Anda di halaman 1dari 1
Oh Os filhos do lixo 4 quem diga que dou esperanga; hi quem proteste que sou pessimisia. Eu digo quo ‘0s maiores otimistas s20 aqueles que. ape- sar do que vivem ou observam, continuam, apostando na vida, trabalhando, cultivando afe- tos e tendo projetos. As vezes, porém, escrevo com dor. Como hoje. ‘Acabo de assistir a uma reportagem sobre is do Brasil que vivem do lixo. Digamos que sto 0 lixo deste pafs, e nds permitimos ou ctiamos isso. Eu mesina jf vi com estes olhios gente morando junto de Hixoes, eeriangas disp {ando com urubus pedages de comida estragada para matar a fome. ‘A reportagem era uma hiscria de terror — mas verdadelra, nossa, dese pafs. Uma jovem de me- nos de 20 anos tazia numa caretnta feita de ma deiras Velhas seus ts flhos, de 4,2 € | ano, Che- gavam ap x20, € a maiorzinha, ja treinada, sata Catar coisas utels,sobnetudo comida, Logo estavam (0s és comendo, ea mae, indagada, explicou com simplicldade: “A gente tem de sobreviver, ne" “Gravei a tristeza, a resignagao, a imagem das criancas minitsculas e seminuas, contentes comendo lixo. Sentadas sobre o lixo. Uma cuidand do irmaozinho menor, que escalava a montanha de lixo. Criadas, como suas maes, acreditando que Deus queria isso” (© relato dessa quase adolesee © 0 de outras eram parecidos: todas com filhos pequenos, duas novamente grividas e, co- ‘mo diziam, vivendo a sua sina—como sua mae, © sua av, antes delas. Uma chorou, dizendo que ‘nha estudado até a 8" série, mas entdo precisou ajudar em casa e foi caarlixo, Iheres da fara, “Minna sina”, repetiu, e olhow a filha que amamentava. “E essa af?", perguntou a jomalista. “Essa af, bom, depende, tomara que ‘mo, mas Deus ¢ quem sale. Se Ele quise..” (s didlogos foram mais ou menos assim; repi- {o.de memoria, ndo gravel. Mas gravei a tristeza, a resignacfo, a imagem das eriangas mindsculas © semiinuas, contentes comendo Tixo, Sentadas s0- sect bre 0 Hixo. Ua eutdando do jem que escalava a montanha ée lixo. Cris, como sas mes, aereditando que Deus queria isso. io sel como ¢possfvelalgusm dizer que es- te pats vai bem enquanto esses ftos, € outros S2- melhantes, acontecem. Pois, sendo rk nossa. pic tra, nfo importa em que recanto for, tudo nos iz respeito, como nos dizem respeto & malanra- gem ea roubalheia, a mentira ea impunidade € 6 falso ufanismo. Ouvinnos a toda hora que nunca 6 pals esteve cdo bem. ALE que em algumas coi- 5, talvez muitas, melhoraios. Teno vacinas. Existem hospitals eensino publicos — ainda gue arasadse ruins. Temos alguns beneficie, como Aaposentadoria — embora miserivel —, eestabi- Tide econmica aparene. Andamos un poweo tals bem equipaos do que 100 anos ats Mas quem somos, afinal? Que pats somos, due genté nos tomamos, se vemos tudo isso ¢ Cowinuamos comendo, bebendo, rabalhando & estudando como se nem fosse conosco? Deve Ser © nosso jeto de sobreviver — no comendo lixo conereio, mas engolindo esse lixo moral ¢ fingindo que esté tudo bem. Pos, se nos conven cermos de que isso aconteze no n0ss0 meio, no rosso pis, falvez na nossa cidade, e nos senti- mos parte disso, responsiveis por is80, 0 que se poderia fazer? elo menos, reciamar. Achar que nem rudo esté maravilhoso, Procurar leger pessoas de bem. imeressa- das, que cuidassem dos lixdes, «dos pobrezinhos, da sade pa bie, dos leitos que fakam a0s milhares. des colégios despco vidos, de tudo iss0 que cansati- -va mas incansavelmente tantos do nés tém dito escrito. Que pelo menos a gente saiba e, em vez de distargar, espllte. Nao para ‘ria hostilidade e Gesordem, mas para rmudar um pouguinho essa mentlidade ‘Nunca mais eriangas brasileras sendo filhas 40 lixo, nem maes dizendo que aquela¢ a sua sina, porque Deus quer asi. DDeus ndo quer assim. Os deuses néo invent ram a indiferenga, a crueldade, o mal causado pelo homem. Nem mandaram desviar 0 olhatpa- rando vero menino metendo avikamentena boca restos de um bolo mofedo,talvez sua nia refe- 0 do dia. E, naguele instante, a edmera eapiou Sua irmizinna num grande soso inocente atris de um par de éculos cor-de-rosa que acabara de éncontrar:¢ assim se iluminou por um breve ins- ‘ante aquela imensa,usgica realidade 25 [DEAR 3010] VOR

Anda mungkin juga menyukai