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Institucionalizar Ciéncia e Tecnologia - em Torno da Fundagao do IDORT (Sao Paulo, 1918/1931) Maria Antonieta Martines Antonacci (Wepto. de Histéria da FCS/PUC-SP e CENP/SE-SP) RESUMO Este artigo acompanha a formulagio de estratégias de institucionalizagao de ciéncia ¢ tecnologia em torno da organizagao racional e industrial formulada pelo IDORT (Instituto de Organizagio Racional do Trabalho). Ele relaciona a argumentag&o que sustentou esse projeto com as dimensées de dominago no Brasil do perfodo considerado. ABSTRACT This article traces the formulation of strategies for the institucionalization of science. and technology in terms of the rational and industrial organization formulated by the IDORT (Institute for the Rational Organization of Work). The article relates the argumentation behind this project to the conditions of domination in Brazil during the period in question. Sob o titulo “A Institucionalizagao da ciéncia e da tecnologia”, Adrian Ricardo Levinson — diretor de planejamento e gestao do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico ¢ Tecnolégico (CNPq) = publicou, na “Gazeta Mercantil” de 1/5/87, artigo saudando os dois anos de exist@ncia do Ministério da Ciéncia e Tecnologia. Com referéncias a “dimensao politica da ciéncia e da tecnologia”, que “ganhou consisténcia institucional” com a criagao deste Ministério, foi destacado que: “Essa visio politica da ciéncia e da tecnologia, no fmbito do MCT, ultrapassa 0 horizonte meramente econdmico e coloca-as a servigo da melhora das condigses de vida da popula¢ao brasileira em seus aspectos essenciais: * Bste texto foi extraido do capitulo I de nossa monografia 0 IDORT e a racionalizagio do trabalho em Séo Paulo, 1931/1945, do projeto “Formagao do trabalhador assalariado urbano 1900/1945)", convénio FINEP/UNICAMP, coordenado pela Prof* Dr* Dea Ribeiro Fenelon. Desta monografia, resultou nossa tese de doutoramento A vitdria da razéo—O IDORT de 1931 @ 1945, apresentada em 1985 a0 Depto. de Historia da FFLCH/USP, sob a orientacgo da Prof Df Maria Thereza Petrone, com apoio financeiro da FAPESP. produgdo de alimentos para consumo intemo; sancamento basico ¢ habitacio, erradicagdo das doengas endémicas, produgao, de medicamentos populares servigos piiblicos de educagao, de comunicagio e de transportes Tendo em vista estas colocagdes, este texto explora os caminhos que levaram fundag3o do Instituto de Organizagdo Racional do Trabalho (IDORT), em Sao Paulo, em 1931, para acompanhar a formulagio de outras estratégias de institucionalizagao da ciéncia ¢ da tecnologia, discutindo as dimens6es politicas do cientificismo no entao conflituoso contexto de reorganizacdo do processo de. trabalho, © IDORT, sociedade civil sem fins lucrativos, constitufdo também sob a alegag’o de “aumentar o bem-estar social”, surgin do encontro de cientistas ansiosos por ampliar as bases de suas pesquisas em torno da organizacao racional ¢ industriais em busca de sustentagao técnico-cientifica para suas novas opg6es de administragéio ¢ controle fabril Em Sao Paulo, a preocupag3o em organizar ¢ administrar cientificamente 0 processo de trabalho pode ser seguida no setor industrial, a partir do final da Primeira Guerra, através de algumas iniciativas ¢ experiéncias pioneiras, Entre estas, destacam-se as diretrizes que Roberto Simonsen imprimiu em suas empresas e consolidou na construgao de quartéis, difundindo os principios tayloristas, os métodos de administragao cientifica e promovendo na indiistria pavlista uma nova mentalidade no trato dos negécios ¢ nas relag6es de trabalho. Em fins de 1918, em discurso aos operdrios e companheiros da Companhia Construtora de Santos” - depois publicado como orientagées ao patronato sob 0 titulo O Trabalho Moderno! — Simonsen manifestou o desgaste das usuais formas de poder ¢ de controle do espago fabril. Em torno de questées de autoridade, disciplina, vigilancia personificadas ‘nos patrées, mestres ¢ contramestres - ¢ na auséncia de crit Is para o estabelecimento das condigées de trabalho e de remuneraga0*, concentraram-se os argumentos sobre a deteriorizagao e a ‘Nesta época Simonsen era Diretor Superintendente da Companhia Constnitara de Santos, da Companhia Frigorifica de Santos e Director Presidente da Companhia Santista de Habitagdes Econdmicas. 1 SIMONSEN, Roberto ~ O Trabalho Moderno, Secao de Obras de “O Estado de S. Paulo”, SP.1919, 2 Localizou na “disciplina militar ~ que s6 se impunha pelo rigorismo de feitores carrancudos”, um foco de conflitos substituido pela “disciplina inteligente © consciente - oriunda do conhecimento exato que tem o operério da natureza do sev trabalho € da certeza do justo reconhecimento de seus esforgos”. SIMONSEN, R®berto — “Pelo Trabalho Organizado”, In: 0 Trabatho Moderna, op. cit., p. 10. 60 Testauragao da normalidade da ordem fabril. Questées que melhor se configuram quando Simonsen, tragando as bases da nova estrutura organizacional do trabalho, informou que um “grupo de mogos de sdlido preparo” — leia-se um grupo de técnicos — fora “distribufdo na chefia dos departamentos que constituem o esquema da organizagao que tenho imaginado para as nossas empresas ¢ preocupa-se agora comigo, em reformar e melhorar as condigdes do vosso trabalho, visando assentd-lo em bases verdadeiramente cientificas”3. A nova organizagao do processo de trabalho, que, fundamentada nos principios de Taylor, aparece na fragmentagao ¢ departamentalizagao das atividades, instaurava nova autoridade e nova hierarquia de poder. Técnicos especializados, com um saber fundamentado num “sélido preparo” — o que Ihes garantiria uma pretensa objetividade diante dos conflitos de interesses — , assumiram em conjunto o planejamento das tarefas da forga de trabalho, determinando cientificamente as condig6es de execug’o e remuneracao do abalho. No reptidio as formas discriciondrias de autoridade e no recurso a técnicos como 4rbitros do social, com a conseqiiente representagaio de uma ordem em que nao haveria mais conflitos entre empregados e empregadores ~ uma vez que 0 mundo fabril estaria submetido e administrado pelas regras da ciéncia —, pode-se acompanhar uma situagdo de crise Para o capital em suas relagdes com o trabalho. Um ano depois, em relatério a diregao da Companhia, nas referéncias de Simonsen aos sistemas de remunerac4o, as lutas sociais do perfodo e As novas formas de encaminhamento da “questaio social”, que tomavam yulto nos meios empresariais, sdio evidentes: “Os industriais de hoje tém de abandonar os moldes antigos para considerar como uma forga nova, existente realmente, o descontentamento do operétio; Proporcionar com desassombro a justa remuneragGo ao trabalho, se niio quiserem assistir ao cntravamento da produgio pela tentativa de decisao deste problema, erradamente, por vies politicas, quando poderia ser resolvido, com acento, por vias econémicas. (...) “Compete 20s industriais, no seu proprio interesse, evitar que de seus principais colaboradores se forme uma massa hostil buscando remédios para o seu mal- estar em conquistas politicas perturbadoras da produgao."+ 3 idem, p. 11. 4 SIMONSEN, Roberto ~ “Pela Administrayio Cientifica", in: 0 Trabalho Moderno, op. cite, pp. 37/39, 61 A “justa remuneragdo ao trabalho”, atingida pela expansao dos sistemas de prémio ou de bénus®, veiculando uma redefinigao das relagdes capital-trabalho com base em principios “cientificos”, ainda produz meios de rompimento da solidariedade operaria, uma vez que o patronato ndo trata mais seus trabalhadores como se “constituissem uma massa Unica”, mas “individualizando competéncias”®. Através dos principios e métodos cientificos de administracao e gestio da forca de trabalho, o empresariado desencadeava estratégias para incorporagdo de trabalhadores na competitividade do capital, promovendo a reprodugao do seu dominio a partit da despolitizacao dos movimentos por melhores condigdes de vida ¢ de trabalho. E foi organizada dentro dos novos padrées, fazendo frente as conquistas sindicais dos trabalhadores do setor de construgao civil de Santos’, que a companhia construtora dirigida por Simonsen aceitou a incumbéncia do ministro da Guerra Pandid Calégeras de construir quartéis em varios pontos do pais. A partir de 1921, foram construidos 36 quarté “mediante planos cuidadosamente estudados, de mancira que se pudessem fazer grandes economias pela padronizagio dos edificios e dos servigos”’. Aprofundando a divisdo do trabalho, restringindo a autodeterminagao dos trabalhadores nas formas de dispor de seus tempos, modos e espagos de trabalhos, constituindo novas estruturas ¢ relagdes de poder no processo de produgao, as realizagdes de Simonsen em torno do taylorismo apontam para um enfrentamento patronal com os operdrios qualificados e sindicalizados por oficio. Tanto na construg’o civil, onde a mecanizagao era restrita, como na industria téxtil, onde a acentuada mecanizagao permitia aos industriais reduzir a capacidade de resisténcia dos operdrios de oficio, pode-se apreender que este conflito entre formas de disposi¢ao dos elementos do processo de trabalho? desembocou no taylorismo e foi levado a custa da 5+. onde se determina cientificamente o tempo-padrio eficiente ou a turefa-padrio eficiente, premiando inteligentemente os que ultrapassem esses padrées ¢ sempre proporcionalmente a0 excedido.” SIMONSEN, Roberto ~ "Pela Administragio Cientifica”, op. cit., p. 42, © idem, p. 38. 7 Conforme MUNAKATA, Kazumi ~ A Legislapdo Trabathista no Brasil, SP, Brasiliense, 1981, um dos “exemplos de sucesso de controle do mercado de trabalho pelos sindicatos € 0 caso dos sindicatos de construgo civil (pedreiros, carpinteiros, pintores) de Santos que, em 1909, conseguem impor o controle do mercado de trabalho da categoria”, p. 21. 8 SIMONSEN, Roberto - Relatério reproduzido por FERRAZ DO AMARAL, Pedro, in: “Trinta anos de atividades no campo da adminisira¢’o cientifica”, Revista [DORT, SP, vol. XXX, maiofjunho 1961. 9 Cf. PALLOIX, Christian - “O Proceso de Trabalho: do Fordismo so Neofordismo", in: TRONTI, Mario (org.) Processo de Trabalho ¢ Estratégias de Classe, RJ, Zahar Editores, 1982, que considera 0 processo de trabalho o “corag&o real da economia”, na medida em que & 62 forga de trabaino qualificada. Para anular seu saber-fazer em termos de organizagao e modos de opera¢4o, sua autonomia em termos de ritmo de trabalho, suas conquistas sindicais em termos de controle do mercado de trabalho ¢ impor mecanismos de intensificagdo do trabalho, da utilizagao do maquindrio, das condigdes de remuneragao, os industriais promoveram a fragmentacdo/especializagao de fungdes, a simplificagaio/padronizagao de movimentos, redimensionando a natureza do poder e da autoridade no universo fabril. Esta luta pelo controle do processo de trabalho aparece em outra tentativa de organizacdo cientifica efetuada em S40 Paulo, em 1922. Desta vez, numa fabrica de tecidos de seda — a Santa Branca (Sao Caetano) ~, onde Paulo Nogueira Filho procura sistematizar a aplicagao de princfpios tayloristas na administragao da empresa e na remuneragdo dos trabalhadores. Podem-se avaliar as necessidades industriais quanto & eficiéncia € controle da for¢a de trabalho, bem como a presenca de Propostas em conflito, por trés ordens de considerag6es do préprio autor: 1) “Os resultados néo tardaram, assinalando o que mais importava aos acionistas: dobrar a produgio, abrindo perspectivas seguras para bons Incros.” 2) “Em poucas semanas transformou-se ambiente da {abrica, procedendo-se, automética ¢ insensivelmente, & selecio do pessoal, Retiraram-se, espontancamente, os improdutivos © vagabundos ¢ ingressaram os capazes ¢ ativos, tondo em vista os altos sa}érios que poderiam atingir,” 3®) Convidado a empreger suas “inovagées tayloristas” num cons6rcio europeu de fabricas de seda, constatou a inutilidade destas sem “eficiente « cautelosa preparagio psicolégica onde vigorava uma sélida tradigdo de trabalho" devido a “suas resisténcias a certas inovagGes eficientes, j4 factiveis no meio industrial novo de SP."! Refazendo o discurso apologético de Nogueira Filho em tomo de suas “iuovagOes tayloristas”, tem-se condicdes de configurar 0 processo de trabalho como um campo de lutas, onde sAo estabelecidas relagdes que obtém tanto maior eficiéncia produtiva quanto maior controle conseguem sobre a forga de trabalho ¢ vice-versa. Nesse sentido, “dobrar a produgio” passou inevitavelmente pela necessidade de “transformar o ambiente de trabalho”. Continuando em sua exposigéio ¢ levando em consideragdo as “resisténcias” encontradas para aplicagao destas prdticas Ppatronais onde combinagio entre seus elementos constitutivos (Forga de trabalho, matéria-prima © m4quinas) “no esté isolada da totalidade das relagGes sociais”, p. 71. 10 NOGUEIRA FILHO, Paulo — /déias e lutas de wm burgués progressista, SP, Editora José Olympic, 1965, pp. 122/123. 63 “vigorava uma slida tradigao de trabalho”, percebe-se o sentido do movimento de administrag4o cientifica: destruir uma organizagio do processo de trabalho solidariamente construfda pelo operariado a partir de ‘suas experiéncias de trabalho e tradicOes de luta, através da qual assumiam posigdes frente ao patronato. ‘Na substituico dos “improdutivos ¢ vagabundos” pelos “capazes ¢ ativos”, ndo se poderia identificar a expulsto dos trabalhadores qualificados, que aplicavam seu conhecimento sobre 0 processo de trabalho no sentido de controlar a produgiio? Mantendo a produtividade e os ritmos de trabalho de acordo com seus interesses de classe, em termos de valorizagao de sua forga de trabalho, garantia de cmprego para maior mimero de companheiros, manutengao do saldrio em patamares de preservacao de seu nivel de vida, os operdrios relacionavam-se com os industriais a partir de seu saber-fazer acumulado e equilibradamente transmitido. Foi para quebrar este poder do operariado, destruindo seu controle sobre 0 mercado ¢ 0 processo de trabalho, que os industriais - numa conjuntura de crise do sistema como a do final da Primeira Guerra - aplicaram métodos e técnicas de administragdo cientifica, ampliando a expropriag&o da forga de trabalho € aprofundando seu dominio. A situag4o de acirrada luta social que predominou em S40 Paulo no imediato pés-guerra, como atestam iniimeras greves com dentincias contra os rigores dos regulamentos das fabricas em termos de hordrios, cadéncias, normas disciplinares!!, prolongamento da jornada de trabalho com maior utilizagio do maquindrio'2, fixago de remuneragOes constrangedoras ao mAximo de rendimento!3, indica que profundas alteragées ocorriam no processo de trabalho. Uma reorganizacio, no plano da técnica, do trabalho do saldrio estava em curso em certos setores da indistria paulista neste periodo, minando as estratégias operérias no controle do processo de trabalho. A partir destas consideragdes, situam-se possibilidades de refletir sobre as dimensdes politicas do recurso aos princfpios e métodos cientificos. A utilizagao destes, por parte dos industriais, nfo resultou de preocupacdes 11 Cf. FAUSTO, Boris - “Conflito Social na Repdblica Oligérquica: a greve de 1917", in: Estudos CEBRAP, SP, x 10, 1974; PINHEIRO, Paulo Sergio ¢ HALL, Michael ~ A Classe Operdria no Brasil (1889-1930), Vol. I, SP, Brasiliense, 1981; EIRO, Maria Alice — Condigbes de trabatho na indiistria téxtil paulista (1870-1930), dissertagfo de mestrado, UNICAMP, mimeo. 1980; MACHADO, Oswaldo - Sistema de Fébrica e Dominagao Social, dissertagio de mestrado, UNICAMP, mimeo., 1984, 12 Cf. FAUSTO, Boris - Trabalho Urbano ¢ Conjlito Social, SP, Difel, 1976 ¢ SILVA, Zelia Lopes da — A Face oculta da reprodupdo, dissertagio de mestrado, UNICAMP, mimeo., 1983. 13 Cf. RIBEIRO, Maria Alice - Condigdes de trabalho na indiistria téxtil pawlista (1870- 1930), op. cit. 64 com o crescimento de suas empresas e o bem-estar de seus trabalhadores, como argumentam anilises tecnicistas; pode-se apreender que os industriais paulistas langaram mao da administrag4o cientifica para enfrentar a resistencia dos operdrios qualificados e sindicalizados a intensificagdo e subordinagao do processo de trabalho aos designios do capital. Esta perspectiva de entendimento das prdticas industriais ¢ operdrias no interior do processo de trabalho revela a luta cotidiana que permeia ¢ atravessa todo universo fabril, desmistificando qualquer pretensio de objetividade e neutralidade no tratamento cientifico de uma relacao que é por natureza conflituosa, uma vez que pressupde formas de dominagao ¢ de resist@ncia. Na avaliacao dos pélos deste conflito em termos de forga de trabalho qualificada administragao cientifica, quer-se indicar que os industriais — armados “no pelo recurso aos argumentos tradicionais do direito de propriedade, mas fazendo apelo ao tecnicismo e a planificagao cientifica’”!4 -, revestiram a dominago do capital na fabrica ¢ na sociedade com as normas e priticas da ciéncia e da tecnologia. Que estes procedimentos nao restauraram a ordem do espago fabril,. uma vez que © operariado reinventou meios de interferir na marcha do trabalho, percebe-se na referéncia de Nogueira Filho & necessidade de “eficiente ¢ cautelosa preparagdo psicolégica onde vigorava sdlida tradigao de trabalho”, A elaboracao de novos e complexos métodos ¢ técnicas disciplinares, a partir do desenvolvimento de outros ramos cientificos (Fisiologia, Psicologia, Sociologia, Higiene Mental ¢ do Trabalho) que contraditoriamente submeteram e rebelaram a forga de trabalho, expoe aspectos da luta pelo controle do processo de trabalho que, pela propria dinamica das inter-relagdes fAbrica/sociedade, promoveram uma reorganizagao da sociedade como um todo!5, Quanto as observagbes de Nogueira Filho, no sentido de que na Europa, pela “sdlida tradigao de trabalho”, as resisténcias exigiram uma “eficiente ¢ cautelosa preparagio psicolégica” para implantagao das “inovagdes eficientes, j4 factiveis no meio industrial novo de Sao Paulo”, entende-se que devem ser examinadas com precaug6es. Nao s6 porque foram constantes as preocupagdes dos industriais deste periodo com as questdes do trabalho, localizando neste campo miltiplas tensdes ¢ 14 MATER, Charles - “Entre le taylorisme et la technocratic: ideologies et conceptions de la productivité industrielle dans ! Europe des années 1920", in: MURARD e ZYLBERMAN ~ Le soldat du travail, Paris, Recherches, 1978, p. 134. 15 & respeito de como 2 subordinagiosinsubordinaclo desencadeou necessidades em termos de ‘controle e disciplinarizagio dentro e fora dos muros da fébrica, recolocando desde a década de 1920 questées em tomo de saiide, higiene, habitagfo, educacéo, assisténcia, Inzer, etc., ver DE DECCA, Maria Auxiliadora Guzzo ~ A vida fora das fabricas, RJ, Paz e Terra, 1987. 65 insubordinagoes!®; nem porque as resisténcias por parte do operariado Paulista, no inicio da década de 1930, ulwrapassando as formais deniincias, chegaram a se concretizar em propostas alternativas de organizagdo do trabalho frente as alteragdes introduzidas pelos industriais!7; como porque, contrariamente 0 suposto por Nogueira Filho, também em Sao Paulo houve necessidades de preparo psicolégico, como indica a formagao de grupos de cientistas em toro da psicofisiologia industrial, psicologia educacional, higiene mental e do trabalho. Sem serem tomadas como indicativos da inexisténcia de uma tradigao, de trabalho qualificado em Sao Paulo, assim como da auséncia de resisténcias do operariado paulista 4 penetra¢ao da administragao cientifica, estas consideragdes de Nogueira Filho possibilitam encaminhar teflexdes noutra dire¢io. Podem ser pensadas como referencial das dimensdes da heterogeneidade de operariado paulista neste periodo: nao s6 em fungao de suas origens, experiéncias sociais, padrées culturais - e desde a década de 1920 a regidio centro-sul ja era alvo de atrago para as migracdes internas —, quanto em termos das miltiplas ¢ conflituosas orientag6es politicas que disputavam suas formas de organizagio ¢ de luta, como anarquistas, socialistas, anarco-sindicalistas, comunistas, sindicalistas catélicos, cooperativistas ou associagSes operdrias!8, E a perspectiva de estratégias de controle aperdrio com base na qualificagao por oficio serem respaldadas pelos anarquistas, 0 que ampliaria © redimensionaria as bases de entendimento da derrota de suas orientagSes no movimento operario Paulista na década de 1920, so questdes jé presentes na historiografia!, Apesar de ndo terem deixado maiores relatos, outras iniciativas Patronais voltadas para reorganizagao e expanso dos negécios a partir de solugties orientadas pelos principios da administragao cientifica ocorreram em S3o Paulo neste periodo. Encontrando oposigao na adaptagaio do “fator humano”, empresdrios, engenheiros, médicos, economistas voltaram-se para questdes de selegtio e capacitagao operdria conforme os novos requisitos de qualificagao, abrindo espago para estudos no campo da psicologia industrial, 16 Além dos pronunciamentos de Simonsen e Nogueira Filho, so dignos de mengao os de Jorge Street, Orévio Pupo Nogucira, aliados as quesises abordadas nas Circulares do Centro de Fiagao e Tecelagem do Estado de Sio Paulo, 17 Cy, em SILVA, 2élia Lopes da~A Face oculta da reprodugdo, op. cit. 18 Sobre estas variadas perspectivas organizatérias no interior do movimento operfrio paulista nna passagem das décadas 1920/30, com anslise das suas condig6es de penetracdo e atwacio, vit6rias e derrotas, enfrentando o tratamento homogénco ¢ generalizador dispensado por estudiosos do pertodo ao sindicalismo, ver o j4 citado estudo de SILVA, Zelia Lopes da. 19. ct. as recentes proposigées levantadas pelos estudos de DE DECCA, Edgar —"‘A ciéncia da, rodugio: fabrica despolitizada’, in Revista Brasileira de Hist6ria, SP, ANPUH/Mareo Zero, n® 6, 1983 e RAGO, Margareth ~ Do Cabaré ao lar; RI, Paze Terra, 1985. 66 Foi o caso de Armando de Salles Oliveira & frente de empresas de eletricidade no interior do estado ¢ depois como um dos diretores da ‘Companhia Mogiana de Estradas de Ferro0- de Aldo Mério de Azevedo na diregdo da Fabrica de Tecidos Japhy (Jundiaf); de Francisco de Salles Oliveira como-engenheiro da Companhia Forga & Luz de Jaboticabal, a partir de 1923 como diretor industrial da Companhia Nacional de Artefatos. de Cobre (CONAC) ¢ depois como engenheiro da Pirelli S/A*1. Nestas experiéncias, ressaltaram indicacées no sentido da “caréncia de elementos humanos suficientemente instrufdos ¢ capacitados das suas vantagens”22, ou de que as principais dificuldades encontradas na organizagao da industria nacional foram a selecfio € preparo da mao-de-obra”23_ E foi na direcao da preparacdo da forga de trabalho, desenvolvendo as idéias de Taylor na formagio profissional ¢ no treinamento prévio do operdrio, que ocorreu em $40 Paulo, neste mesmo perfodo, outro conjunto de ensaios ¢ experiéncias, desencadeado por um grupo de cientistas. Conforme registro de Lourengo Filho, um dos participantes deste grupo, desde o inicio da década de 1920, “ensaiava o Instituto de Higiene, anexo & Faculdade de Medicina, propagar idéias de higiene mental, inclusive as de higiene aplicada ao trabalho, Tais idéias se prolongaram na ag3o da Secgao Paulista de Higiene Mental, na da Sociedade de Biologia e na Sociedade de Educagado. Médicos, como Pacheco ¢ Silva, Geraldo de Paula Souza, Benjamin Ribeiro, Moacyr Alvaro; engenheiros, como Roberto Mange, Victor Freire, Aldo de Azevedo; juristas ¢ administradores, como Clovis Ribeiro e Francisco de Salles Oliveira; e mesmo alguns educadores, como Almeida Junior ¢ cu proprio. Tudo, a principio, um pouco incerto, no plano de longas discusses ¢ estudos teéricos. Mas, para logo, passava-se da doutrina a pratica.”24 Um dos ramos destes estudos - dirigido para adaptagao psicofisica do homem a maquina a fim de aumentar o rendimento do trabalho, diminuir a fadiga e os riscos de acidentes e atingir novos nfveis de disciplinarizagao da forga de trabalho —, teve a primeira possibilidade de aplicagaio em 1923, 20 Ver PACHECO E SILVA, Antonio Carlos ~ Armando de Salles Oliveira, SP, Editora da Universidade de Sdo Paulo, 1980, pp. 65/72. 21 SALES OLIVEIRA, Francisco de ~ A Engenharia na Industria, SP, 1933. Como 0 proprio ‘autor registrou, este livro € um verdadeiro manual téenico-administrativo, formando na segunda parte “uma teniativa de programa, em que sfo considerados os principais problemas da indistria modema”. 22 PACHECO E SILVA, A.C. - Armando de Salles Oliveira, op. cit., p. 75. 23 SALLES OLIVEIRA, Francisco de~ A Engenharia na Indistria, op, Cit. p- 18. 24 | OURENGO FILHO ~ “Como surgiu 0 IDOR'T” ~ Revista de Organizagde Cientifica - IDORT, SP, vol. XV, n® 175, 1946, p. 140, 67 quando o Liceu de Artes ¢ Oficio criou um Curso de Mecfinica Pratica2>, A diregao deste curso foi entregue a Roberto Mange, professor de MecAnica da Escola Politécnica, que secundado pelos médicos do Instituto de Higiene, comegaram a aplicar os métodos de selecao baseados em estudos psicotécnicos e fisiolégicos. As experiéncias prosseguiram e a partir de 1925 tiveram suas pretensées originais ampliadas ao se transformarem em Escola Profissional Mecanica, com projeto de autoria de Mange, onde é Possivel recuperar as perspectivas de ensino que se delinearam em Sao Paulo com a aplicacao dos princfpios tayloristas na formagio profissional?6. J4 na introdugo de seu projeto, Mange colocou que as transformagoes técnico-sociais do pds-guerra — como o “progresso rapidissimo das indistrias” e a “perigosa e nefasta diminuigao das horas de trabalho” —, ameagando a manutengao da industria nacional, trouxeram a necessidade de caminhos novos para superacdo destes obstéculos. Como alternativa, indicou o “aproveitamento racional das aptiddes fisicas e Psicofisiolégicas”, atingido pelos testes de selegdo € pelo método de instrugo racional27, As ponderages de Mange permitem a articulagao das novas préticas de ensino profissionalizante com as lutas sociais, como estratégias desenvolvidas perante o impulso das formas de resist@ncia operaria e de suas conquistas sociais, respondendo a certos anseios e reivindicagbes em tomo de educagao, preparo técnico, emprego, melhoria das condi¢Ses de ——————_______. 25 Cf. em RAMOS DE AZEVEDO ~ spresentago de “Escolas Profistionais Mecfinicas”, in: Revista da Politécnica, SP, n°77, Tipografia Brasil de Rothschild & Co., 1925, p. 4. 26 Sobre o ensino profissional em Sfo Paulo, neste periodo, ver o projeto FORMAGAO DO TRABALHADOR ASSALARIADO URBANO (1900/1945), Convénio FINEP/UNICAMP, na sua linha de pesquisa sobre Qualificacdo e Treinamento da Forca de Trabalho, composta de trés monografias: “Liceu de Antes e Oficios (1873/1933)", a cargo de Maria Lucia Gitahy; “Escolas Profissionais Estaduais (1911/1943)" a cargo de Maria Alice Ribeiro e “Centro Ferrovisrio de Ensino ¢ Selecio Profissional (1834/1945)" a cargo de Coraly Gard Caetano, in RIBEIRO, M. Alice (org.) - Trabathadores Urbanos e Ensino Profissional, Campinas, Editora da UNICAMP, 1986. 27 «Para compensar o desfalque do tempo de trabalho e as suas conseqiléncias econdmicas, ¢ necessério procurar os meios de, por um trabalho acurado, perfeito e répido, em que todo movimento indtil seja eliminado, produzir mais em um lapso de tempo mais curto. Isso nos conduz ao estado fisiolégico do trabalho, nos leva a considerar a organizacdo ‘Profissional sobre © ponto de vista das aptidées fisicas, psicofisiolégicas e profissionsis, com o intuito de poder Proporcionar a todo candidato as profissSes mecinicas o lugar mais adequado as suas capacidades, sstisfazendo assim o diser proverbial: “The right man in the right place!” (...) Para conseguir isso, temos de langar mio dos métodos Psicotécnicos, cujo. auspicioso desenvolvimento cientifico nestes tltimos anos, tanto na Franga como na Alemanha, evidenciou 0s meios para o aproveitamento racional das aptiddes fisicas psicofisioldgicas.” MANGE, Roberto — “Escolas Profissionais Mecfnicas”, in: Revista da Politécnica, op. cit., pp. 8/28. 68 trabalho e de remunerag4o?*. Por outro lado, algumas consideragdes podem ser encaminhadas em fungio de expressdes como “organiza¢4o racional”, “gproveitamento racional” ou “instrugdo racional”, no sentido de que a perspectiva de racionalizacdo das atividades humanas, aparecendo associada a0 uso da Fisiologia e da Psicotécnica para obten¢ao do “The. right man in the right place”, consistiu e expandiu-se a partir da aplicagao dos principios tayloristas revigorados pelo desenvolvimento de varios ramos da ciéncia. Neste sentido, a instrugdo racional, com a colocagdo em pratica de recentes conhecimentos cientfficos através de métodos de treinamento baseados em testes de aptidées e séries metddicas de atividades?®, continha elementos para superacdo de reagdes & eficiente taylorizagdo do processo de trabalho. Propondo dispor cada operario na tarefa onde se mostrasse mais produtivo e onde fossem reduzidas as insatisfagdes, 0 absenteismo, a negligéncia, a rotatividade, o “freio” e as intimeras hostilidades aos novos ritmos, natureza e condigdes de trabalho?°, os princ{pios e instrumentos da Fisiologia e da Psicologia Industrial secundaram os objetivos do taylorismo.E mais, produzindo t40-somente trabalhadores para 0 novo tipo de trabalho e os novos niveis de consumo da sua forga de trabalho, discriminaram e segregaram os “inaproveit4veis”, ou seja, aqueles que nao se enquadraram social, politica e moralmente As novas normas ¢ padrdes de produgaio?!. E a multiplicidade das aplicagdes destes métodos e testes de selegaio psicotécnicos, que no levam em conta apénas as capacidades fisicas € psfquicas, mas também “as faculdades intelectuais, as aberragdes € as 28 Em relagdo a um entendimento da questio da qualificagio no campo mais amplo da politica, situada no confronto entre os interesses dominantes em formar um tipo de trabalhador que permita o avango do capital ¢ as lutas reivindicatérias dos tabalhadores por melhores salirios, ‘com projetos aliemativos de vids, ver CAETANO, Coraly Garé ~ Qualificagdo Profissional Ferrovidria (ima estratégia de controle), dissertagdo de mestrado, Piracicaba, mimeo., 1986. 29 Enquanto os testes psicotécnicos séo utilizados para examiner e desenvolver as aptidées psicofisiolégicas, verificando, treinando e conformando as habilidades necessdrias a cada tarefa; as séries metédicas de desenhos serve para guiar “racionalmente” o aprendiz, “para executar epas com medidas certas, para trabalhar com exatidio” e com “disciplina no método de trabalho”. Cf. MANGE ~ op. cit. p. 22. 30 Conforme o projeto de MANGE, “o artifice formado de modo racional trabalha com satisfagio por se sentir apto a0 officio, coloca-se em vantajosas condigées econdmicas, tem amor 4 profissio, dela assumindo a necessiria responsabilidade.” MANGE, Roberto ~ op. cit, p. 12. 31 Sobre os indicios dos miltiplos destinos dos que nfo se conformavam € precisavam ser nommalizados numa sociedade que se urbanizava e racionalizava, como a de Séo Paulo nas <écadas 20/30, ver os estudos de Maria Clementinha Cunha sobre 0 Hospicio do Juquery que, significativamente, foi dirigido neste periodo por Antonio Carlos Pacheco ¢ Silva, um dos componentes deste grupo de cientistas, fundador do IRDORT e seu primeiro viee-presidente, CUNHA, Maria Clementina P. — 0 Espetho do Mundo, RJ, Paz e Terra, 1986. 69 desordens da moral e dos instintos™3*, j4 ocupara as atengdes dos promotores desta primeira experiéncia efetuada em Sao Paulo, conforme indicag6es de um dos integrantes deste grupo: “Nao 96 nesse campo devem entretanto se restringir as nossas aplicages (. Esta primeira tentativa justifica-se, dada a aplicagao imediata € o material jé golecionado ¢ observado pelo Dr. Mange (...} E neste quadro limitado € com este objetivo tinico que se fizeram e se orientaram os primeiros trabalhos destinados a servir de estudo e a serera remodelados mais tarde como se pretende fazer. "33 Além de se perceber a amplitude de vistas com que se organizaram estes grupos de técnicos ¢ cientistas em SAo Paulo, pode-se ter presente 0 constante movimento de ir e vir entre seus postulados tedricos ¢ os resultados de suas atividades que, continuamente avaliadas, foram compondo estratégias em torno da formag&o do tipo de trabalho e de trabalhador requeridos para a expansdo industrial da burguesia paulista, Dar novo contetido ao trabalho, difundir novo conceito de qualificagao, produzir prdticas de ensino e de profissionalizagao, formar trabalhadores Para 0 novo tipo de trabalho ¢ construir os instrumentos para a operacionalizacao destes objetivos foram perspectivas que se entrecruzaram nesta experiéncia do ensino racional em Sao Paulo. No final de 1926, 4 tinham conseguido alguns resultados e, pensando na continuidade de suas atividades, apontavam para modos de “verificar quais as profissées em que a escolha dos individuos mais aptos represente necessidades ¢ utilidades imediatas”, assim como para a “indispensavel divulgag&o do assunto” junto aos industriais ¢ aos poderes piiblicos*+. Também na Escola Normal da Praga, aproveitando a Passagem por Sao Paulo do psicdlogo Henri Piéron, foram reativados em 1925 os estudos e ensaios em torno da psicologia, pedagogia ¢ orientaco profissional, utilizando as instala¢des e os aparelhos do j4 montado Gabinete de Psicologia Experimental’, A partir de entio, outro grupo de técnicos surgiv 32 Citugto retirada de VAUDAGNA, M. -“L’Americanisme et le management scientifique dans Italie des années 1920”, in: MURARD e ZYLBERMAN - Le Soldat du Travail, Paris, Recherches, 1978, p, 425, 33 MONTEIRO CAMARGO ~ “Psicotécnica: Tentativa de Selego Profissional”, in: Boletim do Instituo de Higiene, SP, n® 28, 1928, pp. 3/4. Trabalho apresentado no 4° Congreso Brasileiro de Higiene, na Bahia. 34 idem, p. 9. 35 Em 1914, sob a diregio do psicblogo Ugo Pizzoli,diretor da Universidade de Médena, foi organizado na Escola Normal da Praga um Isborat6rio de psicologia experimental com aparelhos destinados a experiéncias em tomo de sensagdes cutineas, perceppio latil, acuidade visual, auditiva, olfativa, fadiga motora e mental, forga muscular, etc. Entretanto, logo depois 1 em torno da formagao ¢ aplicagao de novas diretrizes no campo educacional, destacando-se Lourengo Filho, que deu grande impulso & renovagio didética e a orientagdo profissional. Da Escola Normal da Praca, © grupo estendeu-se para 0 Liceu Rio Branco, desencadeando outro foco de desenvolvimento de um ensino adequado as necessidades da época. Importa destacar que, mais uma vez, estes adeptos da psicologia tinham presentes as imimeras possibilidades de intervengdo dos estudos que realizavam, quando comentam a respeito dos “(...) exemplos notaveis da aplicagio dessa ciéncia 20 comércio, em matéria de reclamos publicidade. Essa aplicagto se faz também na organizagao militar € no campo da higiene mental, sob 0 ponto de vista da agio dos téxicos e da psicoterapia, Ne organizagio judiciéria, também o concurso da psicotécnica € importantissimo para apreciagio do justo valor de um testemunho, assunto ‘muito delicado, Suas aplicagées sfo também notéveis na terapéutica do delito © do crime, que € uma face nova do regime penitenciério adotado em Sao Proto,*28 Tanto os trabalhos de Mange e do pessoal do Instituto de Higiene, na Escola Profissional MecAnica, como os de Lourengo Filho, na Escola Normal da Praga e no Liceu Rio Branco, marcaram-se pela organizagao, divulgacdo e aplicago de conhecimentos desenvolvidos a partir de bases técno-cientificas. Assim, nao s6 foram difundidas as ciéncias da educa¢ao (Pedagogia, Biologia e Psicologia Educacionais, Psicologia das Vocagdes, Sociologia), como foram estabelecidos os pressupostos do método cientifico, com estudos e ensaios pautados pela andlise, decomposi¢ao do objeto em parcelas, sintese operada de acordo com determinados interesses e avaliacdo para controle dos resultados atingidos. Neste processo, foram formulando concepgdes, testando idéias, ordenando procedimentos, enfim, compondo um conjunto sistematizado e objetivo (no sentido de adequado as condigdes de expanso do empresariado paulista) de princfpios e praticas de ensino que lancaram raizes na estrutura educacional vigente a partir da década de 1930 e na monopolizagio/padronizagao do conhecimento por parte de especialistas com fundamento numa competéncia autoritariamente instituida. Concomitantemente & apropriagdo metédica das experiéncias de trabalho e do saber-fazer operdrio, promovidas pela decomposigao ¢ ficou inativo, sendo reativado em 1925 pelas conferéncias © aulas priticas de Henri Piéron. Ver Psicologia e Psicotécnica (publicag8o do Laborat6rio de Psicologia Experimental), SP, Tip. Siqueira, 1927. 36 Psicologia e Psicotécnica, op. cit., p. 15. Th recomposicao do processo de trabalho subjacentes na adminis! tragao, cientifica, implantavam-se os alicerces de novas bases, posturas e diretrizes no ensino em geral e no ensino profissional em particular. E 0 que aponta a influéncia de Lourengo Filho — que escreven Introdugdo ao estudo da Escola Nova ¢ organizou a coletanea Biblioteca de Educacao?? — no Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova de 1932, considerado um divisor de aguas na ag4o pedagdgica no Brasil®8, ¢ sua posterior nomeacao para a diregao do Departamento Nacional de Educagio (| 1937) aliada & organizagao ¢ diregdo do Instituto Nacional de Estudos Pedagdgicos (1938); assim como a presenga de Roberto Mange na Comisso Mista que redigiu 0 Cédigo de Educagdo de 1933 em Sao Paulo, dando impulso a instrug3o racional ao. Fegulamentar a organizacao do ensino pré-primério, primério, profissional, secundério ¢ normal, com elementos de ligagto entre a escola primaria ¢ o tabalho??, ao par de sua atuagao decisiva na criagdo do Servigo Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAD. A qualificag4o por oficio, que comportava formas de pensar, tomar Posigdes ¢ estabelecer relac¢des com os grupos sociais ¢ 0 meio ambiente, solidariamente constitufda com base em tradigdes de Iuta e dimensdes culturais, perdia terreno nos conflitos da década de 1920 para a expansdo das condigSes de dominagao, onde se abriam espagos para institucionalizagéo de conhecimento tecnicista, departamentalizante e disciplinarizador das relagdes com o saber e o poder. A aproximago e © encontro entre estes diversos grupos que, a partir de seus campos de atuagio, sé preocuparam com a organizago cientifica do trabalho nos seus diferentes aspectos, ocorreram em 1929, quando a Associagaio Comercial de Sao Paulo contratou Leén Walther, especialista sufgo em psicologia industrial, para dar cursos em SZo Paulo. Suas feréncias propiciaram no s6 a reuniao dos varios técnicos ¢ empresirios paulistas interessados na administracdo cientifica, como confirmaram seus estudos e ensaios na diregdo da revisio dos procedimentos do taylorismo, rn 37 LOURENGO FILHO, Manoel Bergstrtem — Inirodugdo ao estudo da Escola Nova, SP, Ed, Melhoramentos, 1927; Biblioteca de Educagéo, SP, Ed. Melhoramentos, 40 volumes Publicados a partir de 1927, com tradugdes de Durkhain, Henri Pieron, Ed, Claparéde, Ferriére € outros. 38 © Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, langado em 1932, era assinado, entraoutros, por Femando de Azevedo, Afrinio Peixoto, Sampaio Doria, Anisio ‘Teixeira, Lourengo Filho, Julio de Mesquita Filho, Almeida Jinior, Noemy da Silveira, etc. Encontra-se publicado em Revista Brasileira de estudos padag gicos, RJ, MEC/INEP, v. 34, o° 79, 1960, pp. 108/12 ‘Sobre a vida ¢ os trabalhos de Lourengo Filho ver “Homenagem a Lourengo Filh Brasileira de Estudos Pedagégicos, v. 54..0° 199: 1970. 39 Cf. D'AVILA, Antonio ~“0 Cédigo de Educagio ¢ 0 SENAT"; Boletim do Centro de Estados Roberto Mange, SP, 1958, Biblioteca do SENAT. oy uma vez que Leén Walther representava a corrente racionalizadora do trabalho, que pode ser resumida em: “Taylor corrigido pela psicologia””, Dentro dos marcos do taylorismo, Walther desenvolvera experiéncias no sentido de superar a “intensificagdo” do trabalho pela “racionalizacao” do trabalho, através de reformulagdes propostas por psicdlogos e fisiologistas que possibilitam ter presentes aspectos dos conflitos e das resisténcias operdrias & administragao cientifica4!. Dai que sua passagem por Sao Paulo também foi considerada muito oportuna pelo grupo industrial que acabaram de fundar o Centro das Indtstrias do Estado de Sao Paulo (CIESP). Realizando curso no Palacio das Industrias, Walther discutiu as dificuldades de aplicaco do taylorismo em Sao Paulo, onde engenheiros e empresdrios esbarravam em entraves como: “(..) falta de auniliares competentes ou com a necesséria dose de boa vontade para colaborar na reforms dos processos de produgao (...) nisso se esvaindo tempo € sade sem resultados aprecifveis. Os chefes da segio eram rotineiros em demasia ¢ da mesma forma o operariado. (...) No caso das grandes indistrias paulistas, essas dificuldades sobem de ponio, pois hé operirios brasileiros, italianos, portugueses, espanhdis, alemies, hiingaros, austriacos, trabalhando nos mesmos misteres, cada qual com sua cultura rudimentar orientada para rumos diversos ¢ falando linguas diferentes.”"42 Frente a estas colocagdes, Walther encaminhou técnicos e industriais paulistas para solugées psicotécnicas, com destaque para sele¢o ¢ educacdo profissionais, que ultrapassariam tais problemas através da preparagao do “fator humano na produgao"43, Fornecendo estas orientagdes para superar a falta de auxiliares competentes, a cultura rudimentar e diversificada, as diferentes linguas, Walther deixa entrever articulag6es entre os novos métodos de ensino e a padronizag’o das formas de expresso e 40 «6 prinefpio da racionalizagSo do trabalho ~ Taylor corrigido pela psicologia — tal 6, nos parece,em sums, a obra de Leén Walther, tio benéfica quanto engenhosa.” ED, CLAPAREDE ~ preficio da edigio francesa de WALTHER, Le6n ~ Tecnopsicologia do Trabalho Industrial, tradugio de Lourengo Filho, SP, Ed, Melhoramentos, 1929, p. 8. 41 Conforme 0 preficio de LOURENGO FILHO so livro de WALTHER, Leén — ‘Tecnopsicologia do Trabalho Industrial, op. cit., p. 3, “(...) se acentua a convicgao de que, pare. produzir muito € barato, nfo basta o apuro téenico do maquinério, o aproveitamento dos residuos € a divisto das tarefas. F preciso a adapiacéo psicofisiolégica do trabalho ao homem, ¢.a adaptacto do motor humano ao irabalho.” (grifos do autor) 42 Informacdes Semanais, CIESP, SP, n* 28, 2/9/1929, p. 1. 43 «<8 opertrio quem deve ser estudado, quando se quer verdadeiramente organizar a fabricagio de um modo racional. (...) Se Taylor no conseguiu realizar integralmente os princfpios que estabeleceu cabe-lhe a gléria de os ter formulado. E hodiemamente, # Psicotécnica trouxe solugdes excelentes para os problemas que propusera.” idem, p. 2, reprodugfo das palavras de Walther. B comunicagaio, bem como das formas de pensar, sentir ¢ agir na constituigo do novo tipo de trabalhador. Em nome da elevag%o do nivel cultural, do grau de escolaridade, das condi¢Ses de vida e em funcdo da especializag0/qualificac4o padrfo, os trabalhadores ¢ a populacdo escolar vém perdendo suas tradigdes culturais, suas experiéncias sociais, seus modos de conhecer e saber-fazer em troca de habilidades e competéncias que Ihes permitem ocupar determinados ¢ hicrarquizados cargos e fungdes nos espagos produtivos organizados. Prestando “reais servicgos” ao “estado do problema em nosso meio”, um livro de Leén Walther chegou a ser traduzido por Lourenco Filho ¢ publicado em 192944. Como resultado de todos esses contatos € discuss6es, © movimento de administragdo cientifica em S40 Paulo tomou vulto e diregio, desembocando num projeto de fundagdo de um “Instituto de Organizagao Cientifica do Trabalho”. Incluido no plano de agao da Associag’o Comercial, o instituto atuaria através de segdes de sclego ¢ educagao profissionais, de organizagSo profissional ¢ de estudos a respeito de legislagao e estatistica referentes a estes temas. Uma comissdo, composta por Geraldo de Paula Souza, Monteiro Camargo, Lourengo Filho e Roberto Mange definiu os objetivos desta iniciativa a partir das possibilidades oferecidas pela psicotécnica As atividades produtoras no sentido de retirar do “fator humano” 0 m4ximo proveito com o minimo de resisténcia“’. Entretanto, a crise econémica em 1929 € os acontecimentos subseqiientes interromperam sua formagdo. Desmobilizada momentaneamente, a movimentacdo para fundagdo de uma instituigdo voltada para as quest6es do trabalho ndo ficou perdida, uma vez que, a partir do “tema da industrializagao”, a administragao cientifica fazia parte da “vasta empresa intelectual da burguesia industrial’#, organizada no CIESP e logo depois na FIESP. Assim, no final de 1930, por iniciativa de Aldo Mario de Azevedo — engenheiro, administrador ¢ proprietario da Fabrica de Tecidos Japhy - 44 “Para o estado do problema em nosso meio, acreditamos que este livra venha prestar reais servigos. (...) Assinalando os pontos de contato da organizagfo racional do trabalho das {fébricas com o da sele¢fo e educugto profissionais, detem-se especialmente nos provessos que mais facilmente possam ser empregados pelos industriais.” LOURENGO FILHO — prefacio de WALTHER, Ledn — op. cit, p. 4. AS “Coligir e aplicar todos os conhecimentos indispens4veis para se retirar do trabalho humano, ‘com minimo de esforgo e Frisco, o maximo proveito, quer para o locatirio, quer para o locador da mio-de-obra, quer para a coletividade ~ cis em poucas palavras, os objetivos da criagao projetada”. PAULA SOUZA, MONTEIRO CAMARGO, LOURENCO FILHO e MANGE ~ in: FERRAZ DO AMARAL, P. “Trinta Anos de Atividade no campo da organizacio cientffiea”, op. cit, p. 10 48 Expressdo de DE DECCA, Edgar — 0 Siléncio dos Vencidos, SP, Brasiliense, 1981, p. 180. 4 come¢ou a compor-se um novo grupo de interessados em questdes de administragao dos negécios ¢ do trabalho. Para “arranjar adeptos daquelas idéias e ideais, selecionando ¢ reunindo homens de projegio para um trabalho de equipe”, Aldo de Azevedo enviou mais de cem cartas, propondo a criag¢do de um Instituto Paulista de Eficiéncia. A oportunidade do momento ¢ a eficdcia da proposta de aplicag4o de administragao cientifica em larga e coordenada escala advieram da situagdo critica de 1930, pois “‘ao mesmo tempo que as empresas se viam na contingéncia de dispersar os seus empregados ¢ operarios, 0 fermento revoluciondrio espalhado Pela politica de 1930 ganhava adeptos até a completa subversto da ordem."4 Para retomar o controle da situag%o, anulando alternativas que transtomariam a produg4o ¢ a ordem através da dtica de setores da burguesia industrial paulista, grupos empresariais apontaram para formas de organizago tendentes a assegurar a expansdo do capital e a manutengao de seus poderes, E nesta conjuntura, expressando as posturas ent4o dominantes a respeito das relacdes entre economia, politica e técnica, era proposta a0 empresariado paulista uma mobilizagao em torno de “associagdo de cardter técnico”, onde ja era explicitada a perspectiva de melhorar o nivel de vida da populac4o a partir de orientagOes no sentido da cooperacao de classes sob © patrocinio de autoridade da ciéncia e de fortes estimulos ao trabalho, conforme as referéncias de Aldo de Azevedo em torno do Instituto Paulista de Eficiéncia. “Associagto de carter técnico exclusivamente econdmico, sem quaisquer fins politicos, partidérios ou religiosos e sem ligaglo de espécie alguma com as ‘vérias doutrinas socisis sobre o trabalho — seu fim principal seria promover uma intensa campanha pela elevacdo do ‘standart of living’ do brasileiro que trabalha, sem discriminagSo de classes © tem preocupactes religiosas. (...) "O Instituto Paulista de Eficincia nfo seré, portanto, uma sociedade de classe; pelo contrtrio, seré de wnido de classes em tomo de uma finalidade Gnict: o Bem Comum."48 Estas intengGes receberam apoio e adesfo de expressivos nomes da indiistria paulista*?, mas foi ao dirigir-se a Armando de Salles Oliveira - presidente da Sociedade Anénima “O Estado de S. Paulo” - que Azevedo encontrou o elemento-chave para a fundacao do IDORT. Dos contatos com a7 AZEVEDO, A.M. — carta sobre o Instituto Paulista de Eficiéncia, in: FERRAZ DO AMARAL, Pedro - op. cit, p. 12. 48 AZEVEDO, A.M. - Canta sobre o Instituto Paulista de Eric’ AMARAL ~ op. cit,, p. 11 (grifos no original). 49 Entre os que se manifestaram destacam-s¢: Pandié Cal6geras, Roberto Simonsen, José Enniric de Moraes, Gastio Vidigel, Gaspar Ricardo Junior, Henrique Dumont Villares, Luiz. ‘Tavares Pereira, Luiz Suplicy, Nicolau Filizole, Francisco Vicente de Azevedo, etc. FERRAZ DO 5 “O Estado”, resultou a formag&o de uma comissao promotora do novo empreendimento, além da sua sustentagao financeira na fase inicial. A fusao desse novo grupo com aquele de 1929, interessado na formagao e instrug&o da fora de trabalho, foi efetuada por Clévis Ribeiro, secretdrio geral da Associagao Comercial. Os antigos grupos, surgidos em torno de quest6es ligadas ao trabalho ¢.& orientacdo profissional, que emergiram incipiente e desarticuladamente na sociedade paulista, ao sc integrarem no IDORT redimensionaram suas experiéncias. Redimensionaram-nas no sentido de que se articularam num plano definido e coordenado por setores avangados da burguesia empresarial, tornando mais eficiente seu desempenho, antes desconexo ¢ circunscrito a campos de acao localizados e limitados. A partir do momento em que se fundiram e recompuseram no IDORT, reapareceram como expressdes de um processo Jevado adiante pelas necessidades de expansio do capital. Nesse sentido, com a fundacao do IDORT, foram “racionalmente” canalizados, passando a se movimentar na dire¢4o e no ritmo dos interesses dominantes, onde o conhecimento e a conformac%o do processo de trabalho e da forga de trabalho foram de fundamental importancia, Das discussdes para sua organizag4o e do encontro com o grupo de técnicos surgido em torno da Fisiologia, Higiene, Psicologia do Trabalho e do Ensino, redefiniram-se as dimensdes ¢ as proposigées da projetada instituigao, o que fica implicito na alteragéo de sua denominacao para Instituto de Organizagao Racional do Trabalho. De Instituto de Organizagao Cientifica do Trabalho, como na programago dos técnicos, passou por Instituto Paulista de Eficiéncia, na proposta inicial dos empresdrios, para chegar a Instituto de Organizagao Racional do Trabalho na formula final, Privilegiando determinados Angulos da subordinagao do trabalho ao capital, os vocdbulos expressam a diversidade de aspectos e diregdes que 0 movimento de organizagio cientifica abarca e constréi para disciplinar a forga de trabalho. Assim, 0 grupo da psicotécnica, que se formou a partir de ensaios nas reas de Fisiologia, Higiene, Psicologia — desenvolvidas para reajuslar 0 taylorismo as resisténcias operdrias —, consolidou-se no atendimento ao “fator humano”, propondo um Instituto de Organizagao Cientifica do Trabalho. O grupo de empresdrios preocupados com os sistemas de administragio, previsdo e controle — leitores de Taylor, Ford, Gilbreth, Gantt, Emerson € outros — desenvolveu-se no sentido de produtivismo, da cficiéncia, projetando um Instituto Paulista de Eficiéncia. Da composiga0 destes grupos, num momento em que jé eram largamemte difundidos ¢ aplicados os tltimos progressos das ciéncias biolégicas ¢ sociais na administragao cientifica da fabrica e da sociedade — sintetizando no. termo 76 RacionalizacZo 0 conjunto de conhecimentos que davam conta de controlar as novas inter-relagSes sociais -, surgiu o Instituto de Organizagao Racional do Trabalho. Constituido para tratar as questées de organizag&o do processo de trabalho a partir dos mais modernos ¢ atualizados procedimentos cientificos, o IDORT, conforme assinalou seu tinico bidgrafo “(...) assim se antecipou & orientagdio que veio a predominar nas atividades mundiais de organizagéo do trabalho. De outros se poderd dizer que, a principio, apenas cuidavam de tirar do trabalho o m4ximo de rendimento, soqueciiias da criatura humana. Dos especialistas brasileiros ou paulistas, no.” Pode-se considerar 0 IDORT como “elemento catalisador’S!, como unidade inicial onde se reuniram grupos ligados aos diversos setores interessados na introdug4o de métodos racionais em todos os aspectos das atividades sociais. Entretanto, como indicaram seus fundadores mais tarde, foi o “catalizador tempordrio de interesses construtivos, originérios de departamentos varios das atividades humanas, que depois pouco a pouco se foram agrupando racionalmente em distintos setores, cada um destinado a realizar determinadas idéias.”>? Conforme as necessidades ¢ possibilidades, diversos desdobramentos foram ocorrendo, através da cria¢do de institutos ow Orgdos especificos, como: Instituto de Psicologia, Associacao Brasileira de Normas Técnicas, Associagdo Brasileira para Prevengao de Acidentes, Conselho de Higiene ¢ Seguranca do Trabalho, Instituto de Administrag30, Fundagao Getilio Vargas, DASP, SENAI € muitos: outros departamentos, conselhos ¢ organismos que, atendendo s necessidades de desenvolvimento industrial, cientifico e tecnolégico, continuam a compor a sociedade racionalizada a partir de estratégias cada vez mais difusas ¢ abrangentes, invadindo todos os espagos da vida social, politica, cultural ¢ mental. Sem esquecer que a instauragio do IDORT — com um discurso que promoveu a identificagao dos interesses particulares do empresariado com os da sociedade como um todo, em fungao do bem-estar da populagiio e do desenvolvimento nacional; estruturado com miiltiplo ¢ variado campo de atuagdio; concebido como associagio técnico-cientifica portadora de propostas de cooperaciio para todos os grupos sociais — como parte de “uma vasta empresa intelectual da burguesia industrial”, foi acompanhada da 50 FERRAZ DO AMARAL, Pedro - “Trinta anos de atividade no campo da administragio cientifica”, in: Revista de Organizagdo Ciemtfica, IDORT, SP, vol. XXX, maio/junho 1961, p. i 51 Expressio utilizada por Moacyr Alvaro, presidente do IDORT, por ocasifio do décimo ‘aniversério do instituto. Revista IDORT, SP, vol. X, 1941, p. 55. 52 Revista de Organizagéo Cientifica, 1DORT, editorial comemorativo dos 10 anos do SENAI, n¥ 250, outubro/1952. 7 fundagao da Escola Livre de Sociologia e Politica (1933), assim como da Universidade de Sao Paulo e do Instituto de Pesquisas Tecnoldgicas, ligado a0 nome do mesmo Armando de Salles Oliveira, ent&o interventor do estado de Sao Paulo. A partir destas consideragées, frente As colocacdes de Levinson em torno do Ministério da Ciéncia e Tecnologia, ndo se pode deixar de ter presente que o “tema da industrializagao” — fundamento do Pprojeto de Teorganizac4o da sociedade formulado e instituido por setores da burguesia industrial desde o final da Primeira Guerra Mundial — tem subjacente o tema da racionalizagao, onde a ciéncia e a tecnologia vém assumindo variadas e estratégicas dimensées politicas na produg4o/reprodugao das formas de controle € disciplinarizagao social. Importa deixar claro que nado se argumenta pelo retorno a época dos “muladeiros, dos tropeiros, dos barqueiros, dos vendedores de 4gua, dos zeladores dos lampides, dos carregadores das imundjcies”, como polemizava 0 IDORT com os adversarios da racionalizacao na década de 193053. O que se quer 6 apontar Para perspectivas que desencadeiem abordagens ¢ relagées criticas frente ao técnico-cientifico, tanto em suas dimensdes Politicas e ideoldégicas, quanto m seus procedimentos € resultados, E pensando em ampliar as bases dos encaminhamentos aqui sugeridos, conclui-se este texto com reflexdes de Christopher Lasch em torno da administragao cientifica: “Sob o lema da gestao cientifica, os capitalistas expropriaram 0 conhecimento técnico anteriormente exercido pelos trabalhadores, reformularam-no em ciéncia e investiram em seu controle uma nova elite gerencial.” “A modema tecnologia tem sobre a cultura o mesmo efeito que tem sobre & Produgio, onde serve para estabelecer o controle administrative sobre a forga de trabalho. O estudo sobre a cultura de massa conduz-nos, assim, 4 mesma conclusio inspirada por um estudo da mecenizagao do trabalho: & tecnologia mais avangada compreende deliberadamente um sistema unilateral de gestfo e comunicagdo. Concentra o controle politico e econémico ~e, cada vez mais, 0 controle cultural ~ nas mios de uma elite de planificadores das corporagses, analistas de mercado ¢ engenheiros sociais,"54 —_— 33 Editorial “Os nossos adversérios”, Revista IDORT, n® 16, abel 1933, p.2. 54 LASCH, Christopher ~O Minimo Eu, SP, Brasiliense, 1987, 4 edigao, pp. 19 e 17.

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