aplicagao do Direito. 4. Referéncias bibliograficas. 1 INTRODUGAO O presente artigo resulta do estudo desenvolvido em nossa Dissertacio de Mestrado onde procuramos defender o controle judi- cial difuso de constitucionalidade das leis e atos normativos. Verifi- camos que 0 controle difuso no Brasil sofria problemas tanto exter- nos como internos ao préprio sistema: Quanto as presses externas, apés a Emenda Constitucional n. 3/93, passando pela regulamenta- gio da Agao Declaratéria de Constitucionalidade e da Agao Direta de Inconstitucionalidade (Lei n. 9.868/99), e a Tegulamentagio da Argiiigao de Descumprimento de Preceito Fundamental (Lei n. 9.882/99), acompanhamos um processo de inclusdo em nosso ordenamento de institutos vindos de fora que, para além de contras- tar com a nossa tradi¢ao constitucional, promovem uma inaceitavel centralizagao no que toca a argili¢iio de inconstitucionalidade, Inter- 301 JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL namente, recentes alteragdes legislativas (e.g., art. 481, §§ 1°, 2° 3° do art. 482 e 0 art. 557 do CPC) tém dificultado (e as vezes, inviabili- zado) a possibilidade de conhecimento pleno em torno da Argitigfio Incidental de Inconstitucionalidade. Para mostrar a importancia do controle difuso de constitucio- nalidade — numa sociedade aberta de intérpretes da Constituigio (Hiberle, 1997) — na Sarantia de que as interpretagées nio-oficiais feitas nas arenas de discussio publica nao-institucionalizadas (ou pelo menos nao-formalizadas) possam penetrar os canais institucio- nalizados através dos mecanismos de circulagao oficial do poder, isto €, passando pelo Legislativo, mas também alcancando 0 Judicia- rio, procuramos reconstruir os paradigmas constitucionais da moder- nidade! chegando até 0 paradigma do Estado Democratico de Direi- to. Ao mesmo tempo, discutimos 0 papel do Judiciario em cada um desses paradigmas através do Tesgate de algumas das Escolas de Interpretagdio inseridas em cada um deles. Assim, mostramos que, no. que toca ao constitucionalismo, pode-se falar em trés Pparadigmas: 0 do Estado Liberal, Estado Social, ¢ Estado Democratic de Direito. Com isso pudemos repassar Tapidamente as diferentes formas como 0s principios de liberdade e igualdade foram lidos e relidos ao longo da historia do constitucionalismo, bem como seus desdobramentos sobre a atividade jurisdicional. Ao final, no paradigma do Estado Democratico de Direito, mostramos como a Teoria Discursiva de 1 Valemo-nos da nogio de paradigma, a partir de Thomas Kuhn (A estrunura das revolugbes cienifficas), 0 qual salienta a historicidade e descontinuidade do conhcct, Trento cientitico peta alteagto de paradigmas. Transpondo para o Direito, Habermas (Facticidad y valides,p. 263) defende que as diferentes conformages qué as orders Juriicas possuem nao se devem apenas d forma como foram consagrads os dircins fundamentais, nelas “se reflejan también paradigmas juridicos distintos”. Assim, no aie ange 20s principios do Estado de Diteito e dos Direitos Fundamentais, um Paradigma juridico mostra como agueles ho de ser compreendidos no interior de dima dada comunidade jurdiea (cf. CARVALHO NETO. Revista Férum Adminis, rani Ps 3 ff Se. ¢ In: SAMPAIO. Jurisdipao constitucional e os direitos funda. Teuas ©. at5 ff 329, CATTONI DE OLIVEIRA. Diretto consttucional, p 81 or sea. € HABERMAS. Facticidad y validec, p. 263 et seq. e p. 469 et seq). 302 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA, Habermas se coloca como a mais adequada, dada a atual complexida- de e (des)integragio social, que, se apenas pode ser mediada pelo meio que representa 0 Direito Positivo, no seio do Estado de Direito, estes pressupdem a co-originalidade das autonomias publica e privada, idéia central que move Habermas no seu “Facticidade e Validade” ? Sao estas algumas das discussdes que aqui trazemos no intuito de mostrar a compreensio habermasiana quanto 4 compreensio do papel do Judiciario da aplicagao/interpretagio do Direito. A questao acerca da posigao do juiz no processo envolve a compreensio mes- ma dos limites da interpretagio do Direito, pois se questiona princi- palmente qual postura deve 0 juiz ter em face de um caso que lhe & dado decidir. Isso nos remete a classica questao: 0 juiz simplesmente cria ou descobre o direito? Cabe aqui também questionar acerca da separacao dos poderes, sobre a diferenga entre a atividade do juizea do legislador. 2 DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO DEMOCRATICO DE DIREITO 2.1 O Estado Liberal e as Escolas da Exegese, Histérica e Positivista O primeiro paradigma constitucional da modernidade corresponde ao que se convencionou chamar de Estado Liberal, que, dentro do espirito da época (séculos XVII-XIX), evocava trés prin- cipios fundamentais: igualdade, liberdade e propriedade.> Como HABERMAS. Facticidad y validez, p. 61. Até a Idade Média, a referéncia a uma base legitimante transcendental havia mantido Unidos os homens em torno de um mesmo cla, polis, reino, etc. O Ihuminismo, Contuclo, veio subverter essas idéias. Refuta-se tudo 0 que niio pode ser apreendido acionalmente, Cré-se que a razio, compartilhada por todos, pode conhecer e domi. nar todas as coisas. Os postulados do racionalismo acabaram com uma estrutura 303 JURISDICAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL mente moderno, fruto de um sem-numero de estruturas novas ou temodeladas ao final da Idade Média, como resposta aos problemas que nao podiam mais ser resolvidos ali. Estamos diante de uma sociedade que se viu, pela Primeira vez, deslumbrada com a declara- ¢ao da igualdade de todos (fim dos privilégios de Nascimento) e liberdade de cada um definir og tumos de sua vida de acordo somen- te com os ditames dos principios que a sua raziio podia alcancar.* O Estado pretendia dar i burguesia uma liberdade quase total Para agir, segundo seus proprios interesses. Assim, 0 Estado (notadamente o Executivo) deveria se abster a cumprir apenas as fung6es piiblicas essenciais (e.¢., poder de Policia), Por isso a bur- Suesia vé nas leis uma insuportavel restrigdo A sua liberdade e a sua Propriedade. A atuagio estatal deve se Testtingir aquele mfnimo necessdrio a garantir os direitos conquistados por aquela, isto é, garantir sua maior liberdade Possivel. Essa era a funcdio da Constitui- cao, desde o paradigma liberal, manter uma separacdo entre indivi- duos que buscavam livremente seus proprios interesses e o Estado, que visava o bem comum,5 Isso se deu pelo proprio pano de fundo Subjacente 4 nogio que os liberais possuiam de Estado, Quanto ao Judici ‘rio, sobre ele ainda pesa grande desconfianga (principalmente na Europa), reminiscéncia de uma época em que este agia como simples longa manus dos eis e demais nobres. Por isso, no que toca & interpretacdo, os liberais desenvolveram um sistema que, tmilenar de castas que estratificava as comunidades. A afitmagio de que todos eram somone ste’ Jevou 8 afirmagao da igualdade e da liberdade de cada ums a eag e Somou a idéia de que todos eram proprietérios, ao menos, do Proprio corpo. 4 Glaro que estes individuos so a burguesia eos “proletirins” (isto é, “os proprietérios tee anes do préprio corpo”, como diria Marx), o que implica reconheos: que, em ema sociedade que se orgulhava tanto da liberdade e igualdade de oportunidades, da afrraea gens livres e escravos durante longo tempo (além do que, 2 despeito a afirmagio da igualdade, apenas podiam votar e set votads lividuos com renda Superior a um certo. minimo). 5 HABERMAS. Facticidad y validec, p. 318 304 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA pee ay § CARVALHO NETO. Revista de Direito Comparado, p. 479, 7 AEscola Exegética dominou todo o Scculo XIX. De qualquer forma, uma critica acla Ji pode ser vista em Savieny- ad i uma “impertei Brasileiro, p. 109) 8 Nesse sentido, FERNANDEZ: LARGO. Hermenéutica juridica... p.21-25 JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL dos, isto é, pela objetividade, pelo rigor metédico e pela absoluta Separagao entre sujeito, objeto e método. Os positivistas negam qualquer fundamento metafisico ao Direito, tanto uma transcendén- cia religiosa quanto aquela propria do Direito Natural Racional.? Direito € apenas aquele posto (positivado) pelo Estado, logo, a Ciéncia do Direito tem por fim apenas a norma. A dogmitica juridica que discorria a partir do Direito positiva- do consolidava /eis (cinones) de interpretacio, aplicagio e comple- mentagao daquele, como as classicas regras de tesolugao de antino- mias (sempre aparentes): “lei superior derroga inferior”, “lei posteri- or derroga anterior” ¢ “lei geral derroga lei especial”; e ainda, os varios métodos para solugdo das lacunas do ordenamento (lacunas estas igualmente aparentes): método gramatical, légico, histérico, sistemitico, teleolégico, etc. O Ordenamento Juridico apenas pode- tia ser interpretado para a tesolugao de antinomias e lacunas acaso existentes através de um sistema de auto-integragio, isto é, a com- pletude e harmonia do sistema de regras garantir-se-ia desde dentro, sem recorrer a elementos estranhos ao Direito. O positivismo prega que se 0 aplicador possui “diividas” quanto a Justia da aplicagio da Tegra ao caso concreto, isto é um falso problema, ou, no maximo, um problema de “Politica do Direito”.” Jano final do século XIX a profunda desigualdade econdmica € social entre as pessoas gerada por uma exploragdo sem precedentes na historia, provocou reacdes. Pululavam revoltas de operarios, os 9 Em razio disso, até mesmo (neo)positivistas como Hans Kelsen ¢ H. L. A. Hart (infra), mostram a condigio especifica das normas juridicas num sistema de regras ¢ acentuam 0 fechamento do sistema jurfdico, tefratério a prine{pios extrajuridicos (cf. HABERMAS. Facticidad y validez, p. 271). 10 FERNANDEZ-LARGO. Hermenéutica juridica.... p. 26. Como afirma Habermas (Facticidad y validez, p. 271-272), a legitimidade da ordem juridica, segundo os Positivistas, advém da legalidade, isto é, da comreta observancia das normas que tratam da produgao de outras normas. 11 Veja-se, no entanto, as eriticas de Dworkin (Cadernos da Escola do Legislative, p. 50 © Uma questio de principio, p. 218) e Alvaro R. S. Cruz (Revista da Faculdade Mineira de Direito, p. 21). 306 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA sindicatos lutavam por reconhecimento de condigdes minimas de trabalho. No meio rural camponeses eram expulsos de suas fazendas € obrigados a procurar trabalho nas cidades, que cresciam sem infra- estrutura, 0 que agravava os problemas. Ao mesmo tempo, as idéias de Karl Marx e Engels se difundiam e logo comecariam a se reunir as “Internacionais Socialistas”. Mais tarde, 0 sucesso da Revolugiio Russa (1917) gerou o temor em outros paises de que em seu territé- rio ocorressem revoluges como aquela. Diante de tais pressGes, os Estados Liberais foram obrigados a ceder, editando leis que, ¢.g., diminufam a jornada de trabalho (ao menos para mulheres e criangas), que permitiam o funcionamento de sindicatos (proibidos durante muito tempo); e também agdes positi- vas, no melhoramento estrutural das cidades e até a ampliagio do direito de voto (acabando aos poucos com 0 voto censitario), Come- gava-se a difundir a idéia de que o mero elenco de direitos nao era suficiente para garantir igualdade ¢ liberdade reais ¢ 0 efetivo acesso a propriedade. Reclamava-se a materializagiio daqueles direitos con- sagrados em “Declaragdes” ou mesmo constitucionalmente; perce- be-se que, além de se afirmar a igualdade, seria necessdrio reconhe- cer as diferengas e proteger o mais fraco. 2.2 Estado de Bem-Estar Social. O quadro de intérpretes de Hans Kelsen Mundial cuidam de sepultar definitivamente o Estado Liberal e fazer surgir uma nova fase no constitucionalismo, a do Estado Social, que implicou numa releitura do que até entio se entendia por “liberdade, igualdade e propriedade” (no sentido de sua materializagdo), e faz, nascer 0 que tradicionalmente se denominam “direitos sociais”.”2 As 12 A esse respeito, no entanto, como salienta Menelick de C. Netto (Revista Férum Adninisirativo, p. 16), na verdade, no € que simplesmente se tenham aglomerado 307 JURISDICAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL através de empresas ou fundagées criadas e mantidas por ele. E uma grande mudanca, pois o Estado amplia a esfera do “pliblico”, A preocupaciio com a materializacao dos direitos reflete-se no ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA entanto, apesar de conhecida sua teoria acerca da interpretaclo “Que téntica”, estas denominacdes nao constavam da primeira edigao da inicio da década de 30)."” As expressdes apenas surgem a partir da edi¢do francesa da Teoria Pura do Direito em 1953, que, ademais, incorpora aquele texto sobre interpretagiio. fundamentos extrajuridicos, partem de tal que no necessita ser funda. Soe funds todo 0 resto e sent tho mais valgn Quanto mais 0). “O juizo em que se enuncia que um Free. tt BM ato juridico (ou antijuridico) é o resultado de fica, a saber, de uma inlerpretagao normativa” (KELSEN, Pura do direito, p. 4), 17 Ci. CATTONIDE OLIVEIRA, Direito processual constitucional, p.31. 18 KELSEN. Caderos da Escola do Legislativo, p. 31-32, 309 JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL autorizagdo que um nivel superior do ordenamento da ao nivel inferior de produzir atos normativos (para Kelsen, um juiz, ao deci- dir um caso, também esta produzindo norma, apenas que neste caso, uma norma individual). Pode ocorrer que o juiz, ou o legislador, possuam um campo “maior” para, diante de normais mais gerais, poder determind-las. Essa “margem’” pode ter sido intencional (e.g. por um ato de delegagdio) ou no intencional: 6 aqui que a questo da interpretagdo ganha corpo. A “indeterminagio nao-intencional” da norma a ser aplicada pode advir de alguma ambigiiidade nas palavras ou no texto como um todo, de uma diferenga entre o que ela diz e o que teria sido a intengao do legislador ou porque hé duas normas contrdrias regulando a mesma situagaio.” O jurista austriaco critica a “Jurisprudéncia Tradicional” que procurava métodos (como os citados acima) que permitissem, com 0 uso da razao, “descobrir” a tnica interpretagao que seria conforme 4 lei. Segundo ele, essa é uma pretensio que nfo faz sentido.” A edicao francesa (1953) da Teoria Pura do Direito foi, mais do que uma mera tradugio, uma reformulagdo do texto. Ali ele esclarece que a fixagio da “moldura” das interpretagGes possiveis € papel da Dogmitica Juridica, que, como intérprete nao-auténtico, descreve as possibilidades, sem, no entanto, jamais fixar a correta. Esta atividade cabe apenas ao intérprete auténtico, isto é, Aquele que cria nova norma aplicando outra superior.” Kelsen reafirma a idéia presente na edigao anterior de que a interpretagio “nio-oficial” poderia apenas inflwenciar o aplicador; as razbes de que este se vale 19 Cf. KELSEN. Cadernos da Escola do Legislativo, p. 35. 20 Como salienta Marcelo Cattoni (Direito processual constitucional, p. 36), para Kelsen, “[do] ponto de vista do Direito Positivo, nao ha simplesmente um méiodo de acordo com o qual somente uma das vérias leituras de uma norma possa ser distinguida como ‘a correta”. Essa critica jé importa um avango frente aos exegetas, pois Kelsen percebe que a norma, como “esquema de interpretagio” ndo se resume 0 texto (lei), isto &, que 0 texto néo pode por si regular comportamentos, necessita da Ciéncia do Direito para que ela estabelega a moldura de interpretagBes possiveis. 21 Cf CATTONI DE OLIVEIRA. Direito processual constitucional, p. 39. 310 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA Para escolher uma ou outra interpretacaio Possivel nio dizem tespeito 4 Teoria do Direito. Quando vem a lume a edigao de 1960 (que é a ultima “versio”), ocoire, af sim, uma mudanga radical na teoria kelseniana: um Siro decisionista, a partir do qual Kelsen passa a defender que a autoridade que aplica 0 Direito Possui liberdade nao apenas para escolher alguma das interpretagdes Possiveis postas na moldura, mas também possui a faculdade de, POF Ser autorizado pelo Direito, criar direito novo fora do quadro (interpretaciio nova), Aparentemente Kelsen percebe que a Dogmiatica Poderia nao Ser Capaz de inferir todas as interpretagdes Possiveis* € entiio caso aquilo ocorresse, 9 aplicador poderia completar 0 trabalho, Ele cede ndo apenas 4 impossibilidade de se estabelecer todas as interpreta- es possiveis. como também a facticidade de que a autoridade nao apenas nao est vinculada ao que disse a doutrina, mas que, por vezes, age em i a0 a esta. 22 KELSEN. Teoria pura do direito, p; 394, 23. Cf. CATTONIDE OLIVEIRA, Direito processual constitucional, p57, 311 CC — ee SURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL, cabe eliminar ya en términos decisionistas”.* Assim, havendo coli- sdo entre regras (ou no caso de haver “lacuna” no ordenamento) e vigendo a maxima do non liquet, outra solugo no cabe ao juiz senaio decidir com certa margem de discricionariedade.* Voltando A descrigdo do paradigma em que Kelsen e Hart estavam inseridos, percebe-se que, nessa época de “grandes constru- Ges” da sociedade através da Politica e do Direito, prevaleciam solugGes burocraticas que procuravam ofuscar as distingGes existen- tes, como a distingo igualdade/desigualdade, privilegiando apenas um lado, como, ¢.g., a producto de igualdade material.”* O paradigma do Estado de Bem-Estar comega a se desgastar ja a partir dos movimentos de contracultura dos anos 60. Mas é na década de 70, quando a economia sofre uma desaceleragio (concomitante a crise do petréleo), que ele entra em xeque. De fato, o Estado Interventor necessita de constante crescimento econdmico que pro- picie grande arrecadagiio de impostos para que possa executar seus programas sociais. Mas, os acontecimentos dos tltimos anos do século passado colocaram por terra as “certezas” até ent&o intocadas do Welfare State” Percebeu-se que a regularidade feita com base em 24 Ci, HABERMAS. Facticidad y validec, p. 279. 25 A “iese da discricionariedade” também esté presente em H. L. A. Hart, que privile- gia a seguranea juridica até chegar ao extremo, paradoxal, de afirmar que, a falta de regra juridica a ser aplicada a um caso, teria 0 juiz a faculdade discriciondria de decidir conforme um critério pessoal (cf. HABERMAS. Facticidad y validec, p. 272). Segundo Garefa Figueroa (Revista Doxa, p. 204), a teoria de Hart “expresa la conveniencia de que exista discrecién judicial, [e} formula un juicio positivo acerca de la necesidad de cierta discrecién por parte de los operadores juridicos. (..) En suma, la discreci6n existe, es bueno que exista y podemos y debemos formutar los mejores criterios posibles para ejercerla”. Nesse sentido Claudio P. de Souza Neto (Jurisdigdo constitucional, democracia e racionalidade pritica, p. 221 et seq.). “O autor [Dworkia, criticando Hart] destaca que, se 0 juiz. possui 0 poder de decidir por sua prépria vontade as questées que Ihe sao apresentadas, as nogdes de autonomia publica, seguranga juridica e separagdo de poderes ficam prejudicadas” (p. 223). 26 Cf. DE GIORGI. Direito, democracia ¢ risco...,p. 186. 27 HABERMAS. A constelacdo pés-nacional, p. 66; DE GIORGI. Direito, democracia e risco..., p. 189. 312 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA distingSes que se apresentavam como S6lidas e definitivas, na verda- de era contingencial. De toda sorte, ha pelo menos mais duas quest6es importantes que precisam ser destacadas: justamente nos paises de Welfare State aparentemente melhor sucedidos, a proposta maior (final) nao se efetivou, qual seja, a de, a partir de condigdes materiais dadas pelo Estado, formar cidadaos ativos e autoconscientes de seu Papel na esfera publica — a critica ao clientelismo partiu inicia mente de paises onde a fruicio de condigdes de “vida boa” foi, aparentemente, melhor sucedida. Ao contrario da Promogio de cidadania (que era, afinal, a meta final do Estado Social), o que se viu foi o Estado tomando Para si toda a dimensio do ptblico, deixando os individuos na Posi¢&o (cémoda?) de clientes, numa relacdo paternalista e dependente.** Outro ponto éa cConstataciio de que a Politica nao cabem mais os “grandes projetos ou ideais”, proprios do Welfare State” Como exemplo podemos falar do “fim” (ou ao menos de uma “reformulagiio”) do modelo de Consti- 28 “[A] outra face de um Estado Social mais ou menos bem-sucedido, é aquela demo- fracla de massas que toma tragos de um processo de leitimagto orientale seamtn Hane tmente” (HABERMAS. Revisia Novos Estudos CEPRAB. p. 106). Noure lugar Habermas (Revista Novos Estudos CEPRAB, p. 99) defende que “uma liberdade Nese zada paternalistcamente significa ao mesmo tempo subtragio de liberinaen Nesse sentido, posig6es como a de Lénio L. Streck (In: SAMPAIO Hermenéutica Jurisdicdo constitucional, p. 25-251) parecem ainda debitétias do paradigma do Estado Social, 20 sobrecarregarem o Direito. 29° Cf. Menelick de Carvalho Netto (Ia: SAMPAIO. Crise ¢ desafios da Constituigao, p. 282): “A Constituigdo canaliza e viabiliza a democracia, mee ce ce espera que ela, 10 poles (eet Suzs normas, possa substitur, apenas a ttulo de exemplo.o trtomerne goncsto concreta de politicas evondmicase socias,terminarse-d por Pagar o prego Go incremento da desestima constitucional a cortoer toda a cus potencial forga normativa ¢ a gerar a ineficdcia de suas normas, produzindo, na Pratica, efeitos Cemeic abs slmejados”. Como mostra Habermas (Bra das transicces, p. 167), a Constituigio, se epresenta um marco histérico (passado), relaciona a com tempo Gmbem na dimensio do futuro, iso, de sua realizagao. © desgaste dn paradigma do Estado de Bem-Estar nos mostra os limites do Direito, 0 limite dag normas, que no Sio capazes de, por si, realizar © que quer que seja. 313 JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL tuigdo Dirigente, tal qual proposto por J. J. Gomes Canotilho, isto €, do fim de uma crenga segundo a qual a Politica, dando cumpri- mento aos ditames da Constituig&o, colocar-se-ia na posigio de realizar tecnocraticamente os grandes projetos que se pressupu- nham queridos por todos. Alias, 0 préprio jurista portugués, ao publicar a 2* edi¢%io do seu Constituigdo Dirigente e Vinculagdo do Legislador, revé seus postulados.” Percebe-se hoje que o risco inafastavel da democracia é per- manecer pernianentemente aberta @ tematizagdo piblica (aos influ- X0$ comunicativos), sob pena de que um fechamento cognitivo e tecnocratico — dadas as atuais circunstincias de acelerada evolugiio social — torne suas estruturas obsoletas." A sociedade, ao mesmo tempo em que se tornou mais complexa, demanda novas pretensdes a direitos a partir de diferentes concepcdes de vida boa, as vezes incompativeis umas com as outras, e muitas vezes incompativeis com a concepgao dominante cristalizada pelo Estado. 2.3 O Estado Democratico de Direito Para dar conta dessa nova demanda - que implica numa tedefinigio do que se entende, e.g., por Estado, soberania popular, democracia e cidadania, ptiblico e privado — e como uma alternativa a uma concepgiio (uma tentativa de volta) a um Estado Minimo, consubstancia-se 9 paradigma do Estado Democrdtico de Direito. Como dissemos, 6 um projeto cujo “tinico contetido (...) é a institu- cionalizagao aprimorada passo a passo do procedimento de forma- 30 Cf. CANOTILHO. Constituigao dirigente ¢ vinculgdo do legislador; COUTINHO. Canotitho e a constituicao dirigente. 31 Como diagnostica Menelick de Carvalho Netto: “A crise, para esse tipo de sociedade, para essa mével estrutura societiria, é a normalidade” (CARVALHO NETTO. In: SAMPAIO. Crise e desafios da Constiuigdo, p. 282 , grifos nossos). O pluralismo dessas sociedades pés-tradicionais tornam 0 “risco” ¢ a “crise” componentes normais de suas estruturas em permanente mudanca. 314 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA, Gao racional da vontade coletiva, procedimento que nao pode preju- dicar os objetivos concretos dos envol vidos”? A proposta do Estado Democratico de Direito parte de pressu- postos bem distintos dos que o sucederam. Defende-se que 0 reco- nhecimento dos direitos individuais representou um avan¢o para a €poca; que a busca por sua materializagio é importante; mas se petcebe que, se o mero reconhecimento formal no é suficiente para garantir a autonomia privada dos cidadaos, sua materializacao pura e simplesmente em direitos “sociais” (ou até as sofisticagdes represen- tadas pelos novos direitos “difusos”) nfo garante a construgdo de uma autonomia piiblica plena. Desde a postura procedimental assu- mida por Habermas, isso vai significar ler este paradigma desde a Teoria do Discurso. Somente através de espagos de discussio publica, formais ou nao, em que se assegure igual participagdo de diferentes gru- pos, agindo discursivamente € que se podera lidar com as desi- gualdades.™ Cidadania é um processo (de participagdo politica) e, tal qual a democracia, um aprendizado. Nao ha pré-requisitos para a cidadania.* 32 HABERMAS. Revista Novos Estudos CEPRAB, p. 112. 0 Estado Democrético de Direito pode ser entendido, desde uma perspectiva discursiva, como “a institucionali- zagio juridica de canais de comunicagio piblico-politica a respeito de raz6es éticas, morais, pragmiticas e de coeréncia juridica. E precisamente esse fluxo comunicativo que conformard e informard 0 proceso legislativo de justificagio e 0 processo jurisdicional de aplicagdo imparcial do Direito democraticamente fundado” (CATTONI DE OLIVEIRA. Devido processo legislativo..., p. 99). 33 Cf. HABERMAS. Facticidad e validez, p, 523-524. 34 Contudo, a definigdo mesma das situacdes onde deva haver ou ndo diferenciagdo (¢ em que medida), seja para implementar politicas de “materializagio de direitos”, seja para protecio de minorias, nao serd definida burocraticamente pelo Poder Adminis- trativo, mas, discursivamente, por todos os afetados (cf. HABERMAS Constellations, p, 525). 35. Delineia-se, pois, no novo paradigma, que o cidadio deverd ter a oportunidade de influir nos centros decis6rios e onde 0 puiblico ndo se resume ao estatal (mas abrange, outrossim, entidades nio-governamentais). O paradigma do Estado Democritico de Direito reclama um “direito participativo, pluralista ¢ aberto” (CARVALHO NETTO. Revista de Direito Comparado, p. 481) 315 NN” JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL Para explicarmos melhor os Pressupostos decorrentes desse Novo paradigma, que cobra de todas as instituicoes (inclusive, no que Teoria do Discurso de Habermas, oportunidade em que também tragaremos as contribuigées de Dworkin e Giinther, 3 ATEORIA DO DISCURSO DE JORGEN HABERMAS: POR UMA NOVA COMPREENSAO DA APLICACAO DO DIREITO Nos valeremos da Teoria do Discurso, de Jtirgen Habermas, como teoria que reputamos constitucionalmente mais adequada para dar conta dos exigentes Pressupostos do noyo paradigma.%6 Hans-Georg Gadamer procura resolver a questiio acerca da Tacionalidade da interpretagao (do Conhecimento) inserindo a razio devem ser construidas e Justificadas caso a caso” — ele nao rejeita a Possibilidade de um conhecimento racional, ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA Gadamer possui (entre outros) 0 mérito de explicitar em ter- mos modernos a idéia de que nenhuma regra pode regular sua pré- pria aplicacao e foi ele quem primeiro uniu este momento (da aplica- ¢40) com dois outros: a compreensio e a interpretagio. Para Gadamer,* estes trés momentos formam um processo unitdrio.® Isso representa um ganho imenso para a Pratica juridica, pois agora se denota que nao é Possivel aplicar uma norma sem, ao mesmo fempo, Compreendé-la ¢ interpreti-la. Até entio, diz Gadamer,” “era coisa légica e natural que a tarefa da hermenéutica fosse a de adaptar 0 sentido de um texto a situag’o conereta a que este fala”. Agora nio faz mais sentido a questao sobre se pode o juiz escother interpretar (e compreender) a norma, pois é impossivel que ele tente aplicd-la sem, ao mesmo tempo, fazer incidir um juizo interpretativo sobre a mesma, Gadamer salienta a historicidade de todo conhecimento, O Passado é compreensivel a partir de seu contraste com o presente, Aquele elemento da tradigao aparece na linguagem, pois, como salienta: “A ciéncia da linguagem é, como uma outra pré-histéria, a pré-hist6ria do espirito humano” 4 A tradigdo & um elemento funda- mental para a condigdo hermenéutica; logo, reconhecer o fato de que se estd imerso nela é 0 primeiro passo para poder se mover com liberdade entre os horizontes.® to busca ultrapassar 0 conceito de método da cigneia modema (que conserva sua TGativa razio), pensando por principio e de mancira geral 0 que sempre ocorre”” (GADAMER, Verdade ¢ método, p. 457). Nessa esteira, at Férnandez-Largo (Hermenéutica juridica, p. 12): “La obra entera de Gadamer hg intentado liberar el 38. GADAMER. GADAMER. Verdade e método, p. 460 39 GADAMER. Verdade e métado, p. 459. 40 GADAMER. Verdade e método. p. 460. 41 GADAMER. In: ALMEIDA; FLICKINGER; ROHDEN Hermenéutica filos6fica.. p. 119. 42 Nesse sentido Gadamer (GADAMER. Verdade ¢ método, p. 415) retoricamente eeaunia: “Achar-se imerso em tradigOes significard realmente em primeiro plano star submetido a preconceitos e limitado na propria liberdade? Nao'é certo, antes, 317 ee JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL, Ja aqui se vé uma sofisticagiio com relagao a exegese e aos positivistas, pela crenga que possufam no texto, por acreditarem que o texto da regra pode regular a vida por si (e nao s6, mas também que uma norma pode regular todas as suas situagdes de aplicaciio). Apés © giro hermenéutico, tomam-se problemiticas teorias que mantém uma separagaéo entre aqueles trés momentos contidos também na aplicagao do Direito (compreensao, interpretaciio e aplicagao) e que defendem que se possa, por exemplo, aplicar uma norma sem interpreta-la, apelando para 0 brocardo: in claris cesat interpretatio.® Aqueles momentos sao indissocidveis; toda aplicagdo de uma norma envolvera, necessariamente, recurso ao passado, 4 “tradigo”, uma tarefa muito mais complexa que a simples busca semantica ou sintd- tica de significados. Gadamer explica que a pré-compreensiio do intérprete esta determinada pelos topoi da tradi¢Zio. Com isso ele quer romper coma separacdo rigida entre sujeito e objeto - ja que antes pontos de partida, agora sao problemdticos. Ao mesmo tempo, quer mostrar que 0 que o intérprete faz ndo é buscar o “sentido original” do texto, mas proceder a renovagio da efetividade histérica do texto, referin- do-se A nova situacéo na qual procede a interpretagio. Buscar-se que toda existéncia humana, mesmo a mais livre, esté limitada ¢ condicionada de muitas maneiras?”. Logo, nao faz sentido falar-se numa razao a-histérica e nem numa garantia absoluta de métodos aprioristicos. 43, Tereza Wambier (2001:42-43) parece ainda defender essa posigdo: “quando a norma contém termos que se referem obviamente a certos elementos do mundo empirico, nao hi que se falar em processo interpretativo, como cntidade autnoma (...). A interpretacio se confunde, nesses casos, com a prépria compreensio imediata. Os romanos diziam, a esse propésito, in claris cessat interpretatio. (...) Ora, pode suceder que 0 intérprete nada tenha para interpretar relativamente fixaga0 de sentido ¢ aleance, como ocorre quando ndo se precisa traduzir algo. (...) Alids, 2s vezes, i880 0 que se vé e 0 que se 1é do resultado do trabalho do intérprete: troca de palavres, para dizer a mesma coisa, (...) [Se] estamos no uso de nossa lingua pratica. natural, o portugués, e deparamo-nos com termos (...) desconhecidos (...), [vJamos, por exemplo, a0 dicionério”, 44 “Ningtin intérprete puede pretender estar frente a lo texto normativo libre de Precomprensiones, pues ello equivaldria a estar fuera de la historia y @ face ‘enmudecer a la norma” (FERNANDEZ-LARGO. [ermenéutica juridica_. p & 318 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO Bat algo como a “intengio origindria do legislador” s6 faz sentido se entendida como um “lugar vazio que se preenche de compreensio, de ocasido em ocasiao”.® A compreensao de um texto mao carece que se tenha de entrar na psique de seu autor. Ao contrario, Gadamer resgata um conceito da hermenéutica tradicional para formular 0 que entende por “circulo hermenéutico”. A partir daf parte para explicar 0 processo hermenéutico atra- vés do recurso a horizontes de compreensdo. O horizonte presente se forma pelos preconceitos que delimitam nossa capacidade de ver — um “horizonte” representa o “Ambito de visio que abarca e encerra tudo o que é visivel a partir de um determinado ponto”.4” Para compreender um outro horizonte, contudo, nado é necessario (nem possivel) desprender-se de seu horizonte e incorporar aquele. Ea partir de nosso proprio horizonte que poderemos ir até o outro, numa relagdio que, ademais, no € estanque, mas tensa, ja que os horizontes ndo sto esferas fechadas, mas, ao invés, posigdes méveis.* A “fusio de horizontes”, como possibilidade, ¢.g., de se poder compreender hoje um texto que pertence a um horizonte histérico, comega por perceber que este nfo é algo absolutamente estranho para nds, pois faz parte da mesma tradigdo a qual estamos inseridos. Tendo isso em vista, Gadamer® conclui que “compreender é sempre o processo de fusdo desses horizontes [passado e presente] presumivelmente dados por si mesmos”. A compreensao de um texto significa, necessaria- 45 GADAMER. Verdade ¢ método, p. 576. Nesse sentido Dworkin (Uma questiio de principio, p. 51): “Mas esse & um erro comum e sério [acreditar-se que a intencd0 original possa ser extraida] porque no ha nada semelhante a uma intengio dos constituintes esperando por ser descoberta, mesmo que em principio. Existe apenas alguma coisa esperando ser criada”. 46. Isto é compreende-se 0 todo pelo individual e vice-versa, sendo que ambos movi- mentos se dao, geralmente, ao mesmo tempo (cf. GADAMER. Verdade e método, p. 436). A compreensio envolve dois movimentos, 0 movimento do intérprete ¢ 0 da tradig&io numa relago em constante formagio. 47 GADAMER. Verdade e método, p. 452. 48 GADAMER. Verdade e méiodo, p. 455. 49 GADAMER. Verdade ¢ método, p. 457. 319 JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL, mente, uma co-implicagio entre este ¢ o intérprete. Nao ha um mergulho no horizonte no qual o texto esta inserido, como se o intérprete pudesse (ou devesse) sair de si mesmo. Mais & frente Gadamer™ resume 0 que esteve até entao propondo: “Compreender um texto significa sempre aplicd-lo a nds pré- prios, e saber que, embora se tenha de compreendé-lo em cada caso de uma maneira diferente, continua sendo o mesmo texto que, a cada vez, se nos apresenta de modo diferente.” Por todo 0 exposto pode-se compreender porque para ele nao hd uma separagao entre a hermenéutica histérica ¢ a jurfdica. Sempre haverd a tensdo entre o texto proposto e o sentido que ele possuiré quando de sua aplicagdo. Ao contrério de um fato histérico, no entanto, uma “lei nao quer ser entendida historicamente. A interpre- tac&o deve concretizé-la em sua validez juridica”.*' Gadamer enten- de, pois, que uma norma s6 fard sentido frente ao caso onde a mesma sera aplicada.* O que é fundamental é compreender a atividade judicial como “una experiencia personal que genera la verdad del aqui y ahora y que no se confunde, sin més con la verdad del texto historico archivado ni con la del legislador” 5 (grifos nossos) Outra resposta a racionalidade das decisées é dada por Ronald Dworkin, com sua teoria deontolégica das pretensdes de validade 30 GADAMER. Verdade e método, p. 519. 51 GADAMER. Verdade e método, p. 461 52 GADAMER. Verdade ¢ método, p. 485 et seq. “A compreensio histérica da norma pretende renovar a sua efetividade histérica em relacdo a uma nova situacao, ¢ nao simplesmente reconstruir a intencdo original do legistador (...). A historicidade da norma, igual que em qualquer outro texto, nfo é uma restricZo a seu horizonte, sentio que, pelo contrério, é a condigio que permite sua compreensibo. (...) Isso implica que nenhum intérprete pode pretender reconstruir a intencdo do legislador, sem assumir que sua propria pre-compreensdo faz, por sua vez, parte desse processo interpretativo, produzindo a cada nova leitura um novo sentido” (LOPES. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, p. 297, grifos nossos). 53 FERNANDEZ-LARGO. Hermenéutica juridica.... p. 13. 320 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA, juridicas. Dworkin, além de romper com o circulo hermenéutico (propondo uma apreensio mais seletiva da histéria), nao permite que 0 Direito caia na contingéncia (como os positivistas) ou esteja 4 disposigiio de objetivos politicos (como os realistas).* Pretende que o Direito seja um sistema tal que garanta integridade por parte do legislador e do juiz, que deyem atuar de forma a tornar o sistema coerente. O recurso & imtegridade em Dworkin® visa promover eficién- cia (além de coerncia interna) ao Sistema do Direito, a partir do TECUISO 20S principios, que assumem em sua teoria n4o o carater de um instrumento hermenéutico de preenchimento de lacunas (como propOem os positivistas,** mas de verdadeiras normas, cujo uso torna © sistema mais complexo, abrindo a margem de legitimidade demo- cratica.7 Uma comunidade que aceitar que € governada por princfpi- os endo apenas por regras dadas por “decisdes politicas tomadas nos passado”, faz com que 0 conjunto de normas que se reconhece como validas possa “expandir-se e contrair-se organicamente, 4 medida que as Pessoas se tornem mais sofisticadas em perceber e explorar aquilo que esses principios exigem sob novas circunstincias, sem a necessidade de um detathamento da legislagdo on da $4 Cf, HABERMAS. Facticidad y validez, p. 278-279. $5 O principio da integridade possibilita aos individuos de uma comunidade se reconhe- cetem reciprocamente como livres ¢ iguais (cf. HABERMAS. Facticidad y validec, p. 285); € um principio que deve ser observado nio apenas pelos cidadios, mas também pelo legislador; 0 recurso & integridade ainda diz respeito a0 conceito de autolegislagio: seria “inconsistente uma lei com a qual 0 cidado no se reconheca como seu autor (cf. DWORKIN. O império do direito, p. 229). 56 SOUZA NETO. Jurisdigiio constitucional, democracia e racionalidade pratica, p. 210 et seg. 357 Os principios, pois, estio na base de sua teoria acerca da argumentacao jurfdica. Uma comunidade assim guiada por principios possui um plus perante a comunidades de “mero acidente” ou comunidades “de regras”. Numa comunidade de principios, os membros “aceitam que sio governados por principios comuns, e nio apenas por regras criadas por um acordo politico”, isto é eles percebem que as regras estipuladas Sail JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL jurisprudéncia de cada um dos posstveis pontos de conflito.”** (grifos nossos) Os princfpios nao sio dados por topoi historicamente compro- vados, mas sao fundamentados no conceito de “interpretag&o cons- trutiva” (infra), a qual, para ele, busca formular seus conceitos das “praticas sociais”, rejeitando, pois, esquemas vindos das ciéncias da natureza, tal qual fizeram a maioria das teorias até ent&o expostas, inclusive Kelsen — pois Dworkin, ao invés de negar que cada intér- prete possui propésitos (escondendo-os sob 0 “manto da objetivida- de”), aceita-os, explicitando, ademais, que cada intérprete possui finalidades distintas que vo orientar as interpretagdes.” Assim, cada case pode ser tratado de forma justa e equanime (num procedi- mento fair) segundo as mesmas normas. A integridade é a medida que garantira tanto a seguranca Juridica quanto aceitabilidade racional & sentenga. “Segundo 0 Di- reito como integridade, as proposigées juridicas sao verdadeiras se constam, ou se derivam dos principios de justiga, eqiiidade e devido processo legal”. Estas proposigdes jurfdicas sio opinides interpre- tativas, que, por isso, devem ser reconstruidas procedimentalmente silo projegdes de um “compromisso comum com princfpios subjacentes que sio, eles proprios, uma fonte de novas obrigagies” (DWORKIN. O império do direito, p.253- 254). Nessa comunidade a Politica é vista como “arena de debates sobre quais princfpios a comunidade deve adotar como sistema, que concepco deve ter de justiga, eqllidade e justo processo legal” (p. 254). 58 DWORKIN. 0 império do direito, p. 229. 59 O recurso a integridade reaparece aqui pois exige que os juizes, na medida do possivel, “tratem nosso atual sistema de normas piblicas como se este expressasse e respeitasse um conjunto coerente de principios e, com esse fim, que interpretem esas normas de modo a descobrir normas implicitas entre e sob as normas explicitas” (DWORKIN. O império do direito, p. 261). O juiz deve chegar a uma decisiio valida na medida em que compensa a indeterminaco do Direito apoiando sua decisao na reconstrugio que faz da ordem jurfdica, de modo que o Direito vigente possa ser justificado a partir de uma série ordenada de principios. Esta tarefa, que cabe a todo juiz (de qualquer instancia), implica que ele deve decidir um caso concreto tendo em mira “o Direito em conjunto” (através dos prinefpios), o que nada mais é do que sua obrigaciio prévia frente a Constituigdo (cf. HABERMAS. Facticidad y valide:, p. 286). 322 ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA, | no presente, voltando-se tanto para 0 passado (tomado nao como dado, mas reflexivamente) quanto para o futuro (como abertura, como possibilidade, mas também como respeito A futuras gera- g6es)." O “Direito como integridade” exige que os juizes ao decidirem um caso tomem aquele niio como uma série de isoladas decisées do passado, mas como um todo. Nao que o passado institucional seja um todo coerente, de forma que hoje se tivesse que dar a mesma decisiio que se deu ontem ou ha cem anos. Ele & retomado, nao para se encontrar uma mens legislatoris que predetermine sentidos (0 passado nao é um dado pronto), mas na medida em que é reconstruido reflexi- vamente como abertura para o presente e para o futuro. “As declaragées de direitos sio permanentemente construti- vas, em Virtude de sua propria natureza”.® A interpretagdo constru- tiva buscard principios vilidos a partir dos quais seja possivel justifi- car uma ordem juridica concreta, de modo que nela se encaixem todas as decisées como se fossem componentes coerentes (retiradas, € claro, aquelas que possuem erros),* 0 que, ao final, Ihe fornecer4 a unica resposta correta para 0 caso. Reconhecendo a dificuldade de uma tal tarefa, Dworkin cria a figura do juiz Hércules: um magistrado imaginario que, ao mesmo tempo, conhece todos os principios e vé os elementos do | Direito vigente ligados por “fios argumentativos”. Contudo, sali- 60 DWORKIN. 0 império do direito, p. 272. 61 Com essa dupla referéncia ele pretende superar tanto 0 convencionalismo (a partir do qual um decisio deve ser resultado da comparaco com outras em casos similares e/ ou de mera aplicagio subsuntiva de lei) quanto 0 pragmatismo juridico (onde o juiz age instrumentalmente, visando com sua decisio 0 que seria melhor para 0 futuro). Segundo Dworkin (0 império do direito, p. 273), em ambas doutrinas perde-se 0 sentido de totalidade do ordenamento juridico, por isso sua teoria pretende assumir ambas perspectivas. 62 DWORKIN. 0 império do direito, p. 274. 63 DWORKIN. 0 império do direito, p. 305. 64 DWORKIN. 0 império do direito, p. 87 et seq. 65 Dworkin (0 império do direito, p. 288 et seq.) aplica Hércules para resolver 0 caso ‘McLoughlin vs, O'Brian (p. 29 et seq.): Hércules seleciona interpretagdes possfveis ¢ sobre elas aplica o critério de adequabilidade; depois, as interpretagdes restantes S30 323 JURISDICAO & HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL ente-se, tendo em vista algumas criticas feitas a Dworkin nesse Ponto, que mesmo o juiz Hércules nao & capaz de definir 0 Direito, mas tdo-s6 fornecer as respostas que, num certo momento, Ihe Parecem as melhores. Nao ha respostas de finitivas, que possam, resolvendo um caso, determinar a solugao de quaisquer outros, a interpretacio é (sempre) construtiva: ao mesmo fornecer “a tinica Tesposta correta” para um caso, isso apenas é possivel dada a complexidade do evento Posto a decisao, que o torna Unico; se ele é Unico, a respectiva decisao nao pode ser a criagdio de um standard que determine, a priori a solugdo de qualquer outro caso, ainda que “semelhante”. Para melhor explicar seu conceito de interpretacdo construti- va, Dworkin fara a famosa analogia entre a atividade do juiz e um romance escrito em cadeia onde cada autor escreve um capitulo da historia (e para isso tem de ler os antecedentes e escrever um capitu- lo que seja novo mas também represente uma continuacio).” Os juizes nesses processos S40, a0 mesmo tempo, autores (porque acres- centam algo) e criticos (porque interpretam) das tradigdes que resga- tam. © juiz (tal qual o romancista que escreve o seu capitulo no livro) atua como se sua decisio fosse uma obra sua, completa e acabada, que di uma Tesposta as partes em conflito. Mas, uma deciséio é sempre produto de varias maos (e Dworkin percebe isso conirontadas com decisbes judiciais passadas para se saber quais destas parecem ser Fiais "importantes, fundamentals ou de maior aleance”. Com isso ele coloca vas prggrnetagio "sob sua melhor luz”, para em seguida submeté-Ias as “duas virtudes”™ rOprias 2 uma comunidade de principios:justga abstratae eqUidade politica, 66 DWORKIN. 0 império do direito, p, 287. $7 DWORKIN, 0 império do direito, p,287 et seq.; Cadernos da Escola do Legislativo, p. 221 et seq. $8 Nit faz, pois, sentido para Dworkin a questo sobre se 0s jutzes eriam ou descobrem © Diteito, eles, ao mesmo tempo criam e interpretam (cf. DWORKIN. O império do direito, p.271 © Uma questo de principio, p. 235 e 253). A interpretago nfo é uma atividade sui generis, que apenas se dé quando houver obscuridace “Devemos estudar a interpretag3o como uma atividade geral, como um modo de conhecimento, stentando para outros contextos dessa atividade” (DWORKIN. Uma quesido de principio, p. 220), 324 ee ALEXANDRE GUSTAVO MELO FRANCO BAHIA muito bem), o juiz € 0 produto da histéria institucional de seu cargo; queira ou nao, de alguma forma sua decisao € uma continuidade — ainda que sua atitude seja de romper com o passado. O melhor que 0 juiz pode fazer é tentar fazer com que sua decisao seja o mais coerente com essa hist6ria, 0 que implica, como dissemos, ; subserviéncia ao passado, mas integridade. Isso porque 0 juiz pode { chegar & conclus&o que os modelos empiricos do passado nao sio adequados ao caso que ele tem a decidir, sendo necessdria uma decisao mais sofisticada.” Um outro autor central, segundo entendemos, para melhor compreender a Teoria do Discurso de Habermas € Klaus Giinther. Nos concentraremos na diferenga que Giinther faz entre “discursos de justificag’o” e “discursos de aplicagao”. Parte ele de um pressu- posto semelhante ao de Dworkin: todo caso é tinico, j4 que todo 69. Os postulados de Dworkin so questionados por varios autores. Muitas dessas obje- ges foram respondidas no seu texto Direito, Filosofia e Interpretagao (53 et seq.), ‘mencionaremos duas que nos ajudardo a melhor compreender os postulados de Dworkin. Questiona-se que “interpretar algo” ¢ “descrevé-lo como ele &” e nao “colocé-lo sob sua melhor luz”. Dworkin responde que a interpretac’lo construtivista € propria dos que se engajam no propésito de resolver uma questo da melhor forma, mas discordam sobre qual a resposta a ser dada (cf. DWORKIN. Cadernos da Escola do Legislativo, p. 58 et seq.). Seria este 0 caso, e.¢., da solugdo do caso do neto que matou o avé para receber sua heranca. Nao havia qualquer lei que proibisse um neto assassino de receber os bens nesse caso. Ainda que diferentes pessoas discordem sobre qual a solucio a ser dada, todos concordam que uma decisao que privilegie a torpeza do neto no seria aceitivel. Com isso mostra que a crenga (subjacente 2 ica) de que interpretar € apenas “descrever algo” estaria ha muito superada (diramos, desde Ga > ha essa neutralidade descritiva, “a interpretagao & teleol6gica, finalistica” (DWORKIN. Cadernos da Escola do Legislativo, p. 62, ver também LAGES. Revista da Faculdade Mineira de Direito, p. 46). Outra objegio & lembrada por Habermas (Facticidad y valides, p. 285): 0s partidérios do Critical Legal Studies questionam a viabilidade de uma teoria como a de Dworkin em uma outra realidade que no a americana. A esta objegdo Habermas responde que o conceito de integridade de Dworkin mostra que na modernidade todas as ordens Jurfdicas so constituidas sob a forma de Estado de Direito ~ 0 que implica o igual teconhecimento das autonomias pablica e privada de todos , servindo, pois, como ponto de referéncia comum a qualquer sociedade organizada sob a forma do Direito. Logo, a teoria de Dworkin nao seria menos universal do que as histérias do constitu- cionalismo e do Estado de Direito. 325) JURISDIGAO E HERMENEUTICA CONSTITUCIONAL evento reconstruido em cada processo é igualmente tinico. A apli- cagio adequada de uma norma demanda uma reconstrucgao discursiva do evento subjacente e do ordenamento, para que se descubra qual a norma aplicdvel. Trata-se de se resolver a relagio entre “la justesse de la norme (...) et de la justice dans le cas despece”.™ O jurista problematiza a posigao de imparcialidade do aplicador: a imparcialidade esta nao num suposto distanciamento (como se 0 juiz pudesse apenas subsumir o caso a uma norma abstrata), mas, num eqiiidistanciamento em relagio As partes que deverao reconstruir discursivamente 0 caso — a participagio em contraditério das partes é fundamental, pois ser‘io elas que tentarao Teconstruir, tanto quanto possfvel, um evento que por definigio jamais poder ser perfeitamente refeito, por mais esforgados e since- ros que sejam autor e réu. Também no que toca ao ordenamento, 0 juiz deve assumir que este nao € um dado a partir do qual ele jd pode partir, mas que o sistema de normas se apresenta como uma rede complexa que deve reconstrufda,” inclusive com a participagao de autor e réu, pois sio estes que levantam pretensdes a direito que deverao ser levadas em conta pelo aplicador. Como salienta Giinther,” a imparcialidade é um principio processual segundo o qual “somente se pode estabelecer que uma norma pode legitimamente ser aplicada em uma situagio se sio levadas em consideragao todas as caracteristicas que sio relevantes em vista de uma interpretacao coerente de todas as normas aplic4- 70 Cf. GUNTHER. Archives de Philosophie dut Droit, p. 272. 71 Como definiu Menelick de C. Netto (Revista de Direito Comparado, p. 483): “Com toda essa abertura para a complexidade de toda situago de aplicagio, o aplicador deve exigir entdo que o ordenamento juridico apresente-se diante dele, nao através de uma tinica regra integrante de um todo passivo, harménico ¢ predeterminado que jé teria de antemo regulado de modo absoluto a aplicagdo de suas regras, mas em suua integralidade, como um mar revolto de normas em permanente tensio concorrendo entre si para regerem situagdes” (grifos nossos). 72 GUNTHER. Archives de Philosophie du Droit, p. 269 326

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