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A Sustentabilidade

e o Cosmopolitismo
das Relações de
Consumo na
Sociedade Moderna:
Problematização
de um Paradoxo e
Perspectivas para
o Novo Século
Thr Role of Durability and Cosmopolitism
in the M odern S ociety : P roblems and
Perspectives for a New Century
L a D urabilité et le C osmopolitisme des
Relations de Consommation Dans la Société
Moderne : Problématique D’um Paradoxe et
Perspectives Pour le Nouveau Siècle

“Las computadoras son inútiles. Sólo pueden darte respuestas”


(Pablo Picasso)

Hiroshi Togashi*

* Pós-graduado e professor palestrante de Direito Constitucional pela


Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ). Professor
de Direito Constitucional da Fundação Escola do Ministério Público do
Estado do Rio de Janeiro (FEMPERJ). Mestrando em Direito Regulatório
da Universidade Gama Filho.

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R esumo : O trabalho tem por objetivo analisar os


impactos dos padrões de consumo no meio ambiente.
Para isso, procurará, inicialmente, delimitar a extensão do
termo “meio ambiente”, compreender o meio ambiente
na dimensão do desenvolvimento, os princípios do
desenvolvimento sustentável, a cooperação internacional
e o paradoxo entre os níveis de consumo moderno, e os
reflexos sobre o meio ambiente.
Palavras-Chave: Meio ambiente, Relações de consumo,
Princípios.

Abstract: The study aims to analyze the impacts of


consumption patterns in the environment. To do so,
initially, it will limit the scope of the term “environment”.
It will also try to understand the environment in the
dimension of development, the principles of sustainable
development, the international cooperation and the
paradox between the levels of modern consumption and
the repercussions on the environment.
Key-words: Environment, Consumption, Principles.

Résumé: Ce travail a le but de présenter une réflexion à


propos du rôle de Juges comme protagonistes du champ
juridique et monopolisateurs du capital manipoulé dans
ce champ, d’une manière bien particulière et spécifique
dans le cas brésilien. Dans une première perspective, des
formulations non entrecroisées de Bourdieu et Merriman.
De Bourdieu on a profité la notion de capital juridique
comme la capacité de « dire Droit », aussi bien que le regard
sur la dispute permanente de ce capital faite entre des
secteurs du champ juridique, par exemple : le pratique et le
théorique. Merriman contribue à cette perspective lorsqu’il
diagnostique que la tradition juridique marquante dans un
espace déterminé définit a priori l’hégémonie sur le capital
juridique: le civil law est le Droit des académitiens, tandis
que le common law est le Droit des pratiques, spécifiquement
des Juges. Dans une deuxième perspective, l’entre-coupe
arrive entre les auteurs Garapon et Lévi-Strauss. Garapon
contribue avec une description detaillée des éléments
symboliques qui composent en général l’intitution du

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Pouvoir Judiciaire, et finit par la présence «  inutile  » de


rites, signes et liturgies. Lévi-Strauss contribue en réfutant
telle affirmation, quand il étudie l’éfficacité symbolique
présente dans les systèmes de référence de n’importe
quelle structure sociale. Le travail conclut par l’invasion du
secteur théorique par les Juges brésiliens, y compris par le
peuplement des écoles juridiques par des Magistrats, ce qui
n’est pas commun dans les pays de tradition de civil law.
M ots -C lés : Camp Juridique  ; Division du Travail
Juridique, Tradition Civil Law  ; Efficacité symbolique;
Sociologie du Droit.

1. Introdução

A cada dia, a conscientização ecológica tem despertado o ser humano para o


fato de que a degradação ambiental está atingindo índices insuportáveis, e talvez
irreversíveis, o que tem tornado duvidosa a manutenção da sadia qualidade de vida
no planeta. O crescente aumento populacional, que quadruplicou nos últimos cem
anos, a destruição da camada de ozônio, o aquecimento global e o consequente
descongelamento das calotas polares, a problemática da escassez dos recursos
naturais, a insuficiência dos combustíveis fósseis, o estresse hídrico, por conta do
desperdício de água potável, a contaminação dos lençóis freáticos, pelo derrame de
fertilizantes tóxicos no solo, a crise na segurança alimentar, o desmatamento sem
limites, a desertificação, a poluição dos oceanos, que coloca em risco mais da metade
dos corais de todo o mundo, a contaminação do ar, enfim, toda a problemática
ambiental, são assuntos que entraram, definitivamente, para a ordem do dia em
todos os governos mundiais.
O Relatório Nós os Povos – o Papel das Nações Unidas no Século XXI1, afirma:

O meio natural presta-nos, gratuitamente, serviços


básicos, sem os quais a nossa espécie não poderia

1
ANNAN, Kofi. Relatório Nós os Povos – o Papel das Nações Unidas
no Século XXI. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O
DESENVOLVIMENTO (PNUD). Disponível em: http://www.pnud.
org.br/ [acesso em 21 mai. 2009].

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sobreviver. A camada de ozônio filtra os raios


ultravioletas do sol que são nocivos para as pessoas,
animais e plantas. Os ecossistemas ajudam a purificar
o ar que respiramos e a água que bebemos. Convertem
resíduos em recursos e reduzem os níveis de carbono
na atmosfera que, de outro modo, contribuiriam para
o aquecimento do planeta. A biodiversidade constitui
uma fonte abundante de medicamentos e produtos
alimentares e mantém a variedade genética, que reduz
a vulnerabilidade a pragas e doenças. Mas estamos a
degradar e, em alguns casos, a destruir a capacidade
de o ambiente continuar a fornecer-nos esses serviços
essenciais à vida.

Portanto, cabe ao homo sapiens a responsabilidade de transformar o contexto da


história para as futuras gerações, tomando atitudes verdadeiramente sábias para a
preservação do meio ambiente, tendo em vista que o planeta e a continuidade de
todas as espécies, inclusive sua própria, dependem disso.

2. A extensão terminológica de “meio ambiente”

A doutrina comumente emprega a terminologia “meio ambiente” de forma


adjetivada, com o objetiv o de especificar quatro espécies distintas2, quais sejam,
o meio ambiente natural ou físico, o meio ambiente artificial ou urbano, o meio
ambiente cultural e o meio ambiente do trabalho.
Meio ambiente natural ou físico, objeto desta pesquisa, é aquele que engloba
os seres vivos e as condições físicas e químicas necessárias ao desenvolvimento das
espécies, em que estão alcançadas todas as “[...] formas de vida, não só aquelas da
biota (...) como da biodiversidade (...), e até mesmo está protegido o meio que as
abriga ou lhes permite a subsistência”.3 O art. 3º, I, da Lei n. 6.938/81, disciplina
a questão, afirmando tratar-se do “[...] conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida

2
SILVA, 2003, p. 3-5. LEITE, 2003, p. 47, nota de rodapé n. 15. MAZZILLI,
2003, p. 137.
3
MAZZILLI, 2003, p. 136.

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em todas as suas formas”.4 Meio ambiente artificial ou urbano é aquele decorrente


da produção humana, individualizado pelo espaço urbano construído.
Também com origem nas realizações do homem, o meio ambiente cultural
encontra classificação autônoma, porquanto seu valor preponderante está nos
aspectos históricos e culturais das criações, da qual fazem parte o patrimônio artístico,
o arqueológico, o histórico, o paisagístico e o turístico. Meio ambiente do trabalho
distingue aquele em que são empreendidas as atividades laborais do ser humano,
previsto no texto constitucional brasileiro de 1988, através do art. 200, VIII, ao
determinar que compete ao sistema único de saúde, além de outras atribuições,
“colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho”.
Com fundamento na própria Constituição da República, assim como nas
modernas concepções a respeito dos direitos humanos, também é possível
acrescentar duas outras espécies de meio ambiente àquelas regularmente citadas – o
meio ambiente familiar e o meio ambiente pré-intra-uterino.
Entre os diversos aspectos da vida social, o meio ambiente familiar constitui a
primeira e fundamental instituição em que se insere o ser humano. Isso permitiu
ao constituinte originário garantir, conforme norma do art. 2265, ser a família
a base da sociedade, assim como prever a especial proteção a essa instituição
em legislação infraconstitucional, através, e.g., da Lei n. 8.009/90, que dispõe
sobre a impenhorabilidade do bem de família, como em seara penal, no título
VII, da Parte Especial do Código Penal. Já o meio ambiente pré-intra-uterino
pode ser encontrado no próprio capítulo em que está previsto o meio ambiente
ecologicamente equilibrado, pelo art. 225, § 1º, II, CRFB/886, e aborda o polêmico
debate a respeito da experimentação e descarte dos embriões excedentários7, tema
diretamente relacionado à principiologia da bioética.

4
A Lei n. 6.938/81 dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus
fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
5
Art. 226, Constituição da República: “A família, base da sociedade, tem
especial proteção do Estado”.
6
Art. 225, § 1º, Constituição da República: “Para assegurar a efetividade
desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) II - preservar a diversidade
e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades
dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético”.
7
A Lei n. 8.974/95 regulamenta os incisos II e V do parágrafo primeiro
do art. 225, da Constituição da República, estabelecendo normas para o
uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de
organismos geneticamente modificados, autorizando o Poder Executivo a
criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional
de Biossegurança. A Lei n. 11.105, de 24 de março de 2005, Regulamenta

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3. O meio ambiente e o direito


internacional do desenvolvimento

Por conta da controvérsia doutrinária existente entre os autores internacionalistas


a respeito da localização jurídica, inclusive a da própria existência de um direito
internacional do desenvolvimento, esta pesquisa, desde logo, irá se filiar ao
entendimento daqueles que compreendem a existência do direito internacional do
desenvolvimento, assim como a perspectiva de que se caracteriza como um moderno
e autônomo ramo do conhecimento jurídico, inserido no direito internacional
público, a fim de que o aprofundamento destes assuntos não desvirtue os estreitos
limites deste trabalho.8
Feita esta observação, o desafio inicial a ser enfrentado está em definir o que pode
ser entendido por desenvolvimento, ou ainda, qual a abrangência contida nesse termo.
Neste caminho em busca de um conteúdo para o desenvolvimento, um primeiro
aspecto a ser ressaltado se traduz pela diferenciação merece ser estabelecida em
face da noção de crescimento econômico, visto, não obstante a autoridade do aspecto
economicista, como a evolução da sistemática dos direitos humanos fez com que os
paradigmas norteadores do desenvolvimento passassem a abranger diversas outras
expectativas inerentes à própria existência humana.
Em linha com esse entendimento, o Parecer do Comitê Econômico e
Social Europeu sobre o tema “Para além do PIB — Instrumentos para medir
o desenvolvimento sustentável” (Beyond GDP — measurements for sustainable
development)9 busca definir um indicador que consiga estabelecer uma medição
para o desenvolvimento social, tendo em conta ser o PIB uma referência essencial

os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição da República,


estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades
que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus
derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura
a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre
a Política Nacional de Biossegurança – PNB.
8
Para uma análise dos diferentes posicionamentos doutrinários a respeito
da existência e localização do direito internacional do desenvolvimento
no cenário jurídico internacional: PEREIRA, 1988, p. 103-110.
9
O Parecer do Comitê Econômico e Social Europeu sobre o tema “Para
além do PIB — Instrumentos para medir o desenvolvimento sustentável”,
foi publicado no Jornal Oficial n. C 100 de 30/04/2009 p. 0053 – 0059.
Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri
=OJ:C:2009:100:0053:01:EN:HTML [acesso em 24 mai. 2009].

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do crescimento econômico, porém insuficiente10 para organizar uma política


concernente aos desafios a serem enfrentados no século XXI. Para isso, será
necessário recorrer a outros indicadores complementares que meçam duas coisas
distintas, a sustentabilidade e o bem-estar, conforme dispõe o item 2, do Parecer:

Tratando-se de duas coisas distintas — sustentabilidade


e bem-estar — são necessários dois instrumentos de
medição. A sustentabilidade tem em mira um mundo
saudável agora e no futuro e a solidariedade entre as
gerações e é um pressuposto, ao passo que o bem-estar
passa necessariamente pelo desenvolvimento social e é
uma meta variável. Para a sustentabilidade é suficiente
garantir que o estilo de vida atual se possa manter ainda
por muitos anos ao nível mundial. Uma vez cumprido
este critério, não é necessário empenhar-se por uma
sustentabilidade ainda maior. Já com o bem-estar é
diferente: mais bem-estar é sempre melhor do que
menos bem-estar. É, por isso, lógico ambicionar um
bem-estar cada vez maior.

Entre os indicadores existentes, capazes de mensurar o grau de sustentabilidade


e sua evolução, está a pegada ecológica (ecological footprint)11 que, não obstante sua
insuficiência, se apresenta como o único adequado a analisar “[...] o impacto

10
No item 2 do Parecer, que cuida das limitações do PIB, reza o seguinte:
“Atualmente, o PIB (Produto Interno Bruto) é o instrumento mais
utilizado pelos governos para medir e ficar a saber como vai a sociedade
(...) Mas, ao mesmo tempo, não diz nada sobre o bem-estar (felicidade)
das pessoas ou sobre o grau de sustentabilidade do desenvolvimento da
sociedade. O PIB per capita nos Estados Unidos é um dos mais elevados
do mundo, mas isso não quer dizer que os americanos sejam mais felizes
do que os habitantes de outros países. (...) Felicidade é o objetivo último de
todos os seres humanos. A tarefa mais importante dos governos é, pois,
criar as premissas que permitam a cada cidadão alcançar essa felicidade.
Isso significa que os governos terão de sondar constantemente a sociedade
para recolher informações sobre a situação em que se encontra. Medir é
saber. Só depois de saber qual o motivo e qual o objeto da insatisfação
sentida em dado momento é que se poderá tentar remediá-la”.
11
Ao tratar do ecological footprint, o Parecer dispõe que seu ponto de
partida é “[...] a possibilidade de calcular o consumo de certos produtos
com base na área necessária para a sua produção. É, deste modo, possível

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ambiental dos padrões do nosso consumo e da nossa produção (importações e


exportações) noutros países”. Contudo, o grande desafio está em estruturar um
indicador12 suscetível de analisar, de forma realista, o desenvolvimento social,
em conta dos diversos aspectos da vida humana. Para tanto, alguns domínios são
essenciais ao conceito de qualidade de vida, ou seja, “a integridade física e saúde, o
bem-estar material, o acesso aos serviços públicos, a participação cívica e integração
dos imigrantes, lazer e qualidade do meio ambiente”.
Para tanto, duas soluções são propostas pelo Parecer, com o fim de deslocar o
PIB de sua posição dominante na política socioeconômica mundial, quais sejam, a
criação de diferentes indicadores que digam respeito à sustentabilidade e ao bem-
estar, e que se situem em equivalência de forças ao PIB, uma vez que este tem sido o
problema dos até então já existentes, pois, embora capazes de medir outros aspectos
além do PIB (criminalidade, nível de instrução, indicadores de democracia, o Índice
de Desenvolvimento Humano, ou HDI - Human Development Index), não traduzem
o mesmo peso do PIB; ou substituí-lo, definitivamente, por um novo indicador
global13 que consiga agregar essas novas perspectivas.
Corroborando os campos de possibilidade propostos pelo Parecer, os 191

comparar o impacto ambiental de vários comportamentos de consumo


(estilos de vida) ou de várias faixas da população (países). Para satisfazer
o consumo individual, em todo o mundo, é necessária uma superfície de
solo produtivo por habitante de 1,8 hectares. São utilizados atualmente
2,2 hectares por pessoa, o que significa que a humanidade está gastando
as reservas da Terra a grande velocidade. As diferenças ao nível mundial
são, contudo, enormes: nos Estados Unidos a pegada ecológica média
é de 9,6 hectares, ao passo que no Bangladesh é apenas de 0,5 hectares.
Se não houver mudanças na política, estes problemas agudizar-se-ão
ainda mais”.
12
O item 1.9 do Parecer, ao tratar da dificuldade em estabelecer um indicador
e sua tarefa de mensuração, esclarece que “[...] medir é um processo
dinâmico, sobretudo se o que se mede são as mutações na sociedade.
Além disso, estas mutações podem, por seu turno, criar a necessidade
de outros indicadores mais precisos. Definir um indicador é também um
processo dinâmico e a sua definição deve ser o resultado de debates e
discussões, como é normal numa sociedade democrática”.
13
Sobre a possibilidade de alteração do PIB por outro indicador, o Parecer
argumenta ser esta hipótese mais complexa, porquanto“[...] estão em
jogo duas questões fundamentalmente diferentes: a sustentabilidade e o
bem-estar. A sustentabilidade constitui um pressuposto, o bem-estar uma
meta variável. Para a sustentabilidade é suficiente garantir que o estilo
de vida atual poderá continuar ainda por muitos anos ao nível mundial.
Uma vez cumprido este critério, não é necessário empenhar-se por uma
maior sustentabilidade. Já com o bem-estar é diferente: mais bem-estar é
sempre melhor do que menos bem-estar. É, por isso, lógico ambicionar
um bem-estar cada vez maior”.

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Estados-Membros das Nações Unidas assumiram, até 2015, o compromisso


de efetivar as 8 diretivas propostas pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD): 1) erradicar a extrema pobreza e a fome; 2) atingir o
ensino básico universal; 3) promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das
mulheres; 4) reduzir a mortalidade infantil; 5) melhorar a saúde materna; 6) combater
o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; 7) garantir a sustentabilidade ambiental; e
8) estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Essas diretivas foram
propostas como Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) do PNUD.
Assim, fica evidente que o desenvolvimento está para além dos critérios
financeiros tradicionais. Isto não quer significar que o aspecto econômico será
desprezado ou posto em segundo plano, visto que

[...] a democracia – governo do povo, pelo povo e


para o povo – aponta para a realização dos direitos
políticos, que apontam para a realização dos direitos
econômicos e sociais, que garantem a realização dos
direitos individuais, de que a liberdade é a expressão
mais importante. Os direitos econômicos e sociais
são de natureza igualitária, sem os quais os outros
não se efetivam realmente.14

Na verdade, o que se quer entender por desenvolvimento é crescimento


sustentável, é economia ambiental, é solidariedade inclusiva e participativa, numa
dimensão consentânea à que foi proposta por Peter Häberle, do status activus
processualis, do direito quanto à dimensão procedimental e organizatória dos direitos
fundamentais, com a criação de procedimentos que garantam a participação efetiva
do cidadão na organização e no procedimento dos direitos fundamentais. Por
desenvolvimento, entenda-se a busca por um ethos universal.

4. Princípios gerais de uma justiça ambiental

Um importante princípio para a preservação ambiental traduz-se através do


princípio da precaução, também denominado in dubio pro ambiente. Trata-se do
princípio de número 15, assegurado pela Declaração do Rio sobre Meio Ambiente

14
SILVA, 2003, p. 132.

301
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e Desenvolvimento: “[...] quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a


ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento
de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.15 Em
conta da vagueza de sua redação, o texto oportuniza diversas controvérsias, como
o grau de incerteza científica que permite a adoção de medidas preventivas16, o que
configuraria dano grave ao meio ambiente, assim como a quem caberá o encargo
probatório de demonstrar se determinada conduta pode ser, ou não, agressiva ao
meio ambiente.
Diante dessas dificuldades, a União Européia editou a Comunicação da Comissão,
de 2 de fevereiro de 2000, relativa ao princípio da precaução – COM (2000) 1 final17
– cujo objetivo é estabelecer diretrizes para sua aplicação, o que permite assegurar
um elevado nível de proteção do ambiente e da saúde humana, animal e vegetal, nos
casos em que os dados científicos disponíveis não permitam uma completa avaliação
do risco. Consoante a Comunicação, o princípio pode ser invocado quando os
efeitos potencialmente perigosos de um evento, produto ou procedimento forem
identificados, por meio de uma avaliação cientifica e objetiva, mas essa avaliação não
determinar o risco com certeza suficiente. Para tanto, devem ser preenchidas três
condições prévias: a identificação dos efeitos potencialmente negativos, a avaliação
dos dados científicos disponíveis e a extensão da incerteza científica.
A aplicação do princípio poderá resultar numa obrigação de fazer ou de não-
fazer, cujo resultado dependerá de uma decisão política, por força do nível de risco
considerado aceitável pela sociedade. Como diretrizes gerais para a aplicação do

15
BRASIL. Senado Federal. Declaração do Rio sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento. Brasília, Secretaria Especial de Editoração e
Publicações do Senado Federal, 2003.
16
“De fato, ao decidir uma disputa comercial entre os Estados Unidos e a
União Européia sobre a comercialização de carne de bovinos submetidos
a técnicas de crescimento induzido por hormônios, o Órgão de Apelação
da OMC entendeu que a demonstração pela última de que a administração
de hormônios do crescimento genericamente considerados pode
causar câncer não era suficiente para legitimar sua decisão de proibir a
importação de carne norte-americana. Para o referido órgão, a aplicação
do princípio da precaução exigia, ao menos, a demonstração específica
de que os hormônios de crescimento utilizados pelos pecuaristas norte-
americanos poderiam causar câncer”. LEITE, 2003, p. 18.
17
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO, DE 2 DE FEVEREIRO DE 2000
– COM (2000) 1 FINAL, Relativa Ao Princípio da Precaução. Disponível
em: http://eurolex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:
52000DC0001:EN: HTML [acesso em 15 mai. 2009].

302
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princípio estão a proporcionalidade entre as medidas tomadas e o nível de proteção


procurado, a não-discriminação da aplicação das medidas, a coerência das medidas
com as já tomadas em situações similares ou que utilizem abordagens similares, o
exame das vantagens e desvantagens resultantes do fazer ou não-fazer, e, por fim,
o reexame das medidas à luz da evolução científica.
Como foram estabelecidas diretrizes específicas segundo as quais sua aplicação
deverá se basear numa avaliação científica tão completa quanto possível, devendo ser
determinado o grau de incerteza, a decisão deverá ser precedida de uma avaliação
do risco e das potenciais consequências do não-fazer. Quando os resultados da
avaliação científica estiverem disponíveis, todas as partes interessadas deverão
ter a possibilidade de participar do estudo das várias ações cabíveis, com a maior
transparência possível.
Com relação ao ônus da prova18, foi estabelecida a possibilidade de sua inversão
em determinados casos, não sendo preconizada a extensão generalizada a todos
os produtos. Como forma de aplicação do in dubio pro ambiente, encontra-se um
julgado em que a Suprema Corte dos Estados Unidos determinou a paralisação da
construção de uma hidrelétrica, pois o rio a ser represado constituía o habitat de
determinado peixe e, caso a medida judicial não fosse tomada, esta espécie poderia
extinguir-se.19
Caso análogo, porém com resultado diverso, ocorreu no Brasil, com a
cachoeira de Sete Quedas, que desapareceu em 1982, submersa pela represa
da usina hidrelétrica de Itaipu. No ano de 2002, tramitava perante o Supremo
Tribunal Federal questão semelhante, que cuida do prosseguimento das obras do
Aproveitamento Hidrelétrico de Itapebi, na Bahia, sob a Ação Cível Originária n.
59320, de relatoria do Ministro Gilmar F. Mendes, cujo mérito não foi julgado por
perda superveniente do objeto.
O princípio da precaução não deve ser interpretado de forma a inviabilizar

18
Merece ser feita ressalva quanto ao uso habitual da expressão ônus da prova,
visto que ônus é a consequência do descumprimento de um encargo, na
hipótese, o probatório. De tal sorte, Parece ser mais adequado empregar
a terminologia encargo probatório, porquanto somente haverá ônus caso
seja previamente descumprido algum encargo.
19
LEITE, 2003, p. 61.
20
Em despacho na Ação Cível Originária n. 593: “Trata-se de Ação
Declaratória Negativa proposta pela Agência Nacional de Energia Elétrica
- ANEEL e Itapebi Geração de Energia S.A. contra o Estado de Minas
Gerais em que se requer a declaração de inexistência de qualquer relação
jurídica valida, decorrente da Lei Estadual n. 13.370, de 30 de novembro
de 1999, que impeça o prosseguimento das obras do Aproveitamento

303
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o desenvolvimento econômico do País, porquanto questões relevantes, como os


alimentos geneticamente modificados, acabam sendo alvo de diversos discursos
fundamentalistas, a impedir uma análise econômico-ambiental sobre o tema. Por
isso, afigura-se necessária uma reflexão mais ampla a respeito da abrangência do
princípio, que leve em conta os diversos interesses existentes no debate, assim como
uma aplicação principiológica organizada a partir da intensidade recíproca, vale dizer,
o entendimento sobre a extensão do princípio deve ser feito na mesma medida
em relação àqueles países que celebram relações internacionais de comércio com o
Brasil, para que haja uma aplicação igualitária entre os Estados soberanos.
Outra importante ferramenta ambiental aparece através do princípio do
poluidor pagador, constituído a partir da responsabilização pelo encargo econômico
decorrente da poluição a ser suportado pelo poluidor, o que permite “[...] aos
Estados conduzirem os atores econômicos a arcar como todos os custos dos
impactos negativos da produção de bens e serviços, mesmo antes que estes venham a
ocorrer”.21 A aplicabilidade do princípio do poluidor pagador não considera a licitude
da atividade econômica desenvolvida, o que equivale a dizer que, mesmo aquelas
condutas perfeitamente adequadas às normas ambientais, caso sejam geradoras de
poluição, implicarão sanções econômicas nos limites da poluição originada.
Em linha com esse entendimento, a norma disposta pelo art. 931, do Código
Civil, ao prever que “[...] os empresários individuais e as empresas respondem
independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em
circulação”, estabelece uma responsabilização de caráter genérico, diversa da que
se encontra no Código de Defesa do Consumidor, pois não relaciona o dano às
hipóteses de vício ou defeito do produto; determina apenas que, pelos danos
causados pelos produtos, responderão aqueles que os puseram em circulação.
Logo, a norma se harmoniza com o art. 170, VI, da Constituição da República,
ao prever tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos

Hidrelétrico de Itapebi e a posterior operação desse empreendimento.


Alegam as Autoras que referida Lei do Estado de Minas Gerais, ao instituir
a área de proteção ambiental da Cachoeira Tombo da Fumaça, adotou os
limites dos terrenos do Município de Salto da Divisa que serão atingidos
pelo reservatório da Usina de Itapebi, para neles vedar qualquer obra ou
serviço que altere ou descaracterize a paisagem natural da área definida”.
No entanto, a lei do Estado de Minas Gerais foi revogada no curso da
ação, o que acarretou a perda superveniente do objeto e a consequente
extinção do processo sem o julgamento do mérito. Disponível em: http://
www.stf.jus.br/portal/diarioJustica/listarDiarioJustica.asp?tipoPesquisaD
J=AP&numero=593&classe=ACO [acesso em 15 mai. 2009].
21
LEITE, 2003, p. 23.

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e serviços, harmonizando-se com o que poderia ser definido por princípio da


isonomia ambiental.
Em consonância com o princípio do poluidor pagador está a responsabilidade
objetiva, prevista pelo art. 225, § 3º, do texto constitucional22, ao determinar que as
condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, sem prejuízo da
obrigação de reparar os danos causados, ampliando a responsabilização penal no
domínio ambiental, entendimento reproduzido pela lei de crimes ambientais (Lei n.
9.605/98). Destaca-se, de igual modo, entre os princípios gerais de direito ambiental,
o princípio da participação que, diretamente vinculado ao princípio democrático
e à perspectiva de democracia participativa, engloba, de modo inclusivo, os temas
concernentes às questões ambientais.
Corolário do princípio republicano, o princípio da informação se caracteriza pela
divulgação de conhecimentos ambientais aos cidadãos23, proporcionados através
de um conteúdo didático, atualizado e acessível, em perspectiva com as realidades
e necessidades locais. Guardando consonância com o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, assim como pela positivação, em sede constitucional,
da defesa do meio ambiente como princípio geral da atividade econômica, está
o princípio do desenvolvimento sustentável, fundamentado axiologicamente a
partir daquilo que poderia ser definido por princípio da dignidade ambiental da pessoa
humana.
Princípio largamente propagado pelos países desenvolvidos, que, em grande
parte, se caracterizam pela escassez de recursos naturais, em face dos países em
desenvolvimento, abundantes em riquezas naturais, está o princípio do patrimônio
comum da humanidade24, que aduz serem determinados recursos naturais, tendo

22
Art. 225, § 3º, Constituição da República: “As condutas e atividades
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas
físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente
da obrigação de reparar os danos causados”.
23
Como, por exemplo, a Lei n. 3.206/99, do Estado do Rio de Janeiro,
ao determinar, em seu art. 2º, que as garrafas e embalagens plásticas
comercializadas no território do Estado do Rio de Janeiro terão impressa
orientação ao consumidor sobre os riscos para o meio ambiente sobre
o descarte de forma inadequada, e que esta orientação deverá informar,
expressamente e com clareza que os referidos objetos de plástico não
são degradáveis ou absorvíveis pela natureza, devendo ser separadas para
coleta e destinação final adequada. Disponível em: http://www.alerj.
rj.gov.br/processo2.htm [acesso em 15 mai. 2009].

305
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

em conta a relevância que apresentam à garantia do meio ambiente, pertencentes


a toda a humanidade, e não somente àquele país que os possui.

5. A harmonização do paradoxo entre desenvolvimento


24
Ao ser questionado sobre seu artigo “A internacionalização do Mundo”,
publicado em e traduzido por diversos jornais do mundo, o Senador
Cristovam Buarque fez o seguinte comentário: “Fui questionado sobre o
que pensava da internacionalização da Amazônia, durante um debate, nos
Estados Unidos. O jovem introduziu sua pergunta dizendo que esperava a
resposta de um humanista e não de um brasileiro. Foi a primeira vez que um
debatedor determinou a ótica humanista como o ponto de partida para uma
resposta minha. De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a
internacionalização da Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham
o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso. Respondi que, como
humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia,
podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que
tem importância para a humanidade. Se a Amazônia, sob uma ótica humanista,
deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de
petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar
da humanidade quanto a Amazônia é para o nosso futuro. Apesar disso, os
donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração
de petróleo e subir ou não o seu preço. Os ricos do mundo, no direito de
queimar esse imenso patrimônio da humanidade. Da mesma forma, o capital
financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é
uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela
vontade de um dono, ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto
o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais.
Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países
inteiros na volúpia da especulação. Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de
ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre
não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das
mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar que
esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, possa ser
manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não
faz muito, um milionário japonês decidiu enterrar com ele um quadro de um
grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.
Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniam o
Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em
comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu disse que
Nova York, como sede das Nações Unidas, deveria ser internacionalizada. Pelo
menos Manhattan deveria pertencer a toda a humanidade. Assim como Paris,
Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua
beleza específica, sua história do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro. Se
os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos
de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até
porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando
uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas
nas florestas do Brasil. Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência
dos EUA têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do

306
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

sustentável e a sociedade de consumo moderna

O ser humano do século XXI vive numa sociedade que converteu a máxima de
René Descartes, cogito, ergo sum, para consumo, ergo sum. Torna-se utópica a concepção
de vida em sociedade dissociada da idéia de consumo. O útil e o supérfluo tomam
conta do imaginário do homem moderno. O avanço das tecnológicas, a propagação
dos meios de comunicação de massa, as técnicas de merchandising, enfim, todo o
desenvolvimento da era atual modela sua personalidade.
Com o aumento do consumo, aumentam também os riscos de degradação
ambiental. Por falta de políticas públicas voltadas para a prevenção da escassez dos
recursos não-renováveis, bem como pela ausência de coordenação no gerenciamento
de resíduos, a produção e o consumo desmedidos numa sociedade de massa trazem
sérias consequências à preservação dos ecossistemas.
A emissão de dióxido de carbono e demais poluentes na atmosfera, que
provocam alterações climáticas como o efeito estufa e o descongelamento das calotas
polares, a esgotabilidade dos recursos não-renováveis, como combustíveis fósseis
e água, e a quantidade de lixo produzida pelas grandes metrópoles são questões
diretamente relacionadas aos padrões de consumo da sociedade moderna. A Agenda
XXI, em seu capítulo 4 (itens 4.5 e 4.6), dispõe o seguinte:

[...] Embora em determinadas partes do mundo os


padrões de consumo sejam muito altos, as necessidade
básicas do consumidor de um amplo segmento da
humanidade não estão sendo atendidas. Isso se traduz
em demanda excessiva e estilos de vida insustentáveis
nos segmentos mais ricos, que exercem imensas pressões
sobre o meio ambiente. Enquanto isso os segmentos

mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que
cada criança do mundo tenha possibilidade de ir à escola. Internacionalizemos
as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram,
como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do
que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres
do mundo como um patrimônio da humanidade, eles não deixarão que elas
trabalhem quando deveriam estudar; que morram quando deveriam viver.
Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas,
enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia
seja nossa. Só nossa”. Disponível em: http://www.cristovam.org.br/index.
php?option=com_content&task=view&id=546 [acesso em 15 mai. 2009].

307
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

mais pobres não têm condições de ser atendidos em


suas necessidades de alimentação, saúde, moradia e
educação (...) Alguns economistas vêm questionado
os conceitos tradicionais do crescimento econômico
e sublinhando a importância de que se persigam
objetivos econômicos que levem plenamente em conta
o valor dos recursos naturais. Para que haja condições
de formular políticas internacionais e nacionais
coerentes é preciso aumentar o conhecimento acerca
do papel do consumo relativamente ao crescimento
econômico e à dinâmica demográfica.

O princípio 8º, da Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento,


afirma que “[...] para alcançar o desenvolvimento sustentável e uma qualidade de vida
mais elevada para todos, os Estados devem reduzir e eliminar os padrões insustentáveis
de produção e consumo, e promover políticas demográficas adequadas”.
Do mesmo teor é o capitulo I, item 6, da Declaração do Milênio das Nações
Unidas: “[...] é preciso alterar os atuais padrões insustentáveis de produção e consumo,
no interesse do nosso bem-estar futuro e no das futuras gerações”. Dez anos após
a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
a Conferência de Joanesburgo sobre o Desenvolvimento Sustentável, ao tratar
dos padrões de consumo e produção, afirmou: “[...] se toda a população do
mundo vivesse como um habitante médio dos países com elevados rendimentos,
precisaríamos de mais 2,6 planetas para nos sustentarem a todos”.
Diante desse quadro fático, fica claro que o crescente aumento nos padrões de
consumo compromete os valores inerentes à preservação ambiental. Estabelece-
se, porém, um paradoxo, porquanto os bens de uso e consumo, que alavancam a
economia e garantem o desenvolvimento econômico, estão, de forma concomitante
e talvez irreversível, degradando a qualidade do meio ambiente.
Na tentativa de buscar uma nova filosofia para o consumo, algumas organizações
não-governamentais norte-americanas, como a Adbusters25, passaram a difundir
a campanha Buy Nothing Day26, para promover a redução do consumo ao nível
do quase não-consumo. No entanto, ao que parece, in medio stat virtus. Por certo,

25
Além da Adbusters, existem também a Buy Nothing Christmas, Global
Exchange, Fair Trade, Anti-Consumerism Action e a Christmas Resistance.
26
O programa Buy Nothing Day encontra-se presente em países como
Finlândia, Alemanha, Noruega, Itália, Dinamarca, Suécia, Portugal,
Japão e Nova Zelândia.

308
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

programas como o Buy Nothing Day poderiam proporcionar diversos benefícios de


ordem ambiental. Contudo, de modo simultâneo, ocasionaria estagnação econômica,
aumento de preços, inflação, falências e demissões em massa, formando contingentes
de desempregados a depender da assistência governamental. Levando-se em conta
a crise econômica mundial, esse tipo de política agravaria ainda mais os resultados
atualmente experimentados. Além disso, condutas pautadas pelo não-consumo
afastam uma importante prerrogativa do consumidor: o poder de compra. Com base
nessa prerrogativa é que foi desenvolvida a teoria do consumo responsável.
Essa teoria consiste na organização das relações de consumo a partir da ética e do
compromisso empresarial com os valores sociais. O mundo corporativo no século XXI
transforma-se a cada dia. No contexto da globalização, fica evidente que o exercício da
atividade financeira não pode estar desvinculado de uma perspectiva sócio-ambiental.
Diante de um mercado altamente competitivo, em que o patamar de qualidade
está cada vez mais próximo entre os grandes concorrentes, o diferencial se traduz a
partir de um comprometimento com aqueles valores inerentes ao próprio conceito
de desenvolvimento sustentável. Esse processo de mudança de mentalidade tem sido
denominado responsabilidade social corporativa, que consiste no compromisso com
valores éticos, respeito ao ser humano, melhoria da qualidade de vida de empregados,
de suas famílias e do meio ambiente. É a holística empresarial. E, nessa tomada
de consciência por uma ética empresarial, encontra-se também a responsabilidade
ecológica, o que ensejou uma dimensão de eficiência denominada triple-bottom-line, que
diz respeito à mensuração do desempenho corporativo, tendo em conta parâmetros
de responsabilidade econômica, social e ambiental.
Alinhada a essa concepção otimizadora, a International Organization for
Standardization (ISO) padronizou, em esfera internacional, a norma de gerenciamento
ISO 1400027, que tem por objetivo conferir certificação às empresas ambientalmente
sustentáveis, abrindo espaço à competitividade ambiental.28 Assim, a teoria do
consumo consciente e a responsabilidade social corporativa encerram uma nova
perspectiva nas relações de consumo para o novo século, em que preço e qualidade

27
A ISO 14000 foi a segunda norma de gerenciamento empresarial, editada em
1996. A primeira foi a ISO 9000, em 1987. Estão sendo realizados debates,
nacionais e internacionais, a respeito da elaboração de uma terceira norma
de gerenciamento, que irá tratar da responsabilidade social das empresas.
28
Para obtenção da certificação ISO 14000, são apontadas como forma de
gerenciamento ambiental das empresas questões como o controle e a redução
dos impactos da produção sobre o meio ambiente, o cumprimento das normas
ambientais, o desenvolvimento de tecnologias apropriadas para a eliminação dos
resíduos, a eliminação ou redução dos riscos ao meio ambiente e ao homem,
assim como a utilização de tecnologias limpas, objetivando a redução de energia
e materiais e o relacionamento com a comunidade e com o Governo.

309
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

estarão aliados à ética empresarial. Mas para que seja possível a conscientização do
consumo, devem ser oferecidas informações aos consumidores a respeito do nível de
comprometimento econômico, social e ambiental das corporações, para que possam
ser privilegiadas aquelas que maiores retornos tenham dispensado à sociedade.
Um dos instrumentos utilizados para a prestação de contas sobre o empenho
empresarial com o bem-estar coletivo tem sido a divulgação do chamado balanço
social. Modernamente, jornais e revistas contam com a publicação das diferentes
ações sociais empreendidas por grandes empresas. Isso se traduz, na verdade, numa
releitura do próprio conceito de publicidade, visto como são apresentados não apenas
produtos ou serviços; também em razão do novo marketing corporativo é divulgado
o portfólio sustentável desenvolvido em favor da sociedade.
Como consequência, ainda que o ato de consumo esteja se transformando em
consumismo29, no novo século, os produtos passarão a ser escolhidos não apenas
em função de suas qualidades intrínsecas. Pela nova relação consumidor-empresa
que se estabelece, diferentes fatores serão sopesados, pois, mesmo contando com
produtos de alta qualidade e grande aceitação no mercado, empresas que, na era da
transparência, proporcionada pelas inúmeras fontes de comunicação, são destaque
na mídia pelo uso de mão de obra infantil em suas linhas de produção, ou por
comportamentos ambientalmente destrutivos, tendem, com o novo século, a oscilar
diante da crescente conscientização dos consumidores.
Por ser óbvia, essa concepção está manifestada, com maior intensidade, nos
países desenvolvidos, onde a distribuição de renda acontece de forma mais equânime,
o que oportuniza o maior acesso aos bens de uso e consumo. Nos países em
desenvolvimento, como as diferenças sociais, em regra, são extremas, a vontade de
ter um determinado bem se encontra tão distante da real possibilidade de o conseguir,
que toda e qualquer oportunidade que permita a aproximação entre o imaginário e
o concreto torna-se superior à conscientização do consumo.

6. A cooperação internacional dos Estados para a garantia

29
Entenda-se por consumismo, expressão difundida a partir do século
XX, a distorção do ato de gastar, ou o gastar como ato substitutivo
e compensatório a outros valores mais elevados e relevantes ao
desenvolvimento humano.

310
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

Com bastante atraso, as questões ambientais passaram a ingressar no debate


político internacional, ao ponto de a própria Declaração Universal dos Direitos
Humanos, de 1948, em seus trinta artigos, não fazer qualquer referência a respeito
da existência de um direito relacionado ao meio ambiente saudável. Somente a partir
da década de 60 as questões ambientais tornaram-se tema da agenda dos governantes
mundiais. De início, foram relegadas, de maneira preconceituosa, aos chamados
hippies, fazendo com que a preocupação com o meio ambiente fosse considerada algo
de pouca importância, a ocupar a mente de pessoas alienadas ou menos esclarecidas.
No entanto, através das inúmeras fontes de informação existentes na atualidade,
as idéias estão sendo aclaradas, o que permite que a conscientização ecológica seja
cultivada nas escolas e os temas ambientais descortinados e debatidos não só pelos
ambientalistas, mas por toda a sociedade e, principalmente, no meio empresarial.
Talvez em conta da grande desproporção entre extensão territorial e densidade
demográfica, o Japão, em 1971, foi o primeiro país a promulgar leis destinadas a
gerenciar a destinação final de resíduos, promovendo o uso da incineração como
forma de diminuição do volume de lixo gerado nas cidades.
Em 1972, surge o primeiro texto internacional a respeito da preservação
ambiental, a Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano.30 Em seu
conteúdo, proclama que a proteção e o melhoramento do meio ambiente humano
são questões fundamentais que afetam o bem-estar dos povos e o desenvolvimento
econômico do mundo inteiro, um desejo urgente dos povos de todo o mundo
e um dever de todos os governos. Contém, em sua segunda parte, a previsão
de 26 diretrizes aos governos celebrantes. Ainda durante essa década, algumas
constituições, como a de Portugal31, em 1976, e a da Espanha32, em 1978, passaram
a mencionar em seus textos disposições a respeito da preservação ambiental.
Com o progresso científico ainda incipiente, sem conseguir oferecer respostas

30
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano,
reunida em Estocolmo, Suécia, durante os dias 5 a 16 de junho de 1972, que
contou com governos de vários países, estimulou a criação de ministérios
governamentais relacionados ao meio ambiente perante os governos
mundiais, como também criou o Programa das Nações Unidas para o
Ambiente (PNUA).
31
Art. 66, da Constituição da República Portuguesa: “1. Todos têm direito a
um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever
de o defender. 2. Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um
desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos
próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos: a) Prevenir
e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão;

311
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

satisfatórias aos níveis de degradação ambiental existentes na época, práticas ambientalmente


não-sustentáveis, como os incineradores e os vazadouros públicos, tornaram-se soluções
comuns para a destinação final do material descartado. Em razão desse descompasso,
em julho de 1976, na cidade italiana de Seveso, o superaquecimento de um reator da usina
de incineração provocou a liberação de uma fumaça, até então desconhecida, mas que
ocasionou a morte de diversas pessoas. Soube-se, posteriormente, que, entre as substâncias
liberadas, havia dioxina33, composto químico altamente tóxico, produzido durante a
incineração de certos materiais. Esse acidente despertou a sociedade para a gravidade das
consequências ambientais, assim como ao fato de que novas técnicas de gerenciamento
de resíduos deveriam ser desenvolvidas, uma vez que a utilização dos incineradores, além
de perigosa, não resolvia o problema da esgotabilidade dos recursos naturais.
Com o início dos anos 80, novas técnicas de reaproveitamento dos resíduos

b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma


correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-
económico e a valorização da paisagem; c) Criar e desenvolver reservas e
parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e
sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores
culturais de interesse histórico ou artístico; d) Promover o aproveitamento
racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação
e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre
gerações; e) Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade
ambiental das povoações e da vida urbana, designadamente no plano
arquitectónico e da protecção das zonas históricas; f) Promover a integração
de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial; g) Promover
a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente; h) Assegurar que
a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e
qualidade de vida”. Disponível em: http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/
Portugal/Sistema_Politico/Constituicao/ [acesso em 15 mai. 2009].
32
Art. 45, da Constituição Espanhola: “1. Todos tienen el derecho a disfrutar
de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como
el deber de conservarlo. 2. Los poderes públicos velarán por la utilización
racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la
calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en
la indispensable solidaridad colectiva. 3. Para quienes violen lo dispuesto en
el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán sanciones
penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar
el daño causado”. Disponível em: http://www.tribunalconstitucional.es/
constitucion/laconstitucion.html/ [acesso em 15 mai. 2009].
33
As dioxinas foram utilizadas como armas químicas durante as guerras do Vietnã
e do Afeganistão. Um exemplo marcante, que contou com ampla divulgação
pela mídia, ocorreu na tentativa de envenenamento do então presidente da
Ucrânia, Viktor Yuschenko, em eleição realizada em 21 de novembro de 2004,
quando foi constatado em seu organismo um nível 6000 vezes superior aos
níveis normais de dioxinas encontrados no corpo humano.

312
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

começaram a ser desenvolvidas. Entretanto, pela falta de esclarecimento e divulgação


na mídia, a aceitação social aos materiais reaproveitados era ínfima, visto que eram
considerados um subproduto do lixo. Consequentemente, os investimentos nesse
setor eram precários.
No final dessa década foi promulgado outro importante documento internacional
a respeito do meio ambiente, o Protocolo de Montreal34, celebrado em setembro
de 1987, que cuida da proteção da camada de ozônio. Tem por finalidade a adoção
de medidas apropriadas “[...] para proteger a saúde do homem e o ambiente contra
os efeitos nefastos que resultam ou podem resultar de atividades humanas que
modificam ou podem modificar a camada de ozônio”.35 Visa, ainda, à regulação
equitativa do total de emissões globais de substâncias que afetam a camada de
ozônio, os clorofluorcarbonos (CFC), e tem como objetivo final a eliminação dessas
substâncias em função da evolução dos conhecimentos científicos, tendo em conta
considerações técnicas e econômicas, reconhecidas as necessidades crescentes dos
países em vias de desenvolvimento.
A partir dos anos 90, as questões ambientais ingressaram, de forma definitiva,
na pauta dos debates internacionais. A crescente conscientização ecológica, o alto
nível de desenvolvimento científico, os desastres ecológicos, como os de março de
1989, em que o navio-tanque Exxon Valdez, numa manobra imperita, colidiu com um
iceberg, o que ocasionou o vazamento de mais de 40 milhões de litros de petróleo
no Alasca; ou o incidente ocorrido em janeiro de 1991, no Golfo Pérsico, em que
aproximadamente dois bilhões de litros de petróleo foram jogados no mar durante
a Guerra, deram o passo que faltava para que a preservação do meio ambiente fosse
colocada na lista de prioridades de todos os governos do mundo.
Durante essa década, foram celebrados os mais importantes acordos

34
De acordo com o Relatório Nós os povos – o Papel das Nações Unidas
no século XXI, que precedeu a Conferência do Milênio, “[...] sem o
Protocolo (de Montreal), os níveis das substâncias prejudiciais à camada
de ozônio seriam cinco vezes superiores aos de hoje em dia, e os níveis
de radiação UV-B à superfície teriam duplicado nas latitudes médias do
hemisfério norte. De acordo com as estimativas atuais, espera-se que a
concentração de CFC na camada de ozônio regresse aos valores anteriores
a 1980 até ao ano 2050”. ANNAN, Kofi. Relatório Nós os Povos – o
Papel das Nações Unidas no Século XXI, PROGRAMA DAS NAÇÕES
UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Disponível em:
http://www.pnud.org.br/ [acesso em 21 mai. 2009].
35
PROTOCOLO DE MONTREAL SOBRE AS SUBSTÂNCIAS QUE
DETERIORAM A CAMADA DE OZÔNIO. Disponível em: http://
ozone.unep.org/Ratification_status/montreal_protocol.shtml [acesso
em 15 mai. 2009].

313
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

internacionais para a preservação ambiental. Dentre eles, destaca-se a maior


convenção sobre meio ambiente já realizada, a Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, que teve por sede a cidade
do Rio de Janeiro, e ficou conhecida como Eco-92. Durante esse encontro, foram
promulgadas a Agenda XXI, com 40 capítulos, divididos em quatro seções: as
dimensões sociais e econômicas para o desenvolvimento sustentável, a conservação
e gerenciamento dos recursos para desenvolvimento, o fortalecimento do papel
dos grupos principais e os meios de implementação; e a Declaração do Rio sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, que contém 27 princípios, dentre os quais, e.g.,
o desenvolvimento sustentável, princípio 1º; o consumo consciente, princípio 8º;
a participação dos cidadãos na preservação ambiental, princípio 10º; a precaução,
princípio 15º; e a importância dos povos indígenas no gerenciamento ambiental,
princípio 22º. Nesse mesmo ano, foi promulgada a Declaração de Dublin, sobre o
desenvolvimento e gerenciamento de recursos hídricos.
Em 1995, o Protocolo de Cartagena sobre Diversidade Biológica, cujo
objetivo, previsto em seu art. 1º, é assegurar um nível adequado de proteção no
campo da transferência, da manipulação e do uso seguro dos organismos vivos
modificados, resultantes da biotecnologia moderna, que possam ter efeitos adversos
na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica. No ano de 1996,
na Declaração de Santa Cruz de La Sierra, os Chefes de Estado e Governo das
Américas confirmaram a determinação de avançar em direção ao desenvolvimento
sustentável e implementar as decisões e responsabilidades constantes na Declaração
do Rio e na Agenda XXI.
Em 1997, no Japão, outra importante declaração foi promulgada – o Protocolo
de Kyoto36, que versa sobre as mudanças do clima e tem por meta a redução média
de 5% das emissões de gases poluentes, por parte dos países industrializados, como
forma de prevenção do efeito estufa. Finalmente, em 1998, a Declaração de Paris,
que aborda a Água e o Desenvolvimento Sustentável, e tem por base as deliberações
anteriores sobre a água, em particular, as conclusões das reuniões em Mar del Plata,
em 1977, Nova Déli, 1990, Dublin, 1992, e Noordwijk, 1994.
Os primeiros anos do novo milênio foram caracterizados, no cenário
internacional, pela ratificação e avaliação das declarações firmadas durante a década
passada. Assim foi com a Declaração de Haia, de março de 2000, que trata da

36
O Protocolo estabelece o chamado Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo, que permite aos países industrializados obter créditos de emissões
através de investimentos que permitam reduzir os níveis de emissões de
gases de efeito estufa nos países em desenvolvimento.

314
VoxJuris | Ano 2, v. 2, n. 1, pág. 293-319, 2009

Segurança Hídrica no Século XXI, corroborando as discussões iniciadas em Mar


del Plata, 1977, e Dublin, 1992, consolidadas no capítulo 18, da Agenda XXI, de
1992, e reafirmadas em Paris, em 1998. O mesmo ocorreu com a Declaração do
Milênio, promulgada durante a Conferência do Milênio, realizada em setembro de
2000, na cidade de Nova Iorque, e com a Conferência de Joanesburgo, na África
do Sul, em 2002, também denominada Rio+10, que teve por objetivo avaliar, após
dez anos, a evolução das propostas apresentadas durante a Eco 92.
Assim, o conhecimento científico produzido durante mais de 30 anos de
pesquisas encontra, no novo milênio, campo fértil para se expandir. A conscientização
ecológica fez com que a sociedade de hoje exija a utilização de técnicas que não
degradem o meio ambiente. Os legisladores estão voltados para a edição de leis
que digam respeito à preservação ambiental37, assim como os empresários passaram
a compreender que o gerenciamento de resíduos é fator importante no processo
produtivo. Muito já foi acordado para que o meio ambiente seja protegido e
preservado. Resta a árdua tarefa de colocar em prática aquilo que foi firmado.

7. Conclusão

Na sociedade cosmopolita moderna, é inequívoco que a proteção ao meio


ambiente assinala um imperativo de primeira ordem na agenda dos governantes
mundiais. A partir da Revolução Industrial, os níveis produção assumiriam
proporções até então inimagináveis àqueles que viviam no século XVIII, para
atingir seu ápice com a globalização, num cenário de transnacionalização do capital
e fragmentação do conceito de soberania dos Estados.
Como consequência, não apenas os sistemas econômico e político dos países

37
Cite-se a Lei n. 1838/91, do Estado do Rio de Janeiro, que determina,
em seu art. 1º, que o Poder Executivo promoverá, no prazo de um ano,
a substituição gradativa de todo seu material institucional e de uso diário
(envelopes, cartões, formulários, blocos, notas, recibos, papéis timbrados,
processos, boletins e publicações) por similares confeccionados em
papel reciclado. Disponível em: http://www.alerj.rj.gov.br/processo2.
htm [acesso em 15 de mai. 2009]. No mesmo sentido, o Projeto de Lei
Federal n. 1760, apresentado em 20 de agosto de 2003, que prioriza os
produtos oriundos da reciclagem de resíduos sólidos nas compras de bens
de consumo e duráveis, realizadas pelos órgãos da Administração Pública
Federal. Disponível em: http://www.camara.gov.br/sileg/prop_detalhe.
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modernos sofreram alterações substanciais, mas também os ecossistemas foram


demasiadamente sobrecarregados, de um lado, por uma extração sem limites de
recursos naturais não-renováveis e, de outro, pelos padrões de consumo adotados
na sociedade de massa. Contudo, o momento que a história mundial atravessa
oportuniza uma tomada de consciência em favor do meio ambiente, aliada à
ética empresarial e ao consumo responsável. Com a crise econômica, que põe em
xeque o mundo capitalista moderno, surge uma nova chance para se buscarem
alternativas que permitam congregar as perspectivas dos direitos humanos ligados
ao desenvolvimento sustentável. Não há mais tempo a perder. Ou se busca uma
solução em favor da sustentabilidade, ou o ser humano corre o grave risco de
conviver ao lado de uma degradação ambiental irreversível, que colocará em dúvida
a dignidade humana e sua própria existência no planeta Terra.

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