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CRIMES SEM PUNIÇÃO


Filho do ex. director do Gabinete de Nito Alves quebra silêncio
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data20 de junho de 2008 09:55


assunto: Filho do ex. director do Gabinete de Nito Alves quebra silêncio
enviado pornetcabo.pt

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Vale a pena ler ... e sentir !!!!

Repasso...
Filho do ex – director do Gabinete de Nito Alves quebra silêncio

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29-May-2008
Lisboa - Chamo-me Rui Tukayana. Tenho 30 anos e nasci em Angola, quando esta já
era uma nação livre e independente. Do meu pai herdei o meu primeiro nome próprio:
Rui. Ele chamava-se Rui Coelho. Fruto do que aconteceu, faz hoje 31 anos, a minha
mãe escolheu o meu segundo nome próprio: Tukayana. Esta é uma palavra em
Kimbundo, um dialecto angolano, que quer dizer "venceremos". Chamo-me, portanto,
Rui Venceremos.
A 27 de Maio de 77, ainda eu não tinha nascido, Luanda acorda ao som de tiros. A
população estava nas ruas e havia uma marcha em direcção ao palácio presidencial.
Hoje em dia a opinião geral é que se tratava de uma tentativa de golpe de estado
liderada por dois homens: Nito Alves e José Van Dunen.
O meu pai era muito próximo de Nito Alves. Enquanto ele (o Nito Alves) foi Ministro
da Administração Interna, o meu pai foi o seu chefe de gabinete. A tentativa de golpe,
se é que a houve, correu mal e a rebelião foi esmagada. Agostinho Neto, o presidente
angolano na altura, disse qualquer coisa como "não perderemos tempo com
julgamentos". E assim foi.Logo na noite de 27 de Maio a DISA, a polícia politica,
começou as buscas às casas. O meu pai não estava em Angola nesse dia. Estava noutro
país ao serviço do Governo. Chegou apenas um dia depois (a 28) e não dormiu em casa.
Não era seguro. No dia seguinte, 29 de Maio, ele e a minha mãe (grávida de 7 meses)
foram presos. À entrada da prisão foram separados. Nunca mais se viram.
A minha mãe, talvez por estar grávida, foi solta pouco depois. O meu pai não teve a
mesma sorte. Foi espancado, torturado e, perante um tribunal, obrigado a confessar
crimes. Não perderemos tempo com julgamentos. Esta espécie de tribunal, ficou
conhecida como a Comissão das Lágrimas. Um dos interrogadores era o Pepetela, um
(actualmente) conhecidíssimo escritor angolano.
Após o julgamento a TV angolana ainda mostrou o meu pai (Rui Coelho) como um
troféu da DISA e do MPLA. Depois fuzilaram-no. No meio de tudo isto, eu ainda tive
alguma sorte. Primeiro, porque sobrevivi. Segundo, porque a minha mãe sobreviveu.
Terceiro, porque depois de dias à porta de um ministro, a minha mãe conseguiu obter
uma certidão de óbito. Ainda hoje não sabemos onde estão os seus restos, se numa vala
comum, se no meio da selva, mas mesmo assim lá se fez uma espécie de luto.
Depois do dia 27 de Maio de 1977, seguiram-se dois anos de terror, repressão, prisões e
execuções. Acredita-se que, como o meu pai, outras 30 mil pessoas desapareceram. 30
mil mortos. 30 mil pessoas que, talvez por não terem sido mostradas como troféus na
TV, as respectivas famílias ainda não receberam uma certidão de óbito, ou não se sabe
onde estão os restos mortais. Lembro que Pinochet "apenas" é responsável pelo
desaparecimento de 3 mil e é um monstro aos olhos de todo o mundo civilizado.
É evidente que nem todos os que foram presos, foram mortos. Os sobreviventes, nós,
criámos uma associação. A ideia é que ninguém esqueça o que se passou e que um dia
se faça justiça e as vítimas sejam homenageadas de alguma forma. Recuperar e
identificar os restos mortais parece-me mais difícil, mas quem sabe?
É este o dia, 27 de Maio, que escolhi para fazer o luto ao meu pai. Não sei quando
morreu. Sei apenas que tinha 25 anos quando foi morto, menos cinco do que a minha
idade actual. Dizem-me que soube que teve um filho (nasci em Agosto). Um rapaz.
Quero acreditar que sim.
Todos os anos, neste dia, lhe digo a mesma coisa:
Rui, Tukayana.
Pai, venceremos.
Venceremos.
Rui Coelho - Um retrato

02.10.2005
Nasceu na Catumbela, viveu no Lobito, brincou nos mangais, cresceu, estudou no
Compão, fez a Universidade em Lisboa, ensinou em Luanda. Voltou ao Lobito para
casar. Amou Angola. Nunca chegou a conhecer o filho. Da sua execução não se
conhecem local, data ou circunstâncias. Tinha 25 anos. Sobrou uma certidão de óbito,
lágrimas, saudades e revolta.
O Rui Coelho, familiarmente conhecido por Zeca, era o terceiro de seis filhos. Nasceu
em casa, na Catumbela (República Popular de Angola), a 31 de Março de 1952. O
Bilhete de Identidade registava, contudo, como data de nascimento, o dia 21 de Março.

Na memória familiar, ficaram os seus bonitos caracóis loiros - cortados pelo mano Luís,
inspirado por algum cabeleireiro, com enorme desgosto da mãe: não tinha havido
oportunidade de uma fotografia que os fixassem para a posteridade…!!!
Antes da escola primária, feita no Colégio Manuel de Arriaga (à época, localizado no
antigo mercado do Lobito), frequentou a pré - primária nas Madres Doroteias. Que, na
altura, ele próprio descrevia como "umas meninas de brincar como as outras, que depois
se vestiam de bruxas e iam para madres". Um comentário tecido perante a mãe, quem
sabe… a tentar justificar uma mordidela no rabo (ou terá sido na mão?) de uma das
freiras. Episódios familiares…

Apesar de ter nascido na Catumbela, a maior parte da infância e adolescência viveu-a no


Lobito. Os mangais por detrás da antiga 28 de Maio (ainda não existia a rua 15 de
Agosto) eram o paraíso da garotada. Aí se apanhavam os caranguejos que eram trazidos
para casa (no antigo prédio do Figueiredo, ao pé da Robiallac) como se de cachorros se
tratassem: amarrados numa das patas com um cordel eram transportados à trela pela
miudagem, e lá estava o Zeca… O futebol e o jogo do arco (com os aros dos barris da
mercearia do pai) foram outras das suas brincadeiras de infância.

Desde muito cedo que manifestou o seu gosto pela leitura. Na casa da família o acesso
aos livros era fácil, não havia proibições, era possível ler de tudo: clássicos da literatura
portuguesa e estrangeira, atlas, histórias aos quadradinhos, livros mais científicos como
a farmacopeia - a mãe era farmacêutica e, com o pai, co-proprietária da Farmácia
Lobito. Tudo era "devorado", Camilo Castelo Branco, Rip Kirby, Eça de Queirós, Ene
3, Karl May… e muitos outros livros emprestados ou deixados em casa pelos muitos
amigos.

A curiosidade natural e a inteligência do Rui foram ainda mais espicaçadas pelas


histórias (e os sempre oportunos remoques e observações) da mãe e pelos passeios, idas
à praia, viagens e cantorias proporcionadas pelo pai. As idas ao Cubal, à Ganda, ao
Cavimbe, a Novo Redondo ou a Benguela constituíam-se em verdadeiras aulas de
Botânica e Zoologia, sempre estabelecendo pontes e relacionamentos com a fauna, flora
e geografia de Portugal ou de outras partes do mundo…

As surtidas à Fazenda Agrícola da Lunda, propriedade da firma Simões Coelho de


Benguela (onde o padrinho era funcionário), proporcionaram-lhe contacto com a
realidade da vida nas fazendas e com a caça (capotas, gulungos, cabras do mato etc.).
Amândio Ribeiro - gerente da fazenda, grande amigo da família, excelente caçador e
bom contador de histórias - juntamente com a sua esposa, D. Helena, proporcionaram-
lhe férias inesquecíveis. Quase tão inesquecíveis como aquela ida à fazenda do
Cavimbe, propriedade de José e Cândida Marques: A Bela, a Teresinha e o Rui
Marques, filhos desse casal amigo dos seus pais ficariam como companheiros quase
fraternais da infância do Rui Coelho.
A estes, teríamos de juntar outros, como o Mandito e o Rui (filhos dos seus padrinhos
de baptismo, D. Adelaide e Sr Licínio Barata, de Benguela) que juntamente com os
Portela Marques, constituiriam algumas das amizades que ele iria preservar ao longo do
tempo.
O liceu, começou por frequentá-lo ainda ele funcionava na Associação Comercial do
Lobito e, a partir do 5º ano, já no edifício novo do Liceu Almirante Lopes Alves, no
Compão. Desses tempos ficou a recordação dos relatos cheios de sentido de humor -
feitos pelo Rui e seu mano Luís, sobre as aulas do professor de Físico-Química,
carinhosamente apelidado pelos alunos de "Barbeiro" - que tornavam os jantares em
família num delicioso divertimento. Um sentido de humor também condensado naquela
resposta a uma determinada professora quando, sendo-lhe perguntado o nome,
responde: Rói Jorge Pratos de Massa Cotovelo (em vez do Rui José Pinto de Matos
Coelho que lhe tinha cabido em sorte na pia baptismal).
Já nesta fase da vida ele começava a evidenciar capacidades de liderança à mistura com
uma personalidade forte. Recorde-se aquela vez em que, nomeado chefe de turma e
depois de uma aula onde os colegas se terão portado menos bem e sujado a sala, a
Directora de Ciclo lhe ordena que limpe aquela sujidade. Recusa-se, dizendo que não
tinha sido ele a sujar e que era Chefe de Turma e não varredor…!!!

O liceu é também tempo de novas amizades, já fora do círculo de relações da família: o


Tá–hy Viana, a Mila "Brasileira", o Vasco e a Elisa Afonso, o César, o Castelão, o
Patoilo, o Filipe Campos e o Filipe Nascimento engrossam o lote dos seus amigos. E é
também no liceu que conhece aquela que (mais tarde, em Abril de 1975) passará a ser a
sua mulher: a Mila Ferreira, conhecida lá por casa como Mila 18, numa referência a
uma personagem de um livro de Leon Uris.
Com o mano Luís e os amigos Filipes, participava nos vários concursos promovidos por
programas do Rádio Clube do Lobito. Eram noites divertidas em que os almanaques de
casa voavam ao sabor das perguntas. E vai acumulando vários prémios, nomeadamente
um conjunto de cadeiras de varanda, com a sua deliciosa espreguiçadeira…adereços que
passaram a adornar a varanda da casa dos pais…
Constituiria (com o Gil, O Fililipe C. e o Castelão) o grupo Aquela Máquina que
manteve uma intervenção activa na área da crítica musical através dos textos difundidos
na rádio. Ficou conhecido em boa parte de Angola (graça às emissões de onda curta) e
apresentava a particularidade de a identidade dos seus componentes permanecer,
durante muito tempo, desconhecida. Da escuta das emissões internacionais de diversas
rádios, retiravam a informação que lhes permitia sustentar a referência ás correntes e aos
grupos musicais mais avançados do momento.
Nas férias, com o Luís Coelho e com os Filipes, ajuda o pai na farmácia e na mercearia.
O resto do tempo livre era gasto com passeios à volta do Mercado, com as jornadas de
ping-pong no Lobito Sports Club, sem perder, à noite, o Cine-Esplanada Flamingo.
Claro que, antes da ida ao cinema, havia que fazer sempre uma incursão pela pastelaria
Áurea. A apetência fílmica vai desenvolver-se durante os tempos de faculdade, com o
gosto pela sétima arte a ser cimentado pelo acesso mais fácil aos "Cahiers du Cinéma".
Muitas vezes, depois da ida ao cinema, vinham as caçadas nocturnas na estrada Lobito–
Luanda, nas chamadas anharas de Novo Redondo. À companhia do irmão e dos Filipes
acrescentava-se o Patoilo e lá vinham as caçadas de estrada com o tal farolim - que mais
tarde viria a ser banido mas que naquela altura estava muito em voga! E tudo acabava
em grandes patuscadas com os amigos. As mães é que achavam menos graça devido ao
trabalho suplementar que tais façanhas lhes acarretavam.
Era durante as férias que se juntavam todos nos acampamentos na Ponta da Restinga.
Tempo de convívio e divertimento, mas também de afirmação de necessidade de
autonomia e independência. Para os irmãos mais novos, então, era um deslumbramento:
entre as emoções de preparativos e montagem e as histórias de contar noite fora…
O gosto pela língua inglesa desenvolveu-o no liceu. O facto de viver numa cidade
portuária e cosmopolita permitiu-lhe treinar a conversação com estrangeiros que aí
chegavam e aprofundar o treino da escrita com os correspondentes que foi arranjando e
que o ajudaram ainda a enriquecer a sua colecção de selos, naquele que foi outro dos
seus hobbies: a filatelia.
A formação católica, inculcada pela mãe, vai conduzi-lo, nesta fase da vida, à JEC
(Juventude Estudantil Católica). Os padres D. Celso e Jorge deixaram marcas profundas
nos jovens que acorriam à sede da JEC, na Rua 28 de Maio. Aí o Rui Coelho vai
complementar a sua formação religiosa, participar em encontros de jovens, acompanhar
as visitas aos hospitais e visitar os detidos na prisão. Alguns anos mais tarde virá,
porém, a pôr em causa o papel da Igreja e afastar-se-á das práticas religiosas.
Mas a JEC servia também de ponto de encontro dos jovens e de ocupação dos tempos
livres. Conversava-se, jogava-se ao monopólio e à sueca e organizava-se a biblioteca. É
aqui que desenvolve o gosto pelo xadrez. O amigo Calicas ensina-o e incute-lhe o gosto
por este jogo. Consultando livros, estuda os diferentes tipos de aberturas possíveis num
jogo de xadrez. Torna-se um bom jogador. O Calicas nunca mais lhe consegue ganhar
um jogo. De referir que, para ele, os livros lhe permitiam aprender tudo, inclusive a
dançar: quando decide que quer aprender a dançar o Twist, a Valsa ou o Tango, compra
um livro… e durante uns tempos dedica-se à aprendizagem da dança, transformando em
cobaias os irmãos mais novos…
O Rui era estudioso (estudava falando alto e andando de um lado para o outro),
inteligente e bom aluno. Tantos e tão diversificados interesses permitem-lhe também
que todo o seu percurso escolar seja feito de uma forma fácil e sem percalços. Aliás,
com um pequeno percalço: o do Latim no 7º ano - rapidamente superado com umas
explicações nas férias. No exame de segunda época obtém, facilmente, 19 valores!
No ano lectivo de 1969/1970, vai para Lisboa, para fazer o curso de Direito. Os
primeiros tempos são de adaptação: à faculdade, ao lar universitário (no Lumiar), aos
almoços e jantares nas cantinas universitárias e ao clima. Estranhou, sobretudo, o frio.
Nas férias do Natal (em casa dos avós, na Beira Alta, ao pé da serra da Estrela) dorme,
por vezes, de sobretudo.

Em Lisboa ele reencontra antigos amigos de Angola, faz novos conhecimentos, trava
novas amizades. A Portugal tinham chegado os ecos do Maio de 68, os movimentos
estudantis em Coimbra e Lisboa transportavam ventos de mudança e renovação, vivia-
se em plena fase de lutas académicas, a Oposição Democrática faz campanha nas
eleições para a Assembleia Nacional mas não se apresenta às urnas, denunciando o
estado de Ditadura e a burla eleitoral.
Nos finais de 1970 a mãe vai de licença graciosa a Portugal (com os filhos mais novos).
Aluga um apartamento no Campo Grande: saía mais barato ter os filhos, que estavam na
Universidade, todos juntos numa casa do que cada um em seu lar. E como o
apartamento ficava muito próximo das faculdades de Direito e Letras, o Rui e a irmã
mais velha nem precisavam sequer de utilizar transportes. Nessa altura, o mano Luís,
que frequentava Engenharia em Luanda, vem também para Portugal.
E a casa do Campo Grande estava situada num ponto estratégico: mesmo ao lado da
Residência Feminina das Estudantes Ultramarinas, e a uma centena de metros da
"Gôndola", café de longas conversas e de encontros de muita gente ligada a África e
que, frequentemente, era local de refúgio de estudantes em debandada à frente dos
cavalos da Guarda Republicana nas manifes da Cidade Universitária. Ao lado do café, a
antiga barbearia dera lugar a uma tabacaria com livros… Aí se conseguia - às
escondidas - encomendar quase tudo. Não espantava, por isso, que o apartamento do
Campo Grande começasse a abarrotar de literatura sobre a guerra do Vietname ou as
lutas na Irlanda, à mistura com os livros sobre as revoluções na Rússia ou na América
Latina, os poetas de Libertação africana… E o quarto dele vai-se forrando com os
posters de Ho Chi Min e de Che Guevara.
São tempos de grande companheirismo, entre as noites no "Apolo 70″ ou até às tantas
na "Alga", tempos dos Festivais de Jazz em Cascais, com música e polícia de choque à
mistura, a espiral frenética dos meetings, dos plenários, dos concertos improvisados
com Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira, mas são também os tempos do culto
do cinema, da casa sempre inundada de gente e envolta numa imensa nuvem de fumo de
cigarro, com intermináveis discussões políticas entremeadas de partidas de xadrez…
Nos intervalos… havia as aulas da Faculdade e os exames que sempre foi cumprindo.
Quando regressou a Angola, em 1973, só lhe faltava uma ou duas cadeiras para terminar
Direito. Instalado em Luanda, inicia uma carreira de Professor. Casa-se em 1975.

Em Outubro de 1975, a mãe e os irmãos mais novos vêm para Portugal. O Rui fica em
Angola - só o voltaríamos a ver em Junho de 1976, já nessa altura cidadão Angolano ao
serviço do Ministério da Administração Interna (Gabinete de Estudos). Chegou bastante
magro, instalou-se de novo no Campo Grande com a família. Foi a última vez que
esteve com a mãe e os irmãos. Foi a última vez que o vimos.
Quando se dá o 27 de Maio, ficámos alarmados com as notícias do que se estava a
passar em Angola. Mais alarmados ficámos quando começámos a ver a fotografia do
Rui nos jornais. Não queríamos acreditar no que se estava a passar, nem nas acusações
de que era alvo o Rui, que tinha querido ficar em Angola porque a amava e a queria
ajudar a construir. As comunicações entre Lisboa e Angola eram muito complicadas,
frequentemente quase impossíveis: não conseguíamos falar para o Lobito onde estava o
pai do Rui, não conseguíamos falar com a Mila Ferreira.
Um dia, finalmente, conseguimos contactar uma pessoa amiga que vivia em Luanda.
Não nos queria dizer nada, sentia-se-lhe o medo na voz, não podia falar… Tempos
difíceis, tempos de ansiedade, de angústia, de desespero aqui e ali pontuados com
alguma réstea de esperança no meio de indicações tão contraditórias…
A mãe escreve uma carta à mulher do então Presidente da República Portuguesa com o
objectivo de ela interceder junto do marido para buscar informações e apoiar se
necessário uma actuação em defesa de Direitos Humanos. Escreve também à Cruz
Vermelha Portuguesa solicitando informações. Porque, até nós, só chegavam boatos
dizendo que ele estava na prisão A, tinha sido visto na prisão B ou já fora transferido
para a prisão C…
Depois de meses de solicitações, de pedidos, de insistências várias, a única informação
oficial que obtivemos veio através de um frio telegrama da Cruz Vermelha Portuguesa:
aí se anunciava, de forma crua, que ele estava morto. Ninguém queria acreditar. A mãe
não se conforma. Recusa-se a aceitar a notícia do assassínio do seu filho… Em 1977,
ele, quase advogado e defensor de causas, preso, sem culpa formada, apresentado como
suspeito de delito de opinião, condenado à morte sem direito a defesa ou a julgamento
justo??? Ele, que nem se encontrava em Angola aquando do 27 de Maio???
Recusámo-nos a acreditar e aceitar, até que recebemos a notícia (já em 1978), de que se
tinha conseguido obter uma Certidão de Óbito que referia a sua morte. Ironia do
destino, neste capítulo até fomos privilegiados: alguns dos desaparecidos no 27 de Maio
nunca conseguiram qualquer documento que comprovasse a sua execução!!!
Durante muito tempo não fomos capazes sequer de dar a notícia à nossa mãe. Foi a
Mila, a filha mais velha, que o viria a fazer. E jamais poderemos esquecer os gritos, as
lágrimas e a dor de uma mãe quando recebe a notícia de que o seu filho foi assassinado,
sem que nada (nem ninguém) o pudesse explicar e, muito menos, justificar.
No meio de toda aquela dor, de todo aquele desespero, apenas a boa notícia, a alegria de
sabermos que o nosso pai, o Coelho da farmácia Lobito, consegue trazer o Ruca
Tukayana (filho do Rui Coelho, e já então com seis meses), para Portugal, para a
segurança e o carinho da restante família.
O desespero, a não aceitação dos factos, a impossibilidade de se saber em concreto o
que se passou, tornam-nos ainda hoje extremamente difícil esta narrativa. É difícil falar
da dor… mas ainda é mais difícil falar de uma coisa que não se entende nem se
compreende. Porque foi morto o Rui, ele que nunca atentou contra ninguém? Que não
pode ser acusado de crimes de sangue ou de actos de violência fosse contra quem
fosse…???
Continua a ser difícil falar disto tudo. Mas estamos num tempo em que é necessário e
urgente saber-se o que se passou. Exigimos que as circunstâncias do seu assassínio
sejam esclarecidas e que os seus responsáveis sejam encontrados. Se Angola quer
abraçar os princípios da convivência internacional não poderá escusar-se às regras de
investigação dos Tribunais Internacionais. E nós, irmãos (os pais já faleceram) exigimos
saber o que aconteceu (e como aconteceu) porque nada poderá justificar o assassínio do
Rui Coelho.
Ele estará sempre na nossa memória, no nosso coração. Aquela saudável teimosia,
aquela viva inteligência, o gosto pela leitura, pelo cinema, pelo xadrez e pela filatelia, a
curiosidade e o interesse pelas questões sócio - políticas e pelo mundo à sua volta,
aquela sede de vida e de amizade, aquele carácter carinhoso… não, não esquecemos…
nem perdoamos!
Não há vidas sem história. E esta é a história de uma vida: curta, precocemente
interrompida, ceifada de forma cruel, cobarde, à margem de todo o Direito Internacional
e contrariando todos os princípios de defesa dos Direitos Humanos. Um crime
inominável que lhe roubou a vida e com o qual todos perdemos: perdeu Angola que ele
amou e por quem trabalhou e lutou, perderam os pais e irmãos, perdeu a mulher e o
filho que ele nunca chegou a conhecer.
Este pequeno retrato foi feito a várias mãos. Teve o contributo das informações, das
opiniões e dos relatos dos amigos (mais ou menos próximos) e dos familiares. Ele
constitui, sobretudo, uma pequena homenagem a um jovem idealista e generoso, que
lutou por um mundo mais justo e melhor, que lutou, em suma, pelos seus ideais.
*Maria da Conceição Coelho (irmã)
Fonte: Associação 27 de Maio

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Comentários (14)

1. 29-05-2008 16:54
lagrimei
Nao tenho palavras,perdi tb muitas familias.E a dor é imensa e nunca iremos esquecer
os nossos ente queridos.Deus salve a Angola dos criminosos.
Visitante

angolano na alemanha
2. 29-05-2008 16:54
lagrimei
R.I.P
Visitante

yano

3. 29-05-2008 18:51
Chorei muito
Só devo citar as palavras de um grande humanista:
" que me preocupa não é o grito dos violentos. É o silêncio dos bons."

Martin Luther King


Visitante

A para o Z
4. 29-05-2008 18:54
27 de maio de 1977
Isto que lemos é apenas uma estória triste de um filho e esposa de mais um dos milhares
que foram executados pura e simplesmente a mando do Presidente Neto.

Há livros (pelo menos quatro) publicados em Portugal sobre o tema que eu descrevi em
parte no meu site.

E alguns chamam ao defunto Agostinho Neto o "pai da nação angolana".

Por tudo que li e escrevi no meu site que todos conhecem pois o logo está aqui neste
portal, eu chamar-lhe-ia o "carrasco da nação angolana".

O general cubano no exílio Del Pino descreve bem quem foi Agostinho Neto no texto
27 de Maio explicação política.

Podereis ler isso e muito mais no meu site.

Kota
Visitante

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5. 29-05-2008 19:09
Que pensamentos que provocam lagrimas
Bem, eu conheco alguem que sofreu mas felizmente teve sorte de sair de ai vivo nao sei
como mas ele chora quando chega estas datas e nao esquece a morte dos amigos.
Agostinho Neto fez merdas e cultivou a guerra que depois levou ao inferno milhoes de
Angolanos e a crise em si e hoje estamos pagando a baixaria do Neto.
Neto nao confiou em ninguem e apenas provocou tribalismo em Angola e matou os que
eram diferente a ele e como ditado explica todo que nasce morre e ele esqueceu que iria
deixando detras uma Eugenia Neto podrecendo nas ruas de Angola e filhos que nao tem
quase poder na terra dos Angolanos.
Justica é cega e nos paises pobres esta nas maos dos criminosos e assassinos sem
sentimentos e nao parecem humanos e me pergunto o que educam nos seus filhos estes
criminosos.
A morte do Neto evitaria as tantas de mortes que houve na guerra e hoje por crises, JES
nao chegaria a ser presidente e estaria estudando engenheria ate hoje mas
lamentavelmente salvou e triste morreu antes deixando-nos onde estamos.
Criou o mau ambiente com o pessoal do Uige quando declara publicamente que os
Uigenses comiam pessoas coisa de louco e hoje certos lerdos ainda acreditam na sua
palavras mas quem sabe que somos gente educada e inteligentes sempre dira Neto
apenas criou cagada.
Deu para sentir a dor de uma filha que viu como o seu pai sofreu por ser o que era e nao
porque foi culpado.
Senti muito e deixo espaco para os demais.
Neto to hell forever
Visitante

Coracao Uigense
6. 29-05-2008 22:55
tristes verdades

aqui está vertido todo o drama de angola...neste caso a angola de pele branca, cuja
estória de infortúnio ombreia com adepele negra e com a mestiçagem intermédia...
que triste sina a deser angolano....
Visitante

Mandachuva

7. 29-05-2008 23:13
não se apaga o fogo com a gasolina
meu caro compatriota, Tukayana falando como Bantu, significa DIVIDIMOS,e por
outra, Kimbundo é lingua e não dialecto, quem defende esta tese é Movimento Viva
Angola.Portanto, meu caro Tukayana,tens um bonito nome, que em kikongo significa
não comes sozinho mas divide com outro, porque o outro também tem fome, durante o
dia não comeu nada. No entanto, convido o caro Tukayana para partilhar na
reconstrução numa angola prospera de direito onde os vindouros possam encontrar uma
angola melhor uma angola que os nossos avós sonharam.Estamos condenados a
construir a unidade na diferença.A minha avó sempre desde muito cedo do meu
crescimento, KE VENA KANDA YANDIKULU YONDI TELELA VO MUNTÚ?
UNFUNUN KENA VENA KANDA,KAKADI NDOKI, I Z E N Z I MATA,
YTOLU,YPUMBULU POOFÚ, PÚKUTO...São todos necessários, por isso o Grande
dilema do MVA-Movimento Viva Angola, é encontrar solução dos nossos problemas
que já são muitos,logo, a formula é MVA uma associação sediado em todo mundo onde
se encontram angolanose amigos de angola,amantes da paz da justiça, dependentemente
da sua cor partidaia crença,raça,etc... Oque MvA e para que isso fica é encontrar em
conjunto as soluçoes dos nossos problemas no espirito de amor de fraternidade e
solidariedade.Peço lhe mais uma véz a unica prende que podes ofercer nos nossos enter
queridos é ver uma angola melhor e atribuir o nome do seu querido, nos teus filhos.
Coragem Deus que te abençoa. VIVA ANGOLA.
Visitante

viva angola
8. 30-05-2008 05:46
Vai chegar o momento
O 27 de Maio foi uma verdadeira tragedia para Angola,toda responsabilidade deve ser
atribuida a Agostinho Neto,enquanto lider do MPLA,porém outros culpados,em ambos
lados estão vivos.
O meu tio,comandante Bula Matadi,foi assassinado e queimado pelos
fraccionistas,quem ja contou aqui o que aconteceu com ele.
Devo também pedir contas aos membros da Associação 27 de Maio,porque como o
Tukayana,a minha prima viveu orfã a vida toda,e o sistema até esqueceu-se dela,as
culpas são dividadas,entre os golpistas e os seus algozes.
Porém devemos como Angolanos ultrapassar estas diferenças e projectar uma futuro
melhor para este país.
Não queremos aqui novos 27 de Maios,queremos,paz,prosperidade e unidade para a
reconstrução e desenvolvimento deste país.
Visitante

Ntondele

9. 30-05-2008 07:35
Vai chegar o momento
O PEPETELA FOI O PIOR CARASCO DOS ANGOLANOS; ELE È UM
VERDADEIRO ASSASSINO.

Visitante

PIZDIET
10. 30-05-2008 10:42
lamentacoes
mano,coragem, temos apenas q esperar pelo tempo so ele pode apagar as magoas do
passado,.espero pacientemente q no proximo governo ja nao haja pessoas caducas e
analfabetas a governar angola.e q tu eu e outras pessoas sa possamos dar o nosso
contributo para edificar este grande pais
Visitante

soares carlos
11. 30-05-2008 11:04
Tristeza triste
Exisem alguns que têm o mau hábito de que sempre que alguém expresse o seu
sentimento sobre o passado, no caso o 27 de Maio, a porque está a fomentar a discórdia,
está a dividir, etc. O 27 de Maio não foi brincadeira meus irmãos e quem pensa que
falar do 27, tal como foi é dividir, é porque não tem noção do que foi o 27, nesse caso
então calem-se. Obrigado pelo bonito e corajoso testemunho meu irmão.
Visitante

Calú
12. 30-05-2008 11:57
luanda
gostaria que o senhor dono do país se pronucie sobre isto,tens filhos os tefilhos estão
bem e nós vitimas deste massacre julgado por pepetela,recordo-me chorando quando a
dulce no palanca diz que o seu pai saíu com o ico carreira e até hoje não voltou,que
nome querem que chamemos a voces,bonszinhos ou criminosos um dia teremos uma
grupo muito +coeso,meu amigo rui venceremos juro venceremos faça o tudo que
poderes estaremos do teu lado,para acabarmos com este massacre que continua até
agora
Visitante

toy

13. 30-05-2008 14:52


Quem avisa seu amigo é!
O malogrado Mário Pinto Rodrigues Coelho de Andrade, um dos principais fundadores
do MPLA, alertou à Agostinho Neto a quem Mário considerou que este tinha
capacidades para dirigir o MPLA.Mas a partir daí Neto tornou - se egoísta, deixou de
ouvir conselhos. Chegou a mandar matar Mário quando este o conselhou a não seguir a
via que estava a seguir. Póis o resultado de tanta ganância foi o que todos nós
vimos....melhores cumprimentos
Visitante

anonimo
14. 30-05-2008 16:31
DESAFIA ,NÃO AO ÓDIO.
Estamos preparado espirtualmente,intelectualmente,cientificamente,politicament
e,tecnicamente para encontrarmos soluções crediveis para estabilidade do país sem
equivoco, a nossa grande missão é encontrar soluções dos nossos problemas que aligem
de dia a dia os nossos povos. O

...

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