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12 de junho de 2010

OS ESTADOS UNIDOS E A ASCENSÃO


DE NOVOS PÓLOS: OS BRICS

CHINA
Prof. Marco Cepik

Apoio institucional: Apoio logístico:


Projeto “Relações Internacionais para Educadores” – 12 de junho de 2010
OS ESTADOS UNIDOS E A ASCENSÃO DE NOVOS PÓLOS: OS BRICS – CHINA

A ASCENSÃO DA CHINA NO SISTEMA INTERNACIONAL


Por Gihad Soares e Carlos Gorito1

A China, este gigante país situado a milhares de quilômetros de nós, está


diariamente dentre as notícias da mídia nacional e internacional. As matérias variam
desde indicadores de crescimento econômico, investimentos em infraestrutura na
África, disputas comerciais com os Estados Unidos, mediação de negociações com a
Coreia do Norte, entre outros. Para serem melhor compreendidas, estas informações
devem ser complementadas por uma análise mais profunda do que é a China, em toda
sua pujança. Seus aspectos políticos, históricos, econômicos e sociais são a chave para
esse entendimento. Essa é a proposta desta seção, em que se buscará não só analisar o
que a China representa hoje, mas também o que este país pode vir a representar para o
Brasil.

CHINA: UM BREVE PERFIL

A civilização chinesa foi uma das primeiras a se formarem no decorrer da História


e desenvolveu uma cultura muito característica. A fim de compreender o que é a China
hoje e como se está dando sua nova ascensão internacional, precisamos saber um pouco
sobre seus pilares, suas características e os desafios a serem enfrentados por ela.

A República Popular da China (RPC, cuja capital é Pequim, ou Beijing) é um país


situado no leste da Ásia, que Fig. 1: China
ocupa uma área de 9,6 milhões
de quilômetros quadrados (ver
Figura 1), sendo o terceiro
maior do mundo em extensão
territorial, mantendo fronteiras
com quatorze outros Estados.

Aproximadamente 1,3
bilhão de pessoas habitam o
território chinês. É a maior
população do mundo. Devido a
especificidades de geografia, Fonte: Folha Online.

1 Estudantes de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

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evolução histórico-social e expansão territorial, há uma enorme disparidade de


densidade populacional entre as regiões leste (costeira e populosa) e oeste (interiorana
e esparsamente povoada) do país. 91% dos chineses são da etnia Han; os cerca de cem
milhões restantes incluem 56 outros grupos étnicos reconhecidos pelo governo central,
o qual lhes concede significativa autonomia política.

O chinês mandarim, de escrita simplificada, é a língua dominante, mas coexiste


com uma série de dialetos regionais e línguas de minorias étnicas. As principais religiões
da China são o budismo e o taoísmo, e existem grupos expressivos de muçulmanos,
especialmente entre minorias étnicas, e de cristãos.

O país é governado pelo Partido Comunista Chinês (PCC), que tem o poder
garantido constitucionalmente. Outros oito pequenos partidos, regulados pelo PCC,
compartilham o Poder Legislativo. O sistema eleitoral nacional é indireto, partindo do
nível distrital até o nível nacional, e os chefes do executivo são determinados pelos
próprios membros do PCC.

História e formação

O embrião da China atual surgiu nos vales dos rios Amarelo e Azul. Acredita-se
que a primeira dinastia chinesa foi a Xia (em aproximadamente 2200 a.C.). Os Shang
dominaram a região em 1750 a.C., e foram sucedidos pelos Zhou, em 1100 a.C. Os dois
períodos seguintes (Período das Primaveras e Outonos e dos Estados Guerreiros) foram
determinados por guerras cada vez mais longas e sangrentas entre os reinos chineses.
Foi nessa época que surgiram três grandes correntes de pensamento que determinariam
a cultura chinesa: o taoísmo, o confucionismo e o legalismo. Enquanto as duas primeiras
disseminaram princípios de compaixão, humildade e virtude, o legalismo fixava que os
homens são maus, e são necessárias medidas rígidas para controlá-los. O confucionismo
também cria que o rei era o filho do Paraíso, com direitos totais de governar.

Em 221 a.C., a China foi unificada pelo reino de Qin. A nova dinastia Qin durou
pouco, ruindo em vista de uma revolução. A dinastia seguinte, Han, estendeu-se por
quatro séculos (206 a.C. - 220) e pode ser considerada a “era de ouro” da história
chinesa, tornando eficiente a coleta de impostos e pautando a burocracia em princípios
do confucionismo. Houve enorme avanço tecnológico, a exemplo da criação da porcelana
e do papel. A expansão Han permitiu o início da famosa Rota da Seda2, a oeste, e
estabeleceu relações de vassalagem3 com reinos periféricos.

2
Série de rotas comerciais marítimas e terrestres que conectavam o Oriente e a Europa. O trecho mais
comumente denominado Rota da Seda, contudo, é um percurso que atravessa o noroeste chinês.
3
Relação social em que um indivíduo – vassalo – oferece fidelidade e sua força de trabalho em troca de
abrigo e subsistência por parte de seu superior – suserano. Aplicada ao contexto internacional da Ásia

3
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Essa grande China, no entanto, foi acometida pela corrupção, pela


superpopulação e por invasões ao norte, e se desintegrou, dando fim à era Han. O
período seguinte, de 220 a 589, foi marcado por derramamento de sangue e desunião,
mas apresentou avanços tecnológicos (invenção da pólvora) e a penetração do budismo,
originado na Índia, pelo território chinês.

A dinastia Sui, do norte, unificou novamente a China em 589. Todavia, foi de curta
duração, sendo sucedida pela dinastia Tang em 618. A era Tang foi um novo pico na
história chinesa, com o enraizamento do budismo, numa variação própria da China, nas
bases da sociedade. O sistema de mandarinato – funcionários públicos selecionados por
concurso – foi criado nessa época, e seria importantíssimo para a manutenção da
unidade chinesa através do fortalecimento do governo central. A era Tang se encerra em
907. Uma dinastia duradoura, Song, viria em 960, após um período de rápidas sucessões
no poder.

Com a dinastia Song no poder unificado da China, houve um desenvolvimento


inédito das cidades chinesas. O crescimento do comércio ligou a costa e o interior, e
esboçou uma economia de mercado absolutamente inexistente na Europa à época.

A tecnologia agrícola, associada ao fluxo de arroz advindo do Vietnã, chegou ao


topo nesta era. Para Samir Amin (1973), essa suficiência na agricultura e o excedente de
mão-de-obra agrícola (em contraste com a escassez dela, na Europa) são apontados
como causas pelas quais o capitalismo não se desenvolveu na China antes que no
Ocidente.

A pressão dos invasores do norte, que já havia provocado a mudança da capital


da dinastia Song para o sul, acabou por desfazê-la para dar lugar a uma dinastia mongol,
Yuan, em 1279. O governo de ocupação mongol pode ser caracterizado por contatos
freqüentes com o Ocidente; a convocação de oficiais e burocratas era feita entre mongóis
e outras populações não-chinesas (do Oriente Médio, por exemplo). Foi conservada a
maior parte das instituições chinesas, embora os próprios chineses ficassem de fora
delas.

Os chineses retornaram ao poder sob a dinastia Ming. Tanto o Grande Canal como
a Muralha da China, obras iniciadas muitas dinastias atrás, foram terminados ou
aperfeiçoados pelos Ming. Também foi sob o império Ming que os chineses organizaram
expedições marítimas pelo Oceano Índico, até a costa leste africana, quase um século
antes de Cristóvão Colombo ou Vasco da Gama. Essas viagens foram encerradas em
1433, devido à desaprovação de setores conservadores do império, e à necessidade de
concentrar esforços financeiros na defesa do norte, pressionado pelos mongóis. Em
seqüência, houve um processo de fechamento da China em si mesma, no antigo modelo
agrário.

Oriental à época, significa basicamente a aceitação, por parte dos outros Estados, da superioridade da
China.

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Em 1644, os manchus, etnia não-chinesa, dominaram a China e fundaram a


dinastia Qing. Sua administração era radicalmente baseada nos princípios chineses,
conservando o mandarinato e suas instituições burocráticas. Mesmo assim, não havia
igualdade de direitos entre chineses e manchus, casamentos entre as duas populações
não eram permitidos, e a ocupação da Manchúria por chineses era vetada.

A defesa do país contra invasores era extremamente rigorosa: os Qing


conquistaram a Mongólia, o Tibete e Taiwan, e tinham repulsa a contatos com o Ocidente
(lembrando que os Estados-nação europeus já estavam em franco desenvolvimento). No
entanto, fechar-se para os comerciantes e missionários europeus apresentou-se como
não sendo a melhor forma de lidar com o problema, e inicia-se, ainda na dinastia Qing,
uma era de submissão e desmantelamento da China.

Embora os chineses tenham doado, na dinastia Ming, o porto de Macau (ver


Figura 2) para Portugal, sua reação às tentativas
Fig. 2: Macau
de estabelecer relações comerciais por parte dos
europeus foram negativas. De qualquer forma, o
comércio com o Ocidente começou, seguindo
parâmetros tradicionais chineses. As potências
ocidentais tinham muito interesse no chá e na
seda da China, enquanto esta pouco ou nada
desejava dentre os produtos de exportação Fonte: Wikimedia Commons.
europeus e norte-americanos.

O governo britânico foi o primeiro a pensar numa maneira de reverter o déficit


comercial4 que tinha com a China. Sua solução foi introduzir o algodão, produto de sua
colônia na Ásia meridional, a Índia, e o ópio. O comércio deste era ilegal no Império, mas
essa restrição foi burlada pela busca de lucro dos novos mercadores chineses e pela
corrupção da burocracia. Quando o governo chinês finalmente agiu contra o comércio da
droga, provocou uma guerra com a Inglaterra, a primeira Guerra do Ópio, que exacerbou
sua desvantagem militar em relação às potências ocidentais.

A derrota chinesa na primeira Guerra do Ópio foi estabelecida no Tratado de


Nanquim de 1842, que determinou a abertura de mais portos chineses ao comércio
exterior, a diminuição das tarifas para produtos britânicos e a cessão de Hong Kong à
Grã-Bretanha. O tratado foi seguido de mais incursões e conflitos com os estrangeiros,
além da abertura de mais portos para o comércio externo.

O caos político, fomentado por rebeliões populares, intervenções estrangeiras


explícitas e problemas sociais, foi acompanhado de tentativas fracassadas de
fortalecimento e de reformas na burocracia. Em 1911, foi proclamada a República da

4 Situação em que as importações de um país superam suas exportações.

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China, através de uma revolução encabeçada pelo líder Sun Yat-sen, pondo fim a quatro
milênios de reinos e impérios.

A nova república chinesa, fraca como estava, alinhou-se com os Aliados na


Primeira Guerra Mundial. O Tratado de Versalhes, que deu fim à guerra, descumpriu a
promessa de devolver a área de influência alemã na China aos próprios chineses, dando-
a para os japoneses. Esse fato gerou inúmeros protestos em Pequim em 1919, que
acabou intensificando o nacionalismo no povo chinês.

Sun Yat-sen, até sua morte em 1925 iniciou a unificação efetiva do país, em
detrimento dos caudilhos regionais, contando com o apoio dos comunistas e do regime
soviético. Foi Chiang Kai-shek quem se tornou o novo chefe do Partido Nacionalista
(chamado Kuomintang) e continuou a unificação nacional. Entretanto, rompeu com os
comunistas, promovendo o Massacre de Xangai,5 em 1927.

A partir de 1927, uma guerra civil se instalou no país entre o Partido Comunista e
o Kuomintang, com interrupções apenas quando da luta contra a ocupação japonesa (e
na Segunda Guerra Mundial). Devido à perseguição dos nacionalistas de Chiang Kai-
shek, os comunistas fugiram e espalharam-se pelo campo, realizando a Longa Marcha6,
de 1934 a 1936.

Após anos de luta, o Kuomintang - abalado por corrupção, endividamento e


desorganização – abre uma fresta para o avanço dos comunistas que estavam instalados
no norte e nordeste do país em acampamentos guerrilheiros. A proclamação da
República Popular da China (1949), Fig. 3: Taiwan
encabeçada pelo líder revolucionário Mao Tsé-
Tung, tão logo foi reconhecida pela União
Soviética. Gradativamente, outros países,
sobretudo do bloco socialista, reconheceram o
regime, enquanto os aliados dos Estados
Unidos reconheciam o domínio de jure da
República da China – isto é, o governo
estabelecido pelos nacionalistas em Taipei, na
ilha de Taiwan (ver Figura 3), após a derrota
para os comunistas na porção continental. Fonte: Folha Online.

Em 1953, é colocado em prática o primeiro plano qüinqüenal da China, com


inspirações no modelo econômico soviético7. A União Soviética, aliás, foi o principal
parceiro do governo comunista chinês em seu início. Em 1958, Mao decide acelerar o

5
Episódio em que centenas de comunistas, trabalhadores e estudantes foram mortos em Xangai e outras
cidades do país, em ações promovidas por frações direitistas do Kuomintang.
6
Processo histórico em que os comunistas chineses se disseminaram pelo interior do país, e percorreram
12 mil quilômetros de norte a sul, conquistando os postos locais.
7
Modelo de planejamento da produção e dos investimentos nacionais, executado na União Soviética até
seu colapso em 1991.

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desenvolvimento econômico e a implementação do socialismo com o Grande Passo


Adiante. Essa política centrava-se na coletivização da agricultura e na dispensa de mão-
de-obra para o trabalho industrial. Provou ser um fracasso ao provocar a pior fome não
causada por condições naturais da história da Humanidade.

Desde 1949, quando firmada a aliança sino-soviética, a relação sino-soviética


gradativamente se enfraqueceu, dado as ideológicas na maneira de manejar o
comunismo e a revolução.Em 1969 a relação é rompida com um conflito no extremo
leste da fronteira entre os dois países.

Desde o fracasso do Grande Salto Adiante, reformas foram feitas na economia


chinesa e levaram a uma suposta suavização ideológica da população e do Partido
Comunista. Em reação a isso, Mao Tsé-Tung lança a Revolução Cultural em 1966. Sob a
bandeira da nova revolução, o líder remobilizou a população contra a liderança
comunista de então, formando as famosas Guardas Vermelhas de universitários e
estudantes. Ocorreram vários ataques a nomes do Partido Comunista, o qual se
desmantelou quase por completo, concentrando poder nas mãos de Mao e instaurando o
caos no país. A partir de 1969, houve a reestruturação do partido, com o surgimento de
correntes moderadas lideradas por Zhou Enlai, em oposição ao radicalismo maoísta. O
processo de renovação partidária ocorreu até 1976, com a morte de Mao. Em 1977,
Deng Xiaoping, líder político exonerado duas vezes sob o governo de Mao, foi restituído
em seus postos governamentais e viria a determinar todo o futuro da China, em especial
sua economia, a partir das reformas que promoveria.

A CHINA DE HOJE: PANORAMA INTERNO, CARACTERÍSTICAS E DESAFIOS


IMEDIATOS

Em trinta anos, a China se transformou radicalmente, passando de uma economia


socialista de planejamento centralizado e isolamento internacional, a uma economia
mista altamente competitiva no plano global, suprida por fatores produtivos
abundantes. Entre 1982 e 2000, o Produto Interno Bruto (PIB) chinês quadruplicou.
Hoje, é o terceiro maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da União
Europeia.8

O pontapé inicial da transformação econômica do país foi dado pelas reformas


modernizadoras de Deng Xiaoping, centradas na agricultura, indústria, defesa nacional e
ciência & tecnologia. As primeiras modificações concentraram-se na esfera agrícola, com
o fim da coletivização no campo e a criação de propriedades familiares, ainda que sejam
formalmente consideradas de propriedade estatal. O país se abriu para o comércio

8 Segundo dados de 2009 no IMF World Economic Outlook. <www.imf.org>

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exterior, com a criação de zonas econômicas especiais (ZEE) localizadas na costa sul,
que, com políticas flexíveis de negócios e um ambiente propício ao empreendedorismo,
atraíram investimentos estrangeiros maciços.

Os efeitos dessas modernizações sobre a economia e a sociedade chinesas como


um todo foram impressionantes – atualmente, a China é o maior exportador do mundo, e
o segundo maior importador.9 Desde a década de 1980, a taxa de crescimento
econômico anual da China caminha a passos largos, tendo atingido 13% em 2007.10 11
Naturalmente, tais fenômenos agregados trazem uma série de desafios à administração
da nação.

Se, por um lado, as reformas de Deng Xiaoping iniciaram o vigoroso crescimento


do produto econômico chinês, trouxeram também o aumento das desigualdades de
renda entre as regiões, e a maior liberdade econômica diminuiu sensivelmente a
arrecadação de tributos e fragilizou o poder e a influência do governo de Pequim.
Ademais, a situação de diversas empresas estatais deficitárias tornou-se insustentável
diante da nova concorrência internacional, e a concessão de crédito emergencial por
bancos estatais a estas firmas tornou-se uma questão de política econômica importante.

O influxo de investimentos estrangeiros diretos, estimulados pelo baixo custo e


alta lucratividade da produção e pela promessa de um enorme mercado consumidor em
expansão, tornou-se imprescindível para a continuidade da expansão econômica
chinesa. No entanto, a estratégia reformista de privatização de pequenas empresas e de
permissão da combinação do capital público com o privado nas grandes empresas, ao
mesmo tempo em que atraiu investidores externos, não foi acompanhado de um
ambiente regulatório à altura, trazendo riscos ao país no caso de uma recessão
econômica. Neste caso, a crescente dependência dos capitais estrangeiros poderia
configurar um problema face à eventual fuga desses capitais12, causada por uma crise,
desestabilizando ainda mais a economia.

A matriz energética chinesa é bastante dependente do carvão mineral, sendo este


responsável por 65% de toda geração de energia do país13, que é o maior produtor e
consumidor do mundo. O uso do carvão na China, além de altamente poluente, enfrenta
problemas de distribuição, com o uso de padrões tecnológicos e de segurança
antiquados em minas de carvão, onde o número de acidentes é considerável.14 O

9 WTO International Trade Statistics 2009, disponível em <www.wto.org>


10 CIA The World Factbook, disponível em <https://www.cia.gov/library/publications/the-world-
factbook/>
11 As taxas de crescimento de 2008 e 2009 foram de, respectivamente, 9,0 e 8,7%. Essa queda percentual

ocorreu em vista da crise econômica mundial iniciada no fim de 2007.


12
Fuga de capitais é a retirada de dinheiro aplicado em fundos quaisquer (títulos públicos, por exemplo)
em vista da incerteza quanto à rentabilidade futura desses fundos.
13 Dados retirados do report de 2009 para a China, pela companhia Jane’s Information Group.
14 “Mina inunda e deixa 123 trabalhadores presos na China”, Folha Online

<http://www1.folha.uol.com.br/folha/videocasts/ult10038u713664.shtml>

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consumo nacional de petróleo (ver Figura 4), que já é o segundo maior do mundo15,
cresce com rapidez, refletindo-se no aumento vertiginoso das importações, como mostra
o gráfico abaixo.

Fig. 4: Importações chinesas de petróleo, em US$ milhões

Fonte: International Trade Statistics 2009, WTO

Essa tendência não se limita ao petróleo, mas sim se estende para outras
commodities16 como produtos químicos e materiais plásticos.17 Diante disso, o governo
central tem dado ênfase ao desenvolvimento de fontes energéticas alternativas ao
carvão, tais como hidrelétricas, usinas de gás natural e de fissão nuclear.18

Além da crescente demanda por recursos naturais, outro problema enfrentado


para a gestão político-econômica da China reside nos seus recursos hídricos. A sobre-
exploração, por meio, por exemplo, da construção desenfreada de usinas hidrelétricas
nos cursos de rios, tem causado escassez e dificuldades de distribuição nas cidades e no
campo. Dois terços das cidades chinesas não têm garantia de fornecimento constante de
água no decorrer do ano. O fenômeno da desertificação de terras aráveis se tem
intensificado de ano em ano – o que pode vir a danificar severamente a capacidade
produtiva agrícola dos únicos 15% de terras chinesas que são próprias ao cultivo.19
Ademais, a poluição de águas subterrâneas pela chuva ácida, e dos rios pelos dejetos
industriais, agrava toda a questão.

15 Op. cit.
16 Termo utilizado para fazer referência a produtos em seu estado bruto (matérias-primas) ou com baixo
valor agregado (de processamento industrial simples).
17 O comércio entre Brasil e China é fortemente determinado por essa tendência. No ano de 2009, segundo

dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, 46% das exportações brasileiras
são compostas de minérios (ferro, manganês, petróleo, zinco, etc.)
18
Jane’s (2009).
19 Op. cit.

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No plano social, indicadores mostram o inegável avanço do desenvolvimento


chinês nas últimas décadas. Dados do PNUD20 demonstram uma elevação do Índice de
Desenvolvimento Humano21 da China de 0,530 para 0,777 no período 1975-2005. Em
1978, adotou-se na China a política do filho único, que restringe o número de filhos por
casal através de multas e condicionamento de direitos sociais à obediência da política.
Desde 1978, então, o número de pessoas abaixo do nível de pobreza determinado
nacionalmente caiu de 250 milhões para 14,79 milhões em 2007. A população urbana,
no mesmo período, saltou de 17,92% para 44,94%. No entanto, essa crescente
urbanização deixa clara uma característica do desenvolvimento chinês: com a expansão
do crescimento econômico pelas províncias costeiras e orientais, iniciou-se um processo
intenso de êxodo rural. O campo chinês tem se desenvolvido a passos muito mais
vagarosos, e as desigualdades regionais avançam, com a concentração
desenvolvimentista nas cidades e com as migrações de mão-de-obra para os centros
urbanos. Essa massa populacional desprendida da terra passou a formar um exército de
mão-de-obra barata que, embora auxilie o setor industrial, representa uma ameaça à
ordem nacional.

Ademais, o aumento do desemprego urbano real, aliado à persistência do sistema


hukou (um sistema tradicional de registro de habitantes em seus locais e atividades de
origem, que restringe o acesso dos migrantes rural-urbanos a serviços básicos), vem
gerando descontentamento, com o potencial de provocar crises políticas. Já no campo, a
constante desapropriação pelo governo de terras ocupadas por famílias para “projetos
de desenvolvimento”, como fábricas e represas, revolta os camponeses, já perplexos com
os efeitos reais da poluição sobre suas colheitas e a percepção de corrupção local
desvelada.

De uma maneira ou de outra, o esforço do governo chinês para expandir a


economia e distribuir a prosperidade obtida para seu povo acaba por trazer o equilíbrio
nos casos específicos de protestos por melhores condições estruturais de vida.

Quanto aos regionalismos, todavia, o panorama muda. A estratégia do PCC é


focada no incentivo a migrações de chineses Han para as áreas sensíveis, a fim de 1)
realizar um processo de assimilação cultural das minorias étnicas; 2) promover a
construção de infraestrutura de transportes para maior integração dessas regiões com o
restante do país; e 3) conceder autonomia política relativa às regiões, dentro das
instâncias representativas do governo central.

O caso mais latente de regionalismo em território chinês é o Tibete (ver Figura 5),
cujo movimento separatista é reconhecido internacionalmente – sobretudo sob a figura
do líder espiritual Dalai Lama, cujo governo-em-exílio localiza-se na Índia.

20 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. China Human Development Report. 2007-2008:
Basic Public Services Benefitting 1.3 Billion People. PNUD, Pequim.
21 Indicador numérico gerado por índices de dezenas de parâmetros distintos, agrupados em riqueza,

educação e expectativa de vida, que classificam a qualidade de vida da população de um país ou lugar.

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Fig. 5: Tibete Hong Kong também apresenta movimentos


reivindicativos por democracia completa e abandono
da política de “uma nação, dois sistemas”
implementada pelo PCC, mas não representa uma
ameaça imediata à unidade nacional.

Xinjiang (ver Figura 6), a região mais a


noroeste da China, é um foco de tensão étnica entre a
população uigur, de origem turca centro-asiática, e os
chineses Han. Os últimos atritos ocorreram em 2009,
Fonte: Folha Online. quando protestos inicialmente pacíficos dos uigures
resultaram em combates violentos com a população
Fig. 6: Xinjiang Han.

No curto prazo, a gestão política chinesa


trabalha constantemente sob o espectro de
superaquecimento econômico. Nos médio e longo
prazos, surgirão novas provocações, como os impactos
da “política do filho único” sobre a população
economicamente ativa e os crescentes gastos com
seguridade social, dado o envelhecimento
demográfico. Enfim, numa nação de dimensões
continentais, a manutenção da unidade constitui
sempre uma árdua tarefa.
Fonte: Universidade do Havaí.

China e sua inserção no sistema internacional

Logo após a Revolução Comunista de 1949, a República Popular da China


estabeleceu-se como um país comprometido com a propagação da revolução para o
restante do planeta. Para isso, contava com a tutela da União Soviética, sua maior aliada.
Todavia, nos anos 60, exacerbaram-se as divergências doutrinárias existentes entre
chineses e soviéticos há alguns anos, o que levou ao rompimento de relações entre as
duas maiores nações comunistas do mundo – e até a uma guerra de fronteira em 1969. A
perda do apoio político soviético lançou a China num esforço unilateral de afirmação
internacional, principalmente no bloco socialista.

Desde as Quatro Modernizações22, com a mudança no padrão de


desenvolvimento para um baseado no crescimento econômico sustentado, a política
externa chinesa tem sofrido alterações básicas. Percebeu-se a necessidade de um

22 Nos campos da agricultura, indústria, defesa nacional e ciência & tecnologia.

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ambiente internacional estável e pacífico, para assim eliminar preocupações imediatas


de segurança e dar cabo do projeto desenvolvimentista. Esse fundamento político molda
um comportamento de cooperação e tentativa de construção de uma imagem
internacional positiva por parte da China, a fim de convencer tanto os países vizinhos
quanto as potências globais de que não há ameaças no fortalecimento interno chinês; em
outras palavras, implementa-se a política da “ascensão pacífica”.23

Certamente, uma das áreas em que a ascensão pacífica mais se manifesta é na


diplomacia comercial. Já que uma enorme parcela da prosperidade da economia chinesa
se deve à dinamização do seu setor externo, torna-se imprescindível proteger os canais
de investimento estrangeiro e de comércio exterior. Para tanto, a República Popular da
China adota uma política de negociação flexível, livre de teor ideológico ou doutrinário e
de baixíssimas exigências políticas de seus parceiros comerciais. A obtenção de
fornecedores de combustíveis fósseis para a geração de energia é provavelmente a
prioridade da China nessa área, em vista do crescimento de sua demanda energética.

Ao mesmo tempo, a importação de energia é o ponto mais sensível de sua política


comercial. Pelo fato de os mercados energéticos mundiais estarem atualmente
dominados pelos Estados Unidos e seus aliados mais próximos, a China satisfaz suas
necessidades energéticas por meio de acordos bilaterais com países vistos com
restrições pela comunidade internacional, tais como Irã, Sudão e Myanmar.24 Isso
evidentemente gera atritos diplomáticos, com a previsão de agravamento futuro. O
relacionamento da China com esses países muitas vezes se estende à área militar, pela
venda de material bélico – mais um motivo para a reprovação da “baixa seletividade
política” dos negócios chineses.

Nos últimos anos, a China tem contribuído sensivelmente para o progresso de


organismos e mecanismos de integração e cooperação internacional. A resposta chinesa
à crise financeira asiática de 1997, com a articulação política com a ASEAN25 e a recusa
de desvalorizar o renminbi26 para estimular suas exportações, estimulou a integração
regional do Sudeste da Ásia. A entrada da China na Organização Mundial do Comércio
(OMC), em 2001, foi extremamente benéfica para a economia chinesa e, em muitos
aspectos, para a economia global.

A Organização de Cooperação de Shanghai (OCS), por sua vez, tendo objetivos de


coordenação militar contra o terrorismo e em prol da estabilidade na Ásia Central,
demonstra outra faceta, ainda ambígua e moderada, da política externa chinesa: a
promoção da multipolaridade. Juntamente com a Rússia e quatro repúblicas centro-

23 Termo usado pela primeira vez por Zheng Bijian, alto membro do PCC, em um encontro do Fórum Boao
para a Ásia, em 2003.
24
São países que, grosso modo, não possuem governo democrático e são acusados de violações nos direitos
humanos.
25 Organização internacional composta de dez países do Sudeste Asiático, que tem como objetivo

coordenar o desenvolvimento econômico e as questões de segurança da região.


26 Moeda nacional chinesa.

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asiáticas, a China promove a articulação estratégica em uma região que, nos últimos
anos, tem visto crescer a quantidade de tropas, a influência e a ação concreta dos
Estados Unidos da América.

Simultaneamente, a China tenta manter sua política silenciosa e amigável no


plano internacional, pela conformidade e obediência a organismos internacionais
característicos da ordem estabelecida (ONU, OMC, FMI, etc.), e advoga pela ascensão de
novos pólos de poder no denominado Terceiro Mundo.

Fig. 7: Mar da China Meridional e Ilhas Os países que circundam a China, bem como
Spratly as potências globais, enxergam-na de acordo com a
evolução histórica conjunta pela qual passaram.
Japão, Índia e principalmente o Sudeste Asiático
temem a restauração de um sistema regional
hierárquico baseado na centralidade chinesa, o que
de certa forma lhes tiraria a soberania e seria uma
ameaça à segurança nacional. Talvez por isso o
foco da política externa de Hu Jintao, atual
presidente chinês, esteja nas questões regionais e
periféricas. Procura-se estabelecer relações sólidas
com os países do sudeste asiático, o que se
expressa pelas iniciativas de integração dos
últimos anos e pelo apaziguamento de disputas
Fonte: Spartly.com
territoriais no Mar da China Meridional pelas ilhas
Spratly (ver Figura 7) e outras.

Nesse contexto, Índia e China reconhecem-se como potenciais rivais pela


dianteira política asiática, dadas suas populações, recursos naturais e taxas de
crescimento de magnitudes similares. Na alta época da Guerra Fria, as duas mantinham
relações hostis, ocorrendo inclusive uma guerra de fronteira em 1962. Pequim sempre
apoiou o Paquistão e seu programa militarista anti-indiano. Contudo, na década de 1990,
intensificou-se um processo de reaproximação entre os dois países, com acordos de
segurança e operações militares conjuntas. Entretanto, a melhoria das relações entre
China e vizinhos da Índia ainda causa temor a esta, a qual tem de administrar o desejo de
Washington de criar, em Nova Déli, um contraponto político-diplomático à ascensão de
Pequim.

As relações sino-japonesas, indissociáveis do legado histórico da Guerra Sino-


Japonesa27 e da II Guerra Mundial, e acompanhadas de perto pela opinião pública
chinesa, são pautadas na desconfiança. Japão e China são parceiros comerciais vitais um
para o outro, e seu comércio é mais ou menos balanceado. Todavia, já ocorrem disputas

27Em 1931, o Japão inicia sua invasão da China pela Manchúria, ao norte. Em 1937, atritos pontuais entre
as forças chinesas e japonesas se transformaram numa guerra total, que acabaria somente em 1945.

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por fontes energéticas, a exemplo do redirecionamento de um projeto russo de gasoduto


da China para o Japão. Para alguns analistas, a ascensão chinesa ameaça a posição
japonesa de potência regional asiática.28 A resposta japonesa é estreitar sua aliança
militar com os Estados Unidos, com a possível construção de uma barreira contra
mísseis balísticos em parceria com os EUA.

A Rússia, desde o rompimento de suas relações com a China em 1969, ainda no


período soviético, manteve-se afastada. Em 1992, assinou-se uma declaração de
restauração de relações amigáveis entre os dois Estados, após a demarcação de quase
toda a fronteira russo-chinesa. Moscou é um dos principais fornecedoros de material
bélico para a China, sobretudo desde o embargo da União Européia em vista do
Massacre na Praça da Paz Celestial (1989)29. Há coordenação militar no escopo da
Organização de Cooperação de Shanghai30, e relações comerciais de energia. Ao mesmo
tempo em que Pequim e Moscou cooperam pelo contraponto aos Estados Unidos e
contra a disseminação do fundamentalismo islâmico na Ásia Central, cada lado estuda
minuciosamente a aproximação do outro em relação a Washington. Em suma, existe aí
uma relação incerta, baseada quase puramente em alguns objetivos comuns.

Os Estados Unidos da América mantêm hoje uma relação vital e indissociável com
a China. Pequim depende dos investimentos e do consumo norte-americano, enquanto
Washington encontra na China um fornecedor de bens manufaturados a baixo custo. As
crescentes reservas chinesas de moedas estrangeiras fortes, sobretudo o dólar, são
usadas para comprar títulos da dívida pública do Tesouro americano, e assim sustentam
os gastos governamentais. Dessa forma, a China encontra uma forma de manter o
renminbi desvalorizado, estimulando suas exportações.31 Esse sistema relacional gera
um déficit comercial gigantesco do lado norte-americano, e estimula acusações de
manipulação econômica e concorrência desleal contra a China.

Em 2009, após o impacto da crise econômica mundial de 2008, emergiu na mídia


internacional um conceito que circula em círculos acadêmicos norte-americanos desde
2006. Trata-se de um “G2” composto por Washington e Pequim, cuja coordenação
passaria a balizar a economia mundial. Essa proposta vem em uma época em que o G832
se mostra obsoleto e o G2033 diverso demais para reagir de forma eficaz aos desafios

28 Em 2005, Taro Aso, então Ministro dos Assuntos Exteriores do Japão, afirmou que “a China é um país
vizinho com armas nucleares, e seus gastos militares estão aumentando há 17 anos. Ela está começando a
apresentar-se como uma ameaça considerável.”
29
Episódio em que protestos pró-democracia foram sufocados por forças militares, o que resultou em
aproximadamente três mil mortos.
30 Ver material de apoio “Os Estados Unidos e a ascensão de novos pólos: os BRICs – Rússia”, de 29 de

maio de 2010.
31 Quando um país gasta suas reservas de moeda forte, a moeda nacional fica mais barata em relação às

moedas fortes, e isso barateia as exportações.


32 Grupo das sete nações mais ricas do mundo (Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha,

Itália e Japão) mais a Rússia, para coordenação política e econômica.


33 Grupo que reúne os 19 países com as maiores economias do mundo mais a União Europeia, para

articulação do debate financeiro e econômico mundial.

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econômicos internacionais. No entanto, a ideia não consegue conquistar apoio da China,


já que assumir abertamente a liderança mundial vai contra a defesa chinesa do
multilateralismo, além de desagradar países como Japão e Rússia. No entanto, a mera
existência de tal conceito demonstra a crescente coordenação de ação política a nível
global entre China e Estados Unidos, e o reconhecimento do peso de Pequim no cenário
internacional.

O fortalecimento político da China no âmbito regional e no sistema internacional


provoca preocupações intensas em Washington. Pequim já expressou diversas vezes o
seu desejo de um mundo multipolar, embora sua política externa siga linhas pragmáticas
e moderadas. O ponto mais sensível da relação EUA-China é a questão de Taiwan:
Pequim considera a ilha como uma província dissidente e um assunto político interno.
Ademais, o governo da RPC reserva-se o direito de resposta militar a uma declaração
oficial de independência por parte de Taipei. Os Estados Unidos, por meio do “Taiwan
Relations Act”34, assumem que qualquer tentativa de violação da soberania de Taiwan
será tratada pelo governo estadunidense como uma ameaça à sua segurança nacional.
Isso obviamente restringe e torna mais delicadas as ações de Pequim, e complica o
triângulo político Washington-Taipei-Pequim. Além disso, a presença norte-americana
em bases na Ásia Central35 é reprovada pela China, mas acaba por deter o avanço do
terrorismo e fundamentalismo pela fronteira oeste chinesa, o que poderia incitar o
movimento pelo separatismo da região autônoma de Xinjiang.

A despeito dos receios mútuos, as relações sino-americanas devem manter-se


estáveis. As pressões estadunidenses para valorizar a moeda chinesa podem mostrar-se
contraproducentes para a economia americana, pois isso se fará com a venda de títulos
da enorme dívida pública do Tesouro americano. Dificilmente a prosperidade e a
profundidade das relações econômicas entre China e Estados Unidos serão rompidas
severamente por fricção estratégica, a não ser que esta se intensifique de maneira
inédita.

CHINA E BRASIL: GIGANTES DESCONHECIDOS

O Brasil e a República Popular da China estabeleceram relações diplomáticas em


15 de agosto de 1974. Evidentemente, uma relação informal já se estabelecera antes
desse ano, podendo-se traçar um histórico desde uma época de desconhecimento
mútuo, no século XIX. Desde então, vem se construindo uma sólida parceria político-

34
Ato legislativo aprovado pelo Congresso dos Estados Unidos em 1979, em vista do reconhecimento da
República Popular da China em detrimento da República da China (Taiwan). Esse ato firmava o
comprometimento norte-americano com Taiwan, mesmo com o fim de relações diplomáticas formais
entre eles.
35 Há duas bases, uma no Quirguistão e outra no Uzbequistão.

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econômica entre os dois megaestados, condizente com os objetivos externos de ambos


no sistema internacional.

Durante a Guerra Fria, sobretudo suas primeiras décadas, Brasil e China


consideravam-se países distantes, em contextos regionais radicalmente distintos, e
pouco sabiam um do outro. Em 1952, o governo brasileiro abre uma embaixada em
Taipei, capital da República da China (Taiwan). Além do não-reconhecimento político do
regime da região continental, o intercâmbio econômico era perto do inexistente. Só no
governo de Jânio Quadros (1961), sob seu projeto de Política Externa Independente
(PEI), seria enviada uma missão econômica oficial à China, com a participação do vice-
presidente João Goulart.36 Mesmo depois da adoção de linhas de política externa que
almejavam a independência internacional, os esforços do Brasil não eram fortemente
direcionados à Ásia, mas sim à África e ao Oriente Médio. Ademais, o maior parceiro
econômico do Brasil na Ásia era o Japão.

A partir de 1974, seguindo o exemplo dos Estados Unidos, houve a aproximação


política entre Brasília e Pequim, em detrimento de Taipei. Ela foi respaldada por
semelhanças na política externa desses países, nas questões da busca pela autonomia
internacional, ênfase na soberania nacional e na integridade territorial, e oposição à
“diplomacia dos direitos humanos”37 dos norte-americanos. Em outras palavras, o novo
perfil de atuação internacional do Brasil, com realce para a causa dos países
subdesenvolvidos e para a cooperação Sul-Sul, era legitimado pelos laços sino-
brasileiros.

A década de 90 assistiria a uma real intensificação dos laços entre China e Brasil,
com o florescimento do intercâmbio comercial, inserido num contexto de priorização da
Ásia na política externa brasileira, tanto estratégica quanto comercial. O intenso
crescimento econômico chinês passa a ser auxiliado pela exportação brasileira de
matérias-primas e insumos básicos, enquanto o Brasil se interessa cada vez mais pelo
promissor mercado de consumo chinês e pelo acesso à tecnologia de ponta. A possível
formação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) gerou ares de desconfiança
para os interesses comerciais chineses e asiáticos em geral, estimulando o aumento das
relações do Brasil, nação que desempenha um papel-chave para o panorama latino-
americano.

China e Brasil adotam posturas similares em relação a diversos temas de política


internacional. A obediência às regras dos organismos internacionais mais importantes
lhes confere legitimidade para defender questões de primazia para os países
emergentes, sem promover grandes rompimentos nas suas relações com países

36 Quando do Golpe Militar de 1º de abril de 1964, João Goulart encontrava-se exatamente em missão
oficial à Republica Popular da China.
37 Linha de política externa adotada pelos Estados Unidos sob o governo de Jimmy Carter (1977-1981),

que, através do discurso da universalidade dos direitos humanos, legitimava exigências norte-americanas
junto a governos de outros países.

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desenvolvidos, sobretudo Estados Unidos. Contudo, os objetivos de política externa da


China limitam o escopo de suas ações segundo os próprios princípios de ascensão
pacífica. Portanto, o papel de liderança internacional que o Brasil vem tentando
construir nos últimos anos não é seguido lado a lado pelo comportamento chinês, o qual
se concentra em assuntos regionais e numa resistência ao engajamento aberto em
tópicos controversos. No tema do programa nuclear do Irã, por exemplo, em pauta nas
discussões internacionais, viu-se a China responder cautelosamente, enquanto o Brasil
estendia seus serviços para conversas diretas com o governo iraniano.

Enquanto a dinamização da cooperação sino-brasileira em medicina, farmácia,


engenharia de satélites, biotecnologia, informática e outros campos acompanha a
coordenação de ações políticas (OMC, ONU, BRIC), é necessário avaliar cuidadosamente
a mudança no perfil das relações econômicas entre China e Brasil. A China, em 2009,
ultrapassou os Estados Unidos como maior parceiro comercial do Brasil, mas o inverso
está longe de ocorrer. Adicionalmente, o sistema de troca de matérias-primas por
manufaturados pode não indicar uma relação característica de Sul-Sul, mas de Norte-Sul.
Os principais produtos brasileiros exportados para a China são minerais (ferro, petróleo,
manganês, cobre) e produtos agrícolas (soja, açúcar), enquanto a China vende para o
Brasil produtos de tecnologia intensiva – monitores, circuitos, microprocessadores,
maquinário, etc.38 Portanto, há desafios a serem resolvidos, e custos ainda
despercebidos a serem subtraídos de benefícios.

CONCLUSÃO

É impossível ignorar as mudanças pelas quais está passando a China e seu papel
no sistema internacional. O crescimento sem precedentes de sua economia não é o único
processo que deve ser analisado; o aumento de suas capacidades militares nos últimos
anos, seu estilo próprio de negociação em fóruns e discussões internacionais e sua
importância no comércio internacional são apenas alguns dos novos aspectos a serem
levados em consideração em qualquer análise que rompe com a superfície do que
sabemos acerca da China. Ademais, além de mudar em si mesma, a China muda nos
olhos de outros países. A emergência do dragão chinês é percebida de maneiras
diferentes pelos mais diversos países: seus vizinhos, os Estados Unidos, o Brasil, etc.

No entanto, a trajetória do desenvolvimento chinês não é simples como pode


parecer. A manutenção da estabilidade política interna, a racionalização de seus
recursos naturais, seu sistema econômico ainda na transição do planejamento central
para o livre mercado e a reforma de sua infraestrutura para acompanhar o crescimento

38 Dados da balança comercial brasileira com a China podem ser obtidos no sítio do Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, em www.mdic.gov.br.

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econômico são desafios crônicos enfrentados pelos formuladores de políticas públicas


da China. Visto que o equilíbrio interno é imprescindível para atingir os objetivos de
política internacional, o Partido Comunista Chinês hoje lida com um delicado balanço de
questões internas e problemas externos (segurança na Ásia Central, o impasse na
Península da Coreia, os contenciosos de fronteira com a Índia, a coordenação econômica
com os Estados Unidos) para dar cabo de suas metas para o futuro. Resta-nos aguardar
saber por que meios a China fará a manutenção de sua ascensão internacional, até onde
esse processo pode chegar e quais serão as implicações para o Brasil dessa
redistribuição de poder no sistema internacional a favor de Pequim.

LEITURAS COMPLEMENTARES39
Leitura obrigatória
PAUTASSO, Diego. O lugar da China no comércio exterior brasileiro. 19 jan. 2010.
Disponível em <http://meridiano47.info/>.
BRUSSI, Antônio José Escobar. A pacífica ascensão da China: perspectivas positivas para o
futuro? Revista Brasileira de Política Internacional. Volume 51, número 1, Brasília, 2008.
Leitura complementar
PINTO, Paulo Antônio Pereira. China: a ascensão pacífica da Ásia Oriental. Revista
Brasileira de Política Internacional. Volume 48, número 2, Brasília, 2005.
Ministério das Relações Exteriores. Temas Políticos e Relações Bilaterais: China.
Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/temas/temas-politicos-e-relacoes-
bilaterais/asia-e-oceania/china/pdf.

QUESTÕES PARA DISCUSSÃO


1. Em que medida a centralidade histórica chinesa influencia em sua projeção
internacional?
2. A China pode ainda ser considerada um país socialista?
3. Há um limite real para o crescimento chinês?
4. A China é uma ameaça ou uma oportunidade para o Brasil?
5. A quem interessa mais a formação de um G2, aos Estados Unidos ou à China?

39Disponível no site do Projeto “Relações Internacionais para Professores”:


http://www.cursoripe.blogspot.com/.

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LINKS ÚTEIS
1. China Radio International (CRI). Notícias da China, versão em português.
Disponível em: http://portuguese.cri.cn/.

2. Embaixada da República Popular da China no Brasil.


Disponível em: http://br.china-embassy.org/por/.

FILMES
O último imperador (1987), de Bernardo Bertolucci.
Trailer em http://www.youtube.com/watch?v=PtFrcVjVJBI (em inglês)
Pequim 1908 - Um menino de três anos torna-se o Imperador da China, Pu Yi. Três anos
depois, a China passa a ser uma República, ele é forçado a abdicar e mais de três mil anos
de domínio imperial chegam ao fim. A única pessoa que parece não compreender é o
imperador de três anos de idade. À medida em que cresce, Pu Yi é tratado como um
Deus. Mas aos dezoito anos é expulso da Cidade Proibida por um guerreiro republicano.
Ajudado por seu amigo e preceptor ele foge e se abriga na legação japonesa. Depois de
um bom período de boa vida, ele é convidado pelos japoneses a ser o Imperador da
Manchúria. Pu Yi permanece no trono até ser capturado pelos russos, sendo então
extraditado e entregue com prisioneiro à República Popular da China, permanecendo
encarcerado por 10 anos. A história do último imperador da China é um conto de intriga,
traição, guerra e desastre nacional. É também a história pessoal de um dos mais
extraordinários e antigos heróis dos tempos modernos.

Desejo e perigo (2007), de Ang Lee.


Trailer em http://www.youtube.com/watch?v=feCMrZ5pqo8
Xangai, 1942. A ocupação japonesa nesta cidade chinesa durante a Segunda Guerra
Mundial continua em vigor. Wong foi deixada para trás por seu pai, que fugiu para a
Inglaterra. Como caloura na Universidade, ela conheceu o colega estudante Kuang Yu
Min, que iniciou um drama social para apoiar o patriotismo. Como a mais nova dama da
trupe do teatro, Wong percebeu que tinha encontrado o seu chamado, capaz de agitar e
inspirar o público – e Kuang. Ele juntou-se a um seleto grupo de estudantes para levar a
cabo um plano radical e ambicioso para assassinar um alto colaborador japonês, o
senhor Yee. Cada estudante tem um papel no jogo; Wong será a Senhora Mak, que
ganhará a confiança de Yee sendo amiga de sua esposa (Joan Chen) e, então, levará o
homem a ter um caso extraconjugal. Wong se transforma completamente, por dentro e
por fora, e o cenário procede como planejado – até uma virada fatal inesperada que a
estimula a fugir.

Balzac e a costureira chinesa (2002), de Sijie Dai.

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Trailer em http://www.youtube.com/watch?v=gAc9CFuwA7Q (em espanhol)


Luo e Ma são dois jovens e cultos universitários de classe média na China pré-
revolucionária. Quando os comunistas chegam ao poder, eles são capturados e
mandados para um campo de reeducação, um lugar no qual intelectuais são ensinados
por camponeses a plantar, colher e produzir alimentos. Enquanto trabalham, fortalecem
sua amizade. É nessa aldeia que eles conhecem uma bela e jovem costureira analfabeta.
Numa época em que a literatura ocidental é considerada um crime, os dois irão ensinar a
moça a ler, apresentando-lhe os melhores escritores ocidentais, entre eles, Honoré
Balzac. Juntos, o trio vai quebrar regras e esconder livros proibidos, além de descobrir o
amor, que é o que pode ruir essa perfeita amizade.

LEITURAS SUGERIDAS
LEONARD, Mark. O que a China pensa? São Paulo: Larousse, 2008.
BECARD, Danielly. O Brasil e a República Popular da China. Brasília: Funag, 2008.
Disponível em http://www.funag.gov.br/biblioteca-
digital/pdfs_livros/lancamentos/pdf_o-brasil-e-a-republica-popular-da-china

BIBLIOGRAFIA
History of China. University of Maryland. Disponível em: http://www-
chaos.umd.edu/history/ Acesso em: 28 de abril de 2010.
OLIVEIRA, Henrique Altemani de. Brasil-China: trinta anos de uma parceria
estratégica. Revista Brasileira de Política Internacional, vol. 47, no. 1, Brasília, 2004.
JANE’S INFORMATION GROUP. China. Jane’s Information Group, 2009. Disponível em
www.janes.com.
UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM. China Human Development Report.
2007-2008: Basic Public Services Benefitting 1.3 Billion People. Pequim: PNUD,
2008.
AMIN, Samir. Le developpement inegal; essai sur les formations sociales du
capitalisme peripherique. Paris: Les Editions de minuit, 1973.

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