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JANETE M. LINS DE AZEVEDO A EDUCACAO COMO POLITICA PUBLICA POLEMICAS DO NOSSO TEMPO 1¢ om 3° Edicao AUTORES (( associanos ©) Dados Internacionais de Catalogacgao na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP Brasil) Azevedo, Janete M. Lins de A educagao como politica publica / Janete M. Lins de Azevedo. — 3. ed. - Campinas, SP : Autores Associados, 2004. — (Colegao polémicas do nosso tempo; vol. 56) Bibliografia. ISBN 85-85701-46-3 !. Educagao - Filosofia 2. Educagao e Estado 3. Politicae educagao |. Titulo. Il. Série. 96-1729 CDD-379 Indices para catalogo sistematico: |. Educagao e Estado 379 2, Educagao e politica 379 I+ Edigo — julho de 1997 Impresso no Brasil - outubro de 2004 Copyright © 2004 by Editora Autores Associados Depésito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto n° 1.825, de 20 de dezembro de 1907. Todos os direitos para a lingua portuguesa reservados pela Editora Autores Associados Ltda. 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Raizes pA TEORIA: AS CONTRIBUIGOES DE DURKHEIM 2 / 2.1.A Abordagem Pluralista 24 2.2. A Abordagem Social-Democrata 29 Capriruo Tres A ABORDAGEM MARrXISTA 39 CapiruLo QuATRO Uma Proposta ANALITICA PARA A Po.frica EDUCACIONAL NO EsPac¢o DE INTERSEGAO DAS ABORDAGENS 57 BIBLIOGRAFIA This cre 69 oe Sopre A AUTORA | Ill Vit 6 Preracio A SEGUNDA EbIgAo uando escrevi este livro, a intengao era a de socializar minhas preocupagdes com a educacgao ~ entendida como politica publica - com pesquisadores e demas interessados. na perspectiva de fomentar o debate a respeito da produgao e difusdo do conhecimento na area das politicas educativas. Desde a sua publicagao, venho sendo contatada por uma quantidade significativa de leitores das diversas regides do pais. © que me permite afirmar que aquela intengao inicial concre- tizou-se para muito além das minhas expectativas. Essas inte- ragdes, por seu turno, representam mais um dado indicativo do processo crescente de institucionalizagéo da subtematica politica educacional no “campo de produgao intelectual” (no sentido que Bourdieu atribul a este conceito) sobre a educa- ¢40, fato que tenho constatado por meio de investigagGes mais sistematicas (Azevedo & Acuiar, 1999 e 2001). A dinamica que se pode apreender nesse campo do conhe- cimento é resultante, seguramente, dos graves problemas que continuam a cercar a educacao como pratica social e, portanto, da inadequagao das politicas educativas que estao sendo pos- tas em agao para equaciona-los E suficiente lembrar que ingres- samos no terceiro milénio com novas demandas de formagao e de conhecimento requeridas pelas mudangas sociais em cur- Vil_A UCAGAO COMO PoLitica PU! LIGA so, sem sequer termos assegurado o direito 4 escolarizagao fun- damenta! de qualidade para a maioria da populagao, o que exemplifica tanto a permanéncia como o agravamento dos ni- veis da desigualdade social historicamente imperantes entre nds. Essas mudangas, elas proprias causadoras dos perversos niveis das desigualdades, ao atingir toda a realidade social, fa- zem com que os seus reflexos atinjam os processos de pro- dugao do conhecimento cientifico. Dentre outras formas, por estar forjande novas configuragdes das praticas sociais, cujas tentativas de entendimento comegaram a colocar em xeque referéncias tedrico-metodoldgicas que se firmaram ao longo do século XX. Sendo assim, encontram-se também em causa os paradigmas utilizados nas investigagGes do campo das Cién- cias Sociais e Humanas e, por conseguinte, da educagao e das politicas educativas. que tém nelas sua fonte fundamental de inspiragao no uso de teorias e categorias analiticas, como pro- curo demonstrar ao longo deste livro. Ao me referir a crise paradigmatica — 0 calcanhar-de-aquiles dos campos cientificos na contemporaneidade — € oportuno reafirmar minha posigaéo como pesquisadora que refuta a idéia do “fim da histéria” € que ndo compartilha da crenga na neu- tralidade axioldgica da produgao do conhecimento. Porém, ao adotar uma perspectiva teérico-critica na abor- dagem do objeto “politicas educativas”, nao deixo de enfren- tar a tensao decorrente da necessidade de uma postura obje- tiva nas praticas investigativas, aliada a um comprometimento politico com a luta pela construgao de alternativas sociais sig- nificativas, que resultem na emancipagao € felicidade humanas. O estudo da educagao, na qualidade de uma politica pu- blica, necessariamente implica o enfrentamento dessa tensdo. A politica educacional definida como policy — programa de agao — € um fendmeno que se produz no contexto das rela- gGes de poder expressas na politics — politica no sentido da do- minagao — e, portanto, no contexto das relagdes sociais que plasmam as assimetrias, a exclusdo e as desigualdades que se configuram na sociedade e no nosso objeto. A questao, pois, é tentar o sdbio equilibrio: manter uma postura objetiva que Preracte AEpicso IX dote o conhecimento produzido de um coeficiente cientifico, sem abdicar de um nivel analitico que contemple as condicdes de possibilidade da adogao de estratégias que vennam a per- mitir a implementagao de uma politica de transformagao, como apropriadamente sugerem Morrow e Torres (1997). Assim, podemos nos livrar da constante tentagdo de nos deixar envol- ver na pratica “das denncias", que pouco contribui para a construgdo de novos saberes comprometidos com a mudanga substantiva da ordem. Essas considerag6es me parecem importantes porque a opacidade que cerca Os novos processos sociais, decorrentes da reorganizagao do capitalismo em escala mundial, constitui 0 grande desafio para as Ciéncias Sociais e Humanas no senti- do de melhor compreendé-los e de buscar alternativas para sua superacgdo. Nao que os problemas postos pelas novas formas de relacgao entre Estado, sociedade e mercado sejam novos e/ ou estejam passando despercebidos. Sao visiveis a crescente pobreza, o desemprego estrutural, a violéncia — enfim, os ni- veis de perversidade decorrentes da exclusdo social espraiada por todo o planeta, colocando por terra as grandes promes- sas que se seguiram ao advento da modernidade. Além disso, nao se desconhece também o poder de persuasdo da doutri- na neoliberal, que vem orientando essas mudangas. Sao passados cerca de sete anos desde quando redigi o primeiro capitulo deste livro, que versa sobre a abordagem neoliberal na andlise das politicas educativas. Naquele momen- to, essa abordagem ja se fazia presente como filosofia de agao orientadora das politicas puiblicas em inumeros paises e ja apa- recia entre nds, como chamei a atengao. Entretanto, as novas configuragGes socioinstitucionais forjadas sob a sua égide ain- da nao se haviam delineado com a nitidez que hoje possuem e que trouxeram implicagSes significativas para a organizagao social e politica, para a educagdo como pratica social e, por conseguinte, para a compreensdo dos meandros pelos quais se definem e imp!ementam a politica educacional, Por isso, neste prefacio, julgo oportuna uma problematizagdo dos de- safios tedrico-analiticos que essa realidade esta nos impondo. (A Epucagio como Potitica Pow Com efeito, o neoliberalismo teve, no campo da cultura e da ideologia, 0 éxito do convencimento a respeito da nao existéncia de outras alternativas para a organizagao e as prati- cas sociais. Em amplos setores das sociedades capitalistas e em grande parte de suas elites politicas, enraizou-se a crenga da inevitabilidade dos novos modos da (des)regulagao social, criando as condigdes para que se difundissem, como se fora senso comum, os padrées de relacao entre Estado, socieda- de e mercado que se tornaram hegeménicos. Boron, apropria- damente, assinala que o éxito do neoliberalismo no campo cultura! e ideoldgico foi completo, pois: [...] ndo sé impés o seu programa, mas também, inclusive, mudou para proveito seu o sentido das palavras. O vocdbu- lo “reforma”, por exemplo, que antes da era neoliberal ti- nha uma conota¢ao positiva e progressista — e que, fiel a uma concepcao iluminista. remetia a transformagdes saciais e eco- némicas orientadas para uma sociedade mais igualitaria, de- mocratica e humana ~ foi apropriado e “reconvertido” pe- los idedlogos do neoliberalismo num significante que alude a processos e transformagées sociais de claro sina! involutivo e antidemocratico [Boron, 1999, p. I 1] Santos (2000), contudo, afirma que as classes dominan- tes ndo mais se interessam pela obtengao de consensos, “tal € a confianga que tém em que nao ha alternativa as idéias e so- lugdes que defendem [pois] ...o que existe néo tem de ser aceito por ser bom. Bom ou mau, é inevitavel, e é nessa base que tem de se aceitar” (p. 35). De outra parte, no contexto da (des)regulagao neolibe- ral, a educagdo ganhou centralidade. Por um lado, devido & base que representa para os processos que conduzem ao de- senvolvimento cientifico e tecnolégico, num quadro em que a ciéncia e a tecnologia, elas prdoprias, transformam-se paulati- namente em for¢as produtivas. Por outro, em virtude das re- percuss6es no setor que a regulacao via mercado vem provo- cando, na medida em que esta forja uma nova ortodoxia nas relagdes entre a politica, o governo e a educagao. ixpa Epigao __X7 Como vem registrando a literatura pertinente, as reformas educacionais operadas mundialmente tem em comum a ten- tativa de melhorar as economias nacionais pelo fortalecimen- to dos lagos entre escolarizacao, trabalho, produtividade, servigos e mercado. Dessa perspectiva, as reformas estao bus- cando obter um melhor desempenho escolar no que tange a aquisigao de competéncias e habilidades relacionadas ao tra- balho, controles mais diretos sobre os conteudos curriculares e sua avaliagdo, implicando também a adogao de teorias e téc- nicas gerenciais préprias do campo da administragao de em- presas. Essa adogdo alga os administradores dos sistemas de ensino e os préprios gestores e professores das unidades es- colares ao papel de principal veiculo do novo “gerencialismo” (Grace, 1995 apud Batt, | 998). Tudo isso vem sendo feito em nome da redugao dos gastos governamentais e da busca de um envolvimento direto da comunidade nos processos das deci- sdes escolares e nas presses por escolhas, conforme os cri- térios de mercado (Batt, !998; Porkewitz, 1997; BonaL, 1995; Carter & O'Neit, 1995; Dare, 1994; Canario, 1992). Nao é outra a realidade que estamos assistindo no Brasil, quando empiricamente constatamos, dentre outros aspectos, o direto imbricamento entre os principios que regem a refor- ma administrativa do Estado e as politicas educacionais que vém sendo propostas e implementadas. No que se refere ao novo “gerencialismo”, aqui ele se traduz na tentativa de adogao do modelo gerencial de gestaéo a educagado. E nesse quadro que se situa a concepgao de autonomia para as universidades pu- blicas, quando se esta propondo sua transformagao em orga- nizagao social a ser administrada por contrato de gestdo. Nele também se inscreve um conjunto de programas e projetos para os trés niveis de ensino. Dentre outras caracteristicas, a garantia de integracgaéo a esses programas, sejam universidades, redes publicas estaduais ou municipais de ensino, ou mesmo a pro- pria unidade escolar, requer a participac¢ao em processos com- petitivos para o acesso aos recursos. As formas descentralizadas de execugao e a avaliagao por critérios de eficacia e eficiéncia e, ainda, a obrigatoriedade de participagao da comunidade nas XA Epucacgio como Pouitica PéBiica parcas fatias de decisdo reservadas aos implementadores, cons- tituem também caracteristicas do quadro em referéncia. Neste ultimo caso, € oportuno lembrar que o tipo de canal de parti- cipagao tem sido definido centralizadamente, a exemplo da obrigatoriedade da criagao de unidades executoras nas esco- las do ensino fundamental, como condigao para integrarem di- versos programas. De outra parte, mas interligadamente, também estamos a assistir as tentativas de homogeneizagao de contetdos via o estabelecimento dos Parametros Curriculares Nacionais, que pretendem atingir todos os niveis de ensino. Do mesmo modo, situa-se a implantagao de uma politica na- cional de avaliagdo de desempenho de todo o sistema de edu- cagdo, traduzida nas agdes do Saes e do ENem, no Exame Nacional de Cursos e na reforma das praticas avaliatérias da pos-graduacao tradicionalmente desenvolvidas pela Cares. Tratando da andlise socioldgica das politicas avaliativas con- temporaneas, Afonso (2000), tendo por referéncia empirica a realidade de outros paises, fornece subsidios que mostram a si- milaridade mundial das diretrizes educativas, tecidas pelos pres- supostos neoliberais. Neste sentido, demonstra que o modelo predominante é o da “avaliacao estandartizada criterial [...] que visa 0 controle de objetivos previamente definidos (quer en- quanto produtos, quer enquanto resultados educacionais)”. Em sua percepgao, este modelo foi introduzido pela possibilidade de favorecer tanto a expansio do Estado como a publicizagao “dos resultados dessa mesma avaliagéo”, o que, por seu turno, pode promover a expansao do mercado educacional (p. | 20). Quando destaco essas analises, tenho presente a contribui- Gao do autor no que se refere a categoria Estado, fundamental para o campo analitico das politicas publicas. E possivel observar que ele se reporta 4 “sua expansdo” num momento em que apa- rentam estar de maos dadas 0 neoliberalismo e o Estado-mini- mo. E necessario, pois, que esta expansdo seja qualificada. A questao é que o Estado-minimo nao é sindnimo de Estado-fraco. No que se refere as estratégias de acumulagao, ele é mais forte do que nunca, j4 que passa a assumir o papel de gerir e de legiti- mar, no espago nacional, as exigéncias do capitalismo global: AcIO A SEGUNDA Eptcio XI Nao se trata do regresso do principio do mercado. mas de uma nova articulagdo, mais direta e mais intima, entre o principio do Estado e 0 principio do mercado [...] A forga do Estado, que no periodo do reformismo consistiu na sua ¢a- pacidade em promover interdependéncias néo mercantis, [através da promogao de politicas plblicas de corte social] passou a consistir na sua capacidade de submeter todas as interdependéncias a légica mercantil [SANTos, | 998, p. 3] Em consequéncia, como em todos os setores alvos de politicas sociais, na educagao essa “fortaleza”, ou expansao, exprime-se no aumento do poder regulador da agao estatal, na medida em que as praticas ditas “descentralizadoras", uma das dimensdées do estilo gerencial de gestéo, tém tido por contraponto o aumento dos controles centralizados. Um dos exemplos se traduz no carater impingido 4 politica de avalia- Gao, como sugere Afonso: [...] parecer agora dbvio ao leitor que, tendo o Estado re- forgado o seu poder de regulagdo e retomado o controle central (nomeadamente sobre o curriculo escolar), a avalia- ao tivesse, de forma congruente, sido acionada como su- porte de processos de responsabilizagéo ou de prestagdo de contas relacionadas com os resultados educacionais e acadé- micos, passando estes a ser mais importantes do que os pro- cessos pedagdgicos [...] Se é verdade que emergiu o Esta- do-avaliador também é verdade que as mudangas nas politi- cas avaliativas foram igualmente marcadas pela introdugdo de mecanismos de mercado [2000, p. 122). No entanto, os novos padrées societais e a nova sociabi- lidade que Ihe é correspondente, resultantes do movimento da globalizacao, nado se forjam independentemente das carac- teristicas historicas e estruturais dos paises em que se implan- tam. Além disso, as novas configuragdes sociais nao surgem do abstrato, pois sdo fruto da agao humana e, como tal, tém his- téria socialmente construida. Sendo assim, sao passiveis de XIV _A Epucacio como Pouitica PUBLICA mudangas por sua ressignificagao em fungao dos interesses in- ternamente dominantes, ou de transformagées resultantes da luta dos grupos dominados contra a propria dominagao, pro- cessos esses que ocorrem no contexto das relagdes sociais en- gendradas em cada sociedade. Santos (2000), por meio de um recurso analdgico, afirma que as sociedades sdo a imagem que possuem de si prdéprias, refletidas nos espelhos que elas forjam para reproduzir as iden- tificagdes prevalecentes num determinado momento de sua historia. Em sua analogia, os espelhos: Sao conjuntos de instituigdes, normatividades, ideolo- gias que estabelecem correspondéncias e hierarquias entre campos infinitamente vastos de praticas sociais. Sao essas cor- respondéncias e hierarquias que permitem reiterar identifi- cagées até ao ponto de estas se transformarem em identi- dades. A ciéncia, 0 direito, a educagao, a informagao, a reli- gido e a tradi¢déo estao entre os mais importantes espelhos das sociedades contemporaneas. O que eles refletem é 0 que as sociedades sao (pp. 47-48] Procurando focalizar essas quest6es de uma perspectiva tedrico-analitica, gostaria de retomar pressupostos que sinali- zo na introdugdo e desenvolvo no decorrer do quarto capitulo. Inspirada nas formulagdes de Pierre Muller e Bruno jobert, afirmo que as politicas publicas, como qualquer agao humana, sao definidas, implementadas, reformuladas ou desativadas com base na memoria da sociedade ou do Estado em que tém curso. Constroem-se, pois, a partir das representagdes sociais que cada sociedade desenvolve a respeito de si prdépria. Se- gundo esta Gtica, as politicas publicas sio agSes que guardam intrinseca conex4o com o universo cultural e simbdlico ou, melhor dizendo, com o sistema de significagées que é prdprio de uma determinada realidade social. As representagdes so- ciais predominantes fornecem os valores, normas e simbolos que estruturam as relages sociais e, como tal, fazem-se pre- sentes no sistema de dominac¢do, atribuindo significados a de- AEpicio XV finigdo social da realidade que vai orientar os processos de decisao, formulagao e implementagao das politicas'. Destaco esses pressupostos porque os julgo fundamen- tais na analise contemporanea das politicas educativas. Eles per- mitem afirmar que nenhuma orientagdo que vem de fora é transplantada mecanicamente para qualquer sociedade. Ao contrario, as diretrizes que desnacionalizam o Estado-nagao em fungao da acumulagao do capital sao sujeitas a processos de recontextualizagdo impingidos pelas caracteristicas historicas da sociedade a que se destinam. Os padrées definidos pelos rumos da globalizagao sao lo- calmente ressignificados, apesar de ndo perderem as marcas advindas das decis6es em escala mundial. Nesse sentido, é pre- ciso considerar que a estruturagdo e implementagao das poli- ticas educativas constituem uma arquitetura em que se fazem presentes, dentre outras dimensdes: as solucdes técnico-po- liticas escolhidas para operacionalizar internamente os princi- pios ditados pelo espaco global; o conjunto de valores que articulam as relagdes sociais; o nivel de prioridade que se re- serva a propria educagao; as praticas de acomodagao ou de resisténcia forjadas nas instituigGes que as colocam em agao, sejam nos sistemas de ensino ou nas prdprias escolas. Na medida em que as orientagdes globalizadas se direcio- nam para contextos socioculturais que nao sao homogéneos, resultam em processos que buscam articular a logica do glo- bal, do regional e do nacional, e, no interior das sociedades, as ldgicas que regem as instituigdes e, em particular, os espa- gos locais. Trata-se de uma complexa alquimia que produz um mesmo fenémeno que, entretanto, vai ser revestido das sin- gularidades prdprias de cada contexto. A sua apreensdo requer, pois, o acionamento de ferramentas que contemplem uma analise relacional sobre o modo como se articulam esses di- versos niveis. Acredito ser esta uma das possiveis maneiras de se buscar 0 entendimento das especificidades que, contradi- toriamente, resultam dos imperativos globais. | Conferir as paginas $-6 e 66-67 deste livro. XVI_A Epucacao como Pouitica PoBLica Esses niveis analiticos, por seu turno, implicam a busca da clareza quanto aos mecanismos que engendram o préprio pro- cesso da globalizagao, naquilo que articula ou dissolve o local e o global. Dessa perspectiva, Santos (200!) ilumina a ques- tdo, quando considera a inexisténcia de uma entidade Unica que possa ser estritamente denominada “globalizagao”. Privilegiando uma definigéo que destaca as dimensdes sociopoliticas e culturais do conceito, ele procura demonstrar que sao diferentes conjuntos de relagGes sociais que originam diferentes fendmenos de globalizagao ou globalizagées. Como resuitam de conflitos que implicam em vencidos e vencedo- res, estes ultimos assumem o discurso sobre a globalizacao, que é a narracdo da sua propria historia, na qual pouco tém lugar os derrotados. Deste modo, Santos define a globalizagao como o processo pelo qual “determinada condicao ou entida- de local estende a sua influéncia a todo o globo" e, quando o faz, “desenvolve a capacidade de designar como iocal outra condigao social ou entidade rival” (2001, pp. 3-4). Além dis- so, sublinha as implicagdes analiticas da sua definigado, afirman- do que: Em primeiro lugar, perante as condigdes do sistema- mundo ocidental nao existe globalizagdo genuina; aquilo a que chamamos globalizagao é sempre a globalizagao bem- sucedida de determinado localismo. Por outras palavras, nao existe condigao global para a quai nao consigamos encontrar uma raiz local, uma imersao cultural especifica. Na realida- de, ndo consigo pensar uma entidade sem tal enraizamento local [...] A segunda implicagdo @ que a globalizagao pressu- pde a localizagao. De fato, vivemos tanto num mundo de localizagao como num mundo de globalizagao. Portanto, em termos analiticos, seria igualmente correto se a presente si- tuacdo e os nossos tdpicos de investigagao se definissem em termos de localizagéo, em vez de globalizagéo. O motive por que é preferido o ultimo termo é, basicamente. 0 fato de o discurso cientifico hegeménico tender a privilegiar a histéria do mundo na versao dos vencedores (Santos, 2001, p. 4]. Preracto A SeGunpa Epigdo XVII Em relagao a nossa realidade, como de resto esta ocor- rendo em outros paises, tem sido a partir do “local interno” que vém sendo esbogadas redes de resisténcia as configura- ges sociais impostas pelos “globalismos”. Nesses contextos, no campo especifico das politicas socials, j4 é possivel identifi- car modos de atuagaéo que procuram ressignificar e filtrar as me- didas impostas, na diregdo da construgdo de um novo espacgo publico que podera forjar a cidadania emancipatoria. Neles, as politicas educativas, como nao poderia deixar de ser, também tém sido ressignificadas. Sao experiéncias que ainda nao tém uma larga dimensao quantitativa, mas que, por isso mesmo, nao podem deixar de integrar a agenda de investigagdo daque- les que acreditam que o conhecimento cientifico deve também portar um nivel analitico que traga contribuigdes para a trans- formagdo da perversa (des)ordem em que hoje vivemos. Finalmente, ao tratar neste livro de um conjunto significa- tivo de abordagens utilizadas na analise da educagdo como po- litica publica — que constituem, em certa medida, as vertentes classicas —, creio que o seu conteudo continua dotado de atua- lidade. Espero, assim, que continue contribuindo para o de- bate na area, suscitando questées, criticas e problemas que possam fazer avangar as referéncias que venham a consolidar © campo investigativo em foco. Recife, maio de 2001 A AUTORA Referéncias Bibliograficas Aronso, A. J. Avaliagdo educacional: regulagdo e emancipagao. Sao Paulo, Cortez Editora, 2000 Azeveno, }. M. L de & Acuiar, M. A. da S. “Politicas de Educagao: con- cepgdes e programas”. In: Wittmann, L. & Gracinno, R. (orgs.). O Estado da Arte em Politica e Gestéo da Educagdo no Brasil. Brasilia, ANpag/IneP, 1999. _______.. “Caracteristicas e Tendéncias dos Estudos sobre a Poli- XVHIA Evucacao como Ponitica PUBuica tica Educacional no Brasil”. In: // Congresso Luso Brasileiro de Polf- tica e Administragdo da Educagao. Braga, Universidade do Minho, 2001 (texto inédito a ser publicado nas Atas do Congresso). BALL, S. J. “Cidadania global, consumo e politica educacional”. In: Sit- vA, L. H. (org.). A escola cidadd no contexto da globalizagao. Petropdlis, Ed. Vozes, 1998. Bonat, X. “Estado e reforma”. Cuadernos de Pedagogia, Barcelona, n, 241, 1995. Boron, A. A. “Os ‘novos Leviatas’ e a pd/is democratica: neoliberalis- mo, decomposicao estatal e decadéncia da democracia na Améri- ca Latina”. In: Saper, E. & Genii, P (orgs.). Pds neoliberalismo I. Que Estado para que democracia? Petropolis, Editora Vozes, 1999. 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Neste contexto, pode vir 4 tona as perversas conseqliéncias do “estatismo autoritario” préprio do regime instalado no pdés-64, o qual forjara um padrao peculiar de politica social que entao se herdava. Naquele momento, tinha-se 0 espaco politico que permitia desvelar publicamente o quanto as politicas econédmicas empre- endidas pelo regime autoritario contribuiram para aprofundar a negacdo dos direitos sociais a maioria, malgrado o alargamento formal das suas politicas sociais. Os governos militares, como se sabe, ao Mesmo tempo em que consolidaram uma area de atuagao social do Estado, o |, Vale rememorar que a organizagao deste campo deu-se, principalmente, através de espacos forjados no ambito de cursos de Pés-Graduagao 2__ A Epucacao como Potirica Pusiica fizeram nos moldes em que a privatizacao dos espacgos publi- cos agudizara-se. A realidade, ao apontar para a presenga de uma intrincada e nebulosa teia de relagGes na definigao e gestao das politicas estatais, suscitava a necessidade de se conhecer/des- velar as praticas ai subjacentes, na perspectiva da construcao de novos padrées de politica com vistas 4 democratizagdo subs- tantiva do Estado e da sociedade. Fruto, pois, principalmente de tal contexto, é que vai se dando a afirmmagao das politicas publicas enquanto area de co- nhecimento especifico no campo académico. Neste processo, a afirmacao da area, por meio dos es- tudos desenvoividos, tinha necessariamente de considerar a crise instalada no inicio dos anos 70 no espago internacional e as suas repercussdes no pais em termos da organizacgdo e redirecionamento dos servicos publicos. Isto significou, por um lado, ter como cenario a propria crise que perpassava o modo de regulagdo das sociedades, implicando a abordagem de tematicas como a crise fiscal do Estado e as necessidades de sua reforma, as proposigées neoliberais, as ameagas aos estados de bem estar social nas democracias avangadas, a debacle do socialismo real; tudo isso naquilo que se somava no sentido de aprofundar, ainda mais, as precarias condigses do nosso estado de “mal-estar social". Por outro lado, e logo em seguida, os estudos sobre as politicas publicas passaram a ter por parametro o movimento da globalizagao, no bojo das novas tendéncias de articulagdo da producdo e dos mercados, bem como dos novos padrées de sociabilidade que passaram a se forjar neste contexto. Ha que se registrar, no entanto, que as preocupagdes em investigar as politicas pliblicas extrapolaram o campo da Socio- logia e da Ciéncia Politica, pelo proprio carater interdisciplinar que, necessariamente, esta irnplicado o enfoque do fendmeno, Neste sentido, tal como ocorreu com outras dreas volta- das para a questdo social, no campo educacional passou-se a produzir estudos que privilegiam a abordagem da educag4o na sua dimensdo de politica estatal. Tratam-se, pois, de estudos que, em sua maioria, tem o prdéprio campo educacional como referéncia primeira, e, portanto, utilizam-se de ferramentas te- drico-metodoldgicas comumente empregadas nas investigacdes deste campo. Considerando-se tal realidade, bem como o conjunto de quest6es anteriormente arroladas, é que se situa o presente trabalho. Nele procurou-se partir de uma postura inversa, na tentativa de se contribuir para o debate de possiveis caminhos tedrico-metodoldgicos na investigacao da educagao como uma politica social de natureza publica. Deste modo, as discussGes que aqui se travam partem do enfoque de distintas abordagens que norteiam os estudos so- bre as politicas publicas, para nelas situar o tratamento que é& reservado a educacao nesta sua dimensdo: como uma politica publica de corte social. Desta perspectiva, percorre-se um caminho constituido por um resgate historico-tedrico de abordagens prdéprias aos estu- dos das politicas publicas, o que é feito pelo exame das verten- tes neoliberal, pluralista, social-democrata e marxista. Assim, faz- se uma problematizacao de possiveis contribuigdes que estas abordagens trazem para a analise especifica da politica educaci- onal, sempre enfocando-a em sua dimensao macro-politica. Este percurso, por sua vez, serve também de procedimento para se colocar em debate, ao final, uma sugestao de caminho tedrico-metodoldgico que, face as especificidades da realidade brasileira, pode contribuir para iluminar andlises da politica educa- cional entre nés, na sua dimensao aqui privilegiada e, portanto, a partir de ferramentas que sao préprias da drea em questao. a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book a You have elther reached a page that is unavailable for viewing or reached your viewing lil far this book Quando estudos académicos sobre as politicas pi- blicas obtiveram um elevado grau de centralidade no Brasil, abriu-se um dominio de investigacao onde o con- curso da Ciéncia Politica e da Sociologia foi decisivo. Ocorre que, na area da educacao, a maior parte da mensao de politica publica de corte social. Desta pers- -pectiva, tenta abrir caminhos terico-metodolégicos cujo eixo central seja esta dimensao. Ao mesmo tempo em que examina abordagens e fer- contrado entre algumas das abordagens, sugere uma pro- posta analitica que pode auxiliar o desenvolvimento de pesquisas sobre a politica educacional brasileira. ‘Trata-se de um trabalho dirigido aos alunos e profes- sores dos cursos de graduacao e p6és-graduacao que tem como interesse particular a investigagao do fendmeno educativo em uma das suas mtiltiplas dimensdes: a de politica de natureza social. ISBN 85- -85701-46-3 AIM Material com direitos autorais associanos Q)

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