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Douglas Kellner = Ea ie ee ee ere Cultura da midia é um livro que desenvolve métodos e analises da produc temporanea de filmes, de progra- mas de televisao, musica e outros, com o objetivo de discernir sua na- tureza e seus efeitos. Sua tese é que na midia se encontra hoje a forma dominante de cultura, forma que [rae mntecdafel gale Man] de identidade, tanto em termos de reproducao quanto de mudancga da sociedade. Por meio de estudos de Reagan e do Rambo, de filmes de horror e de filmes para a juventude, da musica rap e da cultura negra, de Madonna, da moda, dos noticiosos e dos programas de entretenimento Cela (cll - eve mat of = IC] BL Butt-Head, da Guerra do Golfo como texto cultural, da ficcao cyberpunk e da teoria pds-moderna, Kellner f Wlnaresclilael=m=21 (0 (om \-yAc me 0 [oct clarecem a cultura contemporanea e nos apresentam métodos de andlise aesii(e- Muita gente fala hoje de estu- dos culturais, mas Kellner os faz, rea- lizando uma mistura inigualavel de andlise tedrica e discussdes concretas sobre algumas das formas mais po- pulares e influentes de cultura con- temporanea veiculada pela midia. Criticando o contexto social, a luta politica e o sistema de produ¢ao cul- tural, Kellner desenvolve uma abor- dagem multidimensional dos estudos culturais, que alarga esse campo e 0 abre para varias disciplinas. Também apresenta novos modos de abordar a famigerada questao dos efeitos da cultura e oferece novas perspectivas para os estudos culturais. Qualquer um que se interesse foleiFeWmaleliUltcrz-) em 9)=\ [eka cuicl] voL-Mo[- acto ciedade e da cultura contempora- neas deve ler este livro. Kellner argu- menta que estamos num estagio de transigao entre a era moderna e uma nova era pds-moderna, e que a cultura veiculada pela midia é€ um campo privilegiado de estudo, vital para podermos entender toda a importancia das mudancgas que nos sacodem hoje em dia EDUSC Editora da Universidade do Sagrade Caragio Coordenacio Editorial Irma Jacinta Turolo Garcia Assessoria Administrativa Irma Teresa Ana Sofiatti Coordenagao da Colegio Verbum Luiz Eugénio Véscio QD VERBUM Douglas Kellner Cultura midia Estudos culturais: identidade e politica entre o modemo e 0 pés-modemno Tradugdo Wone Castilho Benedetti EDUSC Editora da Universidade do Sagrado Corapio K2951¢ Kellner, Douglas. A Cultura da midia - estudos culturais: identidade € politica entre o moderno e 0 pés-modemo / Douglas, Kellner ; tradugdo de Ivone Castilho Benedetti. Bauru, SP: EDUSC, 2001. 454p. ; 23cm. - - (Coleco Verbum) ISBN 85-7460-073-3 , Inclui bibliografia Traducao de: Media culture: cultural studies, identity and politics between the modern and the postmodern. 1. Comunicacio. 2. Comunicagio de massa. 3. Cultura, |. Titulo. Il. Série. CDD. 302.23 ISBN 0-415-10570-6 (original) Copyright© 1995 Douglas Kellner -All Rights Reserved Authorised translation from English language edition published by Routledge, a menaber of the Taylor & Francis Group. Copyright® de tmdugao - EDUSC, 2001 Traducdo realizada a partir da edigdo de 1998. Direitos exclusivos de publicago em lingua portuguesa para 0 Brasil adquiridos pela Editora da Universidade do Sagrado Coracao Rua Irma Arminda, 10-50 CEP 17011-160 ~ Bauru-SP Fone (14) 3235-7111 — Fax (14) 3235-7219 e-mail: edusc@edusc.com.br PARA O VELVET HAMMER Sumario Introdugao Parte 1:Teoria/contexto/métodos * Capitulo I: Guerras entre teorias e estudos culturais Guerras entre teorias « Abordagens aos estudos culturais A Escola de Frankfurt Os estudos culturais britanicos ¢ seu legado » Estudos culturais pés-modernos? Capitulo 2: Cultura da midia, politica e ideologia: de Reagan a Rambo Ideologia e cultura da midia: métodos criticos i »® Rambo e Reagan » Top Gun:sonho masturbatorio reaganista A Guerra do Golfo! Capitulo 3: Por um estudo cultural, multicultural e multiperspectivico Por um multiculturalismo critico Rumo a um estudo cultural multiperspectivico Por um estudo cultural contextual . » Ideologia e utopia Hegemonia, contra-hegemonia e desconstrutivismo » Platoon: uma critica diagnéstica Parte 2: Critica diagndéstica € estudos culturais Capitulo 4:Ansiedades sociais, classe e juventude insatisfeita Assombracoes, género € classe na época de Reagan e Bush » Diagndstico critico: de Poltergeist a Slackers ¢ Beavis and Butt-Head — Capitulo 5:A voz negra: de Spike Lee ao rap * Os filmes de Spike Lee a © O rap € 0 discurso negro radical Resisténcia, contra-hegemonia e dia-a-dia Capitulo 6:A Guerra do Golfo: uma leitura, Produga0/texto/recepcio e Desinformacio e producao de noticias © A guerra publicitaria na midia » Nagao de guerreiros « Algumas reflexes 4 guisa de conclusio Parte 3: Midia: cultura/identidadc/politica Capitulo 7:Televisio, propaganda ¢ construgio da identidade pés- moderna : » Identidade na teoria pés-moderna » As imagens da publicidade ® Como situar 0 poés-moderno Capitulo 8: Madonna, moda e imagem » Moda e identidade » O Fenomeno Madonna Madonna entre 0 moderno ¢€ 0 pés-moderno Capitulo 9: Como mapear o presente a partir do futuro: de Baudrillard ao cyberpunk » De Baudrillard ao cyberpunk sO Neuromancer ¢ a-visao de Baudrillard « Mapear o futuro; ilumindr o presente Literatura, teoria social e politica Conclusao Bibliografia Indice onomistico 381 388 iol 419 433 419 Introdugao: @ Ha uma cultura veiculada pela midia cujas imagens, sons € espetacu- los ajudam a urdir 0 tecido da vida cotidiana, dominando o tempo de lazer, modelando opinides politicas ¢ comportamentos sociais, ¢ fornecendo o material com que as pessoas forjam sua identidade. O radio, a televisiio, 0 cinéma € os outros produtos da indstria cultural fornecem os modelos da- quilo que significa ser homem ou mulher, bem-sucedido ou fracassado, po- deroso ou impotente.A cultura da midia também fornece o material com que muitas pessoas constroem o seu senso de classe, de etnia e raca, de na- cionalidade, de sexualidade, de “nds” e-““eles”. Ajuda a modelar a visio pre- valecente de mundo e os valores mais profundos: define o que € conside- rado bom ou mau, positivo ou negativo, moral ou imoral.As narrativas ¢ as imagens veiculadas pela midia fornecem os simbolos, os mitos e os recur- sos que ajudam.a constituir uma cultura comum para a maioria dos indivi- , duos em muitas regides do mundo de hoje.A cultura veiculada pela midia fornece o material que cria as identidades pelas quais os individuos sc in- serem nas sociedades tecnocapitalistas contemporaneas, produzindo uma nova forma de cultura global. Essa cultura é constituida por sistemas de radio e reproducio de’som . discos, fitas, CDs e seus instrumentos de disseminag4o, como aparelhos de radio, gravadores, etc.); de filmes € seus modos de distribuicao (cinemas, vi- deocassetes, apresentagio pela TV); pela imprensa, que vai de jornais a re- vistas; ¢ pelo sistema de televisdo, situado no cerne desse.tipo de cultura. Trata-se de uma cultura da imagem, que explora a visio € a audigio. Os va- rios meios de comunicacio - radio, cinema, televisio, mtsica ¢ imprensa, como revistas, jornais € histérias em quadrinhos - privilegiam ora os meios visuais, ora os auditivos, ou cntao misturam os dois sentidos, jogando com uma vasta gama.de emocoes, sentimentos e idéias.A cultura da midia é in- dustrial; organiza-se com base no modelo de producSo de massa e € produ- zida para a massa de acordo com tipos (géneros), segundo férmulas, cédi- gos € normas convencionais. E, portanto, uma forma de cultura-comercial, € seus produtos sao mercadorias que tentam atrair 0 lucro privado produ- zido por empresas gigantescas que estiio interessadas na acumulacio de ca- pital.A cultura da midia almeja grande audiéncia; por isso, deve ser eco de assuntos € preocupagées atuais, sendo extremamente topica € apresentan- do dados hieroglificos. da vida social contemporinea. Mas a cultura da midia é também uma cultura high-tech, que explora a tecnologia mais avancada. E um setor vibrante da economia, um dos mais lucrativos, e esta atingindo dimensdes globais. Por isso, é um modo de tec- nocultura que mescla cultura e tecnologia em novas formas e configura- cées, produzindo novos tipos de sociedade em que midia e tecnologia se tornam principios organizadores. @ Os espetaculos da midia demonstram quem tem poder e quem nao tem, quem pode exercer forca ¢ violéncia, ¢ quem nao. Dramatizam € le- gitimam o poder das forgas vigentes e mostram aos nio-poderosos que, se nao se conformarem, estarao expostos ao risco de prisio ou morte. Para quem viveu imerso, do nascimento 4 morte, numa sociedade de mi- dia c consumo €, pois, importante aprender como entender, interpretar € criticar seus significados e suas mensagens. Numa cultura contempora- nea dominada pela midia, os meios dominantes de informagao € entrete- nimento sao uma fonte profunda e muitas vezes nao percebidas de peda- gogia cultural: contribuem para nos ensinar como nos comportar e o que pensar e sentir,em que acreditar, o que temer e desejar - € o que nao. Conseqiientemente, a obtengio de informacgées criticas- sobre a midia constitui uma fonte importante de aprendizado sobre 0 modo de convi. ver com esse ambiente cultural scdutor. Aprendendo como ler.¢ criticar a midia, resistindo 4 sua manipulacao, os individuos poderao fortalecer-se em relagio 4 midia ¢ 4 cultura dominantes. Poderio aumentar sua auto- nomia diante da cultura da midia e adquirir mais poder sobre o meio cul- tural, bem como os necessarios conhecimentos para produzir novas for- mas de cultura. MIDIA E SOCIEDADE Os estudos que se seguem ajudam a entender a cultura da midia e in- dicam os modos como ela pode ser entendida, usada e apreciada. Nossa intenc&o € dar ao leitor meios de aprender a estudar, analisar,interpretar € criticar os textos da cultura.da midia ¢ a avaliar seus efeitos. Examinamos alguns dos modos de interse¢io entre ela ¢ as lutas politicas ¢ sociais, além da maneira como ela molda a vida diacia, influenciando o modo como as pessoas pensam € se comportam, como se véem e€ véem os Outros € como constroem sua prépria identidade. Por conseguinte, esses estudos explora- rio algumas das maneiras como a cultura contemporinea da midia cria for- mas de dominacio ideologica que ajudam a reiterar as relac6es vigentes de poder, ao mesmo tempo que fornece instrumental para a construgao de identidades e fortalecimento, resisténcia e luta.Afirmamos que.a cultura da midia € um terreno de disputa no qual grupos sociais importantes ¢ ideo- 1 logias politicas rivais lutam pelo dominio, ¢ que os individuos vivenciam essas lutas por meio de imagens, discursos, mitos e espetaculos veiculados pela midia. @ Acultura, em seu sentido mais amplo, € uma forma de atividade que implica alto grau de participagio, na_qual as pessoas criam sociedades ¢ identidades. A cultura modela os individuos, evidenciando e€ cultivando suas potencialidades e capacidades de fala, acio ¢ criatividade.A cultura da midia participa igualmente desses processos, mas também € algo novo na aventura humana. As pessoas passam um tempo enorme ouvindo radio, as- sistindo 4 televisio, freqiientando cinemas, convivendo com misica, fazen- do compras, lendo revistas ¢ jornais, pacticipando dessas ¢ de outras formas dé cultura veiculada pelos meios de comunicacao. Portanto, trata-se de uma cultura que passou a dominar a vida cotidiana, servindo de pano de fundo onipresente ¢ muitas vezes de sedutor primeiro plano para o qual conver- gem nossa atenciio € nossas atividades, algo que, segundo alguns, esta mi- nando a potencialidade ¢ a criatividade human; Este livro estudara algumas das conseqiiéncias do-dominio da cultura veiculada pela midia sobre a sociedade € a cultura em geral. Procura son- dar a natureza ¢€ os. efeitos do modo como essa forma de cultura esta in- fluenciando profundamente muitos aspectos de nossa vida diaria. Um de seus principais temas diz respeito ao modo como as diversas formas da cul- tura veiculada pela midia induzem os individuos a identificar-se com as ideologias, as posicGes € as representacées sociais ¢ politicas dominantes. Em geral, nao € um sistema de doutrinagao ideolégica rigida que induz 4 concordancia com as sociedades capitalistas existentes; mas sim os praze- res propiciados pela midia ¢ pclo consumo. O entretenimento oferecido por esses meios freqiientemente é agradabilissimo e utiliza instrumentos visuais ¢ auditivos, usando 0 espetaculo para seduzir o ptiblico ¢ leva-lo a identificar-se com cértas opinides, atitudes, sentimentos e disposicdes. A cultura de consumo oferece um deslumbrante conjunto de bens € servigos que induzem os individuos a participar de um sistema de gratificacdo co- mercial. A cultura da_midia ¢ a de consumo atuam de mios dadas no sentido de gerar pensamentos e comportamentos ajustados aos valores, as instituigdes, As crengas ¢ As praticas vigentes. @ No entanto, o publico pode resistir aos significados e mensagens do- minantes, criar sua propria leitura ¢ scu proprio modo de apropriarse da cultura de massa, usando a sua cultura como recurso para fortalecer-se e in- ventar significados, identidade ¢ forma de vida préprios.Além disso, a pré- pria midia da recursos que os individuos podem acatar ou rejeitar na for- magéio de sua identidade em oposicao aos mgdelos dominantes. Assim, a cultura veiculada pela midia induz os individuos a conformar-se a organiza- co vigente da sociedade, mas também thes oferece recursos que podem 4 fortalecé-los na oposi¢aio a essa mesma sociedade.O estudo dessas funcoes ¢ efeitos contraditorios sera um dos objetivos deste livro. A cultura da midia é uma realidade extremamente complexa que até agora resistiu a qualquer teorizagio geral adequada (embora tenham sido muitas as tentativas).A maioria das teorias, como mostraremos neste livro, parecem unilaterais e cegas a importantes aspectos da quest’o; grande parte do que se disse sobre a manipulacao e a dominacao da midia, cm teo- rias popularissimas na década de 1960 e em parte da década de 1970, par- tia do pressuposto de que os meios de comunicacaio constituem for¢as oni- potentes de controle social que impdem uma ideologia dominante mono- litica a suas vitimas. Reagindo a esse modelo, muitas das teorias mais recen- tes ressaltaram a capacidade do publico de resistir 4 manipulacio da midia, criando seus proprios significados e usos e fortalecendo-sé com a matéria- prima extraida de sua propria cultura. Como veremos nos estudos que se seguem, essas € outras teorias atuais também sao unilaterais € limitadas, de-_ vendo dar lugar a abordagens criticas mais amplas € multidimensionais, que teorizem os efeitos contraditorios da cultura veiculada pela midia. Em nossa opiniiio, o melhor modo de desenvolver teorias sobre midia ¢ cultura € mediante estudos especificos dos fendmenos concretos contex- tualizados nas vicissitudes da sociedade e da histéria contemporaneas. Por- tanto, para interrogar de modo critico a cultura contemporanea da midia € preciso realizar estudos do modo como a indistria cultural cria produtos especificos que reproduzem os discursos sociais encravados nos conflitos e nas lutas fundamentais da época. Para isso, € preciso ver de que modo cer- tos textos populares como os filmes Rocky ou Rambo,o rap ou Madonna, 0s programas policiais de TV ou a propaganda, os noticiosos € as discussdcs da midia, tudo isso articula posicées ideologicas especificas ¢ ajudam a rei- terar formas dominantes de poder social, servindo aos interesses da domi- nagao da sociedade ou de resistencia as formas dominantes de cultura € so- ciedade - ou se tém efeitos contraditérios. Por conseguinte, nos estudos que seguem, tentamos demonstrar de que modo alguns dos textos culturais mais populares hoje estao implica- dos nos atuais conflitos politicos .¢ culturais.O estudo da cultura popular e de massa recebeu o rétulo genérico de “estudos culturais”, e neste livro apresentaremos\alguns modelos de estudo cultural da midia feitos de for- ma critica, multicultural e a partir de diversas perspectivas. Um estudo cul- tural critico conceitua a sociedade.como um terreno de dominagao € resis- téncia, fazendo uma critica da dominacio e dos modos como a cultura vei- culada pela midia se empenha em reiterar as relagdes de dominacaio ¢ opressao. Esta preocupado com os progressos do projeto democratico, exa- minando o modo como a cultura da midia pode constituir um terrivel em- pecilho para a democratizagio da sociedade, mas pode também ser uma 12 aliada, propiciando o avanco da causa da liberdade ¢ da demoeracia.A cul- tura da midia pode constituir um entrave para a democracia quando repro- duz discursos reacionarios, promovendo o racismo, 0 preconccito de sexo, idade, classe e outros, mas também pode propiciar 0 avanco dos interesses dos grupos oprimidos quando ataca coisas como as formas de segregacao racial ou sexual, ou quando, pelo menos, as enfraquece com represen- tagdes mais positivas de raga € sexo. Portanto, interessados na politica cultural, desenvolveremos um modelo especifico de estudo da cultura da midia, inserindo-nos em deba- ,tes acerca do melhor modo de estudar a cultura € a sociedade, com o obje- tivo de entender plenamente a produgio, a natureza € os efeitos dessa cur tura. Nossa abordagem também langa mao de teorias sociolégicas com o fim de contextualizar, interpretar ¢ analisar adequadamente a natureza ¢ os efeitos da cultura da midia. Estamos convictos de que os estudos culturais nao podem ser feitos sem uma teoria social, e de que precisamos entender as estruturas € a dinamica de determinada sociedade para entender e inter- pretar sua cultura. Também partimos do pressuposto de que os textos da cultura da midia nao sao simples veiculos de uma ideologia dominante nem entretenimento puro € inocente.Ao'contrario, sio produgdes comple- Xas que incorporam discursos sociais € politicos cuja andlise e interpre- taco exigem métodos de leitura e critica capazes de articular sua insergio na economia politica, nas relagdes sociais € no meio politico em que sio criados, veiculados € recebidos. Os estudos que se seguem aplicam essa abordagem abrangente ao estudo da cultura da midia e utilizam os recursos da hist6ria, da teoria so- cial, das teorias da comunicagio ¢€ dos estudos culturais para elucidar’al- guns dos significados e dos efeitos das formas de cultura popular. Os exem- Plos vao desde filmes que reiteram ou contestam ideologias conservadoras durante a era Reagan até a cultura negra depreendida dos filmes de Spike Lee € do rap, passando pelas imagens ¢ pelos sons de Madonna. Também estudamos as populares séries de televisio, como Miami Vice, a MTV, pu- blicidade, o verdadciro espetaculo da midia conhecido como “Guerra do Golfo,’ os aterrorizantes mundos futuristicos da ficcio cyberpunk e a teo- ria pés-moderna de Baudrillard. Partimos do pressuposto de que sociedade e cultura sao tertenos de disputa ¢ de que as produgées culturais nascem € produzem efeitos em de- * terminados contextos. Estamos convencidos de que a analise da cultura da midia em sua matriz de produgio ¢ recepgio ajuda a elucidar suas produ G6es € seus possiveis efeitos € usos, bem como os contornos e as tendén- cias dentro do contexto sociopol cultura produzidas por grupos gigantescos de comunicacio e entreteni- mento constituem um aspecto imediato ¢ onipresente da vida contempo- ico mais amplo. Visto que as formas de 13 ranea,e como a cultura da midia é constituida por uma dinamica social ¢ politica mais ampla - ao mesmo tempo que a constitui -, consideramos que uma excelente Gptica consiste em elucidar a natureza da sociedade, da po- litica € da vida cotidiana de nossa €poca. Na verdade, nossa tese € de que a compreensio dos filmes populares de Hollywood, de Madonna, da MTV, do rap, dos filmes atuais sobre os negros € dos programas de noticias ¢ cntre- tenimento da televisio pode ajudar-nos’a entender nossa sociedade con- temporanea, Ou seja, entender o porqué da popularidade de certas produ- Ges pode elucidar o meio social em que elas nascem e circulam, poden- do, portanto, levar-nos a perceber o que esta acontecendo nas sociedades € nas culturas contemporaneas. O foco de nossa atengio é a midia norte-americana e€ sua cultura, mas, visto que a cultura dos Estados Unidos esta sendo cada vez mais exportada para todo o mundo, tal estudo deve elucidar as formas dominantes ¢ globa- lizadas de cultura de consumo e da midia em outros lugares também.A cul- tura da midia americana esta invadindo outras culturas do mundo, produ- zindo novas formas de popular global. Certos fendmenos nela encontra- dos, como os filmes Rambo ¢ Rocky, Madonna € Michael Jackson, MTV € rap, cenas dos noticidrios da CNN ¢ da TV norte-americana em geral, pro- paganda ¢ bens de consumo, formas de televisao, misica ¢ cinema, além de outros aspectos, sio populares em todo o mundo, o que nos leva a crer que os estudos aqui coligidos devem ser de interesse global, ¢ nio meramente regional Tais estudos foram concebidos ¢ iniciados num momento histérico es- pecifico: o do triunfo do conservadorismo nos Estados Unidos e na maioria das democtacias capitalistas ocidentais. Por essa raziio, depois de definir, num capitulo inicial sobre as guerras tedricas e culturais dos Ultimos anos, nosso conceito sobre o tipo de estudo cultural ¢ de teoria social necessario para entender nossa midia contemporanea e sua cultura, examinamos no capitulo 2 a politica e a ideologia do cinema de Hollywood na era Reagan e demionstramos como a cinematografia popular reproduz os discursos con- servadores hegeménicos da €poca. Este estudo aplica e desenvolye o método de leitura politica do cinema, apresentado por Michael Ryan e por este autor em nosso livro de 1988, Camera Politica, ¢ faz alguns estudos concretos da cinematografia hollywoodiana contemporanea, ao mesmo tempo que delineia um modelo de estudo multicultural e-critico da midia Afirmamos que € preciso fazer um estudo cultural que critique a intersecao de classes, sexos, racas e outros determinantes fundamentais da cultura e da identidade, a fim de conceituar mais plenamente as dimensOes ideologicas dos textos culturais e avaliar toda a gama de seus efeitos. A seguir, no capitulo 3, indicamos a necessidade de interpretar a cul- tura da midia ao arrepio de suas disposigGes ideolégicas, a fim de deslindar 14 momentos criticos € subversivos € analisar de que modo os projetos ideo- légicos.dos textos da midia freqiientemente falham, Também desenvolve- mos um conceito de diagndstico critico que utiliza a cultura da midia para diagnosticar as inclinacdes e tendéncias sociais, lendo em suas entrelinhas as fantasias, os temores, as esperancas € os desejos que ela articula. Um diaghéstico critico também analisa o modo como a cultura da midia prové recursos para a formacao de identidades ¢ promove politicas reacionarias ou progressistas - ou entaio pie 4 disposi¢ao textos e€ efeitos ambiguos, que podem ser utilizados de jas Manciras: , Na parte I, realizamos alguns estudos concretos de criticas diagnésti- cas que interrogam as representagdes dominantes de classe, raca, sexo, se- xualidade, juventude e politica nos dias de hoje. No capitulo 4, ilustramos © conceito de diagnéstico critico por meio de uma Ieitura dos filmes que exploram 0 sobrenatural e que, a nosso ver, articulam na forma cinemato- grafica os temores da classe média em relacao a declinio social, perda de moradia, dissolucao da familia ¢ ameacas provenientes de outras classes ¢ tacas.A seguir, desenvolvemos algumas leituras do filme Slacker ¢ da série Beavis and Butt-Head para obter um diagnéstico do transe por que passa a juventude insatisfeita dos nossos tempos. Assim, enquanto 0 capitulo 2 mostra como os filmes de Hollywood transcodificam os discursos da politica dominante durante a era da hege- monia conservadora, que vai de 1980 até parte dos anos 1990, 0 capitulo 4 mostra de que modo os descjos, as ansicdades ¢€ as insegurangas das pes- soas comuns também encontram expressio na cultura da midia, possibili- tando um retrato das tendéncias de crise que estéo por tras da fachada ideoldgica de uma sociedade de consumo feliz e segura.A avaliagio da po- litica cultural da, midia, portanto, vai desde a Critica ideolégica do modo como os textos populares incorporam os discursos politicos dominantes, em torno das questdes politicas ¢ dos conflitos mais importantes do mo- mento, até a anilise dos textos que codificam a politica da vida diaria e as ansiedades € tensdes referentes a classe, raga, sexo, juventude € sonhos € angustias das pessoas do povo. No capitulo 5, delineamos um modelo de estudo cultural a partir de miiltiplas perspectivas ¢€ ilustramos essa concepcio com um estudo deta- Ihado dos filmes de Spike Lee, que constituem um bom exemplo da explo- racao cinematogrifica de questdes fundamentais de raca, sexo e classe no momento atual.Trazendo a baila a critica feminista ¢ politica de seus filmes, que € feita do ponto de vista do negro, examinamos-a obra de Lee e as con- tribuigdes e limitagdes de seu estilo, de seus textos € de sua politica.A com- paracao dos filmes de Leé com a miisica rap contemporinea de Public Enemy, Ice-T, Ice Cube, Sister Souljah ¢ outros mostra uma parte dos textos culturais socialmente criticos que estao sendo produzidos hoje e os modos 18 como os negros radicais esto pressionando os limites anteriormente esta- belecidos da cultura prevalecente, a fim de articular suas vivéncias de opressio, raiva € rebeliao. a Durante a era Reagan-Bush, a televisio cresceu em importancia cultu- ral € politica, por meio das exibicdes politicas, das fotos didrias, produzidas pela administragao Reagan, e do espetaculo da “Guerra do Golfo”, que ana- lisamos no capitulo 6. Depois de Reagan, veio o regime Bush com seu ¢s- forgo, durante a “Guerra do Golfo”, para estabelecer uma“Nova Ordem no Mundo”. No capitulo 2, indicamos 0 modo como certos filmes de Holly- wood criaram imagens que puderam ser mobilizadas para produzir a apro- vacao da guerra dos Estados Unidos contra o Iraque no inicio dos anos 1990. No capitulo 6, mostramos como os instrumentos dos estudos cultu- rais podem ser utilizados para criticar a producao da “Guerra do Golfo,” propiciar uma leitura critica do texto € ajudar a explicar seus efeitos sobre o publico, bem como por que o publico apoiou macicamente a guerra. Nos ultimos dez anos, portanto, a cultura da midia tem desempenha- do um papel cada vez mais importante nas elcigdcs, nos embates politicos diarios € na legitimacio do sistema politico. Os eventos globais veiculados pelos mcios de comunicacao, como a Guerra do Golfo, demonstraram a cfi- cacia do sistema bélico americano e a hegemonia do poder militar. ameri. cano, enquanto outros eventos, como o espetacular funeral de Richard Ni- xon televisionado em 1994, demonstraram o poder do regime presidencial. Os funerais de Nixon também expressaram 0 mito de que qualquer um pode chegar 4 presidéncia por meio dos cortes freqtientes da. camara durante a’ ceriménia para mostrar a casa modesta em que Nixon nasceu. Além disso, surgiram novas formas de entretenimento televisivo durante essa €poca, e no capitulo 7 analisamos alguns momentos-chave da cultura televisiva nos anos 1980, entre os quais Miami Vice e outro “novo visual” da TV, muitas vezes rotulado de “pés-moderno”. A emergéncia dos musicais para televisio (MTV) revolucionou a industria fonografica, fazen- do surgit novos astros multimidia como Madonna e Michael Jackson. Tam- bém analisamos alguns dos modos como a publicidade oferece modelos de sexualidade ¢ identificagao, bem como a mancira como induz a comprar determinados produtos. Assim como acabou desempenhando papel fundamental na politica da €poca, a imagem também veio a ocupar posi¢ao central na cultura vei- culada pela midia ¢ na vida cotidiana do periodo, no sentido de que a ima- gem, a aparéncia ¢ o estilo pessoais foram se tornando cada vez mais im- portantes na constituigho da identidade individual. Nesse contexto, na Par- te Ill apresentamos uma interpretacao de Miami Vice, da MTV, da publici- dade e de Madonna em correlacio com a tese de que esses fendmenos sio exemplares na producao de mudancgas para aquilo que tem sido identifi- - cado como nova cultura pés-moderna e novas identidades p6s-modernas. Tentamos esclarecer os discursos p6és-modernistas da moda, indicando seus usos € abusos. Examinando as modalidades de representacao na cul- tura contemporanea, analisamos a construgio, as taticas retéricas ¢ os efei- tos de algumas das produces culturais mais importantes da midia contem- poriinea, argumentando que muitos de seus textos tem em comum estraté- gias estéticas modernistas € pOs-modernistas, e que, portanto, o melhor modo de interpreti-las é vé-las como algo situado entre 0 moderno e 0 pés- moderno. . Esse t6pico leva a reflexées sobre o papel da imagem ¢ da moda na construcao da identidade, bem como sobre 0 papel da miisica popular, dos astros ¢ estrelas e da propaganda na cultura contemporanea. No capitulo 8 afirmamos que as mudangas na imagem e na identidade de Madonna arti- culam-se com transformagées nos valores ¢ na politica da época; que suas contradicées captam aspectos conflitantes de seu momento cultural, e que o “fendmeno Madonna’ é sintomatico de tendéncias basicas da época, de tal modo que a interpretacao dos textos de Madonna - e ela tem um texto préprio - pode elucidar caracteristicas do momento presente. No entanto, afirmamos também que Madonna € um fenémeno de sua propria producao e propaganda e de suas préprias estratégias de marketing, e que, por isso, € preciso prestar atencao 4 economia politica da cultura para interpretar adequadamente o “fenémeno Madonna”. Em “Mapeamento do presente a partir do futuro: de Baudrillard ao cyberpunk’ (capitulo 9), examinamos a ficgio cyberpunk e a teoria pds- moderna como produtos da cultura da midia que, por sua vez, apresentam vis6es ficcional-teéricas de uma sociedade cada vez mais dominada pela midia € pela informagao. Focalizando as semelhangas entre'a andlise social de Baudrillard e€ os romances de William Gibson, interpretamos ambos como tentativas de mapear nosso presente, que esta constantemente. escor- regando para o futuro. Por meio de uma leitura atenta de Newromancer, afirmamos que tanto Baudrillard quanto Gibson nos apresentam visdes do futuro que servem para clucidar o presente. Essa anilise leva a crer que a melhor mancira de ler Baudrillard € como ficgdo cientifica antiutopica, embora o cyberpunk possa também ser lido como uma nova forma de teo- ria social que mapeia as conseqiiéncias de uma socicdade da informacio ¢ da midia em rapido desenvolvimento na era do tecnocapitalismo. Numa conclusio, indicamos algumas das tarefas por serem realizadas pelos estudos culturais’e algumas das quest6es que eles deveriam exami- nar no futuro. Os estudos que fazemos, em ultima anilise, propd6em o desenvolvimento de sinteses entre teoria social, critica cultural e pedago- gia da midia a fim de elucidar a sociedade contemporanea, a cultura € a po- litica de nossos dias. Combinando filosofia, teoria social, critica cultural ¢ 7 anilise politica, apresentamos algumas perspectivas de sociedade, cultura e métodos de critica cultural, fazendo algumas propostas para a reconstru- gao dos estudos culturais e da teoria critica da sociedade. Contudo, os textos que se seguem nao foram escritos apenas para o publico académi- co. Embora respondam aos debates académicos sobre 0 método e o terre- no apropriados da teoria social ¢ da critica cultural, também examinamos questées politicas e culturais atuais e assint tentamos escrever para um pu- blico. mais amplo. Nossa aspiragao € explicar com clareza os termos teéri- cos complexos sempre que eles emergirem na argumentacao e ilustrar am- plamente nossas posicdes metodoldgicas ¢ tedricas. ESTUDOS CULTURAIS 4 TEORIA SO€ Como ja fizemos notar, acreditamos que a melhor forma de realizar es- tudos culturais € no contexto da teoria critica da socicdade, € no capitulo 1 € nas secdes seguintes indicamos de que modo a teoria critica da Escola de Frankfurt fornece perspectivas titeis sobre a sociedade contemporanea ¢ armas titeis de critica para os estudos culturais. Mas também indicamos as limitacdes da Escola de Frankfurt e o modo como as perspectivas sobre Cultura ¢ sociedade apresentadas pelos estudos culturais realizados na Gra- Bretanha freqiientemente constituem uma corregao das posigées da Esco- la de Frankfurt (embora também acreditemos que certos aspectos da abor- © dagem da Escola de Frankfurt corrigemi as limitagdes dos estudos culturais britanicos).Além disso, utilizamos as contribuicdes do feminismo e os pro- jetos multiculturalistas sobre sexo, sexualidade, raca, etnia, alteridade ¢ mar- ginalidade que comecaram a proliferar nos anos 1960.Também examina- mos a pertinéncia, pata os estudos culturais, das inovagSes trazidas pelas teorias pds-modernas de Foucault, Baudrillard, Jameson e outros, tentando analisar alguns dos aspectos proeminentes da atualidade, tais como a socie- dade de consumo e da midia, as novas tecnologias nas areas de computa: ¢4o, comunicagées ¢ informagio, as novas formas de moda e cultura, as no- vas formas de poder e conhecimento, e as novas modalidades de subjetivi- dade ¢ identidade. De fato, a atualidade € marcada por debates acalorados em torno da possibilidade de estarmos ou nao vivendo ainda a cra moderna ou de j4 termos entrado numa nova era pds-moderna.Alguns dos que argumentam em favor do pés-moderno afirmam que estamos vivendo um momento in- teiramente novo e original que exige novas teorias € politicas. O tedrico francés Jean Baudrillard € um dos mais influentes defensores de uma rup- tura radical com as formas anteriores de sociedade, cultura, politica € teo- ria. Neste livro, examinamos a assergio de que estamos vivendo uma nova 18 cra histérica de “pés-modernidade” € estudamos a pertinéncia da teoria pds-moderna para 0 estudo da sociedade e da cultura. Nosso argumento é de que, embora uma parte da teoria pés-moderna elucide certas caracteristicas novas e mais evidentes de nossa cultura e de nossa socicdade, a afirmagao de que ha uma nova ruptura pés-moderna na sociedade e na hist6ria é exagerada. Em varios estudos, examinamos 0 uso € o abuso da teoria pés-moderna € das afirmagées de que certas formas da cultura da midia,como Madonna, Miami Vice, rap, MTV e varias outras sao “pés.modernas”. Também abordamos a afirmagao de que € preciso uma nova forma pés-moderna de teoria e de estudo da cultura para tratar ade- quadamente da época contemporanea. Nosso argumento € que estamos agora vivendo uma era de transicao entre o moderno € o pos-moderno, que exige de nés ateng&o tanto As estratégias e teorias modernas quanto as pés- modernas, resistindo, assim, 4 assercio em favor de uma ruptura pds-mo- derna em historia ¢ da necessidade de uma teoria ¢ de estudos culturais pOs-modernos inteiramente novos. Ae contrario, afirmamos que a combinacio dos melhores recursos propiciados pelas teorias modernas com algumas perspectivas pos-moder- fas novas constitui o instrumental mais util para se fazerem teoria social € critica cultural hoje em dia. Nosso trabalho apresenta uma intersecio com © projeto de estudo cultural desenvolvido pelo Birmingham Centre for Contemporary Cultural Studies, da Inglaterra; desde 0 inicio dos anos 1960 até o presente. Esse projeto implicava a leitura da cultura a partir da pers- pectiva de producao e recepcao de textos culturais dentro de contextos historicos concretos. Nossos alicerces sio a tradigo dos estudos culturais britanicos, mas afirmamos que esse projeto precisa ser repensado e retra- balhado em resposta as condigdes € aos desafios contemporiineos.A nosso * yer, embora os estudos culturais britinicos tenham estado na vanguarda dos estudos de cultura e sociedade durante algumas décadas, os.recentes desenvolvimentos dos estudos culturais (que-descentraram 0 foco inicial nas classes) e a falha - verificada em toda a sua histéria - de cuidar adequa- damente da producao e da economia politica da cultura significam que agora é necessario fazer um tipo diferente de estudo cultural. Tal estudo, de- senvolvido neste livro, constitui um trabalho que, baseando-se nas interpre- tagdes dos estudos culturais britanicos, da Escola de Frankfurt, de algumas posicdes da teoria pos-moderna, do feminismo e da teoria multicultural, ao mesmo tempo as revisa, atualiza e reconstréi Em seus melhores trabalhos, os proponentes dos estudos culturais briténicos sempre contextualizaram suas investigagGes nas lutas e nos acontecimentos sociopoliticos contemporaneos.Ao longo de nossos estu- dos, tentamos situar as produgées culturais examinadas no ambiente em que nasceram e€ foram recebidas, além de tratar das quest6es politicas fun- 19 damentais articuladas nos textos culturais.O ambito de nossos estudos € constituido, aproximadamente, pela Ultima década da cultura veiculada pela midia, que vai do inicio dos anos 1980 até o comeco da década de 1990. Desse modo, situamos nossos estudos no contexto das guerras cultu- -fais entre liberais, conservadores e radicais que redundou na hegemonia conservadora dos govefnos Reagan ¢ Bush, na sua constante contestagio por liberais ¢ radicais e na eleigio do governo Clinton, mais liberal, em 1992. Mostramos de que modo os eventos politicos da época, tais como o triunfo do reaganismo e a Guerra do Golfo, influenciaram a cultura da mi- dia no periodo e de que maneira certas formas populares de cuttura veicu- lida pela midia influenciaram o ambiente social € politico da época. Durante todo o tempo, fazemos uma pedagogia critica da midia cujas finalidades sao: possibilitar que os Icitores ¢ os cidadaos entendam a cultu- ta e a sociedade em que vivem, dar-Ihes o-instrumental de critica que os ajude a evitar a manipulagao da midia € a produzir sua propria identidade e resist€ncia e inspirar a midia a produzir outras formas diferentes de trans- formacao cultural ¢ social.A pedagogia critica da midia desenvolye concci- tos e andlises que capacitam os leitores a dissecar criticamente as produ- ‘goes da midia ¢ da cultura de consumo contemporaneas, ajudam-thes a des- vendar significados € efeitos sobre sua propria cultura e conferem-lhes, assim, poder sobre seu ambiente cultural. Partimos do pressuposto de que a critica cultural e a pedagogia da mi- dia exigem teoria social, e de que a teoria critica da sociedade, por sua vez, deve basear-se nos estudos de midia e cultura ¢ nos métodos da critica cul- tural para atingir maior compreensao das qualidades essenciais da vida so- cial contemporanea. Esse projeto, portanto, combina estratégias metodold- gicas, teorias ¢ conccitos extraidos das teorias modernas ¢ pés-modernas, na tentativa de apresentar perspectivas criticas sobre os fendmenos cultu- rais € sociais mais importantes dos nossos dias. Utilizamos e elaboramos idéias basicas expostas em obras nossas passadas € continuamos a delinear as trajetérias da teoria, da cultura ¢ da politica contemporaneas. Inspirado pelo projeto da Escola de Frankfurt, que tenta elaborar aspectos tedricos da atualidade, este estudo deve ser lido como exemplo de critica cultural a fornecer fragmentos de uma teoria critica da sociedade e - esperemos - al- guma inspiracio para uma nova politica futura de libertactio. Ademiais, os estudos que se seguem devem ser lidos em-conjunto com alguumas de nossas obras anteriores, como Camera Politica (em co-autoria com Michael Ryan, 1988), que tentava mapear as vicissitudes da cinemato- grafia de Hollywood desde meados dos anos1960 até meados da década de 1980 e desenvolver, para a interpretacao dos textos culturais, metodologias criticas que definissem os modos como varios textos promovem ou inibem as metas dos movimentos politicos progressistas. Os estudos deste volume 20 também so congruentes com nossos livros Television and the Crisis of Democracy (Kellner 1990) e The Persian Gulf TV War (Kellner 1992), que mapeiam alguns dos modos como a midia sc transformou em terreno da politica € das lutas sociais contemporaneas. Nesses textos, estamos interes- sados nas maneiras como a midia inibe ¢ impede o projeto de democrati- zacgao da sociedade ou como poderia fomenté-lo. Esses primeiros textos tentam teorizar o papel da midia numa sociedade democratica, ¢ continua- MOs esse projeto neste livro. Mas embora os dois livros anteriores tendam a dar mais atengio aos noticiarios ¢ 4 informagao, o presente estudo inter- roga uma vasta gama de fendmenos da cultura da midia e analisa o modo como varias formas dessa-cultura produzem prazer, opinides ¢ identidades que inibem ou fomentam as metas de’ maior democracia, igualdade e de uma sociedade realmente multicultural. AGRADECIMENTOS Pelos utilissimos comentarios sobre muitos dos textos e pela discus- sao de sua tematica, somos imensamente gratos ao amigo ¢ colaborador Steve Best.Também nos ajudaram com comentarios, interpretacdes e mate- rial de grande utilidade: Robert Antonio, David Armstrong,Ann Cvetkovich, Jon Epstein, Henry Giroux, Darrell Hamamoto, Kelly Oliver, Danny Postal, Valerie Scatamburlo, bem como os-redatores € os Ieitores dos periédicos nos quais alguns desses artigos foram publicados, embora em formas dife- rentes. Somos extremamente gratos a Jon ¢ Margarete Epstein pela produ- cao grafica das ilustragées.' As imageis da cultura da midia esto circulan- do por novos ‘espagos e exigem novas tecnologias para andlise ¢ disseca- cao. Também queremos agradecer a Chris Rojek, que nos deu grande apoio no projeto e gtande ajuda em termos de objetividade do texto, dando inicio ao seu processo de producio, Também agradecemos a Diane Stafford, que fez um excelente trabalho de edi¢ao das inclusdes ¢ agiientou nossas con- tinuas revisdes'€ mensagens. Mas somos especialmente gratos a Rhonda Hammer pelas suas constantes criticas, pelo material fornecido, pelas cor- re¢gées cuidadosas ¢ pelas idéias que ajudaram muito a desenvolver este estudo. 1A computacio grifica e a capa [da obra original] foram criadas por Jon S. Epstein e Margaret J. Epstein para The Web. 21 Parte 1 Teoria — contexto métodos 1 Guerras entre teorias e estudos culturais Vivemos um tempo de mudangas ¢ transformagocs drasticas. Desde os anos 1960, houve um série de modificagSes espetaculares na cultura € na socicdadc de todo o mundo. Os anos 1960 foram uma €poca de prolon- gados tumultos sociais em que a todo momento surgiam novos movimen- tos sociais a desafiarem as formas estabelecidas de sociedade e cultura ¢ a produzirem novas contraculturas e, formas alternativas de vida. Geraram uma cra de intensas “guerras culturais” entre liberais, conservadores ¢ radi- cais no sentido de reconstrucao da cultura e da sociedade segundo seus prdéprios programas, guerras que continuam sendo travadas na atualidade. Durante os anos 1970, a recessio econémica mundial fez estourar a bolha de prosperidade do p6és-guerra, € o discurso sobre uma “sociedade da pés- escassez” foi substituido por outros, que falavam de diminuicao das expec- tativas, redugio do crescimento ¢ necessidade de reorganizagio da ccono- mia e do Estado. Tal reorganizacao ocorreu na maior parte do mundo capi- talista durante os anos 1980, na vigéncia de governos conservadores que fi- zeram Cortes nos programas de bem-estar social ao mesmo tempo que ex- pandiam o setor militar e aumentavam o déficit das contas piiblicas, com dividas macicas que ainda nao foram pagas. Nos tiltimos cinco anos também se assistiu ao colapso do comunismo sovi€tico € ao fim da Guerra Fria. Depois da Segunda Guerra Mundial, os paises capitalistas ¢ comunistas comegaram a competir pela hegemonia econdmica, politica ¢ cultural. As forcas de ambos os blocos promoveram guerras frias ¢ quentes, com resultante militarizacio € guerras encobertas ¢ abertas entre paises satélites das superpoténcias.O monstruoso arsenal militar em ambos os lados e as armas de destruicaio total criaram uma €poca tensa e temerosa, durante a qual demagogos ¢ burocratas Cinicos po- diam aterrorizar populacoes, levando-as a aceitar politicas sociais que be- , neficiavam principalmente os avidos ¢ poderosos, enquanto iam sendo adiadas muitas reformas sociais necessarias e a criagio de uma ordem so- cial mais justa e eqilitativa. A derrubada do muro de Berlim,a queda do império comunista sovi tico € a dissolu¢ao final da propria Uniao Soviética pareciam por fim ao pe- sadelo. O resultado, porém, nfo foi a criagao de uma nova era de paz e es- tabilidade, Em vez disso, éxplodiram guerras nacionalistas € religiosas, criando uma nova era de medo e instabilidade, sem forcas politicas capa- zes de oferecer uma via atraente para se sair do pantanal da recessiio eco- ndémica, da instabilidade politica e da confusdo cultural. Nos Estados Uni. dos, também se intensificaram as guerras culturais,em que os assaltos direi- tistas ao “politicamente corteto” funcionaram como arma de ataque as forcas € idéias progressistas. Na ultima década também surgiram novas tecnologias que mudaram os padres da vida cotidiana e reestruturaram poderosamente o trabalho e o lazer. As novas tecnologias do computador substituiram muitos empre- 05 € criaram outros novos, oferecendo novas formas de acesso A informa- Gao € 4 comunicac4o com outras pessoas € propiciando as alegrias de uma nova esfera publica informatizada.As novas tecnologias da midia e da infor- matica, porém, sao ambiguas ¢ podem ter efeitos divergentes. Por um lado, proporcionam maior diversidade de escotha, maior possibilidade de auto- nomia cultural ¢ maiofes aberturas para as intervencdes de outras culturas e idéias. No entanto, também propiciam novas formas de vigilancia e con- trole,em que os olhos € sistemas eletrénicos instalados em locais de traba- Iho funcionam como encarnagio contemporinea do Grande Irmiio.As no- vas tecnologias da midia também propiciam poderosas formas de controle social por meio de técnicas de doutrinacao ¢ manipulacao mais eficientes, sutis € ocultas. Na verdade, sua simples existéncia ja cria a possibilidade de minar as energias politicas ¢ de manter as pessoas bem guardadas dentro dos confins de seus centros de entretenimento doméstico, distantes do tu- multo das multidées ¢ dos locais de acao politica de massa. Como fendémeno historico, a cultura da midia é relativamente recen- te. Embora as novas formas da indistria cultural descritas por Horkheimer e¢ Adorno (1972) nos anos 1940 - constituidas por cinema, radio, revistas, histérias em quadrinhos, propaganda e imprensa -, tenham comecado a co- lonizar o lazer ¢ a ocupar o centro do sistema de cultura ¢ comunica¢gio nos Estados Unidos e em outras democracias capitalistas, foi s6 com o ad- vento da televisio, no pés-guerra, que a midia se transformou em .for¢ca do- minante na cultura, na socializacio, na politica e na vida social (Kellner, 1990a).A partir de entao, a TV a cabo € por satélite, o videocassete ¢ outras tecnologias de entretenimento doméstico, além do computador pessoal - mais recentemente ~ aceleraram a disseminagio ¢ o aumento do poder da cultura veiculada pela midia. 26

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