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Fernando Pessoa

MENSAGEM: HISTÓRIA. MITO. METÁFORA.


Elêusis M. Camocardi

Fernando Pessoa

MENSAGEM: HISTÓRIA. MITO. METÁFORA.

1996

Editora Arte & Ciência


© 1996, by Autor

Editor: Henrique Villibor Flory


Diretor Administrativo: Alexandre Villibor Flory
Editor de Arte : Gregor Osipoff
Capa : Fernando Pessoa num óleo de Almeida Negreiros
Editoração Eletrônica: Ronaldo Ivan Verginio
Rogério Romão da Silva
Nelson Miguel de Paula
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Biblioteca de F.C.L. - Assis - UNESP)

Camocardi, Elêusis M.
C185m Mensagem: História, Mito, Metáfora / Elêusis M.
Camocardi - São Paulo : Arte & Ciência, 1996.
p. 124 (Universidade Aberta, v. 21)
ISBN : 85-86127-04-3
1. Pessoa, Fernando, 1888-1935. 2. Poesia portu-
guesa - Crítica e interpretação. 3. Poesia e história -
Século XX. I.Título. II.Série.
CDD 869.109

Índice para catálogo sistemático:

1. Poesia : Século XX : Literatura portuguesa :


História e crítica. 869.109
2. Poesia portuguesa : História e crítica. 869.109

Editora Arte & Ciência


R. Joaquim Antunes, 922 conj. 3
Pinheiros, São Paulo – SP
CEP 05415 - 001 Tel/fax: (011) 284-0272
Dedico este livro

à minha mãe, Mariinha, exemplo de luta e perseverança;


à minha filha, Débora, motivo de realizações;
aos meus alunos, estímulo profissional.
Índice
Introdução ....................................................................................... 9
A Construção da História e da Trans-História de Portugal -
Da Predestinação à Potencialidade .......................................... 10
1. A Dimensão Mítica: Da Formação do Território aos
Primórdios da Nacionalidade .................................................. 13
2. A Dimensão Épica: a Expansão do Território e os
Mitos da Conquista .................................................................. 24
3. A Dimensão Trágica: os heróis - símbolos do dever ser .......... 59
4. A dimensão profética:“a esperança de ressurreição” ............... 67
Conclusão ..................................................................................... 97
Notas ........................................................................................... 104

Bibliografia ..................................................................................113
Introdução

Fernando Pessoa é um poeta que se exprime não só por con-


ceitos, mas também por símbolos. Estes surgem na sua obra não como
artifícios literários ou estéticos, mas como captadores e transmissores
de sua cosmovisão.
Consciente de sua missão de captar a voz coletiva da reali-
dade nacional, em Mensagem expressa os mitos que os descobrimentos
e as conquistas revelaram em forma de ação, erguendo-se como um
poeta solidário à sua pátria pelos múltiplos laços de uma
supraconsciência coletiva.
Mensagem é construída pela valorização do invisível visto
como realidade objetiva, pela predominância da imaginação como
faculdade de poder cognitivo, pela forma mitológica aliada a um espírito
anti-histórico, pela união do humano e do divino e pela nostalgia do
invisível, encerrando o infinito poder de evocar e de sugerir do Poeta.
Por isso contém em si mesma múltiplas correlações e várias
significações.
Assim, ao curvar-se sobre um ser em transformação
incessante que é Portugal na sua história, Fernando Pessoa não
desenvolve uma visão puramente ou intencionalmente historicista e
factual, mas, antes, toda a Mensagem, na sua formulação simbólica e
mitológica, implica numa concepção trans-histórica ou supra-histórica,
contendo em si uma realidade que excede as coordenadas do tempo e
do espaço.
Para a construção desta supra-história que é a de Mensagem
interseccionam-se as raízes formadoras da espiritualidade de Fernando
Pessoa: a mitologia histórica dos romanos, a mitologia cósmica dos
celtas e a mitologia judaica, com uma visão providencialista da história.
A obra oriunda dessa confluência pode ser considerada uma
epopéia porque parte de um núcleo histórico. Porém a ação dos heróis
10

somente adquire pleno significado dentro de uma referência mitológica:


apenas foram eleitos pelo Poeta, com direito à imortalidade, aqueles
homens e feitos que manifestaram em si mitos significativos.
O presente estudo sôbre Mensagem, fruto de longos anos de
pesquisa e de reflexão compartilhada com professores e alunos em ati-
vidades acadêmicas, privilegiará a re-construção da História de Portugal
- passo determinante para que os alunos desenvolvam uma leitura com-
preensiva da obra e a análise do discurso literário, para o qual concor-
rem também formulações mitológicas e simbólicas.
A Construção da História e da Trans-História de Mensagem
seguirá um percurso que podemos denominar da predestinação à
potencialidade e que presidirá a divisão do desenvolvimento do estudo
em quatro dimensões: a dimensão mítica, a dimensão épica, a dimensão
trágica e a dimensão profética.

A Construção da História e da Trans-História de Portugal - Da


Predestinação à Potencialidade

Embora Mensagem tenha vindo a lume apenas em 1934,


por insistência de amigos, após concorrer a um prêmio instituído pelo
Secretariado de Propaganda Nacional, 1 parece que a organização de
uma obra de cunho nacionalista, inspirada no sentimento esotérico e
“embebida em simbolismo templário e rosicruciano” 2 , nascera no
espírito do Poeta ja em 1913, quando da elaboração do poema “Gládio”,
depois incluído em Mensagem com o título de “D. Fernando, Infante
de Portugal”. Também é aventada a data de 1918, quando compôs
“Padrão”e “Mostrengo”, publicados somente em 1922, no número
quatro da revista Contemporânea, juntamente com os outros poemas
que integram a segunda parte da obra, “Mar Português”. O projeto é,
portanto, antigo no espírito de Fernando Pessoa, e, até pouco antes de
sua publicação denominava-se Portugal. O Poeta justificava a
substituição do título “por não achar a sua obra à altura do nome da
Pátria” e por considerar Mensagem “mais dentro da índole do
trabalho, e, ainda, por ter o mesmo número de letras” 3. Além disso,
alega mais um motivo para a alteração do título: “Alterei o título porque
o meu velho amigo Da Cunha Dias me fez notar - a observação era
por igual patriótica e publicitária - que o nome de nosso pátria estava
hoje prostituído a sapatos, como o hotéis na sua maior Dinastia”. 4
11

Em vários planos de publicação futura de sua obra consta a de


Mensagem. Em carta dirigida a João Gaspar Simões (28 de Junho de
1932), Pessoa explicita: “Era minha intenção começar as minhas publi-
cações por três livros, na ordem seguinte: (1) Portugal, que é um livro
pequeno de poemas (tem 41 ao todo) de que o “Mar Português” é a
segunda parte; (2) Livro do Desassossego (...); (3) Poemas Completos
de Alberto Caeiro.” 5
Com Mensagem, o Poeta pretendia enaltecer a Pátria trans-
mitindo uma mensagem de fé nos destinos da nação, por acreditá-la
predestinada. Como projeto de apologia, Fernando Pessoa tentava um
empreendimento nos moldes da poesia épica moderna dos fatos
enaltecidos. Diferentemente da epopéia camoniana, Pessoa faz o elogio
do povo lusitano não como reencarnação dos antigos, mas orientado
pela idéia de que “A Nação é a escola presente para a Super-Nação
futura” 6. Assim, concebeu Mensagem como um ritual de afirmação
nacional, combinando elementos de espiritualidade, misticismo e
patriotismo.
Ademais, o Poeta teve como função, ao celebrar o seu ritual
de confiança, orientar o povo para a noção de que a decadência nacional
era mais um signo de esperança que de desespero, com profunda vocação
transcendental mais que de êxito terreno.
Muitos críticos e estudiosos da obra pessoana têm-se de-
bruçado sobre a classificação de Mensagem quanto ao gênero literário.
Poema épico? Poema épico-lírico? A maioria dos estudiosos analisa o
gênero de Mensagem confrontando-a com Os Lusíadas, observando
as diferenças e os pontos de convergência das duas obras. Antonio
Cirurgião, na obra O Olhar Esfingico da Mensagem de Fernando
Pessoa chega a considerá-la uma composição hibrica em que se
misturam matéria épica, matéria lírica e elegia. Já Massaud Moisés, na
sua A criação Literária considera Mensagem como um poema épico
de modelo moderno. Maria Helena Nery Garcez em “Mensagem:
Profissão de Fé Poética” também a considera um poema épico dos
tempos modernos, demonstrando que “a essência do épico não está em
apresentar uma proposição, invocação, dedicatória, narração e
conclusão, mas em apresentar uma interpretação da História do ho-
mem e do sentido do mundo.7 Segundo Anazildo Vasconcelos da Silva,
“o que distingue o modelo épico moderno dos outros (clássico e
renascentista) é o centramento do relato na dimensão mítica da matéria
12

épica, levando a epopéia moderna a estruturar-se a partir do


maravilhoso” 8.
Centrado na dimensão mítica da matéria épica, o relato li-
berta-se do tempo histórico tornando possível a utilização do discurso
no tempo presente e o uso da primeira pessoa. A condição mítica do
herói épico moderno permite-lhe narrar seus próprios feitos, em primeira
pessoa, o que não era possível ao herói clássico nem renascentista,
devido à sua condição histórica.
Afirma, ainda, o crítico, que “a estruturação a partir do ma-
ravilhoso acentua a consciência lírica que adere ao fio narrativo
estruturante do relato”.9
Assim, com forte tensão lírica, Mensagem organiza-se como
matéria épica, sustentada na mistura das dimensões real e mítica, com
planos histórico e maravilhoso bem estruturados. A dimensão real con-
siste na estruturação do passado histórico de Portugal - desde os alvores
da nacionalidade até às conquistas ultramarinas e a decadência dos
tempos modernos - e a dimensão mítica estrutura um tempo presente
(futuro) não realizado historicamente.
O fato histórico de Mensagem prende-se à dimensão
temporal da realidade objetiva - século XII ao XVI - enquanto o mito,
sendo uma estrutura de afirmação do real, adere ao fato histórico,
reduplicando sua estrutura de realidade. Assim Mensagem está centrada
numa estrutura de realidade histórica miticamente duplicada, e parte
dela para a dimensão real.
Mensagem constitui-se de três grandes partes: “Brasão”,
“Mar Português” e “O Encoberto”, e é marcada, desde o seu limiar,
por inscrições latinas. Na frase de abertura - “Benedictus Dominus
Deus Noster qui dedit nobis signum” - (Bendito seja Deus Nosso
Senhor que nos deu o sinal), o Poeta fala de uma dádiva divina e na
frase de encerramento, a hipógrafe “Valete, Fratres!” (Saúde, Irmãos!)
o Poeta faz votos para que os destinatários desse dom ou sinal saibam
convertê-lo em meio de salvação. As três grandes partes também são
encabeçadas por epígrafes: “Bellum sine bello” (Guerra sem guerra),
“Possessio Maris” (A posse do Mar) e “Pax in excelsis” (Paz nas
Alturas).
Segundo Antonio Cirurgião, “o poeta dividiu muito apropri-
adamente a obra em três partes (três é o número sagrado da divindade)
13

fazendo corresponder, nas suas linhas gerais, a Primeira Parte ao


Portugal da Europa, a Segunda Parte ao Portugal de Além-Mar, e a
Terceira ao Portugal do futuro ou Quinto Império. Trata-se,
evidentemente, de um discurso de configuração ascensional, um pouco
à maneira, mutatis mutandis, do discurso da Divina Comédia de
Dante.”10

1. A Dimensão Mítica: Da Formação do Território aos Primórdios


da Nacionalidade

Desde a sua epígrafe, a Primeira Parte ou “Brasão” principia


por concentrar em si um oxímoro: “Guerra sem guerra”, como a sugerir
aos destinatários de sua mensagem que a guerra proposta pelo Poeta é
diferente daquela que será retratada nos campos dos Castelos - não será
um combate sangrento, mas um combate espiritual que caminhará em
direção a um império.
Embora na sua configuração exterior o Brasão descrito na
Mensagem seja o do Infante D. Henrique e não o de Portugal
monárquico, parece que no espírito do Poeta é do de Portugal que se
trata. Aliás, a única diferença entre os dois reside no timbre: enquanto
no brasão de Portugal, a partir de D. João I, consta a serpe alada, no
brasão do Infante figura o grifo (metade águia e metade leão).
A apresentação do “Brasão”, no seu aspecto espacial, pro-
cessa-se em movimento centrípeto e ascensional, evoluindo do ex-
terior para o interior. No aspecto temporal processa-se
cronologicamente, desde os tempos míticos do antemanhã da
nacionalidade até ao tempo histórico.
Os 19 (dezenove) poemas que constituem o “Brasão” têm
levado muitos críticos a estabelecerem comparações entre o Poeta
(que se anunciava em A Águia, precisamente no momento em que
começava a elaboração da futura Mensagem, como um super-
Camões), e o grande autor do poema Os Lusíadas. Com efeito,
Camões, no Canto III de sua epopéia, consagrou 13 (treze) estâncias
ao Milagre de Ourique (Batalha de Ourique) e às principais armas
nacionais. É bem possível que Pessoa se tenha baseado no modelo
camoniano para compor o “Brasão”. Camões evoca Afonso Henriques,
ainda no campo de batalha, pintando sobre seu escudo (até então
branco) as armas divinas:
14

Aqui pinta no branco escudo ufano,


Que agora esta vitória certifica,
Cinco escudos azuis esclarecidos,
Em sinal destes cinco Reis vencidos.
E nestes cinco escudos pinta os trinta
Dinheiros por que Deus fora vencido,
Escrevendo a memória, em vária tinta,
Daquelle de Quem foi favorecido.
Em cada um dos cinco, cinco pinta,
Porque assim fica o número cumprido,
Contando duas vezes o do meio,
Dos cinco azuis que em cruz pintando veio. 11
(III, 53-54)
O poeta renascentista português apresenta as armas com os
cinco escudos pintados de cinco dinheiros, como eram as quinas na sua
época, e não no tempo de Afonso Henriques. Mas não faz alusão aos
Castelos, estes foram acrescidos ao escudo português sob o reinado de
D. Afonso III (1248-1279).
A Primeira Parte de Mensagem, cronologicamente, não vai
além do reinado de D. Sebastião. Nessa época o brasão português era
mais ou menos parecido com o de hoje:
De prata, cinco escudetes de azul postos em cruz, cada
um deles carregado de cinco besantes postos em aspa.
Bordadura de vermelho, carregada de sete castelos de ouro.
Timbre: serpe alada nascente de ouro 12

Na comparação do “Brasão” elaborado por Pessoa com o bra-


são português da atualidade, sobressaem algumas variantes: o sétimo Cas-
telo é desmembrado por Pessoa em (I) e (II). Talvez se pudesse interpretar
que esse desdobramento corresponda à variação dos nomes dos Castelos
sobre os brasões de reis sucessivos que iam diminuindo no curso dos
séculos, até chegar ao sétimo. No começo do século XVI ainda se encon-
tram brasões com oito castelos. 13 Em Mensagem o castelo desdobrado
trata de dois poemas, consagrados um a D. João I e outro a sua esposa,
D. Fílipa de Lencastre, e mantêm-se unidos pelo número sete (número
simbólico para Pessoa).
Outra variante, e esta é uma diferença notável, é a presença
do “Grifo”ou Timbre no lugar da serpente alada - é uma insígnia apensa
15

exteriormente ao Brasão: espécie de animal fabuloso, fantástico, misto


de águia e leão:
O grifo da emblemática medieval participa do simbolismo
do leão e da águia, o que parece ser uma duplicação da sua
natureza solar. Na realidade, ela participa da terra e do céu, o
que faz dele um símbolo das duas naturezas - humana e divina
- do Cristo. Evoca, igualmente, a dupla qualidade divina de
força e de sabedoria. Quando se compara a simbologia própria
da águia com a do leão, pode dizer-se que o grifo liga o poder
terrestre do leão à energia celeste da águia. Inscreve-se, desse
modo, na simbólica geral das forças da salvação. 14

Formam o “Brasão da Mensagem cinco secções: ” I. Os Cam-


pos”, “II. Os Castellos”, “III. As Quinas”, “IV. A Coroa”, “V. O Tim-
bre”.

I. Os Campos
“Os Campos”subdividem-se em dois: “Primeiro/Os
Castellos”, “Segundo/O Das Quinas”, sendo este interior àquele.
Como o país descrito no “Brasão” é Portugal da Idade Média,
esses dois Campos associam-se aos campos de batalha onde os cavalei-
ros demonstravam sua força bélica.
No Campo dos Castelos estão representados os fundadores
de Portugal, começando pelos mitos da origem e evoluindo para a di-
mensão histórica. No campo das Quinas estão representados os cinco
mártires, correspondendo os dois primeiros ao corpo e os três últimos à
alma da nação. Pode-se interpretar o Campo dos Castelos como
correspondendo à vida ativa e o das quinas à vida contemplativa.

“Primeiro / Os Castellos”

O crítico Antonio Cirurgião considera esse primeiro poema


como “a abertura de uma ópera” uma vez que ele contém os temas
fundamentais de uma epopéia. 15
Com efeito, através de 04 (quatro) estrofes irregulares, num
total de 12 (doze) versos decassilábicos heróicos (o que harmoniza com
16

a natureza épica de Mensagem) o Poeta apresenta a Europa e a locali-


zação geográfica de Portugal. A Europa é personificada numa figura
feminina, sentada na costa atlântica, fitando.
A Europa jaz, posta nos cotovellos:
De Oriente a Occidente, jaz, fitando,
E toldam-lhe romanticos cabellos
Olhos gregos, lembrando
É a visualização pictórica de uma Europa deitada ou (ador-
mecida?), cujos “romanticos cabellos” seriam os oceanos Atlântico e
Pacífico, os “cotovellos”, a Itália e a Inglaterra. Os “olhos gregos”
estariam a refletir o pensamento clássico e a memória do mundo
helênico. Metonimicamente, Portugal é caracterizado como o rosto dessa
figura. É representado pela cabeça da Europa por ser a porta de entrada
para o Velho Mundo (por via marítima) e, também, por estar fadado -
por predestinação divina - a ser a cabeça do Quinto Império. Estrategi-
camente, Portugal situa-se no extremo ocidental da Europa e “jaz,
fitando” o mar, que foi o seu espaço de realizações passadas e que
pretende o Poeta (profeticamente) venha a ser o de realizações futuras.
(Ressalte-se que o verbo fitar é utilizado enfaticamente três vezes no
poema, como para sublinhar o caráter profético da obra). Os “romanticos
cabellos” remetem, historicamente, aos povos nórdicos e germânicos
que compareceram na miscigenação da raça, enquanto os “Olhos gregos,
lembrando” aludem às heranças culturais da Grécia, associando-se ao
espírito das ciências e das artes.
As referências à Itália e à Inglaterra sugerem os elementos
romanos e celtas que, na proto-história, fizeram sentir a sua presença
na Península e caldearam a alma portuguesa.
Nos versos “Fita, com olhar sphyngico e fatal / O Occidente,
futuro no passado”, observa-se o olhar profundo, penetrante e misteri-
oso de Portugal, tal como o de uma esfinge, a fitar o sol nascente. No-
vamente o Poeta enfatiza no poema os dois mundos: o de descobertas
do passado, que fica a Oriente, e o de descobrimentos futuros, a
Ocidente, “o futuro do passado”. Esse mundo a descobrir seria uma
realização “fatal”, escatológica, numa visão providencialista da história.
Para completar a visualização pictórica que Pessoa transmite
neste poema, cedemos a palavra a Antonio Cirurgião, que analisa o
discurso de PRIMEIRO/OS CASTELLOS Como “visivelmente conotativo e ora-
cular, pois processa-se do geral para o particular, do gênero para a
17

espécie, da diversidade para a unidade, da Europa para Portugal” 16 .


E o poeta consegue traduzir esses conceitos, primeiro, por meio do
esquema estrófico: o poema começa por uma estância de quatro versos
e acaba por uma estância universal ou monóstico; segundo, por meio
da presença da Europa no primeiro verso do poema e de Portugal no
último, a demonstrar a transubstanciação de uma Europa plurinacional
numa Europa uninacional. Quanto à dualidade temporal de Portugal - o
do passado e o do futuro - o poeta procurará resolvê-la numa síntese de
natureza misticamente transcendente, em dois versos de ressonância
cósmica e sibilina:
Fita com olhar sphyngico e fatal
O Occidente, futuro do passado

“Segundo / o das Quinas”

Este Poema apresenta-se em forma narrativa carregada de


subjetivismo: o Poeta tece conceitos e reflexões até certo ponto
estóicas, através de planos duais ambíguos, simbólicos e metafóricos,
constatando que as glórias são conquistadas à custa dos sacrifícios.
Logo de início percebe-se que o poema alude aos cinco mártires
eleitos para as cinco Quinas, que se relacionam com as cinco chagas
de Cristo.
De caráter aforístico, o poema é o desenvolvimento de um pa-
radoxo: “Os deuses vendem quando dão / Compra-se a glória com des-
graça.”
Facultando aos portugueses o dom de conquistar o mar, os
deuses exigiram como recompensa o sangue de seus mártires. Mas tal
como o sucedido com Cristo, o sofrimento é próprio do homem
predestinado a realizar o seu destino superior, daí que, estoicamente,
deva sofrer para transmudar-se: “ Ai dos felizes porque são / Só o que
passa!”
Os versos: “Basta a quem baste o que lhe basta / O bastante
de lhe bastar” reiteram, com requinte barroco, a idéia exposta nos versos
anteriores, enfatizando o viver hedonístico do instante como oposição
aos valores espirituais e eternos representados pelos mártires de Portu-
gal. Esse sentido é reforçado pelas cinco vezes em que o verbo bastar é
repetido, podendo-se associá-lo aos cinco sentidos, que é o programa
do epicurismo e do “carpe diem” horaciano.
18

Os versos seguintes, estruturados de forma dialética, com-


pletam a oposição matéria/espírito; temporalidade/eternidade; glória/
desgraça; felicidade/infelicidade; Natureza/Dom; Paganismo/
Cristianismo, constatando o Poeta, com exemplo em Cristo, a
necessidade da purgação para se atingir a purificação:
Foi com desgraça e com vileza
Que Deus ao Christo definiu:
Assim o oppoz à Natureza
E Filho o ungiu.
Neste poema assistimos à passagem da lei da natureza à lei
da graça, do politeísmo ao monoteísmo e do paganismo ao cristianismo:
na primeira estrofe comparecem os deuses com a teologia do paganismo;
a segunda estrofe, de cunho estóico e epicurista, faz a ponte ideológica
entre o Paganismo e o Cristianismo, e a terceira desenvolve a encarnação
de Deus e a teologia do Cristianismo.
Após estes dois poemas iniciais, síntese temática dos que
se seguirão, os “Campos” do “Brasão” vão ser preenchidos por sete
castelos e cinco quinas.

II - Os Castellos

“Os Castellos” representam a ação criadora da nacionalidade


- desde a origem mítico-lendária da formação do território com
“Ulysses”, o alvorecer da nação em “Viriato”, a proto-história com o
“Conde D. Henrique” e “D. Tareja”, até à história propriamente dita,
iniciada com “D. Affonso Henriques”, prosseguida por “D. Dinis”, “D.
João, o Primeiro” e “D. Philippa de Lencastre”. De modo geral os
Castelos representam a conquista da terra e a preparação para a conquista
do mar.
Na construção poética dos “Castellos” comparecem
elementos de várias partes da Europa: Ulisses vem da Grécia; Viriato,
da Ibéria; o Conde D. Henrique, da França; D. Tareja, de Castela; D.
Afonso Henriques, do Condado Portucalense; D. Dinis e D. João I, de
Portugal; D. Filipa de Lencastre, da Inglaterra e todos estão ligados por
uma ação comum: foram fundadores. Ulisses foi o mito fundador de
uma cidade - Lisboa, futura capital do reino e do Império; Viriato
lendariamente fundou uma nação: Lusitânia; o conde D. Henrique
19

fundou um condado: o Condado Portucalense; D. Afonso Henriques


fundou um reino e uma dinastia: o reino de Portugal e a dinastia de
Borgonha; D. Dinis fundou uma cultura, simbolizada pela criação dos
Estudos Gerais, de Lisboa; D. João I fundou uma dinastia - a de Avis -
e lançou as sementes de um Império. As duas mulheres - D. Tareja e D.
Filipa de Lencastre - colaboraram para a origem ou fundação das
dinastias.

“Primeiro / Ulysses”

Formado por 3 (três) quintilhas, o poema é construído em


forma de silogismo dedutivo. Na primeira estrofe, correspondendo à
premissa maior, o Poeta apresenta sua definição geral de mito; a segunda
estrofe encerra a premissa menor através do desenvolvimento elucidativo
do mito português, e a conclusão está na terceira estrofe, em que se
depreende a significação desse mito para a história de Portugal.
O primeiro Castelo é dedicado a “Ulysses”, personagem len-
dária e mítica cuja estória está preservada entre os segredos e lendas do
território peninsular. De acordo com algumas lendas, teria sido Túbal,
neto de Noé, quem primeiro chegara à Peninsula e fundara uma cidade
na embocadura do rio Sado, que denominou Sathubalo ou Setúbal. Outras
lendas contam que “Baco, filho de Júpiter e Semele, desembarca na Pe-
nínsula e convence os habitantes a aceitar como rei o seu compatriota
Lysias. Mais tarde, Ulisses, soberano de Itaca, emigrado após a destrui-
ção de Tróia, dá o nome de Ulissipo ou Olisipo à povoação já erguida
nas margens do Tejo”. 17 Esta povoação não seria outra senão Lisboa. É a
estes fatos que parece querer referir-se Pessoa neste poema elaborado
através de formas antitéticas entre o nada e o tudo: o nada que foi Ulisses
enquanto lenda, mito, e o tudo em que se transformou com a fundação de
Lisboa - primeira capital do Reino, depois do Império - e, neste poema,
metonímia de Portugal.
Em plano histórico, na dimensão temporal do passado,
Ulisses foi apenas um mito de origem (Mito=Nada),mas no plano
espiritual ou maravilhoso, Ulisses equivale a um símbolo divino
(Mito=Tudo), associando-se tal significado à filosofia essencial do
cristianismo. A figura lendária representaria para a Península e, mais
precisamente para Portugal, o que Cristo significa para a humanidade:
a iluminação, o caminho.
20

Após essa afirmação, o Poeta passa a exemplificar por meio


de outros símbolos (símbolos mitológicos do deus Apolo que puxa o
carro do Sol), de metáforas e de comparações (Deus feito homem; vida
e morte; noite e dia) a crença no eterno retorno. A comparação de Sol
com Deus assenta na dialética metafórica da passagem da vida para a
morte e da morte para a vida.
Nos versos seguintes: “Este, que aqui aportou, / Foi por
não ser existindo. / Sem existir nos bastou. / Por não ter vindo foi vindo
/ E nos creou”, podemos observar o significado lendário de Ulisses,
produto alquímico do ser ficcional (“Nada”) e do não-ser real (“Tudo”),
utopia e realidade e a sua representação para Portugal.
Assim a lenda se escorre
A entrar na realidade
E a fecundal-a decorre.
Em baixo, a vida, metade
De nada, morre.
Nesta estância, tomando o vocábulo lenda como sinônimo
de mito, o Poeta recorre ao símbolo da água corrente, mãe, matriz,
origem e percurso da vida para, como um rio misterioso, explicar a
presença de Ulisses na Península e a permanência de seu mito, enquanto
elemento proveniente da Grécia, na história e na arte portuguesas.
Os dois últimos versos parecem encerrar a idéia de que a
vida (parte material) passa (“morre”) mas o mito (ou a lenda)
transubstanciando-se, permanece.

“Segundo / Viriato”
Na economia de Mensagem Viriato representa o componente
Ibérico de Portugal, e pode ser considerado a matéria, o corpo do país
embrionário, enquanto Ulisses é a forma, segundo a filosofia arístotélica.
Porém, segundo a mesma concepção, a matéria não existe sem a forma,
parece confirmar-nos Pessoa nos versos iniciais:
Se a Alma que sente e faz conhece
Só porque lembra o que esqueceu,
Vivemos, raça, porque houvesse
Memória em nós do instincto teu
Esses versos remetem-nos também à alegoria platônica da
caverna, segundo a qual o homem, afastado da Perfeição, só por meio
21

da reminiscência conseguirá recuperar parcialmente o mundo de Luz.


Historicamente, Viriato foi um caudilho que viveu no século
II a.C., pastor serrano, espírito solitário e desinteressado, que se trans-
formou em mito de resistência peninsular ao chefiar os lusitanos em
combate na Turdetânia, onde venceram as hostes de Vetílio, em 146
a.C.. Por sua bravura heróica e magnanimidade, chega a receber o título
de “Amicus Populi Romanus”, mas, traiçoeiramente, foi assassinado
por três amigos comprados por Quinto Servílio Cipião. 18
A personalidade de Viriato foi enaltecida até pelos próprios
autores latinos, não apenas por suas qualidades de chefe militar, mas
também por suas raras características morais e políticas. “Forte, valente,
decidido, hábil, dotado duma admirável visão estratégica e de magní-
ficos recursos tácticos, ele possuía também faculdades excelentes de
sugestão, que revelou na acção exercida sobre os seus homens, e, ao
mesmo tempo, patenteava, através da sua rudeza nativa, os melhores
sentimentos de justiça, generosidade e desinteresse”. 19
A fama de caudilho perpetuou-se não só na história, mas
também na lenda e na poesia. Várias terras disputaram a honra de terem
servido de berço a esse herói cujo nome verdadeiro nem mesmo conhe-
ciam 20, que provavelmente se deve imaginar nos Montes Hetmínios ou
nas imediações. “A fantasia erudita, a emoção poética e a imaginação
popular teceram em torno do herói lendas de viva devoção nacionalista.
Viriato é um símbolo e um exemplo. Símbolo, expoente, do patriotismo
castrejo, exemplo do que pode o valor indígena, devidamente orientado,
contra as ambições dos mais fortes impérios”. 21
No poema, Viriato é caracterizado como o mito da reencar-
nação de Portugal, devendo entender-se por reencarnação a morte de
um embrião (ou haste) para o alvorecer de uma nacionalidade. Viriato
foi o elemento ibérico que contribuiu para a formação inicial da “raça”
através da fundação da Lusitania, e pode ser considerado a haste da
nação em que se transformou Portugal.
Nação porque reincarnaste,
Povo porque resuscitou
Ou tu, ou o de que eras a haste -
Assim se Portugal formou
Lembre-se aqui da parábola bíblica da semente que deve mor-
rer para que brote nova planta. Essa nova planta é Portugal.
22

Na última estrofe do poema, através de gradação progressiva


de metáforas, o Poeta caracteriza o herói como ser pré-destinado para
conduzir uma raça, pelos caminhos da caverna, atrás das résteas de luz
até encontrar o dia:
Teu ser é como aquela fria
Luz que precede a madrugada,
E é já o ir a haver o dia
Na antemanhã, confuso nada.
Viriato é a metáfora do alvorecer da nacionalidade, e Portugal
está entre a potencialidade e o ato de transformar-se em nação.

“Terceiro / O Conde D. Henrique”


Em virtude de sua brevidade - composto por apenas oito
versos - o poema dedicado ao Conde D. Henrique pode ser considerado
epigramático. Nele o Poeta desenvolve um engenhoso processo para
fazer a passagem progressiva de Portugal da potencialidade para a ação,
do mito para a história. Nas três estrofes,consecutivamente o Poeta fala
do herói, põe o herói a falar e fala com o herói.
Da “antemanhã, confuso nada” com que termina o poema
anterior, o Poeta vai revelar o início acidental e predestinado do novo
dia, a primeira manhã de Portugal com o Conde D. Henrique. É uma
manhã histórica que principia providencialmente quando o soberano
de Leão e Castela, D. Afonso VI, em reconhecimento ao valor
demonstrado por D. Henrique, Conde de Borgonha (neto de Roberto,
Duque de Borgonha e bisneto de Roberto II, Rei da França) nas lutas
contra os mouros, concede-lhe em casamento sua filha D. Tareja (1094)
e com ela um governo delimitado entre os rios Tejo e Minho - o Condado
Portucalense.
Parece-nos que Pessoa não só alude a esses fatos históricos
no poema dedicado ao Conde D. Henrique, como, na primeira estrofe,
anuncia um princípio geral sobre a interação do homem e da divindade,
contrapondo o poder limitado do homem ao providencialismo - o herói
não age, é paciente nas mãos de Deus; a predestinação divina dirige
seus atos:
Todo começo é involuntário.
Deus é o agente.
O herói a si assiste, vário
E inconsciente.
23

A involuntariedade e a inconsciência dos atos fazem com


que o herói se interrogue, na segunda estância, sobre o caminho a seguir:
“ ‘Que farei eu com esta espada?’ ”
Na terceira estrofe, o Poeta relata-nos a ação executada pelo
herói e o resultado desse feito: “Ergueste-a, e fêz-se.”
Assim, o novo reino de Portugal teve uma origem providen-
cial, segundo o Poeta.
Historicamente, com a morte de Afonso VI, em 1109, come-
ça-se a sentir que Portugal vai nascer, porque estava livre dos laços de
vassalagem a Castela, liberdade perseguida árdua e sistematicamente
pelo Conde D. Henrique. Com efeito, “fêz-se” Portugal, pois, com a
morte do sogro, D. Henrique proclama-se Conde e Senhor de Portugal,
alarga o território herdado e deixa já encaminhada a sua independência.

“Quarto / D. Tareja”

D. Tareja herdou o governo e a política do marido, mas quase


levou a perder a relativa independência do Condado Portucalense devido
“à sua excessiva ligação com os elementos preponderantes da Galiza
” 22, ao seu caso amoroso com Fernando Peres de Trava e ao seu
alheamento dos assuntos fundamentais da organização eclesiástica.
O Poema que lhe é dedicado apresenta caráter sentencioso
com invocação suplicativa. Em cada uma das quatro estrofes aparece
um verso com tom de súplica: na primeira - “Vella por nós”, na segunda
- “Por elle resa!”, na terceira - “Dê tua prece outro destino”, na quarta
“De novo o cria!”. Através desse uso do imperativo, o Poeta implora o
auxílio sobrenatural de D. Tareja, como se ela fosse uma entidade divina.
Após reflexões de forma enunciativa sobre a visão
providencialista da história “As Nações todas são mysterios. / Cada
uma é todo o mundo a sós” - o Poeta invoca a celebrada, em forma de
prece, apelando por seu auxílio:
Teu seio augusto amamentou
Com bruta e natural certeza
O que, imprevisto, Deus fadou.
Por elle resa!
Através do adjetivo “augusto”constata-se que D. Tareja se
reveste de dimensões divinas, pois êsse epíteto era aplicado aos
24

imperadores romanos, considerados como detentores, não só do poder


terreno, mas também do poder espiritual, uma vez que eram elevados à
condição de sumos sacerdotes.
A idéia de predestinação divina aparece no poema através do
sintagma “Deus fadou” : assim como o Anjo anunciou a concepção divina
à Virgem, Deus predestinou D. Tareja a conceber o primeiro rei de Portugal,
que, metonimicamente, se transforma, na terceira estrofe, no próprio país:
Dê tua prece outro destino
A quem fadou o instincto teu!
O homem que foi o teu menino
Envelheceu.
Nesta estrofe, o Poeta suplica pela prece em favor de um
Portugal já envelhecido, mas que se mantém vivo e cheio de esperanças
de ressurreição - “eterno infante”.
Elaborado lexicamente sobre o jogo dialético entre Deus e o
homem, a vontade e o instinto, a infância e a velhice, a vida e a morte,
o tempo e a eternidade, no seu aspecto semântico “o poema gira à
volta de três conceitos fundamentais ou núcleos sêmicos: o da
maternidade, o da intervenção do sobrenatural e o do renascimento.” 23
Com o quarto Castelo, Pessoa completa a celebração da
proto-história de Portugal.
É curioso observar como o Poeta insere, estrategicamente,
aquela que gerou o primeiro rei, aquela por ele considerada “Mãe de
reis e avó de Impérios”, bem no centro dos sete castelos: os três
primeiros são dedicados a figuras que fizeram parte da formação lendária
e/ou mítica da nacionalidade e os três últimos referem-se,
cronologicamente, ao primeiro Rei do reino, fundador também da sua
primeira dinastia; o segundo, ao Rei Trovador e Lavrador, mecenas das
Letras e das Artes, primeiro responsável pela criação de um centro
cultural no país e precursor inconsciente das futuras descobertas; o
terceiro, ao rei (ou casal) predestinado, de onde, metaforicamente, se
originaram as conquistas ultramarinas - D. João I.

2. A Dimensão Épica: a Expansão do Território e os Mitos da


Conquista
O período histórico propriamente dito tem início em Portugal
com o reinado de D. Afonso Henrique (1128), porque foi ele quem, na
25

Batalha de Ourique (1139), vencendo os sarracenos, consumou a inde-


pendência política do reino.
No lugar de Ourique trava-se a famosa batalha contra mouros
e espanhóis, e a ela se liga seu nome, bem como à fama da miraculosa
aparição de Cristo crucificado com promessas de vitórias 24 decorrendo
desse fato maravilhoso a intenção de incrustrar nos emblemas nacionais
as cinco chagas de Cristo.
Pae, foste cavalleiro.
Hoje a vigília é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!
No plano histórico, o apelo “Pae” ajusta-se perfeitamente
àquele que foi a origem da linhagem dos reis portugueses, bem como o
atributo “cavalleiro”, pois, em 1125,” na catedral de Samora, a si
próprio se armara cavaleiro, como soíam os reis, para não aceitarem
a superioridade moral que o cavaleiro reconhecia naquele de quem
recebia as armas”. Aquele ato solene quando D. Afonso Henriques
contava apenas catorze anos de idade, foi apressado pelos nobres que o
pretendiam como chefe da luta contra D. Tareja e Fernando Peres de
Trava. Também o atributo “cavalleiro” e o substantivo “vigília”
parecem conjugar-se harmonicamente com a lenda de Ourique e com a
outorga das armas, pois, em ambos os casos, D. Afonso Henriques passa
a noite recolhido em seus aposentos, em preces e lendo a Bíblia. A
cerimonia da investidura das armas é considerada o mais alto grau das
armaduras “pois que o padrinho é Deus, o cavaleiro o futuro rei de
Portugal e suas armas as chagas da Crucificação com que resgatou os
pecados do mundo” 25
Tal como o poema anterior, este também se estrutura em
forma de prece: naquele, o Poeta suplicou à mãe a ressurreição de
Portugal, neste implora ao filho a benção e a graça da sua bravura
heróica.
Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infiéis vençam,
A benção como espada,
A espada como benção!
O quiasmo dos versos finais, além de evocar a
excepcionalidade da investidura de D. Afonso Henriques onde o
26

divino se confunde com o cavaleiresco e o dom de Deus com as armas


do cavaleiro real, ainda reforça a súplica do Poeta pela bênção e pela
coragem do primeiro rei de Portugal. Enquanto o “Pae” daria a benção
e a fé, o “cavalleiro” daria a espada e a ação, numa combinação
perfeita de vida contemplativa e espiritual e vida ativa e material para
a formação do povo português.
A espada é não só o símbolo do estado militar, símbolo de
bravura e poder material, mas apresenta também o significado de guerra
santa, entendida esta como guerra interior. 26 A espada de D. Afonso
Henriques concentra as duas conotações e, remetendo-nos à lenda de
Ourique simbolizaria um fragmento da Cruz da Luz, da Cruz de Cristo.

“Sexto / D. Diniz”

O sexto castelo é dedicado a D. Dinis, homem de excepcional


formação, amante e mecenas das ciências e das artes, temperamento de
intelectual e de poeta. O seu reinado é considerado uma grande era na
história da marinha nacional, porque o rei administrador cuidou em
fomentar a marinha mercante. Lembremos aqui a importância do Tratado
do Comércio feito com a Inglaterra, em 1308, e a melhoria do Porto de
Paredes, na costa ao norte do Cabo da Roca, para defendê-lo das dunas.
Conduzido por propósitos de proteção da agricultura e expansão do
comércio agrícola e industrial, D. Dinis teria mandado semear os pinhais
de Leiria, a que alude o Poeta.
Esses pinhais, a princípio atendendo à necessidade de impedir
a deslocação de grandes massas arenosas, vão, posteriormente, fornecer
a madeira com que serão construídas as caravelas dos descobrimentos.
Daí o fato de D. Dinis ser considerado pelo Poeta “O plantador de
naus a haver” e serem os pinhais “como um trigo de Império”.
Estimado tanto pela nobreza como pelo povo, recebe os
títulos de “Pai da Pátria” e de “Rei Lavrador” - “Porque o lavrador
desvelado, o homem da terra, o protector do Comércio e da Marinha
é, também, extraordinário animador da Cultura e das Letras. Não lhe
bastam as sementeiras lançadas à Terra; outras sementeiras, as do
Espírito, constantemente lhe inspiraram e solicitaram o ânimo”. 27
É curioso observar que, dos nove reis da Dinastia de
Borgonha, o Poeta apenas seleciona dois na ordem de sucessão: o
primeiro (D. Afonso Henrique) e o sexto (D. Dinis) e este ainda
27

comparece na estrutura de Mensagem como herói do sexto castelo, o


que nos possibilita considerá-lo como marcado pelo número 6, que é
o número dos dons recíprocos e dos antagonismos e também do
destino místico 28. Com efeito, foi no reinado de D. Dinis que se
instituiu uma nova ordem militar - a Ordem de Cristo - (1319) em
substituição à extinta Ordem dos Templários. Foi também sob o seu
governo que se organizavam os cultos e as festas do Divino Espírito
Santo.
No plano do discurso, o poema é todo elaborado por meio
de comparações, de metáforas, metonímias e oxímoros, num processo
dialético de passado/presente/futuro; terra/mar; vida/morte, em perfeita
interaçào entre os primeiros tempos do reino como alicerce para as
futuras navegações e para a era dos descobrimentos, interseccionando
os planos do Rei trovador e do Rei Lavrador.
NA NOITE escreve um seu Cantar de Amigo
O plantador de naus a haver,
E ouve um silencio murmuro consigo:
É o rumor dos pinhaes que, como um trigo
De império, ondulam sem se poder ver.
Arroio, esse cantar, jovem e puro,
Busca o oceano por achar;
E a falla dos pinhaes, marulho obscuro,
É o som presente d’esse mar futuro,
É a voz da terra anciando pelo mar.
No plano da heroicidade, D. Dinis configura-se como força
conciliadora da predestinação divina e da vontade humana, pois como
“plantador de naus a haver”, inconscientemente, mas de forma provi-
dencial e com visão administrativa, realiza uma tarefa sem a qual não
teriam sido possíveis as navegações e a transformação de Portugal de
Reino a Império.
Dentro da metafísica aristotélico-tomista que preside a ela-
boração de grande parte do discurso de Mensagem, poderíamos
considerar, tanto D. Afonso Henriques como D. Dinis, como duas
metáforas que traduzem, respectivamente, a matéria e a forma dessa
entidade que se chama Portugal. D. Afonso Henriques concorre com a
espada, que seria o emblema da matéria e, consequentemente, da ação
e da vida ativa. D. Dinis comparece com a sua obra trovadoresca ou
com a sua sensibilidade artístico-cultural, que corresponderia à forma,
28

e, por conseguinte, ao espírito, à sabedoria, à vida contemplativa, à


alma da Nação.
Hernâni Cidade considera relevante D. Dinis sobretudo por
ter sido o promotor da cultura nacional. “E por vários modos a promoveu:
determinando, por ordem expressa, ou ao menos estimulando, o empre-
go da língua nacional em todos os diplomas notariais e escritos de pú-
blico interesse, exemplificando com a mesma actividade de poeta o cul-
tivo da respectiva forma de arte; criando os Estudos Gerais em Lisboa,
que depois transferiu para Coimbra, e com a inserção da Teologia no
quadro das disciplinas, elevou à categoria de Universidade”. 29

“Séptimo ( I ) / D. João O Primeiro”

O poema dedicado a D. João I estrutura-se em forma de


silogismo dedutivo, onde os termos se processam metonimicamente,
correspondendo a primeira estância à premissa maior, a segunda à pre-
missa menor e a terceira à conclusão.
O HOMEM e a hora são um só
Quando Deus faz e a história é feita.
O mais é carne, cujo pó
A terra espreita.
Os dois primeiros versos desta estância traduzem o mistério
que envolve a construção de um país e de um Império, enquanto os dois
últimos enfatizam a natureza humana “O homem é pó e em pó há de
tornar-se”. Os verbos conjugados na voz ativa e passiva enfatizam a
predestinação divina do herói. De fato, historicamente, o Infante D. João,
Grão-Mestre da Ordem de Avis, filho bastardo de D. Pedro I e D. Tereza
de Lourenço, granjeava as simpatias do povo português, que nele depo-
sitava as esperanças para o governo do reino e para a defesa da indepen-
dência, ameaçada pela regência de D. Leonor Teles. Após vencer a Batalha
de Aljubarrota (1385), o Mestre de Avis foi proclamado Rei de Portugal;
“mas rei de Portugal talvez menos por mérito seu do que por um conjun-
to de circunstâncias favoráveis e pelo apoio de homens de coragem e de
valor, como Nun’Alvares ou João das Regras”. 30 Isso se faz em côrtes
convocadas para Coimbra, libertando-se de outros dois pretendentes, D.
João e D. Dinis, filhos ilegítimos do Rei D. Pedro e de Inês de Castro,
com a ajuda de um famoso legista, João das Regras, que ele prontamente
nomeou seu primeiro chanceler. 31
29

Segundo o relato do historiador Fernão Lopes, parece ter


sido também ato da Providência divina a eleição do Infante D. João
como Mestre da Ordem de Avis.
... Depois da morte de D. Inês, el-rei sendo infante,
nunca mais quis casar, nem depois que reinou quis receber
mulher, mas teve um filho de uma dona, ao qual chamaram
D. João.
Desde moço encarregou el-rei D. Nuno Freire, mestre
de Cristo, que o criava e o tinha em seu poder. Entretanto,
sendo D. João de idade até dez anos, veio a morrer o mestre
de Avis, D. Martim do Avelal. Quando soube isto, o mestre de
Cristo foi logo a el-rei D. Pedro ( ... ) e pediu-lhe aquele
mestrado para o dito seu filho, que levava na sua companhia.
El-rei ficou contente com o requerimento e muito mais con-
tente de lho conceder.
Então o Mestre tomou o moço nos braços e seguran-
do-o com eles, cingiu-lhe el-rei a espada e o armou cavalei-
ro, beijando-o na boca e dando-lhe a benção (...)
E disse então el-rei para o Mestre:
- Tenha este moço isto por agora, porque sei que mais
alto há-de montar, se este é o meu filho João de que a mim
me falaram algumas vezes, embora eu preferisse que fosse o
infante D. João, meu filho, pois me disseram que eu tenho
um filho João que há-de montar muito alto, e pelo qual o
reino de Portugal há-de ganhar muita honra. E como eu não
sei qual destes Joões há-de ser (...) eu mandarei que sempre
se acompanhem ambos estes meus filhos, que têm o mesmo
nome, e escolha Deus para isso qual quiser embora eu tenha
o palpite de que há-de ser este e ninguém mais. 32

Na segunda estância conjugam-se a dimensão temporal his-


tórica e a dimensão simbólica ou mística de D. João I, na sua evolução
de Mestre de Avis a Mestre de Portugal erigido como Templo, como
espaço sagrado, simbólico, lugar da Presença Real. Segundo os
ensinamentos da maçonaria, “o Templo pode ser considerado como
uma imagem simbólica do Homem e do Mundo” 33
Teu nome eleito em sua fama,
É, na ara de nossa alma interna,
30

A que repelle, eterna chamma,


A sombra eterna.

Em sentido histórico, D. João I foi cognominado “Monarca


de Boa Memória”, pelo muito que fêz e pelo grande amor que
demonstrou ao país. Em sentido latente ou simbólico, essa cascata de
metáforas remete à idéia de que a simples evocação do nome de D.
João I, tal como o de Cristo, seria suficiente para afastar as desgraças e
desventuras, “a sombra eterna”. Por isso D. João I é considerado,
metaforicamente, como a “eterna chamma” - símbolo da purificação e
do amor espirituais - luz transcendental que ilumina os destinos de
Portugal.

“Séptimo ( II ) / D. Philippa de Lencastre”

Num poema composto por oito versos, distribuídos em duas


quadras, o Poeta fala com D. Filipa de Lencastre, dama de origem inglesa
que se casou com D. João I. Quanto à estrutura formal, o poema divide-
se em duas partes: na primeira estância o Poeta interroga a celebrada e,
na segunda invoca-a, em forma de prece, tal como ocorre com D. Tareja.
Que ENIGMA havia em teu seio
Que só genios concebia?
Que archanjo teus sonhos veio
Vellar, maternos, um dia?
Volve a nós teu rosto sério,
Princeza do Santo Gral,
Humano ventre do Império,
Madrinha de Portugal !
Na exaltação da heroína, o Poeta acena para diferentes di-
mensões da realidade: na dimensão temporal histórica refere-se à D.
Filipa como matriz geradora (“Humano ventre do Império”) de reis e
infantes, considerados “gênios” por Pessoa e “inclita geração” por
Camões, e ao fato de não ter sido considerada rainha e mãe de Portugal
(como D. Tareja), porque ela era nascida na Inglaterra, filha do Duque
de Lencastre, daí a metáfora “Madrinha de Portugal”. Na dimensão
mítica e espiritual ela relaciona-se com a tradição cavaleiresca do Rei
Artur e sua Távola Redonda, metaforizada em “Princeza do Santo
Gral”, e com a Virgem Santíssima no momento da Anunciação: “Que
archanjo teus sonhos veio / Vellar, maternos, um dia?”
31

D. João I e D. Filipa de Lencastre formam o tronco de frondosa


árvore que produz frutos de místico espírito de sacrifício, como D.
Fernando; de estoicismo ilustrado, como D. Duarte; de inteligência e
coragem, como D. Pedro; e de gênio organizador e empreendedor, como
D. Henrique.
Enquanto os “Castellos” representam o plano temporal do
relato épico; “a afirmação da nacionalidade, o domínio da terra e a
promessa do mar” 34, as “Quinas” apontam para o plano espiritual,
indicando a aceitação resignada dos desígnios divinos e das leis
humanas, da sensação de inutilidade da própria vida, e o espírito de
sacrifício de reis e infantes que podem ser considerados os cinco mártires
de Mensagem. Porque eles representam o saldo negativo das conquistas,
tomamos a liberdade de, na nossa leitura, romper com a estrutura
cronológica pré-estabelecida na obra, para deixar fluir a seqüência épica
da história, e depois retomarmos o que se pode considerar como história
trágica.

IV - A Coroa

“Nunalvares Pereira”

Na seqüência da história épica de Mensagem, encimando os


“Castellos” e as “Quinas” do “Brasão”, o Poeta escolheu a figura
heróica de Nunalvares Pereira - na dualidade de santo e de guerreiro -
que reúne em si as características dos “Castellos” e das “Quinas”:
ação e resignação, matéria e espírito.
Como a nação portuguesa possuía regime monárquico no
período histórico coberto por Mensagem, e desde o “Brasão” parecia
predestinada a cumprir misteriosos e elevados destinos, “A Coroa”
não só concorre para definir o tipo de regime, como também para
transmitir a ligação do poder terreno com o poder espiritual. Segundo o
Dicionário de Símbolos, “a coroa une, na pessoa do coroado, o que
está abaixo dele e o que está acima, mas fixando os limites que, em
tudo que não é ele, separam o terrestre do celestial, o humano do divino.
(...) 35
Considerando “o último homem de Idade Média” por aliar
ao seu espírito de cavalaria, segundo o modelo arturiano, a inverossímil
32

e lendária intrepidez, revelada através de um espírito prático e de


infalível tática militar, Nuno Alvares Pereira foi nomeado Condestável
do Reino por D. João I. Após concluir o seu objetivo terreno, o grande
batalhador da independência nacional passou a dedicar-se ao
espiritualismo cristão, ideal manifestado desde a juventude encerrando-
se no Convento do Carmo para assumir votos como Frei Nuno de Santa
Maria. Falece em novembro de 1431, mas a fama de santidade acendeu
a devoção dos fiéis que começaram a invocar a sua intercessão:
levantaram-lhe altares, lavraram-lhe imagens e apresentavam-lhe culto.
Já no século XVII tratou-se em côrtes de pedir a sua canonização, mas
só no século XX, com os trabalhos do processo concluídos, o Papa
Bento XV beatificou Frei Nuno de Santa Maria (1918), confirmando o
culto que desde tempos imemoriais se lhe têm prestado em Portugal.
Num poema organizado em três quadras, em espécie de
dialogísmo, o poeta fala com o santo e herói: em cada estrofe faz uma
pergunta e apresenta uma resposta. Na terceira estrofe o Poeta dirige-
se-lhe em tom de prece litúrgica.
Que AUREOLA te cerca?
É a espada que, volteando,
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.
Embora, em termos canônicos tenha sido apenas beatificado,
a crença popular considera-o Santo Condestável, celebrando sua festa
religiosa no dia 6 de novembro. Nesta estrofe o Poeta alude à santidade
de Nuno Álvares, e, numa espécie de transmutação (mais do que trans-
formação alquímica) em que alia heroísmo e santidade, exalta a “auréola”
do beato, a coroa elíptica, a luz espiritual que transmuda em espada lumi-
nosa.
Mas que espada é que, erguida,
Faz esse halo no céu?
É Excalibur, a ungida,
Que o Rei Arthur te deu.
A “espada” de Nuno Alvares é exaltada como instrumento
de força material e espiritual; não seria uma espada qualquer, simples
arma de guerra, mas “ungida” ou abençoada por Deus, tal como a
“Excalibur” do Rei Artur, daí a extensão de seu significado à espada
mítica e sagrada.
Através da referência a “Excalibur, a ungida” pode-se inferir,
33

metonimicamente, a herança inglesa na história de Portugal e, implici-


tamente, o Santo Graal.
Sperança consumada,
S. Portugal em Ser,
Ergue a luz da tua espada
Para a estrada se ver.
Tal como ocorre nos poemas dedicados a D. Tareja, D.
Afonso Henriques e D. Filipa de Lencastre, nesta estrofe, erigida em
forma de prece, o Poeta suplica ao beato, metonimica e metaforicamente
convertido em “S. Portugal em Ser”, que ilumine, com sua luz de Santo
Condestável, o caminho da pátria.

V - O Timbre
Em sentido simbólico, em sentido heráldico e em sentido
hermético, convergem, emblematicamente, na constituição do “grifo”
do “Brasão” de Mensagem, o rei dos animais e a rainha das aves.
Enquanto a figura do leão é a própria encarnação do poder, da sabedoria
e da justiça, e, pois que “símbolo solar e luminoso ao extremo”36
relaciona-se ao mestre ou soberano, “a águia é a encarnação, substituto
ou mensageiro da mais alta divindade uraniana e do fogo celeste (...)
atributo de Zeus e do Cristo” 37, coroando o símbolismo dos estados
espirituais superiores e da percepcão direta da luz intelectiva, porque
só ela é capaz de fixar o sol sem ter os olhos queimados. Convém
lembrar, também, que em certas obras de arte da Idade Média, a águia
era identificada ao Cristo, exprimindo, a um só tempo, a sua ascensão e
a sua realeza. 38
Por essas considerações gerais, podemos observar como foi
rigorosa e apropriada a seleção das figuras para a constituição do Grifo:
para a cabeça, o Infante D. Henrique, para as duas asas, D. João II e
Afonso de Albuquerque. É necessário constatar também que os três
poemas do timbre são dedicados apenas ao componente águia (parte
superior do Grifo) e isso se justifica porque as figuras enaltecidas estão
na base dos descobrimentos e das conquistas de novos horizontes.

“A Cabeça do Grypho / O Infante D. Henrique”

A cabeça expressa o ardor do princípio ativo, abrangendo a


autoridade de governar, ordenar, instruir e, consequentemente, simboliza
34

“o espírito manifestado, em relação ao corpo, que é a manifestação da


matéria”. 39 Esses sentidos convergem para a representação do único,
do sol, da divindade e da perfeição.
A “Cabeça do Grypho” é justamente reservada àquele que
pensou, que raciocinou os descobrimentos, que concebeu o império ma-
rítimo português: foi ele que, como a águia, conseguiu voar muito alto e,
não temendo encarar a luz do sol, penetrou nos mistérios divinos, estabe-
lecendo a interação entre Deus e os portugueses para a conquista e posse
dos mares.
Se a primeira geração de cronistas e historiadores retratou esse
quinto filho de D. João I como arquétipo de cruzado, ardente de fervor
religioso e indômito na luta contra os infiéis, as posteriores gerações acres-
centaram a esse esboço todas aquelas qualidades que fizeram do Infante D.
Henrique uma figura exemplar na história de Portugal. Foi um extraordi-
nário chefe militar; um sábio interessado pela ciência do seu tempo; um
político clarividente que perseguindo seus objetivos conseguiu a ultrapas-
sagem do Cabo Bojador; um homem que, dominado pelo espírito religioso
(governador da Ordem de Cristo) foi um dos primeiros a entender o senti-
do do ecumenismo missionário. Enfim, um homem de ação, sujeito a êxi-
tos e fracassos (casos de Ceuta e Tânger) mas, sempre insistindo nos fins a
que se propunha alcançar, tornou-se o símbolo das vontades e dos esforços
anônimos de navegadores, cosmógrafos, mercadores e aventureiros que
ajudaram o homem moderno a construir novas dimensões para a perspec-
tiva do mundo. 40
Assim como a cabeça é uma só, o poema também se estrutura
com uma única estrofe de cinco versos, em forma de síntese: “o único
imperador” que representa a posse do mar.
EM SEU THRONO entre o brilho das spheras,
Com seu manto de noite e solidão,
Tem aos pés o mar novo e as mortas eras
O único imperador que tem, deveras,
O globo mundo em sua mão.
E a posse do mar, expressa pelo verbo ter, é também a epígrafe
da Segunda Parte de Mensagem (“Possessio Maris”), cujo poema de
abertura é dedicado ao Infante.
Na descrição pictórica de D. Henrique, o Poeta faz-nos
visualizar a imagem de um imperador com uma esfera armilar na mão,
35

o que, além de ser uma imagem é uma realidade; ele tem realmente o
mundo em suas mãos, um mundo que ninguém conhecia “o mar novo”
por isso é “o único imperador” do qual se pode fazer tal afirmação.
Esses versos nos remetem também à esfera armilar da doutrina
ptolomaica do universo e à Escola de Sagres, onde o Imperador se nos
apresenta como um visionário com os olhos fixos nos longes, nas suas
longas noites de estudo e contemplação - “manto de noite e solidão”
Como a “Cabeça do Grypho”, o Infante é um microcosmo
que possui a visão da totalidade cósmica, do passado ao futuro, e por
isso se justifica o Poeta tê-lo celebrado como “o único imperador que
tem, deveras, / o globo mundo em sua mão”.
A estaticidade e o imobilismo da sua figura sugerem que os
descobrimentos teriam sido realização dos desígnios divinos. É inte-
ressante observar, ainda, que, no poema, metonimicamente se enfatizam
os pés e as mãos do Infante: aos seus pés tem o futuro e o passado - “O
mar novo e as mortas eras” - e na mão traz o mundo todo. Com essa
imagem, o Poeta refere que as caravelas portuguesas, sob o comando
do Infante de Sagres, estiveram na origem de todos os mares e de todas
as terras que formam o mundo. Dai, por antonomásia, merecer do Poeta
o epíteto de “o único imperador” espécie de herói sobrenatural que
desfruta, com a impassibilidade dos deuses, a glória de ter vencido.

“Uma Asa do Grypho / D. João o Segundo”

Se compararmos o retrato de D. João II com o do Infante D.


Henrique, observaremos semelhanças na descrição: o mesmo ar enig-
mático de contemplação distante e misteriosa e a mesma atitude de
imobilidade solitária dão um sentido de continuidade, no tempo e no
espaço, dos sonhos de conquista do Infante a D. João II.
Com efeito, esta “Asa do Grypho” foi um dos continuadores
da obra idealizada pelo Infante D. Henrique, dando vigoroso impulso à
expansão ultramarina. Com seus conselheiros, chegou a arquitetar um
plano coerente e bem estruturado para se chegar à antiga Ásia, por via
marítima, plano esse executado com sucesso no reinado de D. Manuel,
o Venturoso.
D. João II foi cognominado “O príncipe perfeito”, não tanto
pelo significado moral do termo, senão por seu valor político, “pela
energia com que defronta obstáculos e ciladas, pela ordem e minúcia
36

com que se informa da marcha dos negócios públicos, pela


inflexibilidade com que afirma o seu predomínio” 41
BRAÇOS CRUZADOS, fita além do mar.
Parece em promontório uma alta serra -
O limite da terra a dominar
O mar que possa haver além da terra.
A côrte de D. João II apresentava-se de maneira sisuda e
austera e sua figura também é assim descrita, a começar pela côr negra
que punha em tudo. Tinha “hábito de coruja” e adotava como símbolo
a figura de um pelicano, representação de um rei mortificado pelas
esmagadoras exigências do ofício duro, a disfarçar numa compostura
hirta as suas fraquezas e as suas humaníssimas angústias. Não seria
inoportuno lembrar a lenda que diz que o pelicano rasga o peito para
alimentar seus filhos. Assim o sacrifício de um rei se faz em benefício
de seu povo.
Neste poema, novamente a presença de uma ave a marcar,
simbolicamente, a vida heróica de D. João II que, num simples abrir de
braços, poderia desvendar novos mundos.
Seu formidavel vulto solitario
Enche de estar presente o mar e o céu,
E parece temer o mundo vário
Que elle abra os braços e lhe rasgue o véu.
A dupla adjetivação do primeiro verso desta estrofe parece
relacionar-se com a idéia de que foi o único rei a conseguir a rendição
humilhada do Mostrengo, a partir da qual esse mundo diverso, ainda
por conhecer, passou a ser descortinado (“mundo vário”) numa simples
passagem de um gesto: (“abra os braços e lhe rasgue o véu”), da vida
contemplativa para a força da ação. Assim, D. João II é apresentado no
poema como futuro senhor dos mares e dos céus.

“A outra Asa do Grypho / Affonso de Albuquerque”


Observa com muita perspicácia o crítico Antonio Cirurgião
que os três poemas que estruturam “O Timbre” principiam,
curiosamente, por adjuntos adverbiais de modo e de lugar (ou vice-
versa):
Em seu throno entre o brilho das espheras
(A Cabeça do Grypho / O Infante D. Henrique)
37

Braços cruzados, fita além do mar.


(Uma Asa do Grypho / D. João o Segundo)
De pé, sobre os países conquistados.
(Outra Asa do Grypho / Affonso de Albuquerque)
O primeiro, emblematicamente, é a mente que concebe os
descobrimentos e conquistas, contemplando, das alturas do universo, o
futuro império; o segundo é o líder que ordenou a realização dos sonhos:
fita o império que, por seu decreto, as naus irão descobrir; o terceiro,
emblematicamente, é um dos conquistadores desse império 42 . Daí, a
mente que projeta, o chefe que ordena e o comandado que realiza; da
concepção à concretização dos sonhos, da potencialidade à ação. Me-
taforicamente, remete-nos ao verso primeiro de “Mar Português”:
“Deus quere, o homem sonha, a obra nasce”.
Em poema formado por uma única estrofe de dez versos,
Afonso de Albuquerque é apresentado como um estóico, resignado em
seu espírito de fidelidade.
Foi um comandante da armada de Tristão da Cunha que, em
1506, partiu de Lisboa com o objetivo de fundar um império português
no Oriente. Em pouco tempo, orientado pelo ideal supremo de servir a
seu rei e de engrandecer a sua pátria, organizou uma falange própria e,
separando-se de Tristão da Cunha,“largou de Sokotra para a costa da
Arábia, ao longo da qual foi subindo vagarosamente assolando tudo” 43,
conquistando Ormuz, junto da Pérsia, Goa, no meio da India e Malaca,
bem perto da China; tudo isso num breve espaço de cinco anos (de
1507 a 1522), o que significa o domínio de todo o mar desde a Península
Arábica, passando pela Península do Industão até chegar à Península
da Malásia.
Em 1509, foi nomeado, pelo Rei, governador (ou vice-rei)
das Indias, mas devido às invejas e intrigas da corte foi-lhe tirado o
governo. Com a humildade própria dos estóicos, despido de ambições
materiais, almejando tão só a amizade e a compreensão do Rei e dos
homens, no que se viu frustrado por invejas e intrigas, teve aquela
exclamação célebre quando soube de sua substituição no cargo que
ocupara: “Mal com el-rei por amor dos homens, e mal com os homens
por amor de el-rei” 44 .
No poema em que é celebrado, o Poeta alude ao ato de
injustiça praticado contra o herói e também às suas conquistas,
38

exaltando-lhe o espírito de superioridade estóica diante dos bens


materiais.
O grifo do “Brasão” começou a fazer parte do escudo portu-
guês a partir do casamento da Infanta D. Isabel, filha de D. Manuel, o
Venturoso, com Carlos V; como timbre do brasão, êsse é o emblema que
lhe confere a marca distintiva. Para tal, era preciso que fôsse constituído
por figura que caracterizasse realmente Portugal. O Poeta o decompõe
em três figuras que sintetizam a conquista do mar; do sonho-projeto
(Infante D. Henrique), ao comando-ordem (D. João II) e à realização
(Afonso de Albuquerque). Última parte do “Brasão”, o grifo ou timbre
é a figura fantástica que o envolve, como o mar a Portugal, que define
o país como predestinado para o, até então, “impossível oceano”.
Há, nessa primeira parte de Mensagem um breve resumo da
história portuguesa, desde o mítico Ulisses, que aí chegara por mar, até
os três personagens épicos que prepararam e efetivaram sua conquista.
O caminho pela terra é apenas levemente assinalado, enquanto o
caminho pelo mar será destacado, nos seus principais passos, na Segunda
Parte da obra, “Mar Portuguez”

“Segunda Parte / Mar Portuguez”


Doze poemas constituem esta Segunda Parte, dos quais 04
(quatro) têm por título heróis individuais; 01 (um) apresenta um herói
coletivo (“Os Colombos”); 01 (um) tem por título um fenômeno
astrológico e geográfico (“Horizonte”); 01 (um) refere-se a um ponto
cardeal (“Occidente”); 01 (um) encerra uma figura emblemática (“O
Mostrengo”); 02 (dois) enaltecem objetos (“Padrão” que se relaciona
com Diogo Cão e “A Última Nau” que se refere a el-rei D. Sebastião);
01 (um) constitui uma ação suplicativa (“Prece”) e 01 (um) refere-se
ao território português (“Mar Portuguez”).
Na Primeira e Segunda Partes de Mensagem o percurso his-
tórico se opera cronologicamente - com exceção feita, na primeira, à
inserção de D. Sebastião, como a indicar a sua atemporalidade - seguindo
o roteiro do mar conhecido para o mar por conhecer. Abre a Segunda
Parte o precursor ou a origem dos descobrimentos - o Infante D.
Henrique - e a encerra o último navegador desse mar, D. Sebastião. O
fato de, na cronologia histórica da estrutura da obra, Vasco da Gama
aparecer posteriormente a Fernão de Magalhães, parece justificar-se
39

pelo papel que ele desempenha na obra: o de representante simbólico,


como herói coletivo, de todos os grandes descobridores de seu tempo.
Numa visão diacrônica, a conquista do “Mar Português”
poderia sintetizar-se, como a organiza, didática e metaforicamente o
crítico Antonio Cirurgião, da seguinte forma:
O infante D. Henrique concebe a idéia de um império maríti-
mo português; partem as suas naus para os altos mares em
busca de novas terras; Diogo Cão toma oficialmente posse,
em nome de Portugal, das terras descobertas; o Mostrengo
quer pôr termo a essa aventura, mas é simbolicamente venci-
do por Bartolomeu Dias, ousadia que virá a pagar com a vida;
as outras nações européias, desejosas de emular Portugal, lan-
çam-se também nessa aventura marítima, não passando,
porém, os seus feitos, de uma sombra dos de Portugal; pros-
seguem as caravelas do Infante de Sagres na sua empresa e
encontram as terras do Occidente, especificamente o Brasil;
descobertos todos os novos continentes e ilhas sem fim, re-
solvem os nautas da escola do Infante fazer uma viagem de
circum-navegação, proeza por que serão punidos pelas foças
adversas do universo; obreiros de gestas heróicas, os mari-
nheiros do Infante são convertidos em semi-deuses, como os
da antiguidade, e colocados, portanto, no panteão reservado
aos semi-deuses: o Olimpo; sujeito às leis inexoráveis do
tempo, que tudo consome, morre o império marítimo portu-
guês; mas, ansiosos por se perpetuar no tempo e no espaço e
ciente de que esse é o seu destino manifesto, os portugueses
imploram a Deus que lhes conceda a graça de um império
que não morra. 45

Mensagem estrutura-se de forma circular, sem saltos bruscos


na sua cronologia histórica, de uma parte para outra. A transição de
“Brasão” para “Mar Portuguez” e deste para “O Encoberto” verifica-
se através de um encadeamento de poemas. Os últimos poemas da
primeira parte poderiam, sem dúvida, pertencer à segunda. O “Infante
D. Henrique”, (“A Cabeça do Grypho”) está presente no final da
primeira parte e inicia a série de poemas de “O Mar Portuguez”. No
final desta parte, sob o título de “A última Nau”, aparece a figura ale-
górica de D. Sebastião, já invocado no “Brasão” e que vai ser o centro
polarizador de “O Encoberto”. Tal encadeamento acentua a harmonia
estrutural desta epopéia.
40

Em “O Mar Portuguez”, o Poeta apresenta-nos a fase mais


gloriosa da história de Portugal. Seus doze poemas tratam dos grandes
descobrimentos, desde as origens da posse do mar até à morte dos seus
heróis, enaltecendo o saldo positivo e lastimando o lado negativo da
expansão territorial, tentando despertar o país do estado de letargia em
que se encontra no tempo presente:
E outra vez conquistemos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
Histórica e metaforicamente a estrutura também é circular.
Começa a segunda parte com o precursor das descobertas e acaba
com o pós-Alcácer Quibir (a esperança na repetição das façanhas dos
grandes descobrimentos); o último poema de “Mar Portuguez”
(“Prece”) comporta o mesmo apelo do poema de sua abertura (“O
Infante”).
Quem te sagrou creou-te portuguez.
Do mar e nós em ti nos deu signal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
(“O Infante”)
Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ansia -,
Com que a chamma do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
(“Prece”)
O artista plástico Paulo Cardoso, ao proceder a uma leitura
astrológica do “Mar Portuguez”, observa que os doze poemas “são feitos
à imagem e semelhança dos doze signos do Zodíaco, e se perfazem, sob
aquele nome, o corpo central de Mensagem, eles são, por isso, de um
modo cifrado, a imagem do Cíclo da Totalidade, ou seja, do
Universalismo Luso, preconizado nas descobertas marítimas dos portu-
gueses. Por outro lado, isto sugere que este segundo corpo da Mensa-
gem constitui um todo autónomo, um organismo individualizado como é
o próprio Zodíaco. Se relacionarmos as três partes desta obra pessoana
com as três pessoas da Santíssima Trindade, reconheceremos que à Se-
gunda - O Filho, a manifestaçào terrena de Deus-pai, corresponde pois
àquela a que o poeta pôs o título de ‘Mar Portuguez’. Fica pois suben-
tendido que ‘O Mar Universal é Português’ de acordo com a manifesta-
ção dos desígnios de Deus”. 46
41

“I - O Infante”

A abertura desta Segunda Parte da obra com o Infante é muito


apropriada, justificando-se por ser ele o pioneiro na empresa dos des-
cobrimentos, quando, ao fundar a Escola de Sagres, objetivava aí
preparar os navegadores.
DEUS QUERE, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma.
O primeiro verso já nos apresenta uma visão providencialista
da história: as conquistas portuguesas resultaram, em primeiro lugar,
da vontade divina e, em segundo lugar, do idealismo humano. O conceito
de Deus como causa primeira e do homem, como causa segunda, aparece
explicitamente três vezes no decorrer da obra, correspondendo a três
momentos epifânicos da história de Portugal: na sua gênese, com o
poema dedicado ao Conde D. Henrique - “Todo começo é involuntário
/ Deus é o agente”; na sua defesa, com o poema dedicado a D. João I -
“O homem e a obra são um só / Quando Deus faz e a história é feita”;
na concepção do Império, com este poema de exaltação ao Infante D.
Henrique: “Deus quere, o homem sonha, a obra nasce”.
É interessante observar o quanto este poema se apresenta
estruturado sob o número três, que é um número fundamental, univer-
salmente, pois exprime uma ordem intelectual e espiritual em Deus, no
cosmo e no homem. De acordo com os chineses, o três é um número
perfeito e expressão da totalidade, da conclusão, nada lhe podendo ser
acrescentado. Já para os cristãos, esse número significa a perfeição na
Unidade Divina.
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
A estrutura ternária marca o poema tanto na sua
horizontalidade, como na verticalidade. Construido por três quadras,
em forma de silogismo dedutivo, a primeira estrofe corresponde à
premissa maior, a segunda à premissa menor e a terceira à conclusão.
Quem te sagrou creou-te portuguez.
Do mar e nós em ti nos deu signal.
42

Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.


Senhor, falta cumprir-se Portugal!
O primeiro verso da primeira estrofe está elaborado sob o
processo de trimembração numa espécie de comunicação espiritual do
homem com o Ser Superior divino (Deus) através do sonho (anunciação)
e a conseqüente “fiat lux”. A vontade divina é enfatizada também por
três objetivos: pela unidade da terra “Deus quis que a terra fosse toda
uma” - pela unidade do mar: “Que o mar unisse, já não separasse” - e
pela predestinação do povo português para realizar a união da terra
com o mar: “Sagrou-te e foste desvendando a espuma”. Como infante,
D. Henrique era o quinto filho de D. João I e também, pela sagração
como Grão-Mestre da Ordem de Cristo, o ungido pelo Pai: daí o duplo
significado de Filho e Verbo Divino. Além disso, o Infante é a
representação metonímica do povo português com sua predestinação:
Quem te sagrou, creou-te portuguez
Do mar e nós em ti nos deu signal
Todo o cariz divino da obra do Infante está disseminado no
poema através de palavras que indicam luminosidade, pureza, virgindade
- “orla branca”, “espuma” - e de construções que transmitem a
sensação de movimento em direção a um fim - “E a orla branca foi de
ilha em continente, / Clareou, correndo, até ao fim do mundo, / E viu-
se a terra inteira, de repente, / Surgir, redonda, do azul profundo”. -
numa elaboração gradual que nos remete à seqüência cronológica dos
acontecimentos: primeiro, as ilhas do Atlântico e, mais tarde, o
continente africano.
O poema encerra-se com um verso que é, ao mesmo tempo,
uma prece e um lamento sobre o Quinto Império. O verbo no tempo
presente confere caráter de urgência à necessidade de realizaçào do
Ser da Pátria. É a necessidade de se reconstruir o Império feito de sonhos
e de anseios de Absoluto. O crítico Antonio Apolinário Lourenço analisa
a Segunda Parte da Mensagem sob duas diferentes isotopias: a isotopia
dos descobrimentos marítimos e a isotopia da iniciação. Sob este se-
gundo enfoque, ele observa que “O infante é manifestamente um
iniciado pertencente a uma escola muito especial: ele não recebeu a
iniciação da mão de ‘exotéricos Maiores’, mas directamente, e por
cima deste todos, das mesmas mãos do que chamamos Deus.”’ 47
Pode-se considerar o Infante D. Henrique como o ponto onde
o projeto realizado pôs fim à diferenciação e à dualidade mar-terra para
43

iniciar a totalidade individualizada. Ao anunciar-se o Verbo, na terceira


estrofe, “afirma-se a consciência da individualidade lusitana através da
2ª pessoa do singular e do nome que lhe corresponde: PORTUGAL”. 48 Re-
força-se assim, a identificação entre o Infante e o percurso da expansão
portuguesa.

“II - Horizonte”
Este poema, constituído por dezoito versos distribuídos em
três sextilhas, é elaborado na dualidade histórica e esotérica.
No aspecto histórico, o Poeta exalta o alargamento do es-
paço e a possessão efetiva do mar, antes povoado de temores e obstáculos
gerados pela ignorância e pela imaginação.
Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mysterio,
Abria em flor o Longe, e o Sul siderio
Splendia sobre as naus da iniciação.
No aspecto esotérico, o poema remete ao sentido de
“telestai”, de iniciação. Iniciar é, de certo modo, fazer morrer; mas é
uma morte considerada uma saída, porque é a passagem de um lugar ou
de um estado para outro. Metaforicamente o iniciar exige uma
transformação essencial para a ascensão a uma nova vida. E o mar,
como água-mãe, matriz geradora e símbolo da dinâmica da vida, é
justamente o caminho para a iniciação ou metamorfose. Considerado o
lugar dos nascimentos, das transformações e dos renascimentos,
simboliza, outrossim, um estado transitório entre as possibilidades ainda
informes e as realidades configuradas: a imagem da vida e a imagem da
morte.
Os navegadores portugueses, como “telestai”, desvendaram
“a noite” e “a cerração”, “as tormentas” e “os mysterios” do mar
tenebroso, e, nessa ultrapassagem de obstáculos, operaram a
transformação para uma nova vida de conquistas: “Abria em flor o
Longe, e o Sul sidério / Splendia sobre as naus da iniciação”. O
desvendar dos mares foi também uma autêntica gnose.
Na segunda estância o Poeta descreve as viagens portuguesas,
a ação das descobertas. Cada terra descoberta é um festival de cores,
44

formas e sons; o horizonte longínquo e abstrato cede lugar a um mundo


novo, cheio de vida.
A terceira estância encerra a interpretação mística da ação
dos navegantes portugueses:
O sonho é ver as fórmas invisíveis
Da distancia imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esprança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A arvore, a praia, a flor, a ave, a fonte -
Os beijos merecidos da Verdade.
A partir do sonho, no processo gnoseológico do Poeta de
Mensagem, chega-se à Verdade, concorrendo para essa transformação,
para essa iniciação, para essa nova vida, a esperança e a vontade.
Em seu aspecto formal, o poema é estruturado através do
processo de disseminação e recolha: na primeira estância os vocábulos
disseminados referem-se ao mar desconhecido - “coral”, “praias”,
“arvoredos”, “tormentas”, “mysterio”; nas duas outras referem-se
ao mar transposto e à vida nova de esplendor e de Verdade - “terra em
sons e cores”, “a arvore, a praia, a flor, a ave, a fonte” - num percurso
que vai do sonho e da vontade para a realização e para uma nova vida.

“III - Padrão”
Em processo dialético entre presente e futuro, finito e infinito,
matéria e espírito, vontade humana e desígnio divino, o poema consti-
tui-se de quatro quadras e, iconicamente, apresenta-se elaborado em
movimento ascensional. Na primeira estrofe, Diogo Cão declara que
ergueu um padrão; na segunda explica o seu significado; na terceira,
esclarece sobre o significado metafórico das Quinas, e na quarta, o
significado transcendental da Cruz do padrão.
O padrão representava a soberania de Portugal sobre os lu-
gares descobertos. Foi Diogo Cão, escudeiro do Rei D. João II, quem,
em 1482, partiu para levar mais longe o nome de Portugal, em expedição
que atingiria a África (embocadura do Rio Zaire ou Congo). Por reco-
mendação do rei, ele deveria assinalar os lugares conquistados, não
mais com inscrições em troncos de árvores ou com cruzes de madeira,
como até então era o costume, mas colocando autênticos e duradouros
padrões de soberania. O padrão passa a ter a forma de um cilindro,
sobre o qual pousa um cubo e ao cimo deste uma cruz, a atestar a
45

fidelidade a Cristo. Nas diversas facetas do cubo inscrevem-se as armas


de Portugal, com as datas, nomes dos reis e dos navegadores.
O ESFORÇO é grande e o homem é pequeno.
Eu, Diogo Cão, navegador, deixei
Este padrão ao pé do areal moreno
E para deante naveguei.
A alma é divina e a obra é imperfeita.
Este padrão signala ao vento e aos céus
Que, da obra ousada, é minha a parte feita:
E por-fazer é só com Deus.
Na primeira quadra constata-se a dialética humana e divina,
a obra terrena, finita e a obra celestial e infinita.
O limite entre essas duas naturezas é expresso na segunda
quadra, num discurso em primeira pessoa: a parte dos homens é o que
está feito (presente-passado), a parte de Deus é o que está por fazer
(presente-futuro). O padrão atesta apenas a ousadia da obra humana.
Na terceira quadra, num discurso pragmático, o Poeta refere-
se ao processo de aprendizagem adquirido com os descobrimentos.
E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é portuguez.
Podemos observar que, após o pretérito perfeito da primeira
estrofe “deixei”, o tempo presente “ensinam” e “vês” e mais o valor
dos demonstrativos “estes”, “estas” e do advérbio “aqui” reforçam a
atualidade da visão das Quinas do padrão que é a concretização, em
pedra, material durável e resistente, do Brasão de Portugal: a marca da
posse de Portugal, em nome de Deus. A superioridade dos portugueses
ficou atestada, a partir de Diogo Cão, e por muito tempo, por esse
monumento erigido pelos navegadores de Portugal.
E a cruz ao alto diz que o que me ha na alma
E faz a febre em mim de navegar
Só encontrará de Deus na eterna calma
O porto sempre por achar.
Se tomarmos o poema “Padrão” na linha interpretativa das
etapas da iniciação, numa progressão ascensional de valores, parece-nos
que o Poeta quer confirmar a sua concepção rosacrucianista da hierarquia
46

dos mundos e dos deuses, a que o próprio Pessoa se refere numa carta a
Casais Monteiro, datada de 13 de janeiro de 1935 49 . O movimento ascen-
dente vai do cubo, junto à terra, até a cruz, no alto, demonstrando a conju-
gação do esforço humano e a predestinação divina para a realização da
obra portuguesa.

“IV - O Mostrengo”

Elaborado com três estrofes de nove versos cada uma, este é


um dos poemas mais longos de Mensagem. Através da estrutura externa
parece o Poeta querer registrar o longo tempo cronológico e o intenso
tempo psicológico de esforços e sofrimentos dos navegadores até ul-
trapassarem o Cabo das Tormentas, depois transformado em Cabo da
Boa Esperança.
O poema se constrói em torno do número nove e do número
três. Sendo o último da série dos algarismos, o “nove anuncia ao mesmo
tempo um fim e um recomeço, isto é, uma transposição para um plano
novo” 50 . O número três denota a idéia de uma nova fase dos descobri-
mentos após a transposição do Cabo das Tormentas e também a idéia
da morte, do passado.
O “Mostrengo” é, pois, a alegoria do passado de trevas, ig-
norância e crendices vencido pela técnica, bravura e sonho de grandeza.
O número três sintetiza a união do céu e da Terra porque
exprime a ordem intelectual e espiritual em Deus, no cosmo e no homem.
Segundo Oswald Wirth, na obra Le Tarot des Imagiers du Moyen
Age (Paris, 1966, p. 70-72): “Os primeiros Sefirots (números, segundo
a Cabala) são classificados em três ternários. O primeiro é de ordem
intelectual e corresponde ao pensamento puro ou ao espírito (...). O
segundo ternário é de ordem moral e relativo ao sentimento e ao
exercício da vontade, ou seja, à alma (...). O terceiro ternário é de
ordem dinâmica: relaciona-se com a ação realizadora, e, por isso, com
o corpo, engloba o princípio que dirige o progresso, a ordem correta
de execução, as energias realizadores do plano”. 51
Se nos recordarmos de que, aproximadamente dez por cento
dos cerca de vinte e sete mil fragmentos que se conservam no espólio
de Fernando Pessoa dizem respeito à área esotérica, destacando-se temas
como Tarot, I Ching, Numerologia, Alquimia, Cartomancia, Cabala,
Geometria Sagrada e principalmente Astrologia, quer dizer que o Poeta
47

se apoiava em filosofias esotéricas para a elaboração do seu discurso


poético. Portanto, os números nove e três participam do poema como
intencional recurso poético para a mensagem a ser transmitida.
Vejamos como se processa, no poema, o esquema numérico:
três estrofes de nove versos (vinte e sete equivalem a nove, porque
2+7=9); sete vezes aparece a palavra “três” (7x3=21 que equivale a
2+1=3); três vezes o timoneiro é inquirido pelo Mostrengo e três vezes
apresenta a sua resposta; doze vezes o mostrengo voou em roda da nau
(12 equivale a 1+2=3); na terceira estrofe, nove vezes o navegante
hesitou, e três vezes tremeu, antes de responder ao Mostrengo. No plano
do discurso, três vozes se alternam: a do narrador, a do mostrengo, a do
timoneiro.
Podemos observar também que, na tradição hermética, o po-
ema corresponde ao terceiro ternário na classificação dos Sefirots,
porque se relaciona com a energia realizadora das navegações.
No plano histórico, através da alegoria do Monstrengo o
Poeta celebra os progressos substanciais da obra das navegações sob o
reinado de D. João II. Era uma época em que dominavam o povo as
crendices e superstições: os obstáculos encontrados pelos navegantes
ao tentarem transpor os limites até então conhecidos eram logo
convertidos, na versão popular, na existência de terríveis monstros
marinhos que destruíam as embarcações dos que ousavam invadir-lhes
os territórios.
A passagem dos cabos Bojador e Tormentoso marcam dois
momentos culminantes na história dos descobrimentos: sucederia ao
segundo a exploração do comércio do Oriente, como sucedera ao
primeiro a exploração do comércio da Guiné.
“O Mostrengo” é um poema com evidentes relações
intertextuais com o episódio do “Gigante Adamastor” de Os Lusíadas:
ambos são a ilustração simbólica dos obstáculos com que se defrontaram
os navegadores portugueses.
No poema poderíamos destacar, associados à alegoria do
mostrengo, três elementos simbólicos: a água, a noite, a caverna:
O Mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
E disse, ‘Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
48

Meus tectos negros do fim do mundo?’


A água, como massa indiferenciada, no seu simbolismo de
fonte de vida, representa a infinidade dos possíveis e “contém todo o
virtual, todo o informal, o germe dos germes, todas as promessas de
desenvolvimento, mas também todas as ameaças de reabsorção. (...)
fonte de todas as coisas, manifesta o transcendente e deve ser, em
conseqüência, considerada como uma hierofania” 52
A noite simboliza “o tempo das gestações, das germinações,
das conspirações que vão desabrochar em plena luz como manifestação
da vida” 53. Como todo símbolo, a noite apresenta um duplo aspecto, o
das trevas, onde fermenta o vir-a-ser e o da preparação do dia, de onde
brotará o conhecimento racional:
Sou um Povo que quere o mar que é teu;
E mais que o Mostrengo, que me a alma teme
(...)
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-rei D. João Segundo’!
A resposta do timoneiro, metonimicamente representando o
povo português, revela-nos a atitude coletiva de um povo obediente, des-
temido e persistente, capaz de grandes sacrifícios para atingir o seu ideal.
Também não nos parece forçada nem descabida a relação do
Mostrengo, habitante das “cavernas do fim do mundo” com os deuses
que vestem o neófito (do poema “Iniciação”, do autor de “Cancionei-
ro”) na sua escalada da “funda caverna” 54 para a Luz: assim como o
iniciado se descobre igual aos deuses, o Mostrengo reconhece os nave-
gadores portugueses como seus iguais. Por outro lado, remete-nos
também ao mito ou à alegoria da caverna, de Platão.
Na sua leitura astrológica de “O Mostrengo”, Paulo Cardoso
observa que o poema é construído sob o signo de Câncer, e por isso,
corresponde àquilo que a astrologia chama fundo-do-céu, relacionando
o fundo-do-céu português, ao “fim do mar”. “Fundo esse do mar (do
inconsciente) que guarda, que carrega, na sua gênese, o medo e o desejo
de transcender todos os mostrengos decantados ao longo das gerações”. 55

“V - Epitaphio de Bartolomeu Dias”


Foi Bartolomeu Dias o último representante do tipo de des-
cobridor criado pelo Infante D. Henrique, homem de condição modesta,
49

dedicado às coisas do mar. Desde que passara a ponta meridional do


continente africano, o problema náutico e geográfico do caminho da
Índia estava resolvido.
Ao tomar parte na expedição de Pedro Alvares Cabral rumo
a ocidente, sua caravela naufragou e o “Capitão do Fim” encontrou a
morte junto ao Cabo que havia descoberto. É a esse fato histórico que o
Poeta se refere no poema.
JAZ AQUI, na pequena praia extrema,
O Capitão do Fim. Dobrado o Assombro,
O mar é o mesmo: já ninguém o tema!
Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro.
No mais curto poema de Mensagem, o Poeta simboliza a luta
épica entre Portugal e as forças da natureza, com a conseqüente vitória de
Portugal, e resume a vida heróica, a morte exemplar e a mensagem para a
posteridade do mito Bartolomeu Dias: “Atlas, mostra alto o mundo no seu
ombro”.

“VI - Os Colombos”

Desde o tempo do Infante D. Henrique, conta-nos o histori-


ador Fortunato de Almeida que por todo o século XV e ainda no século
XVI, concorriam a Portugal numerosos estrangeiros: italianos,
flamengos, alemães e outros, para tomarem conhecimento dos
descobrimentos marítimos, colaborarem com os portugueses na
esperança de lucro e aprenderem na escola portuguesa de navegação,
cuja fama se estendia aos quatro cantos do mundo. “Cabe assim, aos
portugueses, a dupla glória de terem iniciado as navegações modernas,
através dos mares até então desconhecidos, e de terem amestrado nos
segredos da arte náutica todos os aventureiros que concorreram a
Portugal, como à escola onde deviam conhecer os trilhos do oceano e
por eles a carreira de glórias e interesses”. 56
Como tantos outros, Cristóvão Colombo foi aperfeiçoar-se
nos conhecimentos da navegação com os portugueses: a partir de 1470,
em companhia de marinheiros portugueses, começou as suas viagens
(de que não há clara notícia) e, já em 1474, concebeu com alguns
arrojados viajantes a idéia de procurar novas terras a ocidente. Com
esse objetivo, procura D. João II, em 1481 ou 1482. Mas o fato de
expressar-se com prosápia e demonstrar superficialidade de
50

conhecimentos, além de impor condições inaceitáveis, tal como a


ascensão social e a partilha de terras a descobrir, leva D. João II, ouvidos
os homens de maior autoridade em assuntos cosmográficos do reino, a
recusar sua proposta.
Obstinado e aventureiro, Colombo recorre aos reinos de Fran-
ça e Inglaterra, com o mesmo insucesso. A sua proposta foi acolhida
pelos reis castelhanos Fernando e Isabel. A partida do navegador
genovês se efetua em 03 de agosto de 1492; meses depois, ajudado
pela Sorte ou Acaso, toca um novo continente, a América, acreditando,
porém, ter atingido a Índia pelo ocidente.
OUTROS haverão de ter
O que houvermos de perder.
Outros poderão achar
O que, no nosso encontrar,
Foi achado, ou não achado,
Segundo o destino dado.
Ao tomar conhecimento do fato, D. João II convenceu-se
de que tal território se encontrava dentro da área ocidental já descoberta
pelos portugueses e determina a expedição de D. Francisco de Almeida
para o reconhecimento das terras e para a afirmação dos direitos de
Portugal. Essa notícia alarmou os “reis católicos” que propuseram
uma negociação, a fim de evitar a expedição portuguesa. Do acordo
estabelecido entre Portugal e Castela surge o Tratado de Tordesilhas:
uma linha demarcatória de polo Ártico a Antártico, que passa a
trezentos e setenta e cinco léguas para poente e sul dos Açores e Cabo
Verde, a oeste da qual todas as terras e mares pertenceriam ao reino
de Castela.
Desta forma, Portugal conseguiu preservar o verdadeiro ca-
minho para a Índia e, mesmo no continente americano, abarcou vasta
zona territorial.
Daí o orgulho do Poeta em poder celebrar mais uma vitória
da gente portuguesa, que acolheu um navegador genovês em sua armada
para aprender a arte do ofício com os portugueses e deles extrair o
exemplo, assim conseguindo a glória para os espanhóis.
Mas o que a elles não toca
É a Magia que evoca
O longe e faz d’elle historia.
E porisso a sua gloria
51

É justa auréola dada


Por uma luz emprestada.
Com o título do poema no plural, Colombo seria apenas
uma metonímia: na sua figura o Poeta representa, com ironia e desdém,
todos os navegadores estrangeiros que fundaram os seus impérios à
custa de Portugal, mas a quem faltava o “quid” que sobejava aos
portugueses; por outro lado, o uso da 1ª pessoa do plural no discurso
significa a voz coletiva de Portugal, orgulhosa por reconhecer-se um
país predestinado.

“VII - Occidente”

É também através de uma voz coletiva - discurso em pri-


meira pessoa do plural - que o Poeta explica a obra dos descobrimentos
portugueses ter sido, ao mesmo tempo, uma aventura conjunta operada
pelo “Destino” e pelo “Acto”: por Deus e pelos homens; novamente a
problemática da predestinação.
COM DUAS mãos - o Acto e o Destino
Desvendámos. No mesmo gesto, ao céu
Uma ergue o facho tremulo e divino
E a outra afasta o véu.
Metonimicamente, através do sintagma chave - “mão” -
lexema mencionado cinco vezes de modo explícito e duas vezes
implícito, estabelece-se o diálogo entre a mão de Deus e a mão do
homem. Uma vez que a mão é o símbolo da atividade e do poder, os
verbos decorrentes envolvem ação: “Desvendámos”, “ergue”,
“afasta”. Também a palavra “facho”, outro sintagma chave, significa
luz e é de uma caminhada das trevas do desconhecido - “véu” - à luz
das descobertas que trata o poema.
Fosse a hora que haver ou a que havia
A mão que ao Occidente o véu rasgou,
Foi alma a Sciencia e corpo a Ousadia
Da mão que desvendou.
Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal
A mão que ergueu o facho que luziu,
Foi Deus a alma e o corpo Portugal
Da mão que o conduziu.
Na segunda e terceira quadras, o Poeta exalta, metafórica e
52

metonimicamente, o heroísmo do povo português (implicitamente é


enaltecida a figura de Pedro Alvares Cabral - “A mão que ao Occidente
o véu rasgou” - o descobridor das terras brasileiras - “Fosse Acaso, ou
Vontade, ou Temporal” - na sua ânsia desmedida de estender o olhar
até aos confins da terra, contando com a potencialidade da raça “Acto”,
“corpo”, “Ousadia” e com a predestinação divina “Destino”, “alma”,
“Sciencia”, “Deus”.
Sem que o nome do Brasil seja citado, o Poeta refere-se,
com expressão concisa, às possíveis causas de seu descobrimento:
“Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal”. Essas três hipóteses
apontadas pelo Poeta relacionam-se ou ao ato da Providência divina:
“Acaso”, ou à intenção humana: “Vontade”, ou ao simples fenômeno
da natureza: “temporal”.

“VIII - Fernão de Magalhães”

Foi em 1519 que o navegador português Fernão de Magalhães


(1480 - 1521), com o propósito de chegar à fonte de certas especiarias,
nas Ilhas Molucas, empreendeu o que viria a ser a primeira viagem de
circunavegação do globo terrestre. E foi no decorrer dessa viagem his-
tórica que o navegador foi assassinado pelos nativos das Ilhas Filipinas.
De quem é a dança que a noite aterra?
São os Titans, os filhos da Terra,
Que dançam da morte do marinheiro
Que quiz cingir o materno vulto —
Cingil-o, dos homens, o primeiro—,
Na praia ao longe por fim sepulto.
A morte do marinheiro às mãos dos nativos, que o Poeta
cognomina “os Titans, os filhos da Terra” — aqueles que representam
as transformações cósmicas, as forças selvagens e indomadas da natureza
— simboliza, metonimicamente, a morte de todos os navegadores que,
como ele, ousaram desafiar as forças elementares da natureza: os Titãs
significam as adversidades e obstáculos que os portugueses tiveram
que enfrentar na terra, como o Mostrengo representa as forças adversas
do mar.
Além disso, quando o Poeta caracteriza Fernão de
Magalhães como o navegador “Que quiz cingir o materno vulto — /
Cingil-o, dos homens, o primeiro— ”, esse procedimento Edipiano de
53

violação maternal é castigado com a própria morte — “Na praia, ao


longe, por fim sepulto”.
O “valle” a que se refere o Poeta na primeira estância é o
lugar das transformações fecundantes, por isso simboliza o espaço “onde
a alma humana e a graça de Deus se unem para dar as revelações e os
êxtases místicos” 57 , o que, metaforicamente, se esclarece na terceira
estância: “Dançam, nem sabem que a alma ousada / Do morto ainda
commanda a armada” é o corpo trancendido, a parcela divina, a “alma
ousada” do herói que dirige, inspirando, a viagem prosseguida por seu
piloto Elcano.
Objetivando seguir sempre em frente, Fernão de Magalhães
conseguiu atingir o fim (e o início) da Terra e também o fim (e o início)
de si próprio.
Dançam, nem sabem que a alma ousada
Do morto ainda commanda a armada,
Pulso sem corpo ao leme a guiar
As naus no resto do fim do espaço:
Que até ausente soube cercar
A terra inteira com seu abraço.
Violou a Terra. Mas elles não
O sabem, e dançam na solidão;
E sombras disformes e descompostas
Indo perder-se nos horizontes,
Galgam do valle pelas encostas
Dos mudos montes.
Simbolicamente a “Terra” significa a função maternal, en-
quanto o “monte” participa do simbolismo da manifestação, sendo con-
siderado também o encontro do céu e da terra, morada dos deuses e
objetivo de ascensão humana 58 . Por isso, ao aludir à violação da
“mater” - “Violou a Terra” - o Poeta refere-se à violação do segredo
das navegações, ao conceito ptolomaico da Terra, conhecimento
ignorado pelos gentios.
É interessante observar, do ponto de vista estrutural, que este
poema composto por vinte e quatro versos distribuídos em quatro
sextilhas, organiza-se em forma de círculo, em forma arredondada, com
a repetição paralelística da primeira e da última quadras, como a sugerir
o início e o fim do mundo, o início e o fim das descobertas, o início e o
fim da vida.
54

“IX - Ascensão de Vasco da Gama”

Nos oito poemas anteriores de “Mar Portuguez” contam-se


os feitos dos portugueses. No novo poema, o Poeta elege aquele que
sintetiza a glorificação da gesta marítima de Portugal - Vasco da Gama
- na sua ascensão mística. É um herói individual representando um herói
coletivo.
Como a aventura épica se realizou tanto na terra como no
mar, esse nobre português é homenageado, no poema, tanto pelas
divindades terrenas - “os gigantes da terra” como pelas divindades
marinhas - “os deuses da Tormenta”.
OS DEUSES da tormenta e os gigantes da terra
Suspendem de repente o odio da sua guerra
E pasmam. Pelo valle onde se ascende aos céus
Surge um silencio, e vae, da nevoa ondeando os véus,
Primeiro um movimento e depois um assombro.
Ladeiam-o, ao durar, os medos, hombro a hombro,
E ao longe o rastro ruge em nuvens e clarões.
Em baixo, onde a terra é, o pastor gela, e a flauta
Cahe-lhe, e em extase vê, à luz de mil trovões,
O céu abrir o abysmo à alma do Argonauta.
Ao descrever a ascensão do herói “Pelo valle onde se ascende
aos céus” e a sua passagem pelo “Assombro” (em nítida relação com a
“Estalagem do Assombro” do poema “Iniciação”, inserto no “Canci-
oneiro”), o Poeta nos revela a morte como ascensão iniciática necessária
para o conhecimento - vida. Na ordem seqüencial de “Mar Português”
este é já o quarto poema, em que (com “Epitaphio a Bartolomeu Dias”,
“Fernão de Magalhães” e “O Mostrengo”) podemos atestar o processo
de intertextualidade com os poemas de cunho esotérico e rosacrusista,
insertos no “Cancioneiro”, especificamente “Iniciação”.
A dualidade vida/morte e a própria identificação da morte
como início de nova vida (tendo a alma como mediadora) encerra a
essência das tradições iniciáticas. Esse desnível entre o mundo sensível
ou dos homens e o mundo inteligível ou dos deuses é o que reflete o
terceto. Pela antonomásia do fecho do poema, Vasco da Gama
transmudando-se em “Argonauta”, acentua-se a ascensão do navegador
português, que, da simples condição humana passa, com a morte, para o
nível de herói mitológico.
55

Vasco da Gama representa, em Mensagem, o ápice da fase


gloriosa de Portugal. Observaremos, mais adiante, que nova vertente
se estabelece na estrutura da obra, forjada sempre, como se tem visto,
por seus elementos históricos: a fase de decadência, a partir de D.
Sebastião.
Massaud Moisés apresenta excelente síntese dessa transição,
por isso utilizaremos as suas palavras:
Com efeito, a descoberta do caminho marítimo para
as Indias, empreendida em 1498 por Vasco da Gama, segui-
da pelo ‘achamento’ do Brasil em 1500, cercou-se duma
série de semelhantes e felizes comentimentos, que permiti-
ram a Portugal gozar de momentânea mas intensa euforia,
sobretudo enquanto reinou D. Manuel, entre 1495 e 1521:
conquista de Ormuz, em 1507, de Safim, em 1508, de Goa,
em 1510, de Azamor, em 1513, e a viagem de circunavega-
ção realizada por Fernão de Magalhães em 1519-1520.
Sobrevém uma extraordinária prosperidade econômi-
ca, Lisboa transforma-se em centro comercial de primeira
importância; na Corte impera um luxo desmedido; a maioria
acreditava cegamente haver chegado Portugal a uma inalte-
rável grandeza meterial. Enfim, enganador e iludidor otimismo
ufanista, que aos poucos se vai atenuando, até à derrocada
final em Alcácer-Quibir, em 1578, quando morre D. Sebasti-
ão, e o exército português se dobra, fragorosamente, à malí-
cia e ao poderio da cavalaria sarracena. 59
Embora a dimensão épica dos fatos históricos de Mensagem
possa encerrar-se com a morte/iniciação de Vasco da Gama, completam
a estrutura da Segunda Parte da obra mais três poemas: “Mar
Portuguez”, “A Última Nau” e “Prece”.
Segundo a opção estrutural do nosso estudo, esses poemas
poderiam enquadrar-se na “dimensão profética”, mas procuraremos
interpretá-los dentro da “dimensão épica”, para não truncar a ordem
seqüencial dos doze signos.

“X - Mar Portuguez”
O título dado a este poema é elucidativo acerca do veículo
através do qual o povo “portuguez” cumpriu a missão para que estava
predestinado: o “mar”.
56

Estruturado em duas sextilhas, o poema apresenta um


discurso impregnado de subjetividade, com alternância de vozes da
segunda para a terceira pessoa do singular. Quanto à temporalidade, o
discurso alterna-se do presente para o passado e deste para o presente,
num processo circular que reflete a continuidade entre a história e a
representação literária.
Numa espécie de balanço reflexivo sobre os saldos negativo
e positivo das conquistas, mostrando os dois lados de uma mesma
moeda, na primeira estância, em forma de apóstrofe ao mar, o Poeta
questiona a validade da epopéia marítima, e na segunda estância,
justifica-a. Na primeira, em apenas doze versos, o Poeta resume a
história trágico-marítima dos portugueses que, como em todo grande
ato gerador, tiveram que descer aos infernos do sofrimento para
merecerem as glórias da ventura, ou, recordando versos do Segundo
Campo do “Brasão” “Os deuses vendem quando dão / Compra-se a
glória com desgraça”.
Ó MAR SALGADO, quanto de teu sal
São lágrimas de Portugal !
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão resaram !
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar !
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abysmo deu,
Mas nelle é que espelhou o céu.
Na segunda estância, através da metáfora do “mar”, o Poeta
enfatiza que a experiência do plano físico e material, cheio de
sacrifícios e perigos, é um mal necessário para se atingir a verdade do
plano espiritual: “Quem quere passar além do Bojador / Tem que
passar além da dor”.
Entre o “mar” que abre o poema e o “céu” que o encerra,
estão “o perigo e o abysmo” — uma forma engenhosamente poética
de mostrar ao homem que, para merecer o prêmio da vitória, precisa ter
coragem para enfrentar a prova e vencê-la, pois “Deus ao mar o perigo
e o abysmo deu, / Mas nelle é que espelhou o céu”.
57

“XI - A Última Nau”

Organizado em quatro sextilhas, este poema estrutura-se


como uma viagem de ida e volta, da morte física (ida) para o regresso
espiritual (volta).
Na primeira sextilha, o Poeta figura a nau, que leva D. Sebasti-
ão e com ele o Império português, a caminho do exílio, da ausência, do
mistério.
LEVANDO a bordo El-Rei D. Sebastião,
E erguendo, como um nome, alto o pendão
Do Imperio,
Foi-se a ultima nau, ao sol aziago
Erma, e entre choros de ancia e de presago
Mysterio.
Geralmente as grandes catástrofes épicas são anunciadas por
pressagos. Assim também aconteceu com Alcácer-Quibir: em vários
arquivos públicos, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Biblioteca
Nacional de Lisboa, Biblioteca da Universidade de Coimbra, Biblioteca
de Ajuda, entre outros, existem dezenas de poemas premonitórios, va-
ticínios e profecias agourentas sobre a tragédia de 1578. O Poeta reforça-
os com o título do Poema “A Última Nau” e com as construções “ao
sol aziago”, “choros de ancia e de presago”
Não voltou mais. A que ilha indescoberta
Aportou? Voltará da sorte incerta
Que teve?
Deus guarda o corpo e a forma do futuro,
Mas Sua Luz projecta-o, sonho escuro
E breve.
Nesta segunda sextilha, enfatizando a partida, está manifesto
o sentimente da desagregação, do sonho, da dúvida, mas também o da
esperança na sua ressurreição enquanto mito — “corpo e forma do
futuro”. A lenda apresenta a vinda de D. Sebastião, numa manhã de
nevoeiro, pelo Tejo: “sonho escuro e breve”.
Associando-se essa estrofe ao contexto geral da obra,
podemos perceber que a dúvida do verso “A que ilha indescoberta /
Aportou?” vai relacionar-se e ter resposta em “As Ilhas Afortunadas”
(quarto poema de “Os Symbolos”) e o primeiro indício de que D.
Sebastião, metaforizado como “forma do futuro”, foi encontrar-se com
58

Deus, aparece no primeiro poema de “Os Simbolos”, intitulado “D.


Sebastião”.
Ah, quanto mais ao povo a alma falta,
Mais a minha alma atlantica se exalta
E entorna,
E em mim, num mar que não tem tempo ou spaço,
Vejo entre a cerração teu vulto baço
Que torna.
A terceira sextilha estrutura-se de forma dialética: no primeiro
verso, o povo português sente-se desprovido de sua força essencial “ao
povo a alma falta”; no segundo verso, metaforicamente transformado
em “alma atlantica”, o Poeta tem em excesso (“e entorna”) o que
falta ao povo, porque ele crê e confia no regresso de D. Sebastião.
Assim, como um profeta, ele vislumbra, numa espécie de visão
privilegiada, por “entre a cerração” o “vulto baço” do Rei a regressar
dentro de si - “num mar que não tem tempo ou spaço”. Essa crença na
volta do mito sebástico que trará consigo o Quinto Império do mundo é
a tônica e a dimensão profética de Mensagem.
Não sei a hora, mas sei que ha a hora,
Demore-a Deus, chame-lhe a alma embora
Mysterio.
Surges ao sol em mim, e a nevoa finda:
A mesma, e trazes o pendão ainda
Do Império.
Nesta última sextilha o Poeta figura a nau, que transporta D.
Sebastião e o Império, voltando de seu exílio e, tal como Cristo, ressurgin-
do após a morte. É mais um ato de fé do Poeta, que reconhece estar próxi-
ma a “hora” da ressurreição de Portugal enquanto império de cultura.

“XII - Prece”

O poema que encerra a Segunda Parte de Mensagem, tal


como o que fecha o “Brasão”, é uma “Prece”, em que o Poeta, fazendo
um inventário da história das conquistas, apresenta o hoje cheio de
decadência e de saudade de um passado glorioso, e suplica esperançoso
a Deus pelo “sopro, a aragem, - ou desgraça ou ancia”. Á semelhança
da fantástica Fênix Portugal poderia ressurgir da decadência: esse é o
rasgo de idealismo presente na segunda quadra.
59

Dá o sopro, a aragem, - ou desgraça ou ancia, -


Com que a chamma do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa !
É a crença no Portugal do futuro: suplica-se pela luz -“cha-
ma” - que traz perigos e sofrimentos - “desgraça ou ancia” - premios
e recompensas - “o sopro, a aragem” - mas acima de tudo faculta-se a
possibilidade de lutar e renascer: “E outra vez conquistemos a Distância
/ Do mar ou outra, mas que seja nossa !”
Esclarecendo melhor o significado histórico destes últimos
poemas, diz-nos Gilberto de Mello Kujawsky que “o Sebastianismo
foi o único recurso cabível a uma nação tornada acéfala pela invasão
estrangeira, e reduzida a pasto de disputas imperialistas, para preservar
ilesa sua integridade espiritual. Tornada insuportável a idéia de que
Portugal já não era nação soberana, prenunciou-se no horizonte o
sonho da supernação, encabeçada por um super príncipe, a despontar
em breve. Foi esta a função histórica do sebastianismo: transportar
para o futuro a nação impossível no presente, à semelhança de um
país invadido que prossegue livre e soberano no exílio”. 60

3. A Dimensão Trágica: os heróis - símbolos do dever ser


A grande originalidade de Fernando Pessoa na elaboração
da Primeira Parte de Mensagem reside na distribuição de seus poemas
segundo uma ordem que corresponde à composição do brasão português.
Se pretendêssemos fazer uma leitura heráldica de “Brasão”, teríamos
que, necessariamente, seguir a ordem disposta na obra; os campos, a
enumeração dos objetos neles envolvidos; a coroa; o timbre; enfim,
todos os ornamentos que organizam o escudo. Porém, como nesta parte
do nosso estudo o objetivo é fazer uma leitura histórica e trans-histórica
de Mensagem, optamos por inverter a disposição estrutural dos poemas
que constituem as “Quinas” do “Brasão”, para operacionalizar a
seqüência interna da nossa pesquisa.
Como as cinco quinas do Brasão português remetem às cinco
chagas de Cristo e, historicamente, os heróis nelas dignificados não par-
ticiparam diretamente da epopéia dos descobrimentos, mas representaram
o sangue derramado para que a glória fôsse atingida, procuramos deno-
minar esse anverso da medalha de dimensão trágica da história.
60

“III - As Quinas”

N’“As Quinas” desenvolve-se uma série de cinco retratos


condensados, de heróis concluídos, sem movimento, estáticos como se
fôssem figuras fixadas num brasão.
A tradição oral e escrita tem provado que “as quinas” do
brasão português simbolizam as cinco chagas de Cristo, as duas das
mãos, as duas dos pés e a do lado, lembrando, assim, o milagre de
Ourique, a intervenção divina no destino da batalha e da Pátria, e a
promessa de Afonso Henriques.
As quinas representam, pois, as glórias portuguesas conquis-
tadas com sacrifícios e penas infligidas pelo Destino ou Providência.
Enquanto os “castelos” simbolizam a dimensão temporal épica (a
afirmação da nacionalidade, o domínio da terra e a promessa do mar),
as “quinas” apontam para a dimensão espiritual, caracterizando-se pelo
sentimento do dever cumprido, pelo sacrifício físico e moral em nome
de um sonho, pela aceitação resignada dos desígnios divinos e pela
sensação de inutilidade da própria vida, atitudes próprias dos estóicos.
As quatro primeiras “quinas” são constituídas por quatro
dos filhos de D. João I e D. Filipa de Lencastre, geradores de grandes
prole cognominada por Camões de “Inclita Geração, nobres infantes”.
Segundo Pessoa, todos foram marcados pelo Destino, que os sagrou
“em honra e em desgraça”.
A quinta quina é D. Sebastião, definido por sua loucura pe-
culiar, aquela que faz com que um homem seja um semi-deus e não
“besta sadia, / Cadáver adiado que procria”.
Enquanto n’“Os Castellos” o Poeta enaltece as figuras reais
(reis), as cinco “Quinas” organizam-se dentro de uma hierarquia de
nobreza: D. Duarte e D. Sebastião foram Reis; D. Pedro, Regente, e os
demais Infantes - todos, porém, recebem títulos distintivos de nobreza
e majestade, o que significa que por seus valores e méritos são dignos
de reconhecimento semelhante.
Cinco quinas, cinco mártires, todos da Dinastia Avis, a única
dinastia portuguesa que celebra, no próprio nome, uma ordem de cava-
leiros de Cristo: 61 quatro irmãos e um parente longínquo.
A distribuição dos poemas nas “quinas” obedece a uma
ordem formal em que, nos extremos, ficam dois reis - “QUINTA / D.
61

SEBASTIÃO, REI DE PORTUGAL” - no meio, um regente: “TERCEIRA / D. PEDRO,


REGENTE DE PORTUGAL” - e entre os reis e o regente, dois infantes:
“SEGUNDA / D. FERNANDO, INFANTE DE PORTUGAL”; “QUARTA / D. JOÃO,
INFANTE DE PORTUGAL”. Os reis e os infantes sofreram e morreram, direta
ou indiretamente, vítimas das Cruzadas ou das lutas para o triunfo do
Cristianismo, simbolizando, assim, as chagas dos pés e das mãos de
Cristo. Já o Regente, devido à sua posição central, simbolizaria a chaga
do lado de Cristo.

“Primeira / D. Duarte, Rei de Portugal”

Constituído por seis versos distribuídos em duas estrofes,


este poema curto parece refletir a brevidade do reinado de D. Duarte:
de 1433 a 1438.
MEU DEVER fez-me, como Deus ao mundo.
A regra de ser Rei almou meu ser,
Em dia e letra escrupuloso e fundo.
Firme em minha tristeza, tal vivi.
Cumpri contra o Destino o meu dever.
Inutilmente? Não, porque o cumpri.
Desde a construção do primeiro verso observa-se que o
primogênito de D. João I, embora fôsse filósofo, pensador erudito e
amante das Letras, da lógica e da pesquisa reflexiva da Verdade, não
deixou de ser o Rei que Portugal exigia na fase histórica que atravessava:
tal como Cristo, cumpria sua missão.
Durante a longa fase de reconquista do território e da sua
formação, o comando pertencia aos “homens da espada”. Mas, uma
vez firmada a independência política e organizada a sociedade em
moldes estáveis, as diretrizes do governo passam para as mãos dos
homens de saber e da ciência que, “através do conhecimento e da
aplicação dos grandes monumentos filosóficos e doutrinários,
codificam o Direito e cimentam a sólida estrutura do Estado na sua
tendência para a consolidação”. 62
No segundo e terceiro versos da primeira estrofe o Poeta
refere-se, não só à “Lei Mental”, promulgada por D. Duarte em 8 de
abril de 1438 (mas já posta em prática por D. João I), segundo a qual só
era admitido nos bens da Coroa o filho varão legítimo mais velho - “A
regra de ser Rei” - mas ainda, através do significado do verbo “almar”
62

- “almou meu ser” - pode-se observar a união entre o Ser e a sua função:
o homem D. Duarte (matéria) exerceu função de Rei (forma) “Em dia
e letra escrupuloso e fundo” por imposição de desígnios divinos (Deus)
e vontade humana (D. João I).
Segundo a História, os cinco anos do reinado de D. Duarte
foram cheios de amargura e discórdias familiares. Durante algum tempo
hesitou o rei em aderir às campanhas guerreiras e, pesado revés, Portugal
foi duplamente vencido: perdeu a batalha e o Infante D. Fernando,
Mestre de Avis, acabou seus dias no cativeiro. Para coroar os infortúnios
de seu reinado, D. Duarte vê o país assolado pela peste, em 1438.
Enquanto o Conde D. Henrique foi um herói inconsciente,
segundo o Poeta, D. Duarte assumiu os destinos da nação consciente
de seus deveres, embora não fosse essa a sua vocação. O adjetivo
“firme” reforça a idéia do dever cumprido: “Firme em minha tristeza,
tal vivi”. Das páginas do seu Leal Conselheiro depreende-se a
inclinação do Rei para a melancolia, para a depressão, para o ceticismo,
não só próprias de um filósofo estóico - “Cumpri contra o Destino o
meu dever” - mas também devido ao remorso pelo sofrimento e martírio
de seu irmão D. Fernando, cativo em Fez.
Tanto D. Duarte, como seu irmão, o Infante D. Fernando,
foram heróis que cumpriram uma missão: o primeiro foi moldado para
ser Rei; o segundo foi predestinado para servir a Deus, como cavaleiro
da Cruz e para a Guerra Santa.

“Segunda / D. Fernando, Infante de Portugal”

Num poema organizado em três quintilhas, num discurso em


primeira pessoa, D. Fernando se retrata como herói ungido para cumprir
uma tarefa: tal com Cristo, com sua cruz, ele recebeu de Deus uma
espada um e outro fadados ou ungidos por Deus para serem sacrificados.
DEU-ME DEUS o seu gladio, porque eu faça
A sua santa guerra.
Sagrou-me seu em honra e em desgraça,
Às horas em que um frio vento passa
Por sobre a fria terra.
D. Fernando é, na Mensagem, exemplo de caráter emblemático
e tipológico: como cavaleiro de Cristo e Mestre de Avis ocupava um
lugar de honra, porque significava ser o escolhido de Deus “Sagrou-me
63

seu em honra e em desgraça” para uma vida devota, mas também para
uma vida de infortúnios e de desgraças. Como o próprio Cristo e em
nome de Cristo, a sua morte foi um sacrifício para a salvação seu povo.
Nos versos “Às horas em que um frio vento passa / Por
sobre a fria terra” D. Fernando alude ao momento da investidura de
Cavaleiro de Cristo como um momento de presságios, de mau agouro:
“frio vento passa”, “fria terra”.
Na segunda quintilha, no sentido patente, há reprodução
fiel de uma das fases do ritual da investidura: as bênçãos espirituais.
Poz-me as mãos sobre os hombros e doirou-me
A fronte com o olhar;
E esta febre de Além que me consome,
E este querer grandeza são seu nome
Dentro em mim a vibrar.
É interessante observar que a bênção divina sobre o Infante
Santo é relatada em sentido pleno, ou seja, abrangendo as três pessoas
da Santíssima Trindade: Deus dá-lhe a espada, Cristo fá-lo seu
colaborador na obra da salvação e o Espírito Santo ilumina-o com sua
graça, impulsionando-o a prosseguir na sua missão: “doirou-me / A
fronte ...”, “E esta febre de Além que me consome”.
D. Fernando oferece-se a D. Duarte para seguir com a expe-
dição a Tânger, assumindo o lugar de seu irmão D. Henrique,
pretextando ser este indispensável para o prosseguimento das
navegações. Sacrifica-se sem vacilações, com a vocação de mártir a
serviço da fé cristã:
Cheio de Deus, não temo o que virá,
Pois, venha o que vier, nunca será,
Maior do que a minha alma.
Servindo com zelo e com presteza, cumpriu o seu dever:
missionário de Cristo, impulsionado pela “febre de Além” e com sede
de “grandeza”, partiu para as terras africanas a serviço da cristianização
e aí terminou os seus dias em grande sofrimento.

“Terceira / D. Pedro, Regente de Portugal”

À terceira quina corresponde D. Pedro, figura estranha e


quase lendária que correu “as sete partidas do mundo”.
64

D. Pedro era um príncipe ilustrado, de cuja inteligência e


saber origina-se o Tratado de Virtuosa Benfeitoria. Governou como
regente de Portugal por sete anos (1441 a 1448), durante a minoridade
de Afonso V, herdeiro de D. Duarte. Conta a História que D. Pedro não
procedia com lisura, era ambicioso em extremo e vingativo. “Indifferente
ao que ha em conseguir / Que seja só obter”. Depois de tirar a regência
a D. Leonor, privou-a da educação do filho, pretextando os
inconvenientes de dar a um rei educação feminina.
Embora não tivesse chegado a ser rei de Portugal, porque
não era o filho primogênito de D. João I “Não me podia a Sorte dar
guarida / Por não ser eu dos seus” - D. Pedro tentou um golpe político
para, indiretamente, poder dirigir os destinos da pátria. Enquanto regente
da Coroa, já orientava o futuro D. João V, ao mesmo tempo que lhe
preparava o casamento com sua filha D. Isabel. Daí os versos: “Duplice
dono, sem me dividir / De dever e de ser”.
Como filósofo estóico, tudo o que D. Pedro conseguiu foi
fruto de seu trabalho - “dever” - e de sua vontade - “ser”.
Não me podia a Sorte dar guarida
Por não ser eu dos seus.
Assim vivi, assim morri, a vida,
Calmo sob mudos céus,
Fiel à palavra dada e à idéia tida.
Tudo o mais é com Deus.
O historiador Oliveira Marques relata que quando Afonso V
subiu ao poder dispensou os serviços de seu tio D. Pedro, passando a
receber conselhos e influências de seu tio Afonso. Quando D. Pedro se
viu rejeitado, preterido e injuriado, pegou em armas e lançou-se na
Batalha de Alfarrobeira para defender sua honra e a de Portugal, e aí
morreu proclamando-se inocente das acusações de que teria conspirado
contra o seu rei e sobrinho. Talvez, devido à natureza de sua morte, seja
esse o motivo de Fernando Pessoa tê-lo escolhido para participar de
sua Mensagem: mais um inocente sacrificado estoicamente em nome
da honra da pátria.

“Quarta / D. João, Infante de Portugal”

Estruturado em duas quadras, em termos antitéticos, esteti-


camente o poema traduz o drama interior do Infante D. João: entre o
65

não-ser que abre o primeiro verso e o “nada” que fecha o último; entre
o “ninguém” que D. João significou historicamente e o “pae de amplos
mares” que seus irmãos simbolizaram, à vastidão das almas de seus
irmãos, opunha-se a sua estreiteza e pequenez. 63
NÃO FUI alguém. Minha alma estava estreita
Entre tam grandes almas minhas pares,
Inutilmente eleita,
Virgemmente parada;
Por que é do portuguez, pae de amplos mares,
Querer, poder só isto:
O inteiro mar, ou a orla vã desfeita —
O todo ou o seu nada.
O Infante D. João foi Condestável de Portugal após a morte de
Nuno Alvares Pereira e veio a falecer, por asfixia e inanição, numa prisão.
Ainda hoje é o grande desconhecido dos infantes da Inclita
Geração. Devido à sua pouca idade, não tomou parte na expedição a
Ceuta, mas, com dezoito anos, foi nomeado, pelo Papa Martinho, Ad-
ministrador da Ordem de Santiago da Espada e, posteriormente,
Condestável do Reino. O seu prestígio impunha-se no consenso da
família real, que o consultava para dar parecer sobre a guerra da África.
Embora não se declarasse contrário às Cruzadas, pelo que de vantagens
a guerra poderia conceder, parecia mais determinado a aceitá-la pela
conversão dos infiéis: “no fundo, o infante balança entre a obediência
à vontade do irmão D. Duarte - ‘en todo o que mandardes vos hei
sempre de obedecer e servir lealmente’ - e uma velada discordância
da guerra de Marrocos (...) ora discordando de novas conquistas em
África, ora exaltando a glória de morrer ao serviço de Deus (...)” 64
O martírio do Infante D. João, tal como de D. Fernando,
consistiu em ser “alma estreita” - “Não fui alguém” - entre os seus
irmãos, “grandes almas minhas pares”; enquanto os irmãos conquis-
taram “o inteiro mar”, o “todo”, a ele coube “a orla vã desfeita”, “o
seu nada”.

“Quinta / D. Sebastião, Rei de Portugal”


D. Sebastião desempenha um papel muito importante na
Mensagem: aparece cinco vezes explicitamente e duas vezes
implicitamente, nos poemas “Calma” e “Antemanhã”. Também foi
66

escolhido para dar o título metafórico da terceira parte da obra: “O


Encoberto”. Por isso, poderíamos dizer que a Primeira Parte - “Brasão”,
e a Segunda Parte “Mar Portuguez” correspondem à preparação para
o regresso de D. Sebastião. Na Primeira Parte, D. Sebastião aparece
como um mártir; na Segunda Parte comparece na qualidade de
descobridor, a bordo d' “A Ultima Nau”. Na Terceira Parte, tal como
Cristo, aparece morto (“D. Sebastião”), sepultado (“O Desejado”) e
ressuscitado (“O Encoberto”).
LOUCO sim, louco, porque quiz grandeza
Qual a Sorte a não dá.
Não coube em mim minha certeza;
Porisso onde o areal está
Ficou meu ser que houve, não o que ha.
Minha loucura, outros que me a tomem
Com o que nella ia.
Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia,
Cadaver addiado que procria?
Este poema estrutura-se, em forma de monólogo, em torno da
Loucura épica portuguesa, metonimicamente centrada em D. Sebastião.
O adjetivo “louco” aparece duas vezes e o substantivo “loucura” outras
duas. D. Sebastião enaltece a febre interior que impulsiona o homem,
diferenciando-o da “besta sadia, /Cadáver addiado que procria”. Na
sua “febre de Além” pode ser dividido em dois: o homem, o que ficou
sepultado nas areias africanas, o passado morto - “meu ser que houve” -
o corpo; a loucura, o futuro - “ser que ha” - a forma, o que permanece
vivo através dos tempos e dos espaços histórico-míticos de Portugal. O
Sebastianismo, a febre de conquista foi a loucura, o sonho de um império
de grandezas deixado por D. Sebastião. 65
D. Sebastião encarna toda a loucura positiva do povo, contra
o misticismo exagerado de D. João III. “Quando ele assume os destinos
de Portugal, a dureza das infelicidades da pátria levava o povo ao
estado de loucura coletiva, devido às supertições, aos temores, etc.
Portugal estava em crise: a Inquisição, a Índia e as pestes concorriam
para perverter a moral, aguçando nos espíritos os desejos orgíacos,
irritando cóleras fúnebres, terrores extravagantes. Todo o século fora
açoutado por epidemias: em 1506, em 1530 e (...) nas vésperas da
jornada de África eram vivas as lembranças da peste grande de 1569”. 66
67

A África seduzia-o, mas não tinha planos políticos, nem pru-


dência, nem paciência, nem se deixava aconselhar quanto à sua jornada
- alma autêntica de Cruzado -, místico desapegado da própria vida,
entregava-se inteiramente ao ideal de transmitir a fé cristã aos sarracenos,
como uma missão apostólica.

4. A dimensão profética: a esperança de ressurreição


Partindo do conceito de profecia como predição do futuro feita
por um profeta, místico ou adivinho, bem como anúncios, avisos, pressá-
gios, procuraremos desenvolver o estudo dos treze poemas que estruturam
a Terceira Parte de Mensagem, intitulada “O Encoberto”, inserindo-os
numa dimensão mítico-profética da história, justamente porque o tema
central é o mito do vir-a-ser: Portugal como Quinto Império.
Assim como os conhecimentos do passado se baseiam em
fatos históricos, as esperanças messiânicas se fundam em profecias.
Mas, enquanto o documento histórico é apenas a base dos conhecimentos
do passado, a profecia é a base e, ao mesmo tempo, o produto das
esperanças messiânicas e uma tentativa de penetrar nos mistérios da
Divina Providência 67 .
José Augusto Seabra afirma que “ao profeta cabe antes de
mais receber e transmitir através de uma traditio, de uma tradição, a
visão - mensagem que lhe é dado inteligir, por ininteligível que
esotericamente seja, para os não iniciados no código simbólico”. 68
Segundo o crítico Alfredo Antunes, Fernando Pessoa desde
cedo se sentiu chamado ao centro das profecias nacionais e esse
chamamento leva a marca de uma missão incoercível, para lá de toda a
empostação ou atitude meramente estética ou comportamental “É
missão, a um tempo sacral e patriótica”. Mas o profetismo de Pessoa
não se limita à antevisão dum Desejado para a restauração dum possível
Quinto Império, porque essa era uma crença ou sonho estéril em festas
reais. “Para o poeta de Mensagem, empreende-se agora uma nova
leitura dos sinais e dos sonhos messiânico-sebásticos do sentir lusíada,
para sobre eles anunciar o verdadeiro sentido de Portugal”. 69

“Terceira Parte / O Encoberto”


A “Terceira Parte / O Encoberto”, que tem como epígrafe
“Pax in Excelsis”, é constituída por treze poemas distribuídos em três
68

seções: “I. Os Symbolos” (“Primeiro / D. Sebastião”; “Segundo / O


Quinto Império”; “Terceiro / O Desejado”; “Quarto / As Ilhas
Afortunadas”; “Quinto / O Encoberto”); “II. Os Avisos” (“Primeiro /
O Bandarra”; “Segundo / Antonio Vieira”; “Terceiro”); “III. Os
tempos” (“Primeiro / Noite”; “Segundo / Tormenta”; “Terceiro /
Calma”; “Quarto / Antemanhã”; “Quinto / Nevoeiro”).
Se na “Primeira Parte/Brasão”, Portugal conquista a terra
e consolida-se como nação, numa “guerra sem guerra” (“Belum sine
bello”) e na “Segunda Parte/Mar Português” alarga suas fronteiras,
dominando o mar (“Possessio Maris”), na “Terceira Parte/O
Encoberto”, Portugal procura conquistar a paz nos céus (“Pax in
Excelsis”). Assim, os quatro elementos tradicionais - terra, água, ar e
fogo - conjugam-se e transformam-se na composição de Mensagem 70
reforçando a sua estrutura circular: o mítico Ulisses, como ar, veio pelas
águas, fecundou a terra e transformou o nada em tudo; o mítico
Encoberto, da terra e água transformou-se ascensionalmente em ar e
fogo para trazer o renascimento espiritual ao país: o Quinto Império.
A “Paz nas Alturas” é mais um claro indício de que o Quinto
Império português será essencialmente um império espiritual e cultural,
como já preconizava Fernando Pessoa n’A Águia.

“I. Os Symbolos”

Como representação metafórica da Loucura épica, da “febre


de além”, “Os Symbolos” desenvolvem-se em cinco poemas. O número
cinco é emblemático em toda a construção de Mensagem, notadamente
nesta Terceira Parte, comparecendo tanto n’”Os Symbolos” como n’”Os
Tempos”. Segundo os pitagóricos, esse número representa o centro da
harmonia e do equilíbrio porque está no meio dos nove primeiros nú-
meros. É a representação icônica do homem (de braços abertos, em pé,
forma uma cruz) e, por extensão de significado, da ordem e perfeição
divinas. Além disso, simboliza a terra e o universo manifestado, como
ponto de intersecção dos quatros pontos cardeais.
Nos cinco poemas de “Os Symbolos” a figura de D. Sebastião
aparece três vezes, sob três nomes diferentes, em processo gradativo e
ascensional: como homem transformado em mito - “D. Sebastião; como
o Messias prometido e esperado - “O Desejado”; e como sonho, crença
ou fé - “O Encoberto”. Os outros dois poemas: “O Quinto Império” e
69

“As Ilhas Afortunadas” também a ele se referem - o primeiro, como


realização futura da potencialidade espiritual da raça, metonimica e
metaforicamente representada por D. Sebastião; o segundo, como o
lugar sagrado “Onde o Rei mora”, à espera do momento certo para a
sua ressurreição.

“Primeiro / D. Sebastião”

Neste poema de oito versos distribuídos em duas quadras


retoma-se o problema do mito sebástico e o seu regresso como Dom,
Graça, aludindo à atitude sobre-humana do jovem rei sacrificado no
ideal de levar a fé cristã aos mouros.
SPERAE! Cahi no areal e na hora adversa
Que Deus concede aos seus
Para o intervallo em que esteja a alma immersa
Em sonhos que são Deus.
O discurso apresenta-se em primeira pessoa: D. Sebastião é
o emissor e os portugueses são os interlocutores. Na primeira estrofe,
D. Sebastião aconselha o povo a aguardar com esperança o seu regresso,
explicando a sua morte como imposição da vontade divina. Os versos
sugerem também que o Rei, ungido e escolhido por Deus, estaria cum-
prindo um destino pré-determinado “Que Deus concede aos seus” e a
sua morte representaria apenas “o intervallo” necessário para a alma
embeber-se dos dons e graças divinas - “ ... a alma immersa / Em sonhos
que são Deus” - antes de regressar.
Que importa o areal e a morte e a desventura
Se com Deus me guardei?
É O que eu me sonhei que eterno dura,
É Esse que regressarei.
A segunda estrofe enfatiza a intersecção do homem predes-
tinado com a divindade, através do sonho.
Mas o que é o mito sebástico? Qual é a sua origem? O mito
vem de longe. Por volta de 1520 já circulavam estranhas profecias e
vaticínios derivados de textos religiosos e, até mesmo, de textos
profanos, em todos aludindo-se ao aparecimento de um ser misterioso
e cheio de prodígios que haveria de construir um grandioso império
cristão.
70

Também no tempo de D. João III interpretavam-se como re-


ferindo-se ao destino de D. Sebastião as trovas proféticas do sapateiro
Gonçalo Anes de Trancoso, o famoso Bandarra, e de Simão Gomes.
“Cantavam a epopéia do herói e as condições em que viria a aparecer
para redimir o seu povo: como na Judéia, o Cristo fôra um salvador
da nação, antes de ser redentor das almas, também o Cristo português
havia de alargar o seu império por longes terras, e a sua idéia seria a
era da redenção” 72
Porque a nação inteira aguardava ansiosa a vinda de um mes-
sias, quando, a 20 de Janeiro de 1554, nasce o filho do Infante D. João,
ele vem a receber o expressivo cognome de “O Desejado”.

“Segundo / O Quinto Império”


Construído por cinco estrofes de cinco versos cada, e
intitulado “O Quinto Império”, este poema é, do ponto de vista formal,
a mais fiel concretização poética do escudo português, na representação
simbólica das suas “quinas”: cinco escudos, portando cinco besantes
cada, configuram vinte e cinco besantes, distribuídos de cinco em cinco.
Com efeito, no seu aspecto estrutural, este poema de vinte e cinco versos
compõe-se de cinco estrofes de cinco versos (quintilhas). Deste modo
a correlação elemento heráldico-elemento poético é perfeita: para cada
das cinco “quinas” uma quintilha; para cada dos cinco besantes, um
verso; totalizando, para vinte e cinco besantes, vinte e cinco versos. 73
TRISTE de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!
Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz
Ter por vida a sepultura.
Eras sobre eras se somem
No tempo em que eras vem.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem
Pela visão que a alma tem!
71

E assim passados os quatro


Tempos do ser que sonhou,
A terra será theatro
Do dia claro, que no atro
Da erma noite começou.
Grecia, Roma, Cristandade
Europa - os quatro se vão
Para onde vae toda edade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?
Em todo o poema é ressaltado o contraste entre o homem
que vegeta e o homem que vive: o primeiro, um infeliz por contentar-se
apenas com os bens materiais e morrer sem ter-se realizado; o segundo,
o feliz, porque se realiza através do sonho e da febre de além ou da
loucura. O primeiro tem “por vida a sepultura”, o segundo é existencial
e metafisicamente um insatisfeito.
A terceira quintilha trata dos “quatro/Tempos do ser que so-
nhou” que seriam, metaforicamente, as quatro estações do ano
associadas às quatro fases da vida: primavera ou infância, verão ou
juventude, outono ou maturidade e inverno ou velhice. Convém ainda
recordar que o número quatro é o que representa o universo na sua
totalidade, tratando, mais freqüentemente, do mundo material e sensível.
Liga-se, também, às significações simbólicas do quadrado e da cruz e
aos quatro graus ou portas de aperfeiçoamento que o adepto da via
mística deve transpor - terra, água, ar e fogo - para realizar a sua evolução
espiritual: (evolução quaternária da “anima” segundo as teorias de Jung;
os quatro evangelistas, segundo a doutrina cristã; as quatro portas de
aperfeiçoamento espiritual, segundo a tradição dos sufia e das antigas
congregações dos dervixes). 74
Com efeito, as quatro primeiras quintilhas tratam da evolução
do homem na terra - “os quatro tempos” - enquanto a quinta e última
destaca o quinto tempo, que transcorrerá num mundo de natureza espi-
ritual, para além da morte. O numeral ordinal quinto é explícito desde o
título - “O Quinto Império” - como uma evidência de que este virá
após os quatro que o precedem.
Grecia, Roma, Cristandade
Europa - os quatro se vão
Para onde vae toda edade
72

Parece-nos importante correlacionar os quatro tempos com


quatro poemas de “Os Castellos”, quando o Poeta dedica uma
composição para cada um dos impérios desaparecidos. Para o Primeiro
Castelo destaca Ulisses, o Grego fundador da capital portuguesa
(Grécia); para o Segundo Castelo, Viriato, que, sob o domínio romano
foi o símbolo de independência de Portugal (Roma); para o Quinto
Castelo, D. Afonso Henriques, erigido rei de Portugal por Cristo
(Cristandade) e o Sétimo, D. Filipa de Lencastre, representante da
Inglaterra, que dominara os mares (Europa).
Consumados os tempos, uma nova ordem se inaugurará no
universo Quem vem viver a verdade / Que morreu D. Sebastião? a
consolidação do Quinto Império, crença de Pessoa proveniente do seu
”intenso sentimento patriótico”.
Quando Pessoa regressa definitivamente para Portugal, em
1908, encontra um país sem grandeza, em plena monarquia, e, sentindo-
se imbuído por um sentimento de missão que o acompanhou ao longo
da vida, passa a elaborar ”projetos patrióticos” para combater a Igno-
rância, a Tirania e o Fanatismo. A necessidade de readaptar-se à patria
portuguesa levou-o também a rever muitos autores e, dentre eles, o
Padre Antonio Vieira, em cuja obra Pessoa encontraria convergência
de pensamento. A este respeito diz o crítico João Gaspar Simões: “Lendo
Vieira, acordaram no poeta as suas fibras portuguesas, acordou a
emoção patriótica que o fez adoptar a lingua de Camões como sua
lingua literária, e atribui à mesma lingua pátria uma importância
primária na formação do instinto que veio a considerar o instinto
social fundamental - o patriotismo” 75
A exegeta e estudiosa do espólio pessoano Teresa Rita Lopes,
na obra Pessoa Inédito, colige documentos em que se observam que o
sentimento patriótico de Pessoa e a sua concepção de Quinto Império
vão além do “velho anseio sebastianista” de base popular. “O
Encoberto é o representante máximo do Quinto Império; é o emissário
máximo das forças espirituais que hão de crear tal Império. Como
podemos esperar que elle venha se não creamos primeiro as forças
que, por sua vez, a elle o hão de crear? E essas forças são a ansia de
domínio, e a tensão de todas as potencias da alma em torno d’essa
ansia. Deve cada um de nós fazer por em si realizar o máximo que
pode de similhante ao Desejado. A somma, a confluencia, a synthese
por assim dizer carnal d’essas ansias será a pessoa do Encoberto” 76
73

Comenta a referida estudiosa e pesquisadora que “apelar


para o sebastianismo latente nos portugueses era apenas assoprar uma
brasa ainda viva no esmorecido braseiro da consciência nacional como
se depreende doutros textos. Parece-nos, assim, que o Quinto Império
de que tanto se fala a respeito, seria esse ‘Império portuguez
subordinado ao espírito definido pela lingua portuguesa’, que não se
orientava ( ... ) por nenhuma ‘formula política nem idea religiosa’” 77
Esse documento de que trata a ilustre estudiosa * apresenta uma nota
manuscrita, em que Pessoa enumera, como figuras emblemáticas do
“Grémio da Cultura Portugueza”, “O Senhor D. Henrique, Infante de
Portugal”; “Affonso de Albuquerque “O Imperador”; “O Sapateiro
Bandarra”; “El-Rei D. Sebastião”; “O Santo Antonio Vieira”.
Em outro documento - [“Um Paiz Atlantico”] 125 A - 43,
Fernando Pessoa afirma: “ ... Portugal, neste caso, quere dizer o Brasil
também. Como o império, neste schema, é espiritual, não há mister
que seja imposto ou construído por uma só nação: pode sel-o por mais
que uma, desde que espiritualmente sejam a mesma, que o são se
fallarem a mesma lingua”. (p.233)
Mas, o que mais chamaria a atenção de Pessoa na obra de
Vieira, além da emoção estética que a leitura de suas obras despertava,
era o dom da profecia, além das interpretações de natureza cabalística
que dava a algumas passagens do Velho Testamento e a alguns fatos
da vida nacional.
A partir de Vieira, o poeta de Mensagem empreende uma
nova leitura dos sinais e dos sonhos messiânico-sebásticos do sentimento
lusíada para anunciar o verdadeiro significado de Portugal como nação.
Na sua leitura existe uma dupla profecia: a grandeza futura de Portugal
através do advento do Quinto Império e o papel messiânico que ele
mesmo, Fernando Pessoa, como “Supra-Camões”, é chamado a de-
sempenhar nessa construção futura.
O Quinto Império profetizado por Fernando Pessoa também
difere do profetizado por Bandarra e do sonhado por Vieira. Nas Trovas
de Bandarra e na tradição judaizante lusitana de seu tempo, o Quinto
Império anunciado era um império político; o Quinto Império sonhado
por Vieira na sua História do Futuro tinha mais um caráter religioso,
como revivescência do teocentrismo. O Quinto Império profetizado por
Pessoa e reservado para Portugal é de natureza espiritual, cultural e
universal.
74

No Prefácio ao livro de Augusto Ferreira Gomes, intitulado


Quinto Império, Fernando Pessoa analisa a interpretação de Daniel sobre
o sonho de Nabucodonosor:
A esperança do Quinto Império, tal qual em Portugal
a sonhamos, e concebemos, não se ajusta, por natureza, ao
que a tradição figura como o sentido da interpretação dada
por Daniel ao sonho de Nabucodonosor.
Nessa figuração tradicional, é este o seguimento dos
impérios: o Primeiro é o da Babilonia, o Segundo o Medo-
Persa, o Terceiro o da Grécia e o quarto o de Roma, ficando
o Quinto, como sempre, duvidoso. Nesse esquema, porém,
que é de impérios materiais, o último é plausivelmente en-
tendido como sendo o Império da Inglaterra. Desse modo se
interpreta naquele país; e creio que, nesse nível, se interpreta
bem.
Não é assim no esquema português. Este, sendo espi-
ritual, em vez de partir, como naquela tradição, do Império
material da Babilonia, parte, antes, com a civilização em que
vivemos, do império espiritual da Grécia, origem do que es-
piritualmente somos. E sendo esse o Primeiro Império, o Se-
gundo é o de Roma, o Terceiro o da Cristandade e o Quarto o
da Europa - isto é, da Europa laica de depois da Renascença.
Aqui o Quinto Império terá que ser outro que o inglês, porque
terá que ser de outra ordem. Nós o atribuímos a Portugal,
para quem o esperamos. 78
O augúrio para Portugal desse império novo e,
nomeadamente a nota de universalidade que o seu caráter civilizacional
naturalmente supõe, foi uma constante de toda a vida, nas referências
proféticas de Fernando Pessoa.

“Terceiro / O Desejado”

Toda a obra Mensagem encerra o diálogo constante do


Poeta com a religião judaico cristã, com as religiões orientais, com a
mitologia, com o neoplatonismo, com o Teosofismo, com o
Rosacrucianismo, com o Sebastianismo, com Camões, com a lenda e
com o História de Portugal.
Neste poema, organizado em três quadras, num discurso de
segunda pessoa, formulado à maneira de prece, o Poeta dirige-se ao
75

“Desejado” suplicando o seu regresso como Messias e redentor da


Pátria.
Para a caracterização do herói, o Poeta faz confluirem fatos
históricos e lendários com referências bíblicas e de mitologia cristã.
ONDE QUER que, entre sombras e dizeres,
Jazas, remoto, sente-se sonhado,
E ergue-te do fundo de não seres
Para teu novo fado!
Vem, Galaaz com pátria, erguer de novo,
Mas já no auge da suprema prova,
A alma penitente do teu povo
À Eucharistia Nova.
Mestre da Paz, ergue teu gladio ungido,
Excalibur do Fim, em geito tal
Que sua Luz ao mundo dividido
Revele o Santo Gral!
Na primeira estrofe, observa-se o paralelismo entre o rei D.
Sebastião, mártir celebrado nas “Quinas” que morreu devido à loucura
de sua empresa humana e o novo D. Sebastião, “O Desejado”, que,
divinizado, deverá renascer como prometido fundador do Quinto Im-
pério - “E ergue-te do fundo de não seres/Para teu novo fado!”
Na segunda quadra, o Poeta o compara ao herói bretão das
novelas de cavalaria - “Galaaz com patria” - que, como ele, partia em
demanda do corpo místico de Cristo - “Eucharistia Nova”.
Na terceira quadra, é invocado como o “Mestre da Paz”,
identificando-o a Cristo, na sua natureza dual de homem e divindade, e
metonimicamente ao cavaleiro ungido do Rei Artur, através de seu
“gladio ungido”, “Excalibur” da derrocada final de Alcácer Quibir.
O crítico António Cirurgião observa, com muita pertinência,
que o verbo “erguer”, presente nas três quadras, é o fio condutor que
amarra logicamente os significados do poema. Na primeira estância, o poeta
intima “O Desejado” a erguer-se a si mesmo para o cumprimento de Nova
missão - “E ergue-te do fundo de não-seres/Para teu novo fado!”; na
segunda estância, o Poeta suplica-lhe a erguer o seu povo do pecado e a
conduzí-lo a Deus - “Vem, Galaaz, com patria, erguer de novo/ ... /A alma
penitente do teu povo/À Eucharistia Nova”; na terceira estância, intima-o
a erguer o gládio ungido e a conduzir o povo à fonte da graça de Deus 79.
76

Os últimos versos das três quadras relacionam-se intimamente


em forma de crescente espiritualização e mistério, de tal modo que pare-
ce o Poeta querer comprovar que D. Sebastião, enquanto “O Desejado”
é o próprio Messias, é o Cristo em nova vinda -“Para teu novo fado!” -
e para nova missão; é o Divino sacrificado e transmudado “À Eucharistia
Nova” e simboliza, também, o corpo e o sangue místicos de Cristo - “o
Santo Gral”.

“Quarto / As Ilhas Afortunadas”


O período que decorre de 1630 a 1670 representa o apogeu
do messianismo português, tanto pela quantidade de textos que naquele
tempo foram redigidos, quanto pela qualidade das pessoas que tomaram
parte na discussão. Após a Restauração, o messianismo deixou de ser
um fenômeno sub-cultural para tornar-se um elemento da cultura
nacional. A partir de 1670, afirma José Van den Besselaar, que o
“sebastianismo foi-se tornando cada vez mais um assunto de pequenos
burgueses, tanto no sentido social, como cultural da palavra” 80 , mas,
sobretudo no reinado de D. João V houve nova eclosão da seita sebástica.
Os sebastianistas do século XVIII compraziam-se em ima-
ginar o seu idoso Rei a viver numa Ilha Encoberta, situada numa parte
remota e pouco definível do Atlântico. Os navegantes de alguns navios
pretendiam tê-lo avistado. “Era uma ilha maravilhosa: entremostrava-
se durante curto prazo aos marinheiros, para depois sumir no nevoeiro,
sendo impossível redescobrí-la. Muitas vezes era identificada como
uma das ‘Ilhas Afortunadas’, já mencionadas pelos Antigos, ou com a
’Ilha de São Brandão’ da lenda medieval. Mais freqüente ainda era a
sua identificação com a ‘Ilha das Sete Cidades’, colonizada por sete
bispos das Espanhas que, na época da invasão árabe, tinham fugido
da península com muitos dos seus fiéis, preferindo uma aventura
marítima ao jugo dos Mouros.” 81
Em resumo, esse parece ser o significado histórico das “Ilhas
Afortunadas”.
Elaborado com três quintilhas, este poema estrutura-se em
forma de dialogismo. No plano do discurso, uma voz coletiva fala na
primeira pessoa do plural, indicando o povo português que, em estado
onírico, parece escutar as respostas dadas por uma interlocutora e
enigmática voz de magia que apresenta, não só as ressonâncias da
grandeza heróica do passado, mas também as esperanças de futuro.
77

QUE VOZ VEM no som das ondas


Que não é a voz do mar?
É a voz de alguém que nos falla,
Mas que, se escutarmos, cala,
Por ter havido escutar.
E só se, meio dormindo,
Sem saber de ouvir ouvimos,
Que ella nos diz a esperança
A que, como uma criança
Dormente, a dormir sorrimos.
São ilhas afortunadas,
São terras sem ter logar,
Onde o Rei mora esperando.
Mas, se vamos dispertando,
Cala a voz, e há só o mar.
A mensagem transmitida por essa voz supra-terrena só poderá
ser apreendida em estado onírico (ou de vigília), voz de anunciação às
criaturas de pureza interior.
Essa voz de esperança futura se afirma e constitui o motor
da força criadora da Mensagem. O Poeta sonha uma utopia e, na medida
em que a anuncia, antevê um paraíso futuro imaginado como um estado
de pureza e de perfeição, não sujeito já à evolução do tempo. Esse
paraíso futuro é o regresso de D. Sebastião, como dom, como Graça,
mensagem de Mensagem. É uma visão em que, ultrapassada a situação
de decadência, se recupera a grandeza, antevendo-se um destino trans-
cendente. Ao ideal sebastianista liga-se o do Quinto Império, promessa
de novo apogeu, fora das injunções de tempo e de espaço.
Esse “Rei” que “mora esperando” nas “ilhas afortunadas”
foi uma figura histórica estranha e trágica (1554-1578). Atrofiado na
sua vida afetiva, treinava-se, desde cedo, em exercícios físicos e
ascéticos: era ótimo cavaleiro e caçador, piedoso e casto. Destituído de
qualquer realismo, vivia extraviado na Idade Média, sonhando com atos
de bravura cavaleiresca e com louros militares. Marcado pela grandeza
e pelo idealismo, esta qualidade ficava comprometida, contudo, pelo
excesso de teimosia, fanatismo e egocentrismo.
As conseqüências da grande ambição do jovem monarca são
conhecidas: a 04 de setembro de 1578, o seu exército foi destruído nos
78

campos de Alcácer-Quibir. D. Sebastião deixou aí a vida, com 8.000


dos seus homens; outros 15.000 tornaram-se reféns dos mouros. Foi
provavelmente a maior catástrofe da história de Portugal: além dos
milhares de mortos, os milhares de cativos impuseram pesados
sacrifícios à nação pelo seu resgate, além de a coroa ficar sem herdeiro.
Depois de um breve interregno de D. Henrique, oscilando entre a revolta
e a submissão, o país cedeu finalmente às ameaças militares da Espanha,
prometendo obediência absoluta a Felipe II (1581): seria uma união
pessoal, e Portugal ficava no gozo de seus privilégios.
Durante algum tempo, o país parecia resignado com a situa-
ção, mas o povo, apoiado por grande parte dos frades e do baixo clero,
sentia saudades da independência nacional.
Ninguém sabia ao certo o destino de D. Sebastião: se morrera,
realmente, não o viram morrer. De fato, os mouros entregaram o corpo
do rei morto a Felipe II e este providenciou a seu sepultamento no Mos-
teiro dos Jerônimos (1582). Muitos, porém, tinham dúvidas acerca da
identidade do corpo e viam-nas confirmadas pelas palavras do epitáfio:
“si vera est fama ... “. Segundo as profecias e vaticínios correntes, o
rei deveria voltar “Encoberto” e muitos “encobertos” apareceram, de
norte a sul do país, tentando identificar-se com aquele que desaparecera
em Alcácer-Quibir. Notícias corriam que D. Sebastião estaria vivendo
como um eremita, solitariamente, em ilhas do Atlântico. “Maria de
Macedo, filha dum violeiro de Lisboa, por esse mesmo tempo (Séc.
XVII) ‘dizia ir certas noites à Ilha Encoberta, onde falava a D. Sebastião
e via o rei Artur, os profetas Enoch e Elias e S. João Evangelista’. D.
Francisco Manuel de Mello escreve numa carta: ‘Seja Deus Bendito
que não nos declarou ainda as Ilhas Empoadas como ilhas N., quando
para lá seja, lá dizem que está El. Rei D. Sebastião, que não deixará
de nos fazer mil honras.” 82
Testemunhos de ex-cativos da Batalha também davam conta
desses casos. Com efeito, D. Sebastião era o “Encoberto”: encobrindo
a sua identidade, andaria por lugares santos ou vivia numa ilha
misteriosa, donde haveria de sair, um dia, purificado pelo sofrimento e
pela penitência.
Assim, “D. Sebastião, que durante a sua vida nunca fôra
uma figura muito popular, foi aos poucos reabilitado, apesar de ser o
grande responsável pela perda da independência do país. Durante a
sua vida não conseguira realizar o grande sonho de se ver coroado
79

Imperador da África. Depois da sua morte, a imaginação do povo


metamorfoseou-o no Monarca mítico de um Império não menos
mítico.” 83

“Quinto / O Encoberto”

O poema é construído em três quadras. Os dois primeiros


versos das quadras encerram uma pergunta que é respondida pelos dois
versos subsequentes, em forma de dialogismo.
QUE SYMBOLO fecundo
Vem na aurora anciosa?
Na Cruz Morta do Mundo
A Vida, que é a Rosa.
Que Symbolo divino
Traz o dia já visto?
Na Cruz que é o Destino,
A Rosa, que é o Christo.
Que symbolo final
Mostra o sol já disperto?
Na Cruz morta e fatal,
A Rosa do Encoberto.
Neste poema a comparação de D. Sebastião, o Encoberto,
com Cristo é patente desde as profecias, na sua missão de vida e morte
e na ressurreição. Todo o poema está marcado pela simbologia do
número três: três estrofes, três símbolos, três cruzes, três rosas, três
fases do dia e metaforicamente, três fases da vida, três fases históricas
ou três idades de Portugal.
Como já vimos anteriormente, o número três simbolicamente
sintetiza o triunidade do ser vivo, resulta da união dos números um e
dois, que representam o céu (1) e a terra (2), e encerra o mistério da
Santíssima Trindade. O poema todo está também imbuído de figurações
e símbolos das doutrinas cristã e rosacruz: a rosa, além de designar
uma realização perfeita, na iconografia cristã representa o signo das
chagas de Cristo. De modo similar, na doutrina rosacrucianista, as cinco
rosas dispostas nas extremidades e no centro da cruz evocam o Santo
Graal e o orvalho celeste da Redenção. A cruz, segundo o emblema da
A.M.O.R.C. apresenta uma rosa incrustrada no seu ponto central, isto
é, no lugar do coração de Cristo. Por sua relação com o sangue
80

derramado, a rosa é o símbolo do renascimento místico, enquanto a


Cruz é a síntese do céu e da terra, ponto de fusão do tempo e do espaço. 84
As três quadras constituem-se por versos paralelísticos, numa
gradação de significações místico-esotéricas:
Que Symbolo fecundo ... ... ... ...
Vem na aurora anciosa? ... ... ... ...
... ... ... ... Na Cruz Morta do Mundo
... ... ... ... A vida, que é a Rosa
Que symbolo divino ... ... ... ...
Traz o dia já visto ... ... ... ...
... ... ... ... Na Cruz, que é o Destino,
... ... ... ... A Rosa, que é Cristo
Que symbolo final ... ... ... ...
Mostra o sol já disperto? ... ... ... ...
... ... ... ... Na Cruz morta e fatal
... ... ... ... A rosa do Encoberto
Nos dois primeiros versos de cada quadra, como o Cristo, o Encoberto
é um “symbolo” criador - “fecundo”, proveniente de Deus - “divino”,
com destino pré-determinado - “final”, que surge profeticamente na
Madrugada das conquistas Portuguesas - “vem na aurora anciosa” -
trazendo consigo, na sua trajetória terrena, a esperança da grandeza
pátria -“traz o dia já visto” - e que deverá ressuscitar como Monarca
de um Novo Império místico -“mostra o sol já disperto”. Como afirma
Fernando Mendonça, metaforicamente “esse símbolo fecundo, divino
e final vai surgindo da bruma dos significantes: vem na aurora, é o dia
que traz, é o sol que mostra. Anciosa, visto e disperto observam
igualmente a lei interna da progressividade. O poema inteiro, aliás,
(...) observa uma taxa crescente de intensidade: uma cortina que se vai
abrindo e revelando a presença do mito - o espiritual e o carnal
confundem-se no cumprimento do destino.”. 85
O mito do “sol já disperto” remete ao mito de Ulisses - “O
mesmo sol que abre os céus”. Neste poema, na evolução gradativa da
aurora até o despertar, eleva-se um símbolo (“fecundo”, “divino”, “fi-
nal”), numa cruz (“Morta”, “Destino”, “morta e fatal”), isto é, o sím-
bolo da rosacruz.
Nos dois primeiros versos das três quadras, o jôgo semântico
se estabelece entre os sintagmas Rosa, Cruz, Cristo e Encoberto, numa
81

gradação metafórica: “Vida” = “Rosa”, “Rosa” = “Christo, “Rosa”


= “Encoberto” portanto, “Encoberto” = “Christo”.
Assim como Cristo foi enviado de Deus para a salvação da
humanidade, através de seu sacrifício anunciado antecipadamente, D.
Sebastião, o herói nacional, foi também um ser enviado pela Providência
para a redenção de Portugal - símbolo fecundo, divino, final, com a
fatalidade, preconizada em profecias, a marcar o seu destino - “Na Cruz
Morta do Mundo”, “Na Cruz, que é o Destino”, “Na Cruz morta e
fatal”.
É altamente sincrética a visão de mundo do Poeta: cristia-
nismo, gnosticismo, joaquimismo, cabalismo, rosicrucianismo,
astrologia, tudo nele conflui para a idéia de um novo Império, de uma
nova Igreja, não de Roma, mas de Cristo e do Espírito Santo, idéia de
um Império em que D. Sebastião seria o símbolo. Mas para Pessoa
também ele é um símbolo altamente complexo, como se depreende de
um apontamento do seu espólio coletado por Y. K. Centeno:
(1) King Sebastian, the man
(2) King Sebastian, the hope
(3) King Sebastian, the symbol
(4) King Sebastian, the Master
(5) King Sebastian, the Christ
D. Sebastião, o Cristo do Quinto Império. Homem,
esperança, símbolo, Mestre, Cristo - serpente do Quinto Império, ou
seja, veiculador de um outro conhecimento, que não o ortodoxo. 86

“II. Os Avisos”

Segundo o estudioso José Van den Besselaar, no seu livro O


Sebastianismo - História Sumária, o sebastianismo é uma espécie de
messianismo, ou seja, uma crença obstinada na vinda de um imperador
carismático que pudesse estabelecer uma nova ordem política e social.
O tipo de messianismo a que pertence o sebastianismo português é
próprio de uma sociedade “sacral”: crença mais ou menos generalizada
na vinda de um enviado de Deus que não só livrará seu povo oprimido
das forças internas e externas, como lhe trará a salvação, ou seja, a
saúde, a paz, a prosperidade. “O povo oprimido pode ser uma nação
inteira, ou uma determinada classe da sociedade: existe não só um
messianismo nacional, como também um messianismo social. Aquele
82

foi, quase sem excepção, o caso do sebastianismo português, ao passo


que este marcou os movimentos messiânicos que no século XIX
ocorreram no Brasil.” 87
O messianismo nacional, como é o caso português, evoluiu,
porém, para um certo ecumenismo. O povo eleito não só reivindicava
para si um lugar privilegiado, como se julgava detentor de uma missão
histórica e de uma mensagem universal.
A base e, ao mesmo tempo, o produto das esperanças
messiânicas é a profecia, que tem sempre um núcleo mítico. Mas como
o mito é um poderoso motor do processo histórico, as profecias que se
vinham forjando em Portugal desde a Idade Média, alcançaram o seu
apogeu nos séculos XVI, XVII e XVIII.
As mensagens proféticas eram escritas numa linguagem obs-
cura e enigmática, prestando-se a múltiplas interpretações. Como os
documentos históricos, também as profecias davam margem a constantes
discussões entre os seus intérpretes, criando uma classe de exegetas
que disputavam entre si o seu verdadeiro significado.
Para ilustrar o isolamento cultural em que Portugal se encontra-
va, lembra José Van den Besselaar que aos eruditos e inteligentes polemistas
faltava a noção da crítica histórica (em voga desde o Renascimento da
Itália e aperfeiçoado no século XVII nas universidades holandesas e nas
academias e abadias francesas), pois nenhum questionava o problema de
sua autencidade, embora se empenhassem em colecioná-las.
Assim, sem qualquer critério científico, os cartapácios che-
garam aos nossos dias, alguns feitos por copistas ignorantes e cheios
de erros crassos, outros organizadores com certo esmero e método. 88
Observa ainda o estudioso que, se nos cartapácios não foram encontradas
profecias bíblicas (talvez porque sejam citadas por tratadistas e
consideradas de conhecimento geral), os tratadistas apresentam contudo,
alguns textos dos profetas Isaías e Ezequiel - que se referem à paz e
harmonia universal no reino messiânico - e textos apocalípticos da
Bíblia. Entre o gênero apocalíptico destaca-se o sonho de
Nabucodonosor, interpretado por Daniel (cap. 2 e 7 ), referente aos
quatro grandes Impérios que se sucederam no Oriente: o dos Assírios,
o dos Persas e Medos, o dos Gregos e o dos Romanos.
Inúmeras profecias não-canônicas ocorrem nos cartapácios
dos sebastianistas. Dentre elas, cumpre salientar a dos oráculos sibilinos,
83

redigida em forma de coplas, em castelhano, português ou latim, contém


elementos que parecem relacionar-se com D. Sebastião. Segundo a pro-
fecia da sibila Cassandra, filha de Príamo, rei de Tróia (que apresenta
semelhanças com a de Santo Isidoro), “um rei novo, nos últimos tem-
pos, na Espanha Maior, duas vezes dado por piedade do céu, nascendo
póstumo, reinará por uma mulher, cujo nome começará em I e acabará
em L. E o dito rei virá das partes orientais. Reinará na sua mocidade,
e alimpará a Espanha dos vícios imundos, e o que não queimar o fogo,
devastará a espada. Reinará sobre a Casa de Agar, conquistará Jeru-
salém, fixará a imagem do Crucificado sobre o Santo Sepulcro, e será
o maior de todos os monarcas. (COD. BN9442; f. 328’; COD. TT1172,
p. 13)”. 89
Com efeito, esta profecia apresenta elementos que parecem
talhados para a pessoa do Desejado: duas vezes dado, nascendo póstumo,
reinando na sua mocidade, vindo das partes orientais e destruidor dos
sarracenos. Pe. Antonio Vieira, não reconhecendo a autenticidade das
palavras “nascendo postumo”, aplicou a profecia, primeiramente, a D.
João IV (em 1659) e, mais tarde, a um filho de D. Pedro II.
A Santo Isidoro, famoso arcebispo de Servilha e grande
organizador da Igreja visigótica, se atribuíam muitas profecias que o
cartucho castelhano Pedro de Frias colocou em versos, no fim do século
XV, e que foi uma fonte muito explorada pelos sebastianistas. Além de
ter profetizado também que o Encoberto seria duas vezes dado, o arce-
bispo teria predito que ele traria em seu nome “letra de hierro”, inter-
pretada pelos sebastianistas como “S”, inicial do vocábulo latino
“servus”, letra que os romanos costumavam imprimir no rosto dos es-
cravos. Obviamente o profeta tinha em mente o nome de D. Sebastião.
De São Metódio, bispo de Olimpo, que morreu mártir sob
Dioclesiano, citava-se outro texto profético, segundo o qual um Rei
tido por morto, haveria de despertar como de um sono de vinho. 90
Também os santos portugueses mostravam interesse pelos des-
tinos de Portugal. Assim, tornou-se muito popular uma profecia de São
Frei Gil (1265), um dos primeiros dominicanos de Portugal, segundo a
qual, “Portugal por parte dos seus reis, gemerá por muito tempo e pade-
cerá de muitas maneiras. Mas Deus te será propício e, não
esperadamente, será remido por um não Esperado. A Africa será sub-
metida. O Império Otomano desmoronar-se-á. A casa de Deus será re-
cuperada. Tudo será transformado. (...) Reviverá a Idade do Ouro. Por
84

toda a parte reinará a Paz. (...) (COD. TT1172, p. 95-96)” 91 . Segundo


os intérpretes , o “Não Esperado” tanto podia ser D. João IV como D.
Sebastião; o que não oferecia dúvida era que o redentor de Portugal seria
Imperador de uma Monarquia Universal.
Disseminaram-se profecias em Portugal provindas de religi-
osas, através de visões ou revelações - Madre Leocádia da Conceição,
no Porto; Freira Leonor Roís, em Belém - e de profetas leigos - Bandarra
(sapateiro de Trancoso), Simão Gomes; Simão Nunes (ourives em
Braga), entre inúmeros outros.
Bandarra, Pe. Vieira e Fernando Pessoa também estão
elencados entre os profetas nacionais e são eles as figuras celebradas
nos três poemas de “Os Avisos”.
O “Primeiro/Bandarra” é um poeta popular do século XVI,
“plebeu como Jesus Cristo”, representante do povo; o “Segundo/Antonio
Vieira” é o orador e historiador do século XVII, representante do clero; o
“Terceiro” é um poeta e filósofo do século XX, Fernando Pessoa, repre-
sentante da classe intelectual. Representados pelas três classes sociais
em três tempos diferentes da história nacional, os “Avisos” são sinais e
profecias de que a Portugal está reservado o lugar de edificação do Quinto
Império.
Bandarra profetiza na época em que as nuvens da decadên-
cia do império ultramarino e da fraqueza do reino começavam a
adensar-se sobre os céus de Portugal; é o profeta de Portugal à beira
do abismo; Vieira profetiza na época em que Portugal acaba de fazer
a travessia do deserto, simbolizada pelos sessenta anos da monarquia
dual, durante as primeiras décadas da quarta dinastia: é o profeta de
Portugal que tenta refazer-se do cativeiro de Babilónia; Pessoa faz a
experiência republicana, ensaia os primeiros passos no caminho do
Estado Novo e procura reencontrar a sua alma e o seu destino: é o
profeta da pátria em busca de si mesma. 92

“Primeiro/Bandarra”

Em poema curto, formalmente organizado em duas quadras,


narrado na segunda pessoa do singular, o Poeta exalta aquele que
Fernando Pessoa considera “o verdadeiro patrono do nosso país (...) a
Voz do Povo português, gritando, por cima da defecção dos nobres e
85

dos clérigos, por cima da indiferença dos cautos e dos incautos, a


existência sagrada de Portugal”. 93
SONHAVA, anonymo e disperso,
O Império por Deus mesmo visto,
Confuso como o Universo
E plebeu como Jesus Christo.
Não foi nem santo nem heroe,
Mas Deus sagrou com Seu signal
Este, cujo coração foi
Não portuguez mas Portugal.
Quase tudo o que se conhece sobre a vida de Gonçalo Anes
Bandarra é o que consta do seu processo inquisitorial: deve ter nascido
por volta de 1500, na Vila de Trancoso, onde sempre viveu, exercendo o
ofício de sapateiro. Segundo informações colhidas no seu processo
inquisitorial, publicado por Teófilo Braga na segunda metade do século
XIX, Gonçalo Anes Bandarra era rico e abastado e sabia ler e escrever,
pois trocava correspondência com várias pessoas ilustres do Reino. O
sapateiro de Trancoso conhecia também as profecias de Santo Isidoro,
através das coplas castelhanas de Pedro de Frias, e teriam sido elas a
convencerem-no da vinda de um Rei Encoberto, predestinado a estabele-
cer a Monarquia Universal. 94
As profecias de Bandarra, também resultantes de três sonhos
construídos em trovas rimadas, de natureza bíblica e patriótica, difun-
diram-se rapidamente pelo país e os cristãos-novos, que já antes o con-
sultavam como rabi, passaram a venerá-lo como um profeta solidário
com eles nas esperanças messiânicas. O alvoroço que suas predições
causavam despertou suspeitas da Inquisição recém estabelecida; em 1540,
o poeta foi preso e, em 03 de outubro de 1541, a Mesa Inquisitorial impôs-
lhe como castigo o de abjurar solenemente as suas trovas na procissão do
auto-da-fé no dia 23 do mesmo mês. A partir desse ano, não mais se
ouviu falar dele. 95
A primeira edição (parcial) das suas Trovas saiu publicada
em 1603, em Paris, por instâncias de D. João de Castro. Quarenta anos
depois (1644) saiu em Nantes uma edição completa, sob o patrocínio
do Conde de Vidigueira, então Embaixador de D. João IV, em Paris.
A coleção de Trovas do vate de Trancoso vem precedida de
Dedicatória a D. João de Portugal: compõe-se de dezesseis quadras em
86

que o poeta compara as suas profecias com os produtos de seu ofício de


sapateiro. A estes versos se segue um conjunto de outras dezesseis qua-
dras numeradas que o editor rubricou com a epígrafe “Sente Bandarra
as maldades do mundo, e particularmente as de Portugal”. Em seguida,
vem a matéria profética propriamente dita: reparte-se em 143 trovas
variáveis na sua extensão, que constituem, na edição de Nantes (1644),
três sonhos. Neles, Portugal dará ao mundo o Grande Encoberto, que
há-de desbaratar os exércitos dos Turcos na África, na Terra Santa e na
Ásia Menor. Ele será coroado Imperador e inaugurará, juntamente com
o Papa, a Monarquia Universal, sob a Lei de Cristo. 96
O Poeta atribui a Bandarra um certo grau de anonimato -
“Sonhava, anonymo e disperso”. Nas palavras do próprio Fernando
Pessoa “anonymo é um epíteto que designa Bandarra como um nome
coletivo, metonímia do povo místico português.
É Bandarra um nome colectivo, e designa, não só um ho-
mem, o primeiro que teve a visão profética dos destinos do País, senão
também aqueles outros, que se lhe seguiram, e que, servindo-se do seu
tipo de visão e da forma literária, buscaram legitimamente o anonimato
designando as suas trovas como sendo de Bandarra também. 97
O epíteto “disperso” parece relacionar-se com a variedade
de predições e vaticínios contidos na Trovas do sapateiro de Trancoso.
Nos versos “Confuso como o Universo/E plebeu como Jesus
Christo”, o Poeta acentua a natureza das profecias e do profeta: as profe-
cias são de complexa leitura e passíveis de múltiplas interpretações, e o
profeta foi um homem do povo, de condição humilde como a de Jesus
Cristo.
Tal como Nuno Álvares Pereira, Bandarra também é consi-
derado pelo Poeta um homem eleito por Deus - “Mas Deus sagrou com
seu Signal” - e por Ele metamorfoseado na própria essência de Portugal.
Em Sobre Portugal, o próprio Fernando Pessoa considera Bandarra “o
símbolo do que o povo pensa de Portugal” 98

“Segundo/Antonio Vieira”

Nesse poema, constituido por três quadras, o Poeta seleciona


uma constelação semântica adequada à natureza do profeta: enquanto
Bandarra foi um profeta popular e suas predições tinham caráter político,
87

Vieira foi um membro do clero e suas profecias encerram caráter religi-


oso. Como missionário em terras estrangeiras, Antonio Vieira, homem
das letras e orador famoso, recebeu a missão de colocar o homem em
contato com Deus. Por isso, a constelação semântica em torno da qual
se estrutura o poema é organizada por vocábulos como: “céu” (três
vezes), “strella” (duas vezes), “azul” (duas vezes), “constellado” (duas
vezes), “luar”, “ethereo”, “madrugada irreal”, “doira”.
O CÉU STRELLA o azul e tem grandeza.
Este, que teve a fama e a glória tem,
Imperador da língua portuguesa,
Foi-nos um céu também.
No imenso espaço seu de meditar,
Constellado de fórma e de visão,
Surge, prenuncio claro de luar
El-Rei D. Sebastião.
Mas não, não é luar: é luz do ethereo.
É um dia; e, no céu amplo de desejo,
A madrugada irreal do Quinto Império
Doira as margens do Tejo.
Além de ser considerado o mestre da língua portuguesa, foi
um sinal dos desígnios de Deus para Portugal - “Foi-nos um céu
também” - porque, na sua HISTÓRIA DO FUTURO 99 , acreditava pertencer
à Portugal a glória do Quinto Império. Segundo João Gaspar Simões,
“esperava o padre Antonio Vieira ver cumprida em 1666 a profecia
segundo a qual se estabeleceria no mundo o Império Universal, império
este ao mesmo tempo de Cristo e do Rei de Portugal, o qual rei, segundo
o louco jesuíta seria D. João, filho de D. Pedro II. Ao tempo, porém,
em que o insigne pregador celebra na Baía-de-todos-os-Santos o
nascimento do predestinado Príncipe em cuja cabeça viria a assentar
a coroa do Quinto Império, já o profético monarca, em Portugal, dera
a alma a Deus. E o Quinto Império esperado para breve mal caísse o
império otomano não o veria o grande sermonário.” 100
No poema que lhe é dedicado, o Poeta exalta o estilista ver-
náculo - “Imperador da língua portuguesa” - o profeta místico e
sebastianista - “No immenso espaço seu de meditar, / Constellado de
forma e de visão, / Surge, prenúncio claro do luar, / El-Rei D. Sebastião”
e, principalmente, o mentor espiritual da crença do Quinto Império que
não viu realizado, um Quinto Império messiânico e estético.
88

Mas é interessante recordar que Antonio Vieira, ao entrar


na questão do sebastianismo, era partidário dos que defendiam a tese
da ressurreição de D. João IV, e não de D. Sebastião, como quer o
Poeta de Mensagem. Essa sua intervenção a favor de D. João IV é
comprovada por uma famosa carta do jesuita ao bispo eleito do Japão,
André Fernandes, datada de 29 de abril de 1659, cuja cópia se conserva
na Torre do Tombo, constituindo documento básico do seu processo
inquisitorial. Nela o autor defende a tese do regresso de D. João IV
baseando-se no seguinte silogismo:
O Bandarra é o verdadeiro profeta.
O Bandarra profetizou que el-Rei D. João IV há-de obrar
muitas cousas que ainda não obrou, nem pode obrar senão ressuscitando.
Logo, el-Rei D. João IV há-de ressuscitar. 101

“Terceiro”

Neste poema é enigmática a ausência de um nome concreto


a completar o ordinal “Terceiro”. Com efeito, após os poemas “O
Bandarra” e “António Vieira”, proféticos avisos da restauração dum
Quinto Império respectivamente político e religioso, aparece o terceiro
que, na lógica interna, corresponde ao último da série dos profetas na-
cionais. Fernando Pessoa não lhe atribuiu o próprio nome, confiando
que o futuro lhe conferisse o lugar.
É ele, pois, o último profeta português, o Super-Camões,
anunciando com a sua Mensagem o Império definitivo da Super-
Civilização.
Curiosamente o poema é datado de 10/12/28, tal como o enig-
mático fecho da obra, o poema “Nevoeiro”. E da mesma forma que mui-
tos dos profetas escreviam suas profecias em momentos de tribulação, o
último profeta lusíada escreve seu aviso “à beira - mágua”, uma cons-
trução poética cheia de tristeza, distante daquele estado confiante que
proclamava n’A Águia a vinda iminente de um Super-Camões.
O poema é constituído por vinte versos, distribuídos em cindo
quadras, e apresenta, na sua estrutura externa, um discurso marcado
por afirmações e interrogações: os seis primeiros versos contêm cinco
afirmações e os catorze outros encerram interrogações. A tônica do
poema é a dor e a esperança.
89

SCREVO meu livro à beira magua.


Meu coração não tem que ter.
Tenho meus olhos quentes de água.
Só tu, Senhor, me dás viver.
Só te sentir e te pensar
Meus dias vacuos enche e doura.
Mas quando quererás voltar?
Quando é o Rei? Quando é a Hora?
Quando virás a ser o Christo
De a quem morreu o falso Deus,
E a dispertar do mal que existo
A Nova Terra e os Novos Céus?
Quando virás, ó Encoberto,
Sonho das eras portuguez,
Tornar-me mais que um sopro incerto
De um grande anceio que Deus fez?
Ah, quando quererás, voltando,
Fazer minha esperança amor?
Da névoa e da saudade quando?
Quando, meu Sonho e meu Senhor?
O poeta fala em seu próprio nome, na primeira pessoa do
singular e constrói um poema cheio de ressonâncias bíblicas - “Só tu,
Senhor, me dás viver”. A ambivalência semântica da forma “Senhor”
(Deus? Cristo? D. Sebastião? O Encoberto?) já passa a indicar um
significado transpessoal. A partir da segunda estância a forma vai
assumindo sucessivamente os títulos de “Rei”, “Hora”, “Christo”,
“Encoberto”, Sonho”, “Senhor”. Não é já apenas a sua consciência
lírica, mas a voz coletiva de um povo e de toda uma aspiração secular
que vai ganhando corpo neste profeta simbolicamente ausente, sem
nome, que vai despertar “A Nova Terra e os Novos Céus” e dar sentido
à longa espera iniciada.
“Portugal adormecido e sepultado desde que o Rei D. Se-
bastião desapareceu nos areais de Alcácer-Quibir, em 1578, e
apresentado a dormir no poema de abertura da Mensagem, está à
espera de que alguém o desperte e o leve a gozar das delícias da Terra
de Promissão - “A Nova Terra e os Novos Céus”. E esse alguém o seu
Cristo, que quer dizer Messias ou Ungido do Senhor.” 102
O sentido polivalente da forma “Sonho”, sinônimo de “Se-
90

nhor”, “Rei”, “Christo”, “Encoberto” serve para reiterar a natureza


oracular do poema.
Constata-se no poema também a constelação semântica da
potencialidade através dos sintagmas: “Encoberto”, “dias vácuos”,
“sonhos das eras português”, “névoa”, “saudade”, “meu Sonho”,
“esperança”.
O crítico José Augusto Seabra agudamente observa em
síntese, que “Vieira e Pessoa identificam-se, (...) na sua alteridade,
através de um poeta-profeta popular de que são ambos glosadores,
pois as suas ‘trovas’ constituem para eles o texto matriz: Gonçalo Annes
Bandarra (...) que os precede, no primeiro ‘Aviso’ da Mensagem
pessoana, com as profecias do Encoberto. Se ele, como diz esse ‘Aviso’
‘Sonhava anonymo e disperso / O Imperio por Deus mesmo visto’,
seria Vieira quem, interpretando-lhe as palavras crípticas, ‘No imenso
espaço seu de meditar / Constelado de forma e de visão’, daria melhor
a ler, a reler ‘A madrugada irreal do Quinto Império’ que Pessoa (re)
escreve no seu ‘livro à beira-magua’, anunciando a ‘Hora!’. 103
O profetismo de Vieira e de Pessoa é, pois, o resultado ama-
durecido de um messianismo cujas raízes mais profundas mergulham
numa confluência de várias correntes ideológicas antigas, encontrando
nelas uma voz profética que se revela como expressão universal de
esperança em oposição a um sentimento nacional de crise.

“III - Os Tempos”
Nesta terceira seção de “O Encoberto” o Poeta trata dos
“tempos”: dois períodos do dia “Primeiro/Noite”, “Segundo/
Antemanhã” e três fenômenos meteorológicos “Terceiro/Tormenta”,
“Quarto/Calma”, “Quinto/Nevoeiro”.
Na estrutura externa da Terceira Parte de Mensagem há uma
intencional reiteração do número cinco: cinco “símbolos” e cinco “tem-
pos”, separados por três avisos. Além disso há correspondências entre
os “Símbolos” e os “Tempos”: a “Noite” de “Os Tempos” corresponde
“D. Sebastião” de “Os Symbolos”; à “Tormenta”, o “Quinto Impé-
rio”; à “Calma”, “O Desejado”; à “Antemanhã”, as “Ilhas Afortuna-
das”; ao “Nevoeiro”, o “Encoberto”. De maneira didática, António
Cirurgião, sintetiza: “na noite dos tempos encontra-se envolto o Rei D.
Sebastião, da tormenta há-de nascer o Quinto Império, que todo o acto
de nascimento é acompanhado de dor; no meio de calma antever-se-á o
91

Desejado; à meia luz da antemanhã hão-de vislumbrar as Ilhas Afortu-


nadas; do meio do nevoeiro irromperá um dia a silhueta do Encoberto.
É como se os cinco símbolos fossem figuras ou prefigurações do Antigo
Testamento de Portugal, predictos pelos três profetas.” 104

Primeiro/Noite
Este poema de trinta versos distribuidos em cinco estrofes
de seis versos (sextilhas) é o mais longo de Mensagem simbolizando
todos os séculos de espera pelo advento do Desejado.
No plano do discurso, duas vozes comparecem no poema: a
de uma figura que narra para o leitor um fato histórico e a de uma
figura que fala com Deus - personagens distintos.
Nas três primeiras estrofes, o poema reveste forma narrativa
e nas duas últimas, forma invocativa.
A NAU de um d’elles tinha-se perdido
No mar indefinido.
O segundo pediu licença ao Rei
De, na fé e na lei
Da descoberta ir em procura
Do irmão no mar sem fim e a nevoa escura.
Tempo foi. Nem primeiro nem segundo
Volveu do fim profundo
Do mar ignoto à patria por quem dera
O enigma que fizera.
Então o terceiro a El-Rei rogou
Licença de os buscar, e El-Rei negou
Como a um captivo, o ouvem a passar
Os servos do solar.
E, quando o vêem, vêem a figura
Da febre e da amargura
Com fixos olhos rasos de ancia
Fitando a prohibida azul distancia.
Na primeira e segunda sextilhas o Poeta narra a história de
três irmãos, sem, no entanto, nomeá-los: Gaspar, Miguel e Vasco, filhos
do navegador português João Vaz Côrte-Real. Gaspar e Miguel, filhos
mais novos de João Vaz, ficaram célebres pelas viagens que empreen-
deram para o Ocidente. Gaspar Corte-Real, além da viagem que, segundo
suposições, fizera com o pai antes de 1488, empreendeu outras duas:
92

por volta de 1500, teria atingido a Terra Nova, a Groenlândia, a Costa


da América do Norte, os rios Hudson e São Lourenço, o Canadá e a
Península do Labrador; na segunda, iniciada em Lisboa por volta de
1501, desapareceu no mar - “A nau de um d’elles tinha-se perdido / No
mar indefinido”.
O segundo irmão, Miguel, receando que viessem a faltar vi-
veres à segunda exposição de seu irmão, foi em sua procura e, na segunda
expedição, veio a perder-se no mar “Tempo foi. Nem primeiro nem
segundo / Volveu do fim profundo”.
O irmão mais velho dos dois desaventurados navegadores,
Vasco Anes, e sucessor de seu pai nas capitanias de Angra e de S.
Jorge, pretendeu ir, à sua custa, em busca dos irmãos Gaspar e Miguel,
mas não recebeu autorização do Rei 105 “Então o terceiro a El-Rei
rogou / Licença de os buscar, e El-Rei negou”. As dificuldades das
viagens dos dois irmãos é enfatizada pelas repetições “mar idefinido”,
“mar sem fim e a névoa escura”, “fim profundo”, “mar ignoto”.
Na terceira sextilha (formalmente destacada das duas pri-
meiras por um asterisco) surge o drama do terceiro irmão a quem o Rei
não permitiu a viagem, em toda a sua dimensão existencial: prisioneiro,
impossibilitado de demonstrar sua bravura e de desenvolver as poten-
cialidades que fariam dele um herói, como os irmãos: “E, quando o
vêem, vêem a figura / Da febre e da amargura”.
Nas duas últimas sextilhas, o triste e inconformado “captivo”
explica a Deus o insucesso dos irmãos e o significado profundo da
busca que ele pretendia empreender.
Senhor, os dois irmãos do nosso Nome
O Poder e o Renome -
Ambos se foram pelo mar da edade
À tua eternidade;
E com elles de nós se foi
O que faz a alma poder ser de heroe.
Tal como os irmãos, metaforicamente considerados “O Poder
e o Renome”, o terceiro sentia-se predestinado a cumprir missão de
herói, uma vez que sua alma estava inflada de sonhos de ventura, como
a de todos os navegadores portugueses. As viagens dos dois irmãos
representam, metonimicamente, todas as expedições mal sucedidas, as
viagens sem regresso - a história trágico-marítima. “E com elles de nós
se foi / O que faz a alma poder ser de heroe”.
93

Assim, a busca que o terceiro irmão pretendeu empreender é


mais que uma simples questão de honra, significa a busca de si mesmo
“É a busca de quem somos, na distancia / De nós...” numa espécie de
viagem em que a identidade do ser se funde com a identidade da Pátria.
Mas, como o Rei da terra, também o Rei do céu impossibilitou-lhe a
realização do sonho “Mas Deus não dá licença que partamos”.
Neste poema Fernando Pessoa expõe, com toda a
profundidade possível, o drama existencial do homem que encarna,
por extensão, o da sua nação. Metafórica e metonimicamente é Portugal
quem, na parte narrativa do poema, se sente impedido pelo Fado de
realizar a sua missão terrena; na parte invocativa, é impedido também
de realizar-se na eternidade. “Preso no solar enquanto ser-para-a-
história, preso está também no mundo enquanto ser-para-a-vida-
eterna” 106 , enfatiza António Cirurgião.
Em linguagem metafórica o primeiro poema d’Os Tempos
significa um limite na duração e a distinção mais sentida com o mundo
da eternidade. Não havendo entre o tempo humano e o tempo divino
nenhuma medida comum possível, o homem sente-se impossibilitado
de desenvolver suas potencialidades enquanto ser.

“Segundo / Tormenta”

O poema compõe-se de duas quadras: a primeira, construída


em forma de dialogismo encerra o percurso que Portugal deve seguir para
sair do marasmo do tempo presente e realizar-se como Império Mundial.
QUE JAZ no abysmo sob o mar que se ergue?
Nós, Portugal, o poder ser.
Que inquietação do fundo nos soergue?
O desejar poder querer.
Nos dois primeiros versos está implícita a associação com o
infortúnio de D. Sebastião e a consequente perda da independência e
da prosperidade de Portugal - “O poder ser” - a potencialidade temporal
da nação “jaz no abysmo sob o mar que se ergue”. Mas “a febre de
além”, a “loucura” que impulsiona o português, distinguindo-o do”
cadáver adiado que procria”, a sua “inquietação” levam-no, nos dois
últimos versos da primeira quadra, em forma ascensional a “desejar
poder querer”. Essa locução verbal com três verbos na forma infinita
indica a prospecção dos atos de desejo, de poder e de vontade - a
94

renovação do que apenas está adormecido: a potencialidade da raça e


do ser da Pátria, que se “soergue”, que se eleva do âmago do ser.
Isto e o mysterio de que a noite é o fausto ...
Mas subito, onde o vento ruge,
O relampago, pharol de Deus, um hausto
Brilha, e o mar scuro struge.
Na segunda quadra, através do deítico “isto” o Poeta resume
os dois versos anteriores e, como se já visualizasse nova era de realizações
para o país, muda a tonalidade do poema. O primeiro verso funciona,
metaforicamente, como uma reflexão “e o mysterio de que a noite é o
fausto ...” a noite da decadência e do marasmo, (associada ao mito da
Caverna de Platão) serviu para a conscientização de que tudo é possível
quando há vontade e crença. A “inquietação do fundo” iconicamente
irrompe das profundezas do mar transformando-o em mar agitado, tem-
pestuoso, “onde o vento ruge e o mar scuro struge”, mas onde também
se reflete o brilho o céu: “O relampago, pharol de Deus, um hausto /
Brilha” . A conjugação tempestuosa do mar e do céu parecem prenunci-
ar uma catástrofe, mas o relâmpago pode ser visto metaforicamente, como
o elemento de ligação entre o mundo do presente, de decadência terrena,
que vem do abismo do mar, e o mundo do futuro, de prosperidade espiri-
tual quando se refere ao céu. Entre o Império material e político do pas-
sado e o Império espiritual e cultural do futuro está Portugal.

“Terceiro / Calma”
No seu aspecto intertextual, este poema é a continuação
lógica do poema anterior, porque da tempestade irrompe a paz -
“tormenta” e “calma”. Tematicamente apresenta pontos de semelhança
com “As Ilhas Afortunadas” (quarto poema da I Seção da Terceira
Parte): em ambos há a mesma nota de esperança na ressurreição do
Desejado.
O poema é constituido por duas estrofes de sete versos
(sétima) e uma estrofe de oito versos (oitava), e estrutura-se,
retoricamente, sobre cinco interrogações: três na primeira estrofe, uma
na segunda e uma na terceira, em forma de di0scurso dialógico. No
aspecto fônico, o Poeta se utiliza do processo sinestésico e
onomatopéico, em que sensações auditivas e visuais se interseccionam
no seu mundo anímico, como se ele estivesse diante de uma visão
mística, sobrenatural.
95

QUE COSTA é que as ondas contam


E se não pode encontrar
Por mais naus que haja no mar?
O que é que as ondas encontram
E nunca se vê surgindo?
Este som de o mar praiar
Onde é que está existindo?
Ilha próxima e remota,
Que nos ouvidos persiste,
Para a vista não existe.
Que nau, que armada, que frota
Pode encontrar o caminho
À praia onde o mar insiste,
Se à vista o mar é sósinho?
Haverá rasgões no espaço
Que dêem para o outro lado,
E que, um d’elles encontrado,
Aqui, onde ha só sargaço,
Surja uma ilha velada,
O paiz afortunado
Que guarda o Rei desterrado
Em sua vida encantada?
O barulho das ondas na praia, através da aliteração de gutu-
rais, nasais e sibilantes denota a existência de uma ilha visível e próxima,
no plano material, mas longínqua, invisível e inalcançável, no plano
espiritual: “Ilha próxima e remota”; “ilha velada”; “paiz afortunado”.
O poema desenvolve a dialética entre o espaço visível e o espaço
invisível, com a supremacia deste. Novamente está presente a dualidade
mar e céu. O mar comparece com a constelação semântica de “costa”,
“onda”, “naus”, “praia”, “ilha”, “armada”, “frota”, sargaço”,
imagens diluídas em símbolos mítico-poéticos de tempo e espaço, em
combinação com imagens do ar e do fogo - “som” e “rasgões no
espaço” - referindo-se ao campo semântico do sonho e do mistério:
“outro lado”, “ilha velada”, “vida encantada”.

“Quarto / Antemanhã”

Este poema mantém estreita intertextualidade com o poema


“O Mostrengo”, quarto poema da Segunda Parte de Mensagem. O
96

primeiro verso de ambos é exatamente igual. Porém em “Antemanhã” o


Poeta nos apresenta o herói português ensurdecido aos apelos do Mostrengo,
anteriormente vencido pelos navegadores e pela vontade de D. João II.
Entre os poemas “O Mostrengo” e “Antemanhã” reside uma
grande diferença no tocante à atitude da heróica raça portuguesa: no
primeiro, os navegadores agem guiados pela febre de conquista e pela
vontade enérgica de El-Rei D. João II; no segundo, deixam-se vencer
pela fatalidade e tornam-se passivos, quedando-se a sonhar com as ações
passadas. Em um, o monstro marinho inquire o timoneiro sobre a audácia
das navegações - “Quem é que ousou entrar / Nas minhas cavernas
que não desvendo” - e obtém uma resposta imediata e incisiva: “El-Rei
D. João Segundo!”; no outro, o mostrengo tenta despertar Portugal do
estado de letargia em que se encontra, interrogando-o sobre a identidade
de quem está adormecido, esquecido dos feitos heróicos do passado:
“‘(....) Quem é que dorme a lembrar / Que desvendou o Segundo Mundo,
/ Nem o Terceiro quere desvendar?’”. Mas nem os apelos do mar
parecem diminuir a abulia d’ “Aquelle que está dormindo / E foi outrora
Senhor do Mar”, até mesmo para uma resposta. O povo que conquistara
o mundo nos séculos XV e XVI parecia não acreditar na possibilidade
de conquistar o Quinto Império?
Numa re-leitura da primeira estrofe, infere-se que o
Mostrengo sai das trevas a procurar “A madrugada do novo dia, / Do
novo dia sem acabar”. O “novo dia” significaria uma nova fase de
conquistas, agora não mais no mundo material, mas na esfera espiritual,
o Império Universal - o “Terceiro” mundo.

“Quinto / Nevoeiro”

Este poema que se constitui por uma sextilha, uma sétima e


um verso isolado, num total de catorze versos, lembra os catorze “Passos
da Cruz” do autor de “Cancioneiro” (e estes os catorze passos da Cruz
de Cristo) no seu cunho simbólico e ocultista.
Desde o título, “Nevoeiro” simboliza o indeterminado, as
formas imprecisas, por isso a atmosfera do poema é de ambiguidade,
de indecisão, de indefinição.
Na primeira estrofe, o Poeta tenta definir o “perfil” e o “ser”
de um Portugal antropomorfizado, através de repetições anafóricas e
antitéticas.
97

NEM REI, nem lei, nem paz nem guerra,


Define com perfil e ser
Este fulgor baço de terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder
Como o que o fogo - fatuo encerra.
Para figurar Portugal em crise, o Poeta apresenta um país
indefinido politicamente na sua configuração físico-geográfica e em
estado de total abulia. Os oxímoros “fulgor baço”, “brilho sem luz e
sem arder” enfatizam os traços negativos que caracterizam o país.
Na segunda estrofe, partindo do perfil coletivo para o indi-
vidual, o Poeta define os componentes humanos que caracterizam o
Ser da nação: o amorfismo moral e mental em que Portugal está imerso
pelas antíteses, oxímoros e anáforas. Nos três primeiros versos, o Poeta
constata que Portugal, enquanto coletividade, não se (re)conhece:
“Ninguém conhece que alma tem”; está indiferente, apático, abúlico:
“Ninguém sabe que cousa quer”; não sabe discernir: “Nem o que é o
mal nem o que é o bem”. Na fragmentação e na incerteza, porém, o
Poeta confia na transformação, na ressurreição da Pátria: o brado de
esperança e de alento do verso final do poema - “É a Hora!” -
arrematando com o apelo solidário da hipógrafe “Valete, Fratres”
reforça a idéia de que “é do abismo e das sombras que precisamente a
luz poderá surgir. Do hoje nevoento nascerá a Hora sagrada e iniciática,
a Hora profetizada, a Hora da redenção”. 107

Conclusão
A estrutura de Mensagem revela a planificação da essência
de uma pátria e de sua missão espiritual à frente dos povos. Toda a obra
caminha num crescimento até “Mar Portuguez”, para, em ritmo menor,
até o final, retratar a decadência e o marasmo que definem, na opinião
do Poeta, a nação do “desejar poder querer”.
Desse modo, as partes que compõem a obra estão dispostas
a percorrer essa trajetória: em “Brasão” caracteriza-se a pátria, com
seus heróis predestinados a fazer dela o alicerce de uma nova era; em
“Mar Portuguez” configura-se essa grandeza contada no primeiro
momento, quando se justificam todas as esperanças nela depositadas,
pelo domínio glorioso do mar; na terceira parte, sob a figura onírica de
98

“O Encoberto”, reside o ideal supremo da redenção de Portugal, que


há de acontecer, à revelia dos que não sabem “que coisa quere”. Há
um nítido encadeamento entre as partes, pela retomada de temas, pelo
predomínio da metáfora da água e pelos símbolos mítico-proféticos D.
Sebastião e Quinto Império.
Mensagem organiza-se como matéria épica com forte tensão
lírica, sustentada na fusão das dimensões real e mítica, com planos his-
tórico e maravilhoso bem estruturados. A dimensão real consiste na
estruturação do passado histórico de Portugal (dos primórdios da naci-
onalidade a 1578) e a dimensão mítica na estruturação de um presente
não realizado historicamente.
O factual histórico prende-se à dimensão temporal da reali-
dade objetiva dos séculos XII a XVI, enquanto o mito, aderindo ao fato
histórico, por ser uma afirmação do real, reduplica a sua estrutura de
realidade. Mensagem centra-se, pois, na dimensão mítica e parte dela
para dimensão real.
O relato histórico de Mensagem é a viagem de regresso de
D. Sebastião para a realização do presente (futuro) de Portugal - o Quinto
Império. D. Sebastião constitui a representação simbólica do herói co-
letivo, de Portugal enquanto Ser, enquanto Alma.
Os heróis da obra são construídos de forma a agirem por
impulsos e pela loucura, guiados por força superior; são instrumentos
da predestinação divina. Pessoa concebe a história humana inteiramente
sujeita à história divina e o tempo humano subordinado ao tempo sa-
grado e cíclico. Por isso se justifica a escolha dos feitos heróicos em
Mensagem.
Constatam-se na elaboração do Poema, duas esferas ou rea-
lidades - a sensorial ou terrena e a espiritual ou supra-real. A primeira é
caracterizada pela factualidade e a segunda pelas abstrações gradativas
do Poeta, que parte do real histórico do império terreno português para
a esfera do ideal, do mítico, do simbólico, exaltando, sobretudo, o que
transcende o mundo sensorial - a quimera, o sonho, a febre de Além, a
crença no advento de D. Sebastião e do Quinto Império.
A mensagem transmitida pela obra não é apenas a exaltação
de glórias passadas, mas, partindo das conquistas, o Poeta busca
despertar a nação para uma supra-realidade, ucrônica e utópica, que
reside na Vontade e na Esperança. É a crença na “regeneração” da
99

nacionalidade, através de um Império Cultural e espiritual sob a égide


do Espírito Santo. Além das facetas do poeta e do místico, Mensagem
conta, na sua elaboração, com a do profeta Fernando Pessoa, que, na
esteira de Bandarra e de Vieira, anima e colore o universo da obra com
o seu fatalismo histórico, sugestionando os espíritos, fornecendo-lhes
matéria, não já para o conhecimento do passado, mas, acima de tudo,
para a ação modeladora do futuro. Como profeta do Império Universal,
o “Terceiro” de “Os Avisos” não alude simplesmente à realização do
Quinto Império português, mas anuncia-o. Ao miticizar a paixão, morte
e ressurreição de D. Sebastião, transforma o advento bíblico do reino
de Deus no advento do Quinto Império português, aproximando, assim,
a história de Deus da história dos homens. Nesse sentido, os mitos do
Encoberto e do Quinto Império se relacionam com a teoria do Espírito
Santo. Consideradas “mais aristocrático-iniciáticas do que
antropológicas” 108 as teses dos símbolos proféticos pessoanos seguem a
mesma linha de Sampaio Bruno. A originalidade do sebastianismo
preconizado por Pessoa reside no fato de ser, ao mesmo tempo, cristão,
esotérico e mítico: é cristão porque o Poeta não nega que Cristo, “sagrado
em honra e em desgraça”, tenha sido um Messias encarnado de um ciclo
temporal; é esotérica, porque Pessoa atribui a D. Sebastião, o Cristo
português, os atributos paracléticos e redentoristas do Cristo da Trindade
cristã; e é mítico, porque está integrado num tempo circular e teofânico.
Como quer que seja, porém, o autor de Mensagem é mais
Poeta do que teorizador da História de Portugal.
O par da galeria de heróis e seus feitos está a emoção do
Poeta, extravasada em versos incontidos, no resgate da memória que se
perdeu, na esperança do retorno messiânico, na paixão pelo ideal de
fraternidade, no sonho de conquista de “qualquer Distância”. O amor
pela pátria transubstanciou-se em busca metafísica, em ânsia incessante
pela perfeição e pelo Absoluto.
A mensagem de Mensagem é a busca daquele “projecto
áureo português” interrompido, mas cifrado nos sinais e nos símbolos
que dele subsistem desde os campos de Ourique, que não está fixado
em nenhuma época histórica porque é um projeto de uma “pátria em
seu destino supratemporal”. 109
Perseguindo esse objetivo, o desenvolvimento histórico-cul-
tural de Portugal, obedece, na estruturação de Mensagem, aos sete ciclos
de evolução apontados por Antonio Quadros em Portugal, Razão e
100

Mistério: 110 O primeiro, ciclo solar ou atlante, corresponde ao alvorecer


da civilização fundadora, “assentado numa religião astral, com predo-
minância solar e num culto escatológico orientado para a idéia da
imortalidade”. 111 E sendo um ciclo criativo, gerou lendas e alegorias,
de onde brotou a figura mítica de Ulisses. No segundo ciclo — ciclo
lusitano — convergência de culturas autóctones e imigradas, de
aculturações e miscigenação, avultam as qualidades da raça: a bravura,
o heroísmo, o telurismo, a consciência de Ser de um povo; foi um período
de resistência e de coragem que culminou com a saga de Viriato. Esses
dois períodos configuram a proto-história e a pré-história de Portugal,
o “antemanhã” e o alvorecer da nacionalidade.
O terceiro ciclo, denominado ciclo templário, iniciando-se
com a fundação da nacionalidade, com o Templário Afonso Henriques
e, prosseguindo até o reinado de D. Afonso III, caracterizou-se pelo
espírito cavalheiresco e idealismo cristão das Cruzadas e pelas regras
cistercienses. É o período que deixou marcas profundas na história e na
cultura portuguesas até os nossos dias.
O quarto ciclo define-se com D. Dinis, adquirindo o apogeu
em seu reinado e obscurecendo-se com a morte do rei Trovador. O
ciclo dionisíaco é o período em que o país dá os primeiros passos na
agricultura e no comércio, além de iniciar a sua independência cultural
e espiritual. Sob o reinado de D. Dinis têm raízes todos os grandes
temas que serão desenvolvidos e concretizados pelos Príncipes de
Avis. Com a criação da Ordem de Cristo, com a instauração do Culto
e das Festas do Espírito Santo, com a dedicação do monarca e do
povo ao ideal franciscano, Portugal passou a ter uma teleologia própria,
desenvolvendo uma nova sensibilidade com a formação de elites
culturais a partir da fundação da Universidade portuguesa.
Através das Ordens de Cristo (ex-Templários) e de Avis ar-
ticula-se o ciclo dionisíaco com o ciclo imperial, que se situa no período
entre D. João I e D. Manuel I. Preparado por D. Dinis — “o plantador
de naus a haver” — foi a grande época das conquistas e das navegações,
e onde, além do alargamento territorial, ocorreu a ampliação dos
horizontes culturais e espirituais, que culminou com o Renascimento.
Na estrutura interna de Mensagem esse período corresponde ao “Mar
Portuguez”, ou Segunda Grande Parte da obra.
O sexto período, conhecido como ciclo sebastianista, tem
início durante o reinado dos Filipes, com a historiografia dos
101

alcobacenses. A este se segue o ciclo saudosista, que apresenta duas


vertentes opostas: a primeira é marcada pelo predomínio da frustração,
da desesperança, do complexo de inferioridade de um país saudoso do
período áureo desaparecido desde a sangrenta batalha de África. Na
segunda vertente, ocorre a consciência da necessidade de reassumir a
tradição perdida, com cambiantes culturais que vão desde o nacionalismo
liberal e romântico de Garrett e Herculano, até o saudosismo nacionalista
de Pascoaes e o grupo de A Aguia atingindo o mitogenismo renovado e
o “nacionalismo místico e sebastianismo racional” de Fernando Pessoa.
Através dos sete ciclos da evolução histórico-cultural portu-
guesa pode-se constatar que o projeto áureo português, enquanto afir-
mação da nacionalidade, vai-se firmando progressivamente, tendo como
eixo propulsor o ciclo templário e o pensamento místico e teleológico
de S. Bernardo de Claraval. Este passou a ser o patrono espiritual do
reino quando intercedeu junto ao Papa Anacleto II para o
reconhecimento do título de Rei a D. Afonso Henriques.
Como o rei fundador da nacionalidade era um Cavaleiro Un-
gido, os portugueses cultivaram uma “transcendental confiança nos
destinos superiores da pátria, garantidos pelas divinas promessas” 112
(convicção fortemente influenciada pelos Templários, que formavam
uma sociedade iniciática, com espiritualidade própria) procurando
realizar um projeto que ultrapassasse o lado exterior e visível da sua
ação. Daí que se pode estabelecer estreita correlação entre os Templários
e a Ordem de Cristo, a simbologia do Graal e Mensagem.
Iniciando-se em Portugal no reinado de D. Dinis, tornando-
se incisiva e determinante na época de D. João I e dos Príncipes de
Avis, a simbólica do Graal relaciona-se com a demanda do Preste João,
e, mais tarde, com a bravura de D. Sebastião e com o sonho de regresso
do “Encoberto”.
Em Mensagem, o Graal é aludido explicitamente nos poemas
dedicados a “D. Philippa de Lencastre”, “Nunalvares Pereira” e “O
Desejado”. No primeiro, através da expressão “Princesa do Santo
Gral”, Fernando Pessoa destaca a tradição céltica bretã da mulher,
guardiã do sagrado, e, ao cognominá-la “Madrinha de Portugal” situa
a pátria portuguesa na linhagem da mística arturiana. Além da visão
histórica de uma aliança de estratégia militar, parece que um
providencialismo superior foi determinante na união de D. João I e D.
102

Filipa de Lencastre, pois, com a vinda da representante bretã, a nação


portuguesa foi batizada com o signo do Graal, amplificando a ação
cultural e espiritual já existentes com matizes esotéricas e místicas.
A retomada da tradição mística da cavalaria arturiana é um
dos suportes utilizados por Pessoa para expressar o cavaleiresco e o
graalismo enquanto “mito condutor” 113 de Mensagem. Significado
de mito predestinado a conduzir à salvação toda a coletividade é
explicitado no poema a D. Afonso Henriques: “Dá, contra a hora em
que, errada, / Novos infiéis vençam / A benção como espada, / A espada
como benção”.
Também Nunalvares Pereira é celebrado como um cavaleiro
ungido, herdeiro do Rei Artur — “Mas que espada é que, erguida, /
Faz esse halo no céu? / É Excalibur, a ungida, / Que o Rei Arthur te
deu.” No final do poema, opera-se a transmudação do guerreiro-santo
em símbolo místico de Portugal — “S. Portugal em ser”.
Erige-se Portugal como um país predestinado, país das po-
tencialidades, lugar de encontro de duas concepções históricas: da
história humana, material, factual e da história oculta, ominosa, virtual.
O própria Fernando Pessoa, elegendo os três profetas de “Os Avisos”
insere a obra nessa faceta.
Para além de exemplificar a coexistência das três dimensões
referenciais do tempo — o histórico, representado pela narração dos
feitos passados; o psicológico, pelas intrusões do Poeta no fio dos
poemas; o mítico, integrado pela ação divina no plano terreno,
Mensagem remete ainda a uma quarta dimensão, de ordem metafísica
e ontológica, de caráter trans-histórico, ou seja, a dimensão temporal
da nostalgia platônica.
A nostalgia platônica que envolve Mensagem conduz o poeta
para o refazer de um percurso em direção a um passado não situado na
esfera sensível, mas pelo processo de reminiscência o poeta reporta-se
ao que já anteviu numa pátria primordial, anterior, transcendental.
“Se a alma que sente e faz conhece
Só porque lembra o que esqueceu ... “
O tempo e a história, na sua linearidade e irreversibilidade
cronológicas são substituídos por outro tempo, um tempo circular, que
possibilita a imagem dinâmica do eterno retorno.
103

Os históricos descobrimentos foram para o poeta - profeta


um processo iniciático da pátria. A realização do sonho — “Nós,
Portugal, o poder ser / ... / O desejar poder querer” — a salvação do
Ser e da Pátria só se efetivará a partir do conhecimento da Verdade.
Toda a Mensagem surge como a exaltação da intuição de
um projeto áureo plausível de realizar-se, realizando-se o Ser da pátria.
“Não são as motivações conscientes, explícitas, aquelas que surgem
como realistas e práticas, as profanas, as últimas que levam e conduzem
os homens e uma nação nas grandes aventuras da vida e da história.
Mas sim outras, vindas duma zona mais profunda, conscientemente
intangível. Escondidas e de valor sagrado”. 114 Com efeito, desde os
seus primórdios, essa demanda da nação, tal como de Fernando Pessoa,
é a busca de uma identidade absoluta : os heróis da Mensagem assumem,
na sua vida humana efêmera, a missão de procurar e revelar uma
realidade que os transcende. Não se caracterizam por grandes feitos
bélicos ou como conquistadores de espaços terrenos, mas pelo espírito
de doação, sacrifício, pela resignação, pela predestinação.
Para os heróis de Mensagem, tanto quanto para o poeta-
profeta, a busca da realidade última e absoluta faz-se por um movimento
direcionado ao ser essencial e eterno: “É O que me sonhei que eterno
dura / É Esse que regressarei.” Essa realidade seria atingida, em plano
terreno, pela Obra, a cumprir, juntamente com os heróis e o Poeta, a
missão de anunciar a mensagem da parusia, que se efetivará num tempo
transhistórico ou supra-histórico.
Em Mensagem, coube a Fernando Pessoa, como poeta-
profeta da pátria, não apenas constatar a perda da alma nacional, mas
apelar para a sua redenção. A sua voz traduziu a expressão coletiva
nacional, baseada na crença tradicional e milenarista: a do Encoberto.
Como poeta-profeta da pátria decadente, Pessoa assumiu uma
atitude de recusa da história, porque a época a ser recuperada, a idade
áurea da nação, achava-se fora das convenções espácio-temporais. O
messianismo simboliza a restauração de uma idade primordial e a vinda
do Encoberto marcará o fim da história e do tempo, porque um novo
ciclo, de valor cultural e espiritual terá início com o seu retorno: o Quinto
Império.
“O Quinto Império. O futuro de Portugal — que não cal-
culo, mas sei — está escrito já, para quem saiba lê-lo, nas
trovas do Bandarra, e também nas quadras de Nostradamus.
104

Esse futuro é sermos tudo. ( ... ) Conquistámos já o Mar,


resta que conquistemos o Céu, ficando a Terra para os Ou-
tros ...” 115
Fernando Pessoa estava consciente da sua missão como obrei-
ro da regeneração de Portugal, como se depreende da carta que escreveu
a Adolfo Casais Monteiro, em 1935. Essa consciência missional tão
insistentemente revelada em muitos de seus escritos em prosa, conforme
assevera o crítico Alfredo Antunes, deve ser entendida em dupla direção:
a da profecia e a do messianismo. Ou seja, “Fernando Pessoa julga-se
suficientemente vocacionado, não só para anunciar a chegada iminente
do Quinto Império Cultural para Portugal, como para ser ele o seu
principal realizador.” 116
E essa hipótese poderá ser confirmada numa leitura atenta
de Mensagem, porque esta obra assenta a sua estrutura em símbolos
e mitos, referindo-se a Portugal do vir-a-ser e não a Portugal histórico
do passado.
Mensagem é o canto de um Portugal indefinido, atemporal,
inacabado, mas um país com potencialidades criadoras do Quinto Im-
pério Cultural.

Notas
1
Afirma Massaud Moisés que Fernando Pessoa amargou a frustração de rece-
ber o prêmio de segunda categoria porque, embora a obra “ressuma de nacio-
nalismo, a sua mensagem não coincidiu com as expectativas políticas da hora,
ou transcendia, pela sutil visão poética que nela se continha, o entendimento
dos juízes”. O GUARDADOR DE REBANHOS E OUTROS POEMAS. Seleção e Introdu-
ção de Massaud Moisés. São Paulo: Cultrix, Edusp, 1988.
2
Fernando Pessoa. “O Eu Profundo”. In: OBRAS EM PROSA. 6. reimp. da 1ª. ed.
Org. Intr. e notas de Cleonice Berardinelli. Rio de Janeiro: Nova Aguilar. 1986,
p. 70.
3
Fernando Pessoa - MENSAGEM. Introdução, notas explicativas e bibliográficas
de Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Difel, 1986, p. IV.
4
Idem. “Fragmento 125A-25”, texto nº 53 de SOBRE PORTUGAL. Introdução ao
Problema Nacional. Recolha de textos: Dra. Maria Isabel Rocheta, Dra. Maria
Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão. Lisboa: Ática, 1978, p.
179.
5
Fernando Pessoa - CARTAS A JOÃO GASPAR SIMÕES. Lisboa: Europa-América,
1957, p. 117.
105

11
Luis de Camões. OS LUSÍADAS. 5. ed. Edição organizada por Emanuel Paulo
Ramos. Porto: Porto Editora, s/d. p. 124
12
F. P. de Almeida Langhans. HERÁLDICA, CIÊNCIA DE TEMAS VIVOS. Lisboa:
Gabinete de Heráldica Corporativa. 1966, vol. II, p. 40.
13
Cf. Adrien, ROIG. “Mensagem: Heraldique et Poesie”. In: HOMENAGEM A
EDUARDO LOURENÇO. Organização das Secções de Português e Espanhol da Uni-
versidade de Nice. Lisboa: Ministério da Educação. Instituto de Cultura e Língua
Portuguesa. Nice: Universidade de Nice. 1992, p. 19.
14
Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. Coordenação
de Carlos Sussekind; tradução de Vera da Costa e Silva et alii, 5 ed. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1991, p. 478.
15
Cf. “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. Lisboa: Min. Ed. Inst.
Cult. e Lingua Port. 1990, p. 39.
16
Idem. Ibidem. P. 48.
17
João Ameal - HISTÓRIA DE PORTUGAL. DA ORIGENS ATÉ 1940. Porto: Tavares
Martins, 1949. p. 1.
18
Cf. Fortunato de Almeida - CURSO DE HISTÓRIA DE PORTUGAL, 9 ed. Coimbra:
1933, pp. 10 e 11; Fortunato de Almeida - H ISTÓRIA DE PORTUGAL. TOMO I. Desde
os tempos prehistóricos até à aclamação de D. João I (1385). Coimbra: Impren-
sa da Universidade. 1922, pp. 48-49.
19
Vários. HISTÓRIA DE PORTUGAL. EDIÇÃO MONUMENTAL COMEMORATIVA DO 8º CEN-
TENÁRIO DA FUNDAÇÃO DA NACIONALIDADE PROFUSAMENTE ILUSTRADA E COLABORA-
DA PELOS MAIS EMINENTES HISTORIADORES E ARTISTAS PORTUGUESES. Direção Lite-
rária de Damião Peres, Direção Artística de Eleutério Cerdeira, Barcelos:
Portugalense, MCMXXVIII, vol. I, p. 210.
20
“Viriato é simples adjectivo qualificativo, para designar homem que por dis-
tinção usa bracelete (viriae)” afirma Fortunato de Almeida em sua HISTÓRIA DE
PORTUGAL. TOMO I, p. 49.
21
HISTÓRIA DE PORTUGAL. EDIÇÃO COMEMORATIVA DO 8º CENTENÁRIO DA FUNDAÇÃO
DA NACIONALIDADE p. 213.
22
João Ameal - HISTÓRIA DE PORTUGAL. Das Origens até 1940, p. 45.
23
Antonio Cirurgião.“O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 63.
24
Para dar crédito à tradição lendária, Frei Bernardo de Brito afirma, em 1596,
haver encontrado, no Mosteiro de Alcobaça, um documento em latim sobre a
“Visão” do primeiro soberano, que transcrevemos a título de ilustração. Na
Aparição, Cristo teria dito a Afonso Henriques:
“...Eu sou o fundador & Destruidor dos Reynos, & Impérios, & quero em ti, &
teus descendentes fundar para mim hum Império, por cujo meio seja meu nome
publicado entre as Nações mais estranhas. E para q teus descendentes conhe-
çam quem lhe dá o Reyno, comporás o escudo de tuas armas do preço com q eu
106

remi o género humano, & daquelle por q fui comprado aos Judeus, & sermelha
Reyno sanctificado, puro na fé, & armado por minha piedade.” Apud Adrien
Roig. “MENSAGEM: Héraldique et Poesie.” In: HOMENAGEM A EDUARDO LOURENÇO.
p. 15.
25
Adrien Roig. “Mensagem: Héraldique et Poésie”. In: HOMENAGEM A EDUAR-
DO LOURENÇO. p. 16. (tradução nossa)
26
Cf. Jean Chevalier e Alain Gheerbrant. DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 392.
27
João Ameal. HISTÓRIA DE PORTUGAL. p. 100.
28
Cf. Jean Chevalier e Alain Gheerbrandt. DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 809.
29
PORTUGAL HISTÓRICO-CULTURAL. 2 ed. ref. e ampl. Lisboa: Arcádia, 1968, p.
26.
30
DICIONÁRIO DE H ISTÓRIA DE PORTUGAL. Direcção de Joel Serrão. Porto:
Figueirinhas. Vol II. p. 611.
31
A. H. de Oliveira Marques - HISTÓRIA DE PORTUGAL. Desde os Tempos mais
Antigos até o Governo do Senhor Marcelo Caetano. 5 ed., Lisboa: Palas, vol I,
p. 187.
32
“Cronica de El Rei D. Pedro”.In: AS CRONICAS DE FERNÃO LOPES. Selecionadas
e transpostas em português moderno por Antonio José Saraiva. 2 ed. Lisboa:
Portugália, 1969, p. 55.
33
Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 876
34
Cleonice Berardinelli - “MENSAGEM”. In : REVISTA DE LETRAS. U. F. C. Fortale-
za: Universidade Federal do Ceará, Centro de Humanidades. vol. 9/10, 1986. p.
6.
35
Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 289.
36
Idem. Ibidem. p. 538.
37
Idem. Ibidem. p. 32.
38
op. cit. loc. cit.
39
Idem. ibidem. p. 151.
40
Cf. Joel Serrão. DICIONÁRIO DE HISTÓRIA DE PORTUGAL. p. 420 a 422.
41
João Ameal. HISTÓRIA DE PORTUGAL. DAS ORIGENS ATÉ 1940. P. 205.
42
Cf. “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA.
43
Oliveira Martins - HISTÓRIA DE PORTUGAL. tomo I p. 263.
44
Fortunato de Almeida - HISTÓRIA DE PORTUGAL. tomo II. p. 272.
45
“O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 145.
46
MAR PORTUGUEZ E A MENSAGEM ASTROLÓGICA DA MENSAGEM. Lisboa: Editorial
Estampa, 1990, p. 19.
47
“Mar Português: Aventura e Iniciação”. In: COLÓQUIO/LETRAS. Lisboa: Funda-
ção Calouste Gulbenkian. nº 113/114; jan-abr. 1990 p. 125.
107

48
Paulo Cardoso - MAR PORTUGUÊS E A MENSAGEM ASTROLÓGICA DA MENSAGEM,
1990, p. 26.
49
Essa carta contém alguns parágrafos sobre a posição de Pessoa perante o
ocultismo, os quais se mantiveram em segredo, por desejo expresso do Poeta,
até a sua inclusão no volume II de Vida e Obra e Fernando Pessoa, de João
Gaspar Simões (4 ed., Lisboa: Bertrand, 1954. p. 564): “Creio na existência de
mundos superiores ao nosso e de habitantes desse mundo, em experiências de
diversos graus de espiritualidade, subtilizando-se até se chegar a um ente
Supremo, que presumivelmente criou este mundo. Pode ser que haja outros
Entes, igualmente supremos, que hajam criado outros universos, e que estes
universos coexistam com o nosso, interpenetradamente ou não [...]. Dadas
essas escalas de seres, não creio na comunicação directa com Deus, mas,
segundo a nossa afinação espiritual podemos ir comunicando com seres cada
vez mais altos”. apud Antonio Apolinário Lourenço. “Mar Portugues”: Aven-
tura e Iniciação. In COLÓQUIO/LETRAS. nº 113/114, p. 135.
50
Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 644.
51
Apud Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 901.
52
Jean Chevallien e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 15-17.
53
Idem. ibidem. p. 640.
54
“(...)
Por fim, na funda caverna
Os Deuses despem-te mais.
Teu corpo cessa, alma externa,
Não vês que são teus iguais.
(...)”
In: Fernando Pessoa. OBRA POÉTICA.
55
MAR PORTUGUÊS E A MENSAGEM ASTROLÓGICA DA MENSAGEM. p. 43.
56
HISTÓRIA DE PORTUGAL. Tomo II. Desde a aclamação de D. João I (1385) até à
morte do Cardeal Rei D. Henrique (1580). p. 174-175.
57
Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. p. 929.
58
Idem Ibidem. p. 616.
59
A LITERATURA PORTUGUESA. 16 ed., São Paulo: Cultrix, 1980, p. 62.
60
Mensagem e o Mito Lusíada. In: FERNANDO PESSOA, O OUTRO. 2 ed., Rio de
Janeiro: Transbrasil, 1973. p. 16.
61
Cf. acêrca do assunto, Antonio Cirurgião - “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM
DE PESSOA.
62
Cf. João Ameal - HISTÓRIA DE PORTUGAL. p. 163.
63
Cf. Antonio Cirurgião - “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 113.
108
64
DICIONÁRIO DE HISTÓRIA DE PORTUGAL. Vol. II Direção de Joel Serrão. p. 604.
65
O historiador João Ameal considera Alcácer Quibir o “grandioso fecho da
Loucura portuguesa. Fecho genuinamente medieval, suicídio épico da lusa
cavalaria, com o ‘Capitão de Deus’ a comandá-la. De tudo podemos orgulhar-
nos: de tantas vitórias, de tantas proezas, de tantos descobrimentos, de tantos
troféus - e até, no final, do esplendor lúcido e sangrento desse belo holocausto!”
HISTÓRIA DE PORTUGAL. p. 305.
66
Oliveira Martins - HISTÓRIA DE PORTUGAL. Tomo II. p. 46.
67
Cf. José Van Den Besselaar - O SEBASTIANISMO - HISTÓRIA SUMÁRIA. Lisboa:
Instituto de Cultura e Língua Portuguesa. Ministério da Edução e Cultura. 1987,
pp. 32-33.
68
O HETEROTEXTO PESSOANO. São Paulo: Perspectiva. EDUSP. 1988, p. 82.
69
SAUDADE E PROFETISMO EM FERNANDO PESSOA. Elementos para uma Antropolo-
gia Filosófica. Braga: Publ. da Faculdade de Filosofia, 1983, p. 430.
70
Cf. Antonio Cirurgião - “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA,
p. 198. Maria de Lourdes Belchior. “Fernando Pessoa e Luis de Camões: Heróis
e Mitos n’Os Lusíadas e na Mensagem”.In: PERSONA.5. Porto: Centro de Estudos
Pessoanos, abril de 1981, p. 5.
72
Oliveira Martins - HISTÓRIA DE PORTUGAL p. 77.
73
Cf. Adrien Roig. “Mensagem. Héraldique et Poesie”. In: HOMENAGEM A EDUAR-
DO LOURENÇO. p. 26.
74
Estudo detalhado da representação simbólica do número quatro se encontra
no DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS, de Jean Chevallier e Alain Gheerbrandt, p. 758-764
e na obra O UNIVERSO DOS NÚMENROS. Coor. e supervisão de Sharles Vega
Parucker.
75
VIDA E OBRA DE FERNANDO PESSOA. HISTÓRIA DE UMA GERAÇÃO. 2 ed. rev. e
acomp. de novo prefácio. Amadora: Bertrand, s/d. p. 616
76
Documento 125B-19 “A Fraqueza do Sebastianismo Tradicional”. Misto s/
d, PESSOA INÉDITO. Coordenação de Tereza Rita Lopes. Livros Horizonte. 1993,
p. 228.
77
PESSOA INÉDITO. p. 33.
*
O documento a que alude Teresa Rita Lopes está inserido na parte 3. “A Pátria
Língua Portuguesa”, com o número 110, sob o título [“O IMPÉRIO PORTUGUEZ” E
“FIXAÇÃO DA LINGUAGEM” 123-43 [Misto] [s/d] e diz o seguinte: “O Gremio da
Cultura Portuguesa assenta os seus intuitos nos seguintes fundamentos:
( 1 ) Não ha separação essencial entre os povos que fallam a lingua portugueza.
Embora Portugal e Brasil sejam politicamente nações differentes, não são na-
ções differentes, conteem por systema ( ? ) uma direção imperial comum, a que
é mister que obedeçam.
( 2 ) A Missão imperial a que teem que obedecer as duas nações que formam o
109

Império Portuguez encontra-se estabelecida nas seguintes origens: ( a ) como


memória e tradição, a fundação da civilização universal moderna pelo Infante
D. Henrique, ( b ) como proposito e utopia, a creação, pelos Sebastianistas, da
idéia de um Império Portuguez, designado como o Quinto Império, e formado
em bases diversas das de todos os impérios passados, ( c ) como typo de acção,
a concentração em uma unidade espiritual, a crear progressivamente, da tradi-
ção em que assenta a razão historica do Quinto Império, e da esperança em que
reside a razão religiosa d’elle.
( 3 ) Acima da idéa do Imperio Portuguez, subordinado ao espirito definido pela
lingua portugueza, não ha formula politica nem idéa religiosa.
( 4 ) Para fixação dos meios materiais do Imperio, ha que adaptar a fixação da
linguagem, e, antes de mais nada, a ortographia etymologica, excluindo as
extravagancias simpliflicadoras creadas pela influencia da politica
extrangeira”.p. 240.
78
Apud João Gaspar Simões. VIDA E OBRA DE FERNANDO PESSOA.p. 625.
79
Cf. “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA.
80
O SEBASTIANISMO. HISTÓRIA SUMÁRIA. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua
Portuguesa. Ministério de Educação e Cultura. 1987. p. 139.
81
Idem Ibidem.
82
Lúcio de Azevedo. A EVOLUÇÃO DO SEBASTIANISMO. pp. 96-97.
83
José Van den Besselaar. O SEBASTIANISMO. HISTÓRIA SUMÁRIA. p. 75
84
Cf. Jean Chevalier e Alain Gheerbrandt - DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS. pp. 788-
789.
85
“Simulacro da Organização Poética de ‘O Encoberto’. In: REVISTA DE CULTU-
RA VOZES.. Petrópolis: Vozes. maio de 1974. nº 4, vol. LXVIII, p. 271.
86
FERNANDO PESSOA E A FILOSOFIA HERMÉTICA. Fragmentos do Espólio. Lisboa:
Editorial Presença, 1985. p. 15.
87
pp. 14-15
88
Segundo José Van Besselaar, dois desses “cartapácios” merecem atenção
especial: o Jardim Amoeno (cod. TT774) e o Catálogo das Profecias (cod.
BN8627). O primeiro, “deve ter por base uma compilação de profecias, orga-
nizada por um certo Pedreanes de Alvelos e dedicado por ele a D. Sebastião no
dia 20 de abril de 1636. Mas o copista ampliou a colecção, enriquecendo-a de
algumas alusões à aclamação de D. João IV. ( ... ) O cartapácio transmite
quase todas as profecias básicas da seita, se não sem defeitos, ao menos, de
maneira satisfatória. O Catálogo das Profecias (...) foi organizado em 1809
por pessoa que nos é desconhecida. É uma colecção riquíssima que abrange
mais de 475 páginas (...). Este códice também conserva muito material que
data da época de Napoleão”. O SEBASTIANISMO - HISTÓRIA SUMÁRIA. pp. 36-37.
89
Apud José Van den Besselaar - O SEBASTIANISMO - HISTÓRIA SUMÁRIA. p. 42
110
90
Idem Ibidem.
91
Apud José Van Den Besselaar. O SEBASTIANISMO - HISTÓRIA SUMÁRIA. p. 43.
92
Antonio Cirurgião. “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 227.
93
SOBRE PORTUGAL. Introdução ao problema nacional. p. 177
94
Cf. José Van den Besselaar. O SEBASTIANISMO - HISTÓRIA SUMÁRIA. p. 50-51
95
Cf. Idem Ibidem.
96
Idem Ibidem p. 63-64.
97
SOBRE PORTUGAL. p. 175.
98
p. 177.
99
“Estão os profetas e profecias sobre as gentes e sobre os reinos, ou como
astros benignos que influem e prometem felicidades, ou como cometas tristes e
funestos, que influem e ameaçam suas ruínas. Levantem pois os reinos e os reis
os olhos, olhem para estes sinais do céu, e, se os virem estrelas, esperem; se os
virem cometas, temam.” (PADRE ANTONIO VIEIRA. HISTÓRIA DO FUTURO. (I). In:
OBRAS ESCOLHIDAS. Prefácio e notas de Antonio Sergio e Hernâni Cidade. Lisboa:
Clássicos Sá da Costa. vol. VIII. 1953, p. 90.
100
VIDA E OBRA DE FERNANDO PESSOA. HISTÓRIA DE UMA GERAÇÃO. p.628
101
Padre Antonio Vieira. OBRAS ESCOLHIDAS. Vol. VI, p. 66. Apud José Van den
Besselaar - O SEBASTIANISMO. HISTÓRIA SUMÁRIA. p. 161.
102
António Cirurgião - “O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 242.
103
O HETEROTEXTO PESSOANO. pp. 83-84.
104
“O OLHAR ESFÍNGICO” DA MENSAGEM DE PESSOA. p. 246.
105
Cf. OLIVEIRA MARQUES, A. H. de - HISTÓRIA DE PORTUGAL. vol. I, p. 316 e
DICIONÁRIO DE HISTÓRIA DE PORTUGAL. Dirigido por Joel Serrão. vol II. p.
106
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Mensagem é um poema da
nacionalidade portuguesa, em
cuja estruturação podem-se
constatar duas esferas ou realida-
des: a sensorial ou terrena e a
espiritual ou supra-real. A
primeira caracteriza-se pela
factualidade e a segunda pelas
abstrações gradativas do Poeta,
que parte do real histórico do
império português para a esfera
do mito, da alegoria e do
símbolo, exaltando sobretudo o
que transcende o mundo sensí-
vel: a quimera, o sonho, a febre
de além, a crença no advento de
D. Sebastião, o Cristo português,
para a redenção do país.

Toda a obra é a exaltação desse


projeto áureo plausível de
realizar-se enquanto Ser da
pátria. Coube a Fernando Pessoa
não apenas constatar a perda da
alma, mas traduzir a expressão
coletiva nacional, baseada na
tradicional crença do Encoberto.

Mensagem é a busca desse


projeto áureo interrompido, mas
cifrado nos sinais e nos símbolos
que dele subsistem desde a
formação da nacionalidade.

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