Anda di halaman 1dari 5
BABEL Revista de Poesia, Traducao « etembro a dezembro, 2000 TORQUATO NETO ROBERT LOWELL WALY SALOMAO BABEL Revista de Poesia, Tradugao e Critica Ano I- Néimero 3 Setembro a Dezembro de 2000 Canone e Salvagio Raul Antelo Em um ensaio sobre Bailly e set "Potme de I adieu au potme"’, Jean-Luc Nancy define o adeus como um gesto que, num tnico movimento, volta-se decididamente Aquilo mesmo que abandona, ainda que dele também se desvie, sem retorno nem Temorso, com passo firme. Mostra-nos, entiio, que desvinculados, portanto, de um pensamento das otigens e despojados, mesmo assim, de todo resfduo de eternidade, cabe-nos agora dizer adeus & poesia. Ao menos & poesia tal como concebida quando, sem muito hesitar, escande-se a ordem do desvio. Para nds, em conseqiiéncia, o poema deve funcionar como esse gesto de adeus, esse gesto excessivo cujo proprio excedente sustenta a or- dem precéria. Um clinamen que se desvia para ser um escandalo ontoldgico, o de um centro descentrado. Esse gesto de adeus ambivalente pratica, portanto, uma peculiar estereoscopia. Olha uma imagem que se afas ta sem remissdio (0 mito, a cena originéria) e, a0 mesmo tempo, contempla uma outra imagem, uma imagem futura, que de modo nao menos imperioso ainda permanece invisivel a olho nu. O adeus & poesia implica, em suma, saber olhar o invistvel ou, como diz Nancy, "le regarder a nouveau et le regarder nouveau". Guardé-lo e conserva-lo. Tornar a guardé-lo e vir a conserv4-lo. De novo e como novo frisson. Caberia, entao, pensar nesse adeus a po- esia como um gesto extremado, situado nas rai- as da racionalidade, algo quase patafisico enfim. Gracas a ele pensamos 0 poema, e nao necessari- amente a poesia, como um epifendmeno que vem se actescentar a um outro fendmeno, a palavra. O poema deve assim funcionar como um saber dos par- ticulares na medida em que a poesia, como canone universal, tornou-se abstrata e metafisica. Em conse- qiéncia, o ser, sujeito do enunciado af renovado, mani- festa-se como simples epifendmeno dos entes e, da mesma forma, 0 poeta, esse novo sujeito de enunciago que através do poema se constitui a si prdprio, funciona como epifendmeno do homem. Trata-se, em ambos os casos, de ir além da morte de deus e mesmo além da morte do proprio homem j4 que o homem divinizado da modernidade classica, na deriva de seu barco ébrio, no conseguiu avangar muito 8- NANCY, Jean L 63. “Po&me de I' adieu au poéme: Bailly’, in: Po&sie, n° 89, 3.2 trim. 1999, pp.59- BABEL, Naima 3 Sctembns a Des 110) além daquela divindade de uma reles estatura humana dos tempos arcaicos. Ao contrario, a atual urgéncia do poema consiste em produzir uma maquina fantastica imagindria, um pouco a maneira pela qual Duchamp postula o fim do qua- dro e dé adeus & pintura. Trata-se, com efeito, de um nominalismo poético que, em nenhum dos dois casos, no do poema gestual nem no da experiéncia ready-made, pode ser confundido com maquinas utépicas. As maquinas modernistas, elas sim, abertamente utdpicas, voltavam-se para 0 resgate e a expansio das forgas inconscientes e enrustidas ao passo que as maquinas fantasticas imagindrias de que carecemos podem vir a ativar, nos grupos humanos emergentes, maiores que 0 individuo e bem menores do que a classe, ema peculiar fungao auto-hipnotica, a da poiesis contra a physis e, consequentemente contra 0 sucesso irresistivel da Phynance. Um tal recurso nos permite, em resumo, reencontrar uma forca, uma motivagio, para nossas ages que € artificial, porém, efetiva. Um dos mais sutis operadores de maquinas ut6picas, Oswald de Andrade, apoi- ado na premissa de Sade de que 0 roubo, na estrutura republicana, s6 pode ser uma virtude, pensou o poema modernista como maquina parédica. Na perspectiva de uma dialética do esclarecimento, essa utopia consistia na inversdo orgidstico-carnavalesca de uma ordem enrijecida que, de um lado, recusava o moralismo metafisico ao passo que, de outro, mostrava o alto prego a pagar por tamanha liberdade. A Teoria Critica, com efeito, julgou poder denunciar o formalismo vazio da lei, apontando, em contrapartida, a transgressao antropofigica como simples avesso e complemento da norma. Creio que nossa relagéo com a Lei mudou. Nao se trata agora de simplesmente transformar o proibido em desejado mas em desenvolver no sujeito a responsabilidade de traduzir a injungao abstrata da lei em enunciados e agGes concretas © especificas. Ha, porém, uma ressalva. A tradugéo em questo também nao é mais a tradugéo modernista-mediadora, transculturadora, progressista. Nao se trata de simplesmente apli- car uma categoria universal a um objeto poético particular e, menos ainda, de subsumi-lo em alguma determinacio j4 dada e herdada. A tarefa consiste, pelo contrario, em poder mventar essa nova dimensao universal, necesséria e obrigatéria, elevando-a, como argumenta Zizek, & dignidade de uma Coisa ética. Hé algo, sem divida, da ordem do sublime nessa agdo, porém, de um sublime pés-kantiano, o de das Ding. Por essa via, o trabalho no consiste em expurgar ou limpar concreto da sujeira patolégica do individuo mas de transformar 0 novo enunci- ado em uma pura faculdade de desejo, um desejo cuja causa, um a-priori nao-pato- légico, €.0 de um sujeito em produgao’. 9 - ZIZEK, Slavoj. "Kant with (or against) Sade", in: The Zizek reader. Ed.: Elizabeth Wright & Edmond Wright. Londres, Blackwell, 2000, pp.283-301. Em termos estéticos, h4 uma argumentagao_ semelhante em Thierry de Duve, em Kant after Duchamp (Cambridge, MIT Press, i998). BABEL, [Ninn 3. Setembiy 9 Desembn de 2000 TL Alliés, essa atitude contréria a expurgar ou limpar, me leva a uma segunda idéia de Nancy. Recentemente, quando perguntado sobre o que ele salvaria do século 20, 0 autor de © intruso elaborou uma resposta bem elogiiente. Essa idéia da salvacao (salut) deve set tomada no outro sentido que o termo salut tem em francés, 0 de saudago, um gesto de recepgaio ao novo. Diz Nancy: C est alors la disparition méme du salut et de la sauvegarde que je sauverais si du moins je peux encore employer ce terme. Je méefforce de ne pas me livrer a une acrobatie dialectique (la dialectique aura été, précisément, une figure du salut, et qui plus est, de sa maitrise ou certitude). Mais si quelque chose doit étre garde, c'est cette disparition, sous nos yeux, du fantasme de l'intégrité a maintenir intacte."° Nao se trata, portanto, de pensar poema na érbita da salvagao de um canone, nacional ou ocidental; nem mesmo de pensar nosso trabalho na esfera da condenagio ouabjegao. O objetivo, a meu ver, e todavia, maior e menor, o de pensar uma ontologia critica da palavra. A Poesia Brasileira Entrou “pelo” Canone? Reynaldo Damazio O cénone é um recurso que opeta a posteriori do fato literdtio. Tem uma fun- cao didatica e responde as demandas do registro historiogréfico. Est mais relaciona- do com o universo académico do que com a realidade da cultura. De todo modo, serve para se estabelecer pardmetros, rastrear tendéncias e organizar cenérios. Quando um periddico de grande circulagao propée uma enquete a determina- da lista de intelectuais para a eleigao dos livros mais importantes do século, esta fa- zendo um exercicio de canone. E claro que novos eleitores gerario cAnones diversos, como ocorre com as infindaveis, e necessdrias, “histérias da literatura”. Sujeito ao tempo e suas transformagGes, o cnone é uma ferramenta precéria, incerta, maledvel. Nao pode ser supervalorizado, sob 0 risco de tornar-se um instrumento autoritario, ou no minimo redutor. 10 - IDEM - "Que sauveriez-vous du XX.e sidcle?”, in: La Quinzaine Littéraire, n.2 790, Paris, ago 2000, p.20. Derrida explorou a mesma quest4o do salut ao comemorar 0 meio século de Les Temps modernes, o que se revela como peculiar sintoma de um mal-estar na cultura. Salvag, dizer adeus mas 0 mesmo tempo saudar os enuneiados do novo, a poesia, a dialética, a modernidade. [Traducao da citagao: “E consequentemente o desaparecimento mesmo da salvagao e da protecdo que eu salvaria se ao menos pudesse ainda empregar esse termo. Eu me esforgo por nao me livrar de uma acrobacia dialética (a dialética ters sido, precisamente, uma figura de salvagio, e ainda mais, da sua maestria ou certeza). Mas se alguma coisa deveria se guardag,é essa desapatico, sob nossos olhos, do fantas- ma da integridade a manter a salvo”. Trad. do editor} BABEL Naim 3, Seems 9 eset 2000 12

Anda mungkin juga menyukai