Nesta seção detalha-se a descrição cinética do fluxo de tráfego veicular ao longo de uma
pista e introduz-se as quantidades fenomenológicas.
Todas as variáveis dependentes que descrevem o fluxo de tráfego são dimensionais e seus
valores normalizados no intervalo [0,1]. Em detalhes, as seguintes quantidades de referências
são introduzidas:
L é o comprimento da pista,
VM é a velocidade máxima e representa a velocidade de um veículo isolado movendo-se
em condições de tráfego livre,
ρ M é a densidade máxima de veículos que a pista suporta.
Com base nas quantidades dimensionais acima, as seguintes variáveis adimensionais são
introduzidas:
Nesta seção o fluxo de tráfego veicular é descrito, em geral, pela equação de evolução
representada por:
∂fi ∂f
+ vi i = Gi − Li , i = 1, 2,..., n , (7)
∂t ∂x
onde Gi e Li são respectivamente os termos de ganhos e de perdas do número de veículos
com velocidade vi depois da interação com um veículo com uma velocidade diferente. As
equações diferenciais parciais do sistema (7) para as funções de distribuição
fi ( x, t ), i = 1,..., n são compostas por quatro termos, denominados: taxa de variação temporal
∂f i ∂fi
∂t , transporte convectivo vi ∂x e termos de ganhos ( Gi ) e de perdas ( Li ) , sendo que a
diferença entre os termos de ganhos e perdas denomina-se de termo de fontes.
Essas interações são distribuídas sobre uma zona de visibilidade com comprimento
característico ξ > 0 , ou seja, um veículo localizado em uma posição x é supostamente afetado
por outros veículos que encontram-se dentro desta zona de visibilidade. Três categorias de
veículos são considerados:
(i) o veículo candidato ( vh ): é a velocidade do veículo que após uma interação com um
veículo de mesma velocidade ou velocidade diferente poderá ou não alterar a sua velocidade
final.
(ii) o veículo campo ( vk ): é a velocidade do veículo com o qual o veículo candidato
interage.
(iii) o veículo teste ( vi ): é a velocidade do veículo após a interação do veículo candidato
com o veículo campo.
Delitala e Tosin (2007) sugerem que Ahki [ ρ ] é modelado por uma tabela de jogos com o
parâmetro fenomenológico α ∈ [0,1] que representa as condições da estrada, sendo α = 0 a
pior estrada. Esta tabela considera três casos:
• Interação com um veículo mais rápido (vh < vk ) , quando o veículo candidato encontra
um veículo campo mais rápido e o veículo candidato ou mantém sua velocidade corrente ou
possivelmente acelera, dependendo do espaço livre a frente.
• Interação com um veículo mais lento (vh > vk ) , quando o veículo candidato encontra
um veiculo campo mais lento e supoe-se que não acelerando a probabilidade de passar
depende do tráfego local.
Estes dois casos são representados por:
se vi = vh para vh < vk ,
1 − α (1 − ρ ), ou
se v = v para v > v ,
i k h k
se vi = vh + 1, (vh , vk = 1,.., n) para vh < vk ,
Ahk [ ρ ] = α (1 − ρ )
i
ou , (11)
se v = v , (v , v = 1,..., n) para v > v ,
i h h k h k
0 caso contrário
• Interação com um veículo com velocidade igual (vh = vk ) , quando o veículo candidato
e o veículo campo estão viajando a mesma velocidade. O efeito desta interação é modelado
por:
1 − α (1 − ρ ) se vi = 1
para (vh = 1)
α (1 − ρ ) se vi = 2
αρ se vi = vh − 1
para (vh = 2,..., n − 1) 1 − α se vi = vh
Ahki [ ρ ] = α (1 − ρ ) se v = v + 1 , (12)
i h
αρ se vi = n − 1
para (vh = n)
1 − αρ se vi = n
0 caso contrário
1 − λ vi d1 d2
Φi , j = vi d 2 + −
2 φ d 2 φ d3
d1 d 2
(b) Em cada simulação devem ser iniciadas as variáveis, para o primeiro instante de tempo
(k=0): nv(i) - número de veículos por célula, definido em função da condição inicial; x(i,j,0) -
posição do veículo j na célula i, x(i,j,0)=u*dx, sendo u~U[0,1]; v(i,j,0) - velocidade do
veículo j da célula i, v(i,j,0)=vmin+s*(vmax-vmin), sendo s~U[0,1].
(d) Após serem simulados os movimentos de cada veículo, consideram-se que as velocidades
de cada veículo podem se modificadas, através da interação entre os mesmos. Através deste
procedimento simulam-se as interações que podem ocorrer entre dois veículos, analisando-se
sucessivamente cada um dos veículos verifica-se qual veículo encontra-se na sua frente.
Considerando-se um modelo de tabela de jogos (item 3 deste trabalho) define-se a situação de
cada par de veículos. Considerando-se as velocidades e posição de cada veículo, analisa-se
a interação de um veículo com o próximo veículo que encontra-se na sua frente, e assim
sucessivamente, até que o intervalo de tempo (dt) seja satisfeito. Internamente, o
procedimento de interação, necessita de um procedimento de ordenação para classificar os
veículos em função da posição em que estão localizados, em cada célula e em cada instante de
tempo. Podem ser considerados os passos apresentados na Tabela 2.
Para aplicar o modelo DSMC com o algoritmo apresentado na tabela 2 devem ser
definidos:
• comprimento da estrada (ce),
• número de células (nx),
• comprimento das células (dx=ce/nx),
• intervalo de discretização no tempo (dt),
• velocidade mínima (vmin),
• velocidade máxima (vmax),
• intervalo de precisão da velocidade para realizaçao de comparações entre as
velocidades de dois veículos (pdv)
• a condição inicial com as densidades médias de número de veículos por células (ro),
• número de simulações (nsim),
• densidade máxima (romax) e
• tempo total de análise (taf)
• intervalo entre níveis de velocidade (dv)
6. SIMULAÇÃO NUMÉRICA E RESULTADOS GRÁFICOS
A simulação numérica foi aplicada para uma pista com condições de contorno periódicas
adotando-se como parâmetro fenomenológico α =1 (estrada ótima), o valor de densidade
máxima ρ = 1 , o tempo total de simulação é 25 e comprimento máximo da estrada x = 1 . Os
resultados foram testados para dois valores da zona de visibilidade.
Atribuindo-se uma densidade inicial de ρ = 0, 46 adota-se a seguinte distribuição inicial
(t=0) de veículos ao longo da estrada:
ρ01 (t = 0) = 0, 02 para 0 ≤ x < 0.6
ρ02 (t = 0) = 0,18 para 0.6 ≤ x < 0.7
ρ03 (t=0)= 0,16 para 0.7 ≤ x < 0.8 , (13)
ρ04 (t=0)= 0,08 para 0.8 ≤ x < 0.9
ρ 05 (t=0)= 0,02 para 0.9 ≤ x ≤ 1.
ou seja, inicialmente 2% dos veículos encontra-se na posição entre [0,0.6), 18% dos
veículos entre [0.6,0.7), 16% dos veículos entre [0.7,0.8), 8% dos veículos entre [0.8,0.9) e
2% dos veículos entre [0.9,1].
Para a zona de visibilidade utilizou-se os valores de ξ = 0, 05 e ξ = 0, 0025 . As
interações ocorrem com maior ou menor freqüência de acordo com menor ou maior zona de
visibilidade.
Os resultados obtidos pela simulação numérica utilizando o modelo matemático de
velocidades discretas cujas interações entre os veículos são avaliadas através da tabela de
jogos (eqs. 12 e 13) e as soluções numéricas são determinadas pelo método dos volumes
finitos são apresentados nas figuras abaixo para ξ = 0, 05 e ξ = 0, 0025 , respectivamente.
Nas figuras 3 e 4 o tempo t=0 representa a condição inicial da densidade dos veículos na
estrada. O tempo total de simulação foi 25 sendo considerados 9 tempos para representação
gráfica pois a partir de t=10 o sistema para ξ = 0, 05 tende ao equilíbrio. Embora para
ξ = 0, 0025 o tempo de tendência ao equilíbrio é posterior a t=10, manteve-se na figura 4 os
mesmos tempos da figura 3 com objetivo de comparar estes resultados aos obtidos pelo
método de Monte Carlo.
7. CONCLUSÕES
Neste artigo desenvolveu-se o modelo cinético das velocidades discretas cujas interações
entre os veículos foram representadas por uma tabela de jogos e as soluções numéricas
determinadas pelo método dos volumes finitos (MVF) e comparadas com as soluções do
modelo computacional fundamentado no método de simulação direta de Monte Carlo
(DSMC). Considerou-se o estudo do fluxo de tráfego de veicular para uma pista com
condições de contorno periódicas.
As maiores diferenças existentes entre as soluções obtidas com o modelo de simulação
direta de Monte Carlo (DSMC) e pelo método dos volumes finitos (MVF), encontram-se nos
seguintes pontos:
(i) nas distribuições de velocidades, que pelo DSMC são distribuídas uniformemente
entre vmin e vmax, e com MVF as velocidades são discretas;
(ii) na amplitude espacial das interações entre os veículos, que pelo modelo DSMC é
variável e depende da posição relativa dos veículos e velocidades, e pelo MVF é um
comprimento constante.
Os resultados obtidos demonstram que quanto menor for a zona de visibilidade, maior é o
número de interações, acarretando em um maior tempo de simulação para o sistema entrar em
equilíbrio.
Observa-se que na figura 4 a onda de choque vai para trás até o tempo t=5 e a partir deste
tempo, a onda se desloca para frente. Isto também ocorre na figura 5 usando o método de
Monte Carlo.
Para comparar os resultados obtidos pelo modelo DSMC e pelo MVF, foram analizados
dois valores para a zona de visibilidade, ξ=0,05 e ξ=0,0025. Deve-se salientar que a zona
menor acarreta um maior número de iterações. O método MVF para a ξ=0,05 fornece
densidades com comportamentos semelhantes para diversos tempos entre 0 e 25. Isto também
é observado para a zona de visibilidade ξ=0,0025, entretanto para a zona de visibilidade
menor observa-se que a onda de choque tem uma amplitude menor para tempos entre 0 e 5
atingindo o equilíbrio mais rapidamente, menor do que 9 tempos. Desta forma, podemos
afirmar que o método MVF converge mais rapidamente ao equilíbrio do sistema para uma
zona de visibilidade menor.
Testando a zona de visibilidade menor ξ=0,0025 para um outro método de resolução,
DSMC, obtemos para o tempo 0.2 uma melhor representação da densidade do que aquela
apresentada pelo método MVF. O método DSMC representa melhor o comportamento do
tráfego real atingindo o equilíbrio em um tempo posterior ao do MVF, ou seja, posterior a 9
tempos.
Ambos os métodos MVF e DSMC foram utilizados para análise do fluxo em um pista
para o caso não-espacialmente homogêneo. Comparando estes dois métodos, o MVF
converge mais rapidamente, além de apresentar um menor tempo de execução do que o
DSMC. Quanto a simplicidade de elaboração, o MVF é o mais simples pois representar as
iterações e todas as suas considerações no DMSC não é tão óbvio.
Concluiu-se que existe uma similaridade entre os resultados obtidos pelo modelo
matemático e pelo modelo computacional, cuja inter-relação é caracterizada pela distância da
zona de visibilidade.
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