provadores de vinho. Provam com a orelha: trinta se gundos de som e rapidamente percebem o essencial. Sete orquestras em sete salas diferentes, salas fecha das. O provador de sons abre, uma aps outra, cada uma das portas e inclina o seu sistema auditivo na di reco do som durante trinta segundos. Durante trinta segundos de vida nada existe seno trinta segundos de msica. Ou seja, no so trinta segundos de vida, so trinta segundos de msica. J est. O provador segue para a sala seguinte. No fim, diz: escolho aquela sala, aquela msica.
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O melmanofisionomista
Pelo rosto de quem ouve tentar perceber a msica.
Imaginemos um homem, um melmanofisionomista, que est com os ouvidos tapados e no tem qualquer informao sobre o programa do concerto. Est at de costas para a orquestra, virado para os outros especta dores. O melmanofisionomista tenta concentrarse no rosto dos espectadores do concerto. Na forma como um ou outro elemento do pblico franze as sobrance lhas e no modo at como um ou outro tamborila no seu prprio joelho, de forma subtil, com os dedos da mo direita. Porm, acima de tudo, ele fixase nos rostos de quem ouve o que ele no est a ouvir. E, sim, um gran de especialista em msica e na natureza humana pode r dizer com acerto, pela observao da fisionomia dos ouvintes: Mozart!, Bach, Chopin. E talvez at isto: Silncio.
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O ouvintegemetra
Que fazemos quando ao nosso ouvido chega msica
informe, com melodias que nos tornam tontos, que nos desequilibram, que nos fazem cair, que nos fazem pedir uma cadeira para nos sentarmos? Eis o que fazemos: desistimos e dizemos: no msica, rudo. Ou ento tentamos dar forma a esse informe/disforme. Tentamos fazer quadrados no que catico, fazer tringulos, rec tngulos e circunferncias no que parece ter mais lados do que mil. Eis o ouvido atento: , alm de tudo o mais, um ouvidogemetra. Um ouvido que tenta organizar os sons em formas. (Passar de uma modalidade do tempo para uma modalidade do espao.) O rudo , ento, aquilo para o qual o ouvinte gemetra ainda no encontrou o lpis capaz de fazer traos decisivos. Traos que definem interior e exte rior, lado direito e esquerdo, baixo e alto. Traos que organizam. Porque o ouvintegemetra faz isto: desenha por cima dos sons; desenha com o ouvido, acto to estra nho; desenha com a sua ateno, com a sua audio meticulosa, desenha separando, organizando apro ximando um som louco de outros sons que o podem ajudar a compreender.