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quonsttt gizojodosey Ue tr } aon PERS Fd VIDOTOIDOS V NOD UVSNad V OGNSGNaudV Avy UML, 9 URINE WUNUIBAZ i ‘Titulo oxgioa: ' Thinking Socioogiaaly “Thadugio autovida da segunda ecto inglesa Dublicada ern 2001 por Blackwell Publishing, de Oxford, Inglaterra Copyright © 1990, 2002, Zygmunt Bauman ¢ Tim May Copyright da edigto em lingua portuguesa © 2010: Jorge Zahar Editor Lea. rug Marqus de S, Vicente 99 ~ Ieandat 2451-041. Rio de Jancto, RI tel. (21) 2529-47501 fax (21) 2529-4787 editora@abar.com.r ‘wwrwaharcombr Todos os dicts reservados. |Aeprodgio nto autoriada desta publica, no todo ‘owem pate, constitu violasko de direitos autores (Lei 9.610098) CGrafis atualizada espitand o nov Acordo Ortogrico da Lingua Portuguest Cape: Sergio Campante Fotos da capa: @ Massimo Antognoli e © Anthony Sharpix Be CCIP-Brail. Catalogacao na fonte 5 Sindicato Nocional dos Edores de Livros, RI ‘auenan, Zygmunt, 1925- Batla —-Aprendendo a pensar com a sociolosia/Zygmunt Bouman e Tim May wadugio Alexandre Wemeck,~ Rio de Janeiro: Zaha, 2010. ‘alu de Thinking scopy Hl Ind nie ISaN 78 85.37-0197-0 1. Sociologia. 1 May Tim, 1957-11 Titulo. epp:301 cDU:3168, Prof. Gabrie} Ulian Antropologia Historia Prof. Gabriel Uiten Anaopoionys 1" . Sumario . Prefaécio & segunda edigéo, ? IntroducSo: A sociologia como disciplina, 11 Em busea de distngdo, 11 Sociologia € senso comum, 17 |O conteddo deste vio, 281 Questées pera rllt 27 Sugesties de leitura, 25 Parte | Ago, identidade ¢ entencimento na vida cotidiana 4, Alguém com os outros, 33, Eseolha, iberdade ¢ conwivéneia com os outros, 241 Alguém como autre: perspectives socioligiea, 41 SacilizacZo, importancia © a¢80, 44| Sin- tose, 47 | Questées pare reflati, 491 Sugostbos de leitura, 49 2. Observagio e sustentagao de nossas vidas, 57 Fundarnentanco nossa vidas interagBo, ntendimento e distinc socal '51] Obacrvando e vivendo a vid: frontaias © outsiders, 61 | Siotese, 721 Questées para rele, 72 | Sugestées de letura, 73 3, Lagos: para falar em “nds”, 75 ‘Comunidades: forlar © consenso @ lidar com 0 confit, 75 | Cileul, racionalizagio e vida grupal, a0 | Sitose, 93 | QuestBes pare refit 24 Sugestées cle letura, 4 Parte Il Viver nossas vidas: desafios, escolhas e coercées 4. Decisbes e acdes: poder, escolha e dever moral, 97 ‘Tomadas de deciséo, 7 | Valores, poder aco, 101 |Amotivagae para agit, 10¢ | Sintoze, 1231 Questdat pars rflti 124 | SugastOes de leiture, 126 . Introdugao . A sociologia como disciplina Neste capitulo analisaremos a ideia de aprendler a pensar socio~ logicamente e sua importancia no entendimento de nos mes- ‘mos, uns dos outros e dos ambientes sociais em que vivemos. ara isso, iremos considezar a sociologia uma pritica discipli- nada, dotada de um conjunto préprio de questoes com as quais aborda o estudo da sociedade e das relagoes sociais. Em busca de distingao [A sociologia engloba um conjunto disciplinado de préticas, mas também representa considerével corpo de conhecimento acumulado ao longo de historia. Percorrer com o olhar a seqa0 de sociologia das bibliotecas revela um conjunto de livros que representa essa area dle conhecimento como uma tradigio de publicagio. Essas obras fornecem considerdvel volume de infor- ago para novatos na drea, queiram eles se tornar socidlogos ou apenas ampliar seu conhecimento a respeito do mundo em {que vivem. So espacos em que os leitores podem se servir de ‘tudo aquilo que a sociologia é capaz de oferecer e, com isso, con- sumir, digerir, dela se apropriar ¢ nela se expanditr. Essa cigncia configura-se, assim, uma via de constante fluxo, ¢ os novatos actescentarn ideias ¢ estudos da vida social as estantes originais. " 2 Aorendende a pensar com 2 sociologi ‘A sociologia, nesse sentido, & um espaco de atividade continua que compara o aprendizado com novas experiéncias e amplia 0 conhecimento, mudando, nesse processo, a forma e 0 contetide da propria disciplina Isso parece fazer sentido, Afinal, quando nos perguntamos “o que é a sociologiat”, podemos nos referir a uma colecéo de livros em uma biblioteca, que dao conta do contetido da disci- pina ~ esse um modo aparentemente dbvio de pensar sobre a atéria, posto que, se alguém nos perguntar “o que é um leao?”, podemos pegar um livro sobre animais ¢ indicar uma imagem specifica. Nesse sentido, estamos apontando para a ligagio entre palzvras e objetos. Assim, portanto, palavras referem-se a objetos, que se tornam referentes para essas palavras, ¢, en tdo, estabelecemos conexdes entre uns ¢ outras em condigées especificas. Sem essa capacidade comum de compreensio, seria impossivel a comunicagio mais banal, aquela que niio costuma~ ‘mos sequer questionar, [sso, entretanto, nao é suficiente para tum entendimento de maior profundidade, mais sociolégico, dessas conexdes. Esse processo, contudo, nao nos possibilita conhecer 0 objeto ‘emi. Temos ent de acrescentar algumas perguntas, por exem~ plo: de que maneira esse objeto ¢ peculiar? De que forma ele se di- ferencia de outros, para que se jusifique o fato de podermos.a ele nos referir por um nome diferente? Se chamar umn animal de leao € correto mas chamé-lo de tigre nao, deve haver algo que lebes tenham e tigres nao, deve haver distingdes entre eles, S6 desco- bbrindo essas diferengas poclemos saber 0 que caracteriza umn leo —a que é bem diferente de apenas saber a que objeto cortesponde a palavra “leao”. Eo que acontece coma tentativa de caractetizar a ‘maneira de pensar que podemos chamar de sociolégica. Satisfaz-nos 0 fato de a palavra “sociologia” representar cer- to corpo de conhecimentos e certas praticas que utilizam esse conhecimento acumulado. Entretanto, 0 que faz esses contett- dos ¢ essas priticas serem exatamente “socioligicos"? O que os torna diferentes de outros corpos de conhecimento e de outras disciplinas que tém seus proprios procedimentos? Inwoducae 13 Para responder a essa pergunta, poderfamos, voltando a nosso exemplo do leo; buscar distinguir a sociologia de outras disciplinas, Em muitas bibliotecas, as estantes mais proximas as de sociologia tem etiquetas como “histéria’, “cigncia politica’, “direito”, ‘politicas pitblicas’, “ciéncias conté- beis’,“psicologia’, “ciéncias da administragao’, “economia”, “cri- ‘minologia’, “filosofia’, “serviga social’, “linguistica’ “literatura” e“geografia humana’. Os bibliotecérios que as organizam talvez suponham que os leitores que pesquisam a segao de sociologia podem eventualmente chegar a um livro desses outros assuntos. Em outras palavras, considera-se que o tema central da sociolo- gia deve estar mais proximo desses corpos de conhecimento que de outros. Talvez as diferencas entre 0s livros de sociologia eseus vizinhos imediatos sejam, entdo, menos pronunciadas do que as existentes entre sociologia e, digamos, quimica orginicat Faz sentido essa catalogagao. Os corpos de conhecimento ddessas matérias tém muito em comum, sendo preocupasao de todas elas o srndo feito pelos seres humanos, aquele que sé existe em decorréncia de nossas agbes. Todos esses sistemas de pens mento, cada tum a sua maneira, se referem a agbes humanas ¢ suas consequéncias. Se, entretanto, exploram o mesmo tertit6~ rio, o que os distingue? © que os faz tao diferentes um do outro aque justifique cada qual ter um nome? ‘Somos tentados a oferecer uma resposta simples para essas ‘questées: divisdes entre corpos de conhecimento devem refletir as divisGes em scu universo de investigagao. Sio as agoes huma- nas (ot os aspectos dessas ages) que diferem umas das outras, ¢ as divisdes entre 0s diferentes corpos de conhecimento simples- ‘mente levam em conta esse fato. Assim, a historia diz respeito as agoes que tém lugar no pasado, enquanto a sociologia se con- centta nas ages atuais, De modo similar, a antropologia trata de sociedades humanas em estigios de desenvolvimento diferentes daquele em que se encontra a nossa (independentemente da ‘maneira como isso seja definido). ‘No que diz respeito a outros parentes proximos da sociolo- ia, a cigncia politica tende a discutir agdes relativas ao poder ‘antrupologia’, “4 ‘Aprendendo.a pensar com aseciologie 20 governo; a economia lida com aquelas relacionadas a0 uso de recursos em termos de maximizagao de sua utilidade por in- dividuos considerados “racionais’, em um sentido particular do termo, assim como a producao ea distribuigao de bens; 0 direito ea criminologia estao interessados na interpretagao ¢ aplicacao de leis ¢ normas que regulam 0 comportamento humano ¢ na ‘maneira como essas normas esto articuladas, como se tornam obrigatérias, sao executadas € seus efeitos, Tadavia, esse mode de justificar as fronteiras entre disciplinas toma-se problemé- ‘ico, pois assumimos que o mundo humano reflete divisoes to pprecisas que demandam ramos especializados de investigasio. Chegamos entao a um debate importante: como a maioria das crengas que parecem autoevidentes, essas divisbes s6 se mantém “byias enquanto nos abstemos de examinar os pressupostos que as sustentam. Entio, de onde tiramos a ideia de que as agdes humanas ppoclem ser divididas em categorias? Seria do fato de que elas tim sido assim classificadas, e a cada uma tem se atribuido nome especifico? Ou do fato de que ha grupos de especialistas com credibilidade, considerados conhecedores ¢ confidveis, que cla- ‘mam direitos exelusivos para estudar determinados aspectos da sociedade e nos suprir com opinides fundamentadas? Do ponto de vista de nossas experiéncias, contudo, faz sentido repartir a sociedade entre economia, ciéncia politica ou politicas publicas? ‘final, nao vivemos um momento sob o dominio da ciéncia po- Iitica e o seguinte sob 0 da economias nem nos deslocamos da sociologia para a antropologia quando viajamos da Inglaterra para alguma regio, digamos, da América do Sul; ou da historia ppara a sociologia de um ano para outro! Sera que somos capazes de separar esses dominios de ativi- dade em nossas experiéncias e, assim, categorizar nossas agoes em pollticas num momento e econdmicas em outro porque an- tes de tudo fomos ensinados a fazer tal distingao? Entao o que conhecemos nao seria o mundo em si, mas 0 que nele estamos fazendo em termos de como nossas priticas si conformadas por uma imagem daquele mundo. Trata-se de um modelo cons- Introsugao 15 truido com os blocos derivados das relagées entre linguagem experiéncia, Desse modo, nao hé diviséo natural do mundo hu- ‘mano que se reflita em diferentes disciplinas académicas. O que Ind, pelo contrério, é uma divisko de trabalho entre as estudiosos que se debrucam sobre as agdes humanas,¢ isso é reforcado pela imiitua distingao dos respectivos especialistas, cam os direitos cexclusivos de cada grupo quanto 8 deciséo do que perience ¢ do que nao pertence a suas areas especificas. Em busca da “diferenca que faz a diferenga’, deparamos ‘com a questao: em que as priticas desses ramos de estudo dife- rem umas das outras? Existe similaridade nas atitudes de cada uum deles em relagdo ao que escolheram como objeto de estudo, ‘Afinal, todos exigem obediéncia as mesmas regras de condu- ta ao lidar com seus respectivos objetos. Todos buscam coletar fatos relevantes e garantir sua validade, ¢, entdo, testam ¢ vol- tam a testar esses fatos no sentido de confirmar a confiabilida- de das informagées a respeito deles. Além disso, todos tentam colocar as proposicdes sobre esses fatos de tal maneira que elas sejam clara e inequivocamente compreendidas e confirmadas por evidéncias. Fazendo isso, procuram antecipar-se a contra- digdes entre proposicdes ou mesmo eliminé-las, de modo que nunca duas afirmagées opostas sejam consideradas verdadeiras ‘a9 mesmo tempo. Simplificando, todos eles tentam fazer jus & ideia de uma disciplina sistemitica e apresentar seus achados de modo responsével. ‘Agora podemos afirmar que nao ha diferenga na maneira como a tarefa dos especialistas, bem como sua marca registra~ da — a responsabilidade académica -, € entendida e praticada, Quem reivindica a condicao de especialista parece empregar es~ tratégias similares para coletar e processar seus fatos: observa aspectos das ages humanas ou emprega evidéncias hist6ricas ¢ busca interpreté-las segunda modos de anélise coerentes com ‘essas ages. Logo, parece que nossa tiltima esperanga de encon- trar 0 trago distintivo esta nos tipos de questio que motivam cada campo, ou seja, aquelas que determinam os pontos de vis- ta (perspectivas cognitivas) pelos quais as ages humanas so 16 ‘Aprendenda a pensar com 2 socilogis observadas, pesquisadas, descritas ¢ explicadas por estudiosos dessas diferentes disciplinas. ‘Vejamos 0 tipo de questio que motiva os economistas. ‘Nessa abordagem, o que é levado em consideragao se ceslocaria para a relagiio entre custos e beneficios das ag6es humanas, ava- Jiadas do ponto de vista do gerenciamento de recursos escassos e dos modos possiveis de maximizar seus beneficios. Além disso, as relagies entre os atores seriam examinadas como aspectos da produgio e das trocas de bens e servicos, todos eles conside- rados regulados por relagbes de mercado de oferta ¢ procura pelo desejo dos atores de conquistar suas preferéncias de acordo com um modelo de ago racional. Os achades seriam, ento, arranjados em um modelo do processo pelo qual os recursos 820 ctiados, obtidos e distribuidos entre varias demandas. ‘A ciéncia politica, por sua vez, mais provavelmente se in- teressara pelos aspectos das agdes humanas que mudam — ou slo mudados por ~ condutas vigentes ou progndsticas de outros atores em termos de seu poder ¢ influencia, Nesse sentido, as ages podem ser vistas em termos de assimetria entre essas duas grandezas, e, entio, alguns atores emergem da interaglo com seus comportamentos mais significativamente modificados do que os de outros integrantes dessa interagao. Também € possivel onganizar essas descobertas em torno de conceitos como poder, dominagio, Estado, autoridade e outros, ‘As preocupagdes da economia e da ciencia politica nao so de maneira alguma estranhas 4 sociologia, 0 que logo se evi- dencia em trabalhos sociolégicos escritos por estudiosos que se podem identificar como historiadores, cientistas politicos, an- iropélogos ou gedgrafos. A sociologia, als, como outros ramos das ciéncias sociais, possui sua propria perspectiva cognitiva que estabelece questdes @ langar acerca das agdes humanas, assim como seus préprios principios de interpretagao. Desse ponto de vista, podemos dizer que a sociologia se distingue por observar 1s aces humanas como elementos de figuragées mais amplas; ou seja, de uma montagem nao aleatéria de atores reunidos em rede de dependéncia rmitua (dependéncia considerada o estado Inwrodugae ” no qual a probabilidade de que a agao seja empreendida ¢ as chances de seu sucesso se alterem em fungdo do que sejam os atores, do que fagam ou possam fazer). (Os socislogos perguntam que consequéncias isso tem para ‘os atores humanos, as relacSes nas quais ingressamos ¢ as socie- “dades das quais somos parte. Em tesposta, formatam o objeto da investigagao sociologica. Assim, figuragées, redes de dependén- ‘cia miitua, condicionamentos reefprocos da ago e expanséo ou confinamento da liberdade dos atores estio entre as mais pree- minentes preocupagdes da sociologia. “Atores individuais tornam-se objeto das observagoes de es- tudos sociolégicos & medida que s40 considerados participantes de uma rede de interdependéncia. Por isso, € porque, nao im- portando o que fagamos, somos dependentes dos outros, pode- amos dizer que a questo central da sociologia 6: como os tipos de relagbes sociais e de sociedades em que vivemos tém a ver ‘comas imagens que formamos uns dos outros, de nés mesmas e de nosso conhecimento, nossas agdes e suas consequéncias? Sdo {questbes desse tipo — partes das realidades priticas da vida coti- diana — que constituem a rea propria da discussio sociol6gica ‘edefinem a sociologia como ramo relativamente autonome das cidncias humanas e sociais. Logo, podemos concluir que apren~ der a pensar com a sociologia é uma forma de compreender 0 mundo dos homens que também abre a possibilidade de pensi- lo de diferentes maneiras. Sociologia e senso comum ‘Aprender a pensar sociologicamente é uma atividade que se dis- tingue também por sua relacao com 0 chamado “senso comum”. Talvez mais ainda que em outras Areas de estado, a relagao com senso comum é, na sociologia, conformada por questoes im- portantes para sua permanéncia e sua pritica. As cigncias fisicas ¢ biologicas nao se preocupam aparentemente em enunciar suit relagio com o senso comum. A maioria das ciéncias se estabe~ 8 Aprendlende a pensar com a socilosia lece definindo-se em termos das fronteiras que as separam de ‘outras disciplinas, e ado Se supoe partilhanddo terreno sutfickent para se preocupar em tragar fronteiras ot pontes com esse co- mhecimento rico, ainda que desordenado e nao sistemitico, em eral desarticulado, inefaivel, que chamamos de senso comum, ssa indiferenga deve ter alguma justificativa. O senso co- mum, afinal, parece nada ter a dizer sobre os problemas que preocupam fisicos, quimicos e astrnomos, Os assuntos com os quais eles lidam nao se voltam para as experiéncias cotidianas rem passam pela mente de homens ¢ mulheres comuns. Assim, 1ndo especialistas em geral nao se consideram aptos a emitir opi- nides a respeito desses temas, a menos que sejam auxiliados por cientistas. Afinal, os objetos explorados pelas ciéncias fisicas s6 Zo acessiveis sob circunstincias muito especiais ~ por exemplo, através das lentes de telesc6pios gigantescos, cujo uso para de- senvolver experimentos em determinadas condigdes ¢ exclusivi- dade dos cientistas, que dessa forma reivindicam para sia posse monopolistica de um dado ramo da ciéncia. Como tinicos de- tentores da experitncia que fornece a matéria-prima para scus estudos, o processo, as anélises ea interpretagao desses materiais esto sob scu controle. Os produtos dessa forma de posse devem, entio, submeter-se e resistir ao escrutinio crftico de outros cien- tistas, Nao precisam competir com o senso comum pela simples razio de que este nao tem pontos de vista sobre as matérias a respeito das quais essas éreas se pronunciam. Devemos agora lembrar algumas questdes mais sociologi- ‘cas, Afinal, a caracterizacio seria t2o simples quanto sugere © que acabamos de dizer? A produgio de conhecimento cientifico contém fatores sociais que informam e conformam suas préti- cas, enquanto as descobertas cientificas podem ter implicagbes sociais, politicas e econdmicas a respeito das quais, em qualquer sociedade democritica, a tltima palavra nao sera dos cientistas. Em outras palavras, nao podemos separar tdo facilmente o sen- tido da pesquisa cientifica dos fins a que ela pode ser aplicada, nem separar a razao pratica da prépria ciéncia. Afinal,a maneira Iewrodugio 19 como a pesquisa é financiada, e por quem, pode, em algumas Ancias, ser determinant tad Preocupacées piiblicas recentes com a qualidade do ali- mento que constimimos, 0 ambiente em que vivemos, 0 papel da engenharia genética e o patenteamento de informagao sobre 0s genes de populagses por parte de grandes corporacoes repre sentam apenas uma pequena parcela da gama de questoes que a cigncia nao pode regular sozinha ~ uma ver. que esta diante da justificagao do conhecimento, mas também de suas aplicagSes c implicagdes nas vidas que cle conduz. Esses assuntos dizem respeito a nossas experiéncias ¢ suas relagdes com priticas co- tidianas, ao controle que temos sobre nossa vida e a diregzo em aque nossas sociedades se orientam. Esses temas fornecem a matéria-prima para a investigagao sociolégica. Vivemos em companhia de outras pessoas ¢ intera~ gimos uns com os outros. Nesse processo, demonstramos extra ordinaria quantidade de corshecimento tdcito, que nos permite lidar bem com os desafios do dia a dia, Cada um de nés é um ator habilidoso, mas o que conseguimos e o que somos depende do que fazem as outras pessoas. Afinal, a maioria de n6s jé vi- yeu a angustiante experiéncia de ruptura da comunicaczo com amigos e desconhecidos. Segundo esse ponto de vista, o assunto da sociologia ja esta embutido em nosso cotidiano, sem 0 que, ali, serfamos incapazes de conduzir nossa vida na companhia dos outros. Embora profundamente imersos em nossas rotinas ~ con- formadas por conhecimento pritico orientado para os parime- tros sociais pelos quais interagimos nao é frequente pararmos, para pensar sobre 0 significade daquilo por que passamos; ¢ ‘menos ainda para comparar nossas experiencias pessoais com ‘0 destino dos outros, a nao ser, talve, para obter respostas indi- Viduais para os problemas sociais ostensivamente exibidos para consumo de todos em programas de entrevistas na TV, Nesse «aso, entretanto, a privatizagao de questées sociais é reforgada, aliviando-nos, assim, do fardo de enxergar as dinamicas das relagdes sociais no que é antes visto como reagdes individu » ‘Aprencenio @ pensar com 8 sociologia £ exatamente isso que 0 pensamento sociologico pode fa- zat por niés. Como um modo de pensar, ele nos far questoes do tipo: “Como nossas biografias individuais se entrelagam coma hist6ria que partithamos com outrus seres humanos?” Ao mesmo tempo, socidlogos sao parte dessa experiéneia e, como tal, nao importa quao arduamente tentem manter distincia de seus objetos de estudo — tratando as experincias de vida como objetos “de fora”, nfo conseguem desligar-se completamente do conhecimento que buscam compreender. Apesar disso, essa condigio pode ser uma vantagem, posto que possuem uma vi- slo interna e externa das experiéncias que tentam entender. Hé, entretanto, muito mais a ser dito sobre a relagio entre a sociologia e 0 senso comum. Os objetos da astronomia precisam ser nomeados, alocados em um conjunto ordenado e compara- dos com outros fendmenos similares, Existem poucos equiva- lentes sociolégicos desse tipo de fenémeno limpo € intocado, {que munca tenha sido preenchido com significados antes que os socidlogos aparecessem com seus questionérios,fizessem anota~ oes em seus cadernos de campo ou observassem documentos Televantes. As ages bumanas e 2s interagies que os socidlogos estudam j receberam nomes e jé foram analisadas pelos pro- prios atores, e, dessa maneira, sio objetos de conhecimento do senso comum. Familias, organizagdes, redes de parentesco, vi- zinhangas, bairros, aldeias, cidades, nagdes, igrejas ¢ qualquer outro agrupamento mantido coeso pelas interasSes humanas regulates ja se apresentam com significados e significagdes con- feridos pelos atores, or essas raz0es, a sociologia esté intimamente relacionada a0 senso comum, A seguranga de cada uma dessas instdncias niio pode ser garantida de antemdo, em fungio de suas fron- teiras permedveis e fluidas. Assim como no caso das aplicagoes das descobertas dos geneticistas e suas implicagdes para a vida social, a soberania da sociologia sobre o conhecimento social provavelmente é contestavel. Por isso, estabelecer uma fronteira entre conhecimento sociolégico formal e senso comum é questo tdo importante para a identidade da sociologia como manter Invrosugse 2 ‘um corpo de conhecimento coeso. Nao surpreende, portanto, 1 fato de 0s socidlogos darem tanta atengio a esse tema, © Po- demos apontar quatro modelos segundo os quais essa diferenga tom cido levada em consideracio. Em primeiro lugar, a sociologia, a diferenca do senso co- ‘mum, empenha-se em se subordinar as regras rigorosas do discurso responsdvel. Trata-se deatributo da ciéncia para se dis~ tinguir de outras formas de conhecimento, sabidarsente mais flexiveis e menos vigilantes em termos de autocontrole. Espe~ ra-se dos sociélogos, em sua pritica, um grande cuidado para distinguir—de maneira clara e visivel~afirmagoes corroboradas por evidencias verificaveis e aquelas que reivindicam seu status a partir de meras ideias provisorias ¢ nao testadas. As regras de responsabilidade discursiva exigem que a “oficina” ~ 0 con- junto de procedimentos gue concuz as concludes finals ¢ que, ‘afirma-se, garantiria sua credibilidade ~ esteja sempre aberta para fiscalizagio. ‘0 discurso responsdvel tem também de se relacionar com outras afirmagées a respeito do mesmo t6pico ¢, desse modo, nao pode dispensar ou passar em siléncio por outros pontos de vista que tenham sido verbalizados, por mais inconvenientes Que eles possam ser para 0 argumento, Desse maneira, a fide- dignidade, a confibilidade ¢, finalmente, também 2 utilidade pritica das proposigdes que se seguirem a esse argumento serio bastanteampliadas. Afinal, nossacrengana credibilidade da cién~ cia apoia-se na esperanca de que os cientistas tenham seguido as regras do discurso responsivel. Quanto aos cientistas, eles pr6- prios apontam para as virtudes do discurso responsével como argumento para validar ¢ conferir confiabilidade ao conheci- mento que produzem, [Em segundo lugar, ha o tamanho do campo do qual o ma- terial do pensamento sociologico ¢ extraido. Para a maioria de rnés, no dia a dia, esse campo se resume a nassos proprios muen- dios da vida, ou seja, a0 que fazemos, as pessoas que encontra- mos, 20s propésitos que estabelecemos para nossos empreendi ‘mentos e pressupomos que outras pessoas estabelegam para 08 2 ‘Aprendenda a penser com a sociologia delas, assim como os tempos ¢ os lugares em que interagimos. Poucas vezes consideramos necessirio ultrapassar 0 nivel de ‘nossas preocupagdes cotidianas para ampliar o horizonte de nossas experincias, atitude que exigiria tempo ¢ recursos de que mui- tos podem nao ter ou cam que nao se dispdem a arcar. Dada, porém, a tremenda variedade de condicdes de vida ede experitn- cias no mundo, cada uma € necessariamente parcial e talvez até unidimensional. Essas qluestdes s6 podem ser examinadas se as colocarmos juntas © compararmos experiéncias prospectadas a partir de uma multiplicidade de mundos. $6 entdo as realidades delimi- tadas da experiéncia individual sero reveladas, assim como a complexa rede de dependéncia ¢ interconexdes na qual elas esto envolvidas ~ rede que vai muito além da esfera que pode ser acessada a partir do ponto de vista da biografia singular. O resultado global de tal ampliagio de horizontes sera a des- coberta da intima ligagao entre biografia individual e amplos processos sociais. & por essa razao que 2 busca dessa perspectiva ‘mais ampla efetivada pelos socidlogos faz uma enorme diferen- 4 nao s6 quantitativamente, mas também na qualidade ¢ nos tusos do conhecimento. Para gente como nds, 0 saber sociolsgico tem algo a oferecer que 0 senso comum, por mais rico que seja, sozinho nao nos pode dar. Em terceiro lugar, a sociologia e o senso comum diferem quanto ao sentido que cada um atribui a vida laumana em ter~ mos de como entendem e explicam eventos ¢ circunstancias. Sabemos por nossas experiéncias que somos “o autor” de nossas ages, e que 0 que fazemos ¢ efeito de nossas intengées, muita embora os resultados possam nao corresponder ao que preten- diamos. Em geral agimos para alcangar um estado de coisas, seja visando possuir um objeto, receber elogios, impedir que acontega algo que ndo nos agrada ou ajudar um amigo. Natu- ralmente,o modo como pensamos nossas agdes é 0 modelo pelo ‘qual damos sentido as agdes dos outros. Nessa medida, a tinica maneira que temos para conferir sentido ao mundo humano & Inerocugdo 2 nossa volta € sacar nossas ferramentas explica no interior de nossos proprios mundos da vida ‘Tendemos a perceber tudo que acontece no mundo em geral ‘como resultado da acao intencional de alguém, que procuramos até encontrar, acreditando, entdo que nossas investigagdes tive- am éxito. Assumimos que a boa vontade esté por trds dos even tos para os quais somos favoravelmente predispostos ¢ que ha és intengBes por trés daqueles que nos desagradam. Em geral, as pessoas tém dificuldade em aceitar que uma situacao nao seja feito de agdes intencionais de alguém identificivel ‘Aqueles que falam em nome da realidade contida na es- fera puiblica — politicos, jornalistas, pesquisadores de mercado, anunciantes, publicitérios—mostram sintonia em relacao a essas tendéncias e se referem a “necessidades do Estado” ou “deman- das da economia’. Isso é dito como se o Estado ou a economia fossem feitos na snedida de individuos como nds, com necessi- dades e desejos especificos. De modo similar, lemos ¢ ouvimos falar a respeito de problemas complexos cle nagdes, Estados € sistemas econdmicos, descritos como efeitos dos pensamentos ¢ dos escritos de um grupo de individuos que podemos nomear, fotografar e entrevistar. Os governos muitas vezes também se desobrigam de responsabilidades, referindo-se 2 coisas fora de seu controle ou tratando das “demandas piblicas” por meio de grupos focais e pesquisas de opiniio. ‘A sociologia se op6e tanto a0 modelo que se funda na par- ticularidade das visdes de mundo, como se elas pudessem, sem problema algum, dar conta de um estado geral de coisas, quan to a0 que usa formas inquestiondveis de compreensio, como se las constituissem um modo natural de explicacéo de eventos, como se eles pudessem ser simplesmente separados da mudanga hist6rica ou das localidades sociais de que emergiram. Quando, em ver de atores individuais em agdes isoladas, toma figura~ ses (redes de dependéncia) como ponto de partida de suas ‘Pesquisas, a sociologia demonstra que a metéfora comum do individuo dotado de motivagio como chave da compreensiio do mundo humano ~ incluindlo nossos préprios pensamentos vas estritamente Pa ‘Aprendendo e pensar com a sociologia © ages, minuciosamente pessoais ¢ privados ~ nao é caminho apropriado para nos entender e aos outros. Pensar sociologica- mente é dar sentido & condigao humana por meio de uma and- lise das numerosas teias de interdependéncia humana ~ aquelas sais érduas realidades a que nos referimos para exp] motivos ¢ 0s efeitos de suas ativagbes. Finalmente, em quarto lugar, 0 poder do senso comum depende da autoevidencia de seu carter, isto é, do nao questio- namento de seus preceitos e de sua autoconfirmagao na pritica Esse cardter, por sua vez, repousa na rotina, personagem habi- tual da vida cotidiana, que conforma nosso senso comum ¢ é a0 ‘mesmo tempo por ele conformado. Esse sistema ¢ indispensével a continuidade de nossas vidas. Quando repetidos com suficien- te frequéncia, os fatos tendem a tornar-se familiares, ¢ o que é familiar costuma ser considerado autoexplicativo: ndo apresenta problemas e pode nao despertar curiosidade, Nao se pergunta ds pessoas se elas estdo satisfeitas com “as coisas como sao” por razBes no abertas ao escrutinio. O fatalismo, por sua ver, pode desempenhar seu papel, por meio da crenga de que podemos fazer muito pouco para mudar as condigdes em que agimos. De acordo com esse ponto de vista, é posstvel afirmar que @ familiaridade estaria em tens4o com seu carter inquisitive e que isso também pode potencializar o impeto de inovacio € trans- formagao. Em face do mundo considerado familiar, governado por rotinas capazes de reconfirmar crengas, a sociologia pade ‘surgir como alguém estranho, ititante e intrometido, Por colocar em questiio aquilo que é considerado inquestiondvel, tido como dado, cla tem o potencial de abalar as confortaveis certezas da vida, fazendo perguntas que ninguém quer se lembrar de fazer € cuja simples mengfo provoca ressentimentos naqueles que detém interesses estabelecidos. Essas questées transformam 0 evidente em enigma ¢ podem desfemiliarizat o familiar — com ‘os padres normais de vida e as condi¢des sociais em que eles 18m lugar em julgamento, elas emergem nao como a tinica, mas como uma das possiveis formas de dar andamento a nossas vi- das e organizar as relagdes entre nds 1 OSSOS Inodugso 2s Obviamente isso nio é para agradar todo mundo, sobre- tudo aqueles cuja situagio lhes confere grande vantagem. AS rotinas tém também seu lugar. Cabe aqui recordar a cento- ‘pela de Kipling, que andava sem qualqner esforco sobre as cer. patas até que um adulador da corte comegou a elogiar sua ex traotdindria meméria. Seria essa Faculdade o que permitia que cla jamais pisasse a octogésima quinta perna antes da trigési- ‘ma sétima ou a quinquagésima segunda antes da décima nona. ‘Tornada consciente de si mesma, a pobre centopeia perdeu @ capacidade de andar “Ha quem se sinta humilhado ou ressentido se algo que do mina e de que se orgulha é desvalorizado porque foi questio- nado, Por mais compreensivel, porém, que seja 0 ressentimento assim gerado, a desfamiliarizagiao pode ter benelicios evidentes. Pode em especial abrir novas e insuspeitadas possibilidades de conviver com mais consciéncia de si, mais compreensto do que nos cerca em termos de um eu mais completo, de seu conheci- ‘mento social e talvez também com mais liberdade e controle. ara todos aqueles que acham que viver a vida de maneira mais consciente vale a pena, a sociologia um guia bem-vin- do. Embora repouse em constante € intima conversagdo com 0 senso comum, ela procura ultrapassar suas limitagdes abrindo possibilidades que poderiam facilmente ser ignoradas. Quando aborda e desafia nosso conhecimento partilhado, a sociologia nos incita e encoraja a reacessar nossas experiéncias, a descobrir novas possibilidades e a nos tornar, afinal, mais abertos ¢ menos acomodados 3 ideia de que aprender sobre nds mesmos ¢ 08 ou- i1os leva a um ponto final, em lugar de constituir um processo indimico ¢ estimulante cujo objetivo éa maior compreensio. Pensar sociologicamente pode nos tornar mais sensiveis ¢ tolerantes em relacdo a diversidade, dai decorrendo sentidos afia~ dos e olhos abertos para novos horizontes além das experiéncias imediatas, a fim de que possamos explorar condigdes humanas até entio relativamente invisiveis. Tendo compreendide melhor ‘© modo como surgiram os aspectos aparentemente naturais, inevitavei, imutaveis e permanentes de nossas vidas ~ mediante % ‘Aprendendo » persar com asociologia exercicio de poder e meios humanos ~,nos parecer muito mais dificil aceitar que eles sejam imunes e impenetravels a agdes subsequentes ~incluindo af as nossas prdprias agdes, ‘0 pensamento sociolégico, como um poder antifixagio, & ‘dessa maneira, um poder em seu proprio direito, Ele torna fle~ xivel aquilo que pode ter sido a fixider opressiva das relagoes sociais e, a0 fazer isso, abre un mundo de possibilidades. A arte de pensar sociologicamente consiste em ampliar 0 alcance ¢ a efetividade pritica da liberdade. Quanto mais disso aprender, mais o individuo ser4 flexivel diante da opressao ¢ do controle, ¢ portanto menos sujeito a manipulagao. E provével que ele tam- \bém se torne mais efetivo como ator social, uma vez que passa a ver conexdes entre suas ages € as condigdes sociais, assim como a possibilidade de transformagéo daquelas coisas que, por sua fixidez, se dizem imutaveis, mas estdo abertas & transformacao. Ha também o que se encontra para além de nés como individuos. Dissemos que a sociologia pensa de forma relacio- nal para nos situar em redes de relagGes sociais. Faz, assim, uma apologia do individuo, mas nao do individualism, Nesse senti- lo, pensar sociologicamente significa entender de um modo um pouco mais completo quem nos cerca, tanto em suas esperancas e desejos quanto em suas inquietagées ¢ preocupagoes. Podemos entio apreciar melhor o individuo humano contido nesse coleti- yo e talvez aprender a respeitar aquilo que toda sociedade civili- zada tem de garantir para se sustentar: 0 direito de cada membro do coletivo escolher e por em prtica maneiras de viver de acordo ‘com suas preferéncias. Isso significa selecionar seus projetos de vida, definir-se ¢ defender sua propria dignidade, assim como os demais defen- dema deles, diante de obsticulos com que todos se deparam, em variados graus. Pensar sociologicamente, ento, tem um poten- cial para promover a solidariedade entre nés, uma solidarieda- de fundada em compreensio e respeito miituos, em resisténcia conjunta ao sofrimento e em partilhada condenacao das cruel- dades que o causam. Finalmente, se for conquistada, a causa da Inroducie 2 liberdade ser muito ampliada, posto que elevada ao patamar de causa comum. De volta ao que estévamos falando, a respeito da fluidez daquilo que parece inflexivel, 0 insight sociologico sobre a logica interna eo sentido das formas de viver diferentes da nossa podem nos levar a pensar de novo sobre os limites estabeleci: dos entre nds e as outros. Uma nova compreensdo gerada des sa maneira pode tornar nossa comunicagio com “os outros” ‘ais facil e mais inclinada a conduzir ao méituo entendimento. Medo ¢ antagonismo podem ser substituidos por tolerincia. ‘Nao ha maior garantia de liberdade individual que a liberdade de todos. Dar-se conta da conexio entre as liberdades individual e coletiva tem um efeito desestabilizador sobre as relagoes de po- der existentes ou sobreo gue muitas vezes chamamos de“ordens sociais” £ por essa razdo que acusacbes de “deslealdade politica” silo feitas contra a sociologia por parte de governos e outros de- tentores de poder que mantém o controle da ordem social. Iss0 bastante evidente naqueles governos que buscam moldar a rea~ lidade em seu nome, alegando-se representantes, sem problema algum com relagao a0 estado de coisas em vigor, como se ele fosse natural; ou que castigam as condigGes contempordneas por ‘meio de nostilgicos convites a uma era passada, mitica, na qual todos conheciam seus lugares na sociedade. Quando testemunhamos mais uma campanha contra o“im- pacto subversivo” da sociologia, podemos presumir que aqucles que querem governar por decreto preparam outro ataque & capacidade dos sujeitos de resistir & coercitiva regulagao da vida individual. Tais campanhas em geral coincidem com medidas agressivas que miram as formas sobreviventes de autogeréncia e autodefesa de direitos coletivos; visam, em outras palavras, as fundagbes coletivas da liberdade individual. Diz-se as vezes que a sociologia € 0 poder dos sem poder. Isso nem sempre é 0 caso, em particular nos lugares onde os pra~ ticantes se encontram sob crescentes presses para se adequar as expectativas governamentais. Nao ha garantia de que, tendo at 28 [Aprendendo 2 pensar com a secologis adquirido entendimento sociolégico, alguém possa dissolver e destituir o poder das “drduas realidades” da vida. O poder da compreensio niio € pareo para as presses da coer¢io, aiadas a0 ‘senso comin resignado e submisso sob condigdes econdmicas e politicas dominantes. Nao fosse, porém, por esse entendimento, as chances de administragao bem-sucedida da vida de alguém da administragao coletiva das condigées partilhadas de vida seriam ainda menores. Trata-se de uma forma de pensar s6 valotizada positivamente por aqueles que nao a podem consi- derar indiscutivel; quando se trata daqueles que podem, é quase sempre subavaliada, O contetido deste livro Este livro foi escrito com o objetivo de ajudar as pessoas a enten- der suas experiéncias pessoais em si mesmas ¢ com os outros. Ao fazer isso, mostra como os aspectos aparentemente familiares da ‘vida podem ser interpretados de maneiras diferentes ¢ inovado- ras. Cada capitulo aborda questées que sao parte de nossa vida cotidiana, mesmo que nao se encontrem na linha de frente de nossa compreensio do dia a dia, Blas dizem respeito a maneiras, de ver € aos dilemas ¢ escolhas com que rotineiramente depara- _mos, mas sobre os quais temos pouco tempo ou oportunidade de refletir. Nosso objetivo &, assim, conduzir o pensamento nes- ses termos, e nao segundo um “pensamento correto”, Queremos ampliar 0 horizontes de compreensio, mas nao para corrigit alguma nogdo de erro, com uma ideia de verdade inquestioné- yal. No processo, esperamos encorajar uma atitude questiona~ dora, na qual entender os outros nos permite melhor entender a 1nés mesmos com os outros. Este livro € diferente de grande parte dos demais, porque 6 organizado de acordo com questdes que conformam nosso cotidiano, He temas que interessam a sociélogos profissionais no curso de suas préticas, mas que sfo brevemente mencio- nados ou mesmo inteiramente omitidos, como, por exemplo, Introdugio B a metodologia de pesquisa para o estudo da vida social. Trata~ se de um comentério sociolégico sobre temas que integram diretamente nossa experiéncia didria, cuja divisio em partes ¢ capftulos pautou-se por esse conceito. Neste guia, nossa narrati- va sociolégica nao seré desenvolvida de maneira linear, porque retornamos a alguns t6picos ao longo do texto. Por exemplo, a identidade social aparecerd sob muitas formas nos diversos capitulos, pois ¢ assim que o esforso de compreensio funciona za pritica, Afinal, quando examinamos um novo tema, ele vai re- velande novas questoes e, assim, trazendo para a luz aquelas que ainda nao haviamos considerado. Como assinalamos, isso € parte de um processo no qual adquitimos maior conhecimento ~ uma tarefa sem-fim. Questées para refletic 4. Vocé acredita que haja uma ciéncia do senso comum e/ou uma visio de senso comum da ciéncia? 2.Se Ihe pedissem para definir a disciplina da sociologia em apenas duas frases, 0 que voce ditia e por qué? 3. Quais sao os beneficios e os perigos associados ao processo de “desfamiliarizacao"? 4.0 senso €“comum”? Sugestdes de leitura Benen, Peter. L. e Hansfried Kellner. Sociology Reinterpreted: An Essay (on Method and Vocation, Harmondsworth, Penguin, 1982. Esso livro, saguindo o caminho aberts pela obra anterior de Barger, Perspectivas sociolégicas: uma visdo humanista, analisa temas comoa libercade e 2 “cientfizagao" da vida social Gippens, Anthony. Sociologia. Porto Alegre, Artmed, 2005 (Sociology, 4 ed, Cambridge, Polity, 2001,] Uma visio geral explicativa da sociologia. 20 ‘Aprendendo @ pensar com a sociologia Max, Tim, Pesquisa social: questies, métodos e processos. Porto Alegre, Artmed, 2004. (Social Research: Issues, Methods and Process, 3 ed. Buckingham, Open University Press, 2001.) Se aqui nao nos detivemos em metedelogia de pesquisa, para quem se interessar, esse livro fornece um passaio pelos métodos @ perspectivas lempregados em pesquisa social. Matis, C.Wiight. The Sociological Imagination. Harmondsworth, Pen- guin, 1970 [1959]. Edigao brasileira: Sobre o artesanato intelectual € outras ensais, Rio de Janeiro, Zabar, 2009 (0s artigos “Sobre 0 artesanato intelectual” “A promessa”) Embora paraga datado, 6 ainda um clasico sociolégico @ 0 ultimo capitulo antecipa o tems da Yambivaléncia’

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