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‘Com artigos adicionais de Nathaniel Brandew TRABUCAO ON LINE Assessoria em Idiomas REVISAO DA TRADUCAO Winston Ling Candido Mendes Prunes Z EDITORA ORTIZ 9A, Supervisto elitori!: Vinia Conde we Supervisio grifica: Rogerio Vateas Capa: Cunaicos dsuidio de Criaea ImpressSa: Pollona BaGBst & FICHA CATALOGRAFICA (reproduco reduzids da fioha 7.8 x 12.5 em) Riéev RAND, Av, 105-1982 A virtude dp egoismo / Ayn Rand; traduaide or On Line-Asnescoria ern idiomas; traduoto revis. %9 por Winston Ling @ Candide Mendes Prunes, — Porto Alegre: Ed, Otiz/IBE, 1861, 1, Filosofia 2, Etisa 8. Objeth sie bjetvisma 4. Eyolame f, ISBN 85.85770-1.9 cou Ty eicteaita responsével: Rosa Liicia Vieira Maidana Copyright © 196t, 1968 by ays Rand Copyright © 1962, 1963, 1964 by The Objectivist Nevsleter In. Do original: THE VIRTUE OF SELFISHNESS ‘Todos os dircitos esiio reservados & Editore Ortiz S/A, 1 digo brasileira impreasa erm marco de 1901, ee ©18, Individualismo falsificado, Nathaniel Branden (1962). exaepe age exezxx 4 nen enseeE Ea E224 EXER EDEL ELIS EEAEEEEEESIZIAEEEEIZ SUMARIO Apresentagdo da edigao brasileira 7 Prefacio a edig&o argentina .. 9 Introdugao., oF 1, A ética Objetivista, Ayn. 20 2, Satide mental versus misticismo ¢ auto-sacrificio, Natha- niel Branden (1963) .. 4g 3. A dtica nas situagdes de emergéncia, Aym Rand (1963)... $7 4. Os “conflitos” de interesses entre os homens, Ayn Rand (1962), 66 5. Nao somos todos egoistas?, Nathaniel Branden (1962)... 75 6. A psicologia do prazer, Nathaniel Branden (1964) 80 7. A vida nao requer um pacto?, Ayn Rand (1962)... 89 8. Como levar uma vida racional numa sociedade irraci nal?, Ayn Rand (1962) 92 9, G culto da moral indefinida, Ayn Rand (1964) 97 10. A ética coletivizada, Ayn Rand (1963)... 103 LL. Os construtores de monumentos, Ayn Rand (1962). 12, Os direitos do homem, Ayn Rand (1963) 13. “Direitos”’ coletivizados, Ayn Rand (196: 44. A natureza do governo, Ayn Rand (1963). 15, Financiamento do governo numa sociedade livre, Ayn Rand (1964) ve 145 16. O sagrado direito estagnagaio, Nathaniel Branden (1963) 151 17. Racismo, Ayn Rand (1963) 19. A intimidagao como argumento, Ayn Rand (1964) Notas . AEESAEEEENRUAWOLLEXYELESEEEE2.220RLXEULEEELELIEEEEZELIZEZIALEZE, APRESENTACAO DA EDICAO BRASILEIRA A. contribuicZo dada por Ayn Rand ao pensamento filosdti- co deste século vem ganhando cada vez maior reconhecimento, es pecialmente nos meios académicos norte-americanos. Um numero sempre crescente de fildsofos, economistas, historiadores e psicdlo- gos vem se debrucando sobre o legado intelectual de Ayn Rand, ‘como provam as diversas obras publicasias apés a sua morte, ocor- rida em 1982, ‘ No Brasil, Ayn Rand passou a ser conhecida do piiblico leitor através de seu romance mais famoso, Quem é John Galt?, publica- do’em portugués em. 1987, exatos trinta anos apés a primeira edi- 940 norte-americana. Com A virtue do. egofsmo. ocorreu algo muito semelhante: um dos principais ensaios deste livro (A ¢tica Objetivista) foi originalmente apresentado como uma conferéncia iia Universidade de Wisconsin, em 1961. Hoje, decorridos nova- mente trinta anos, os leitores brasileiros tém oportunidade de co- ahecer mais profundamente a faceta filos6fica de Ayn Rand. Este fivro foi a primeira obra de néo-ficcéo publicada por Ayn Rand, embora, na verdade, os seus romances nao tivessem ‘um carater puramente ficcional. "Ap6s ter safdo a primeira edigdo de Quem é John Galt?, em 1957, Ayn Rand dedicou-se exclusivamente a escrever sobre sua fi- losofia, o Odjetivismo, numa publicacdo intitulada The Objecti- vist Newsletter. Por meio desta ¢ do “Nathaniel Branden Institu- te”, a Filosofia Objetivista ganhiou um enorme impulso na déca- da de sessenta. Toda uma geracio foi marcada pelo que escreveu ¢ ensinou Ayn Rand naquele periodo. Em meados da década de sessenta, a longa associagdo entre ‘Ayn Rand ¢ Nathaniel Branden, que foi uma espécie de porta-voz 8 Avirtude do egofema « oS € intimo colaborador do movimento Objetivista, terminou, Eo fim dela acabou arrefecenido o proprio movimento que, aquela al- tura, jé ganhava corpo e se insinuava nos meios universitarios ¢ na midia, Os livros de Ayn Rand, entretanto, continuaram a ven- der como sempre, No comego da década de oitenta, ela ja havia batido a marca de mais de 20 milhdes de copias vendidas, entre obras de ficgdo € ndo-ficgaot ‘A publicaeao de A virtude do egotsmo em portugués ¢ mais do que oportuna. Significa o resgate de um debate que ja deveria ter comecado entre nds ha trinta anos, mas que, incompreensivel- mente, apenas agora e gracas & iniciativa do Instituto de Estudos Empresariais, tem inicio. Um debate sobre os fundamentos de uma sociedade de homens livres, os postulados éticos sobre os quais devem repousar as instituigdes sociais, o verdadeiro papel que 0 governo tem a desempenhar, os equivoces filoséfices que so mascarados pelo uso inadequado da linguagem e as conseqlién- cias de todas essas questdes para a sobrevivéncia do homiem. O livro que o leitor tem nas maos nao é um tratado de filoso- fia, como bem adverte a autora em sua Introdueao. Trata-se de uma obra gue sistematiza alguns aspectos da filosofia de Ayn Rand, anteriormente exposta em seus livros de fice&o, especialmen- te Quem é John Galt? ¢ The Fountainhead, esia tiltima ainda iné- dita em portugués, e a aplicagdo da mesma a questées cotidianas. Embora escrito hé trinta anos, nenhum dos ensaios perdeu atuali- dace, Antes pelo contrério. Os problemas identificados por Ayn Rand continuam atuais e, dada a sua universalidade, também nao se restringem aos Estados Unidos. Para o leitor brasileiro basta alterar, sem nenhuma dificuldade, datas e nomes de protagonistas para ter a impressdo de que a autora se refere a fatos que ocorrem hoje neste pais. E ao final da leitura descobrird a razao para iss todos os principais problemas que hoje enfrentamos so resulta- do de uma determinada visio ética do mundo, comum aos mais diversos periodos histéricos. Ko Objetivismo se prope a desafiar essas concepydes atdvicas e a oferecer uma afternativa compativel com a natureza racional dos homens. Candido Mendes Prunes egagangeencerrggugx42124 1242022202002 2EELEEEEEELIEIEERIEELIZIEE, PREFACIO A EDICAO ARGENTINA Idéias, Idéias novas. , Em todos os niveis culturais —- desde os citculos intelectuais sis sofisticados, até 0 homem comum, que sO teve acess @ uma modesta instrugia — se reclamam par idéias novas. . ‘© pensador espanhol Julidn Marfas, em uma conferéncia rea~ lizada em 12 de julho de 1983, em Buenos Aires, comentou “... a melancélica tristeza que me produz.a decadéneia intelectual do mundo” ¢ assinalou como causa dos problemas cruciais da huma- nidade “... a utilizagio, em todos os niveis, de idéias arcaicas, que nfo tém mais nada a ver com nossa realidade atual”. Politicos, jornalistas, economistas, escritores, pensadores de todas as corren- tes, juntam suas vozes 4 esta declaracao. "Antecipando-se a estes comentarios € aos de outros pensado- res que cito aqui, Ayn Rand, em conferéncias proferidas nas Uni- versidades de Yale, Brooklin e Colimbia, em 1960, pronunciou-se severamente a esse respeito, dizendo: **... munca antes © mundo clamou tdo desesperadamente por respostas a problemas eruciais. .. munca antes o miundo se apegou to freneticamente & crenea de que niio ha vespostas possiveis"”. Vivemos um tempo de transigo, 0 momento de uma grande mudanga. Como disse C. W. Ceram — autor de Deuses, aimulos ¢ sdbios — em sua obra Yestermorrow: “... com o séeulo vinte es- té se acabando um periodo da historia da Homanidade que abar- ca cinco milénios. Opondo-se a Oswald Spengler e a sett conceito de que 0 Ocidenie estd terminando, a nossa situagao nao se asse- melha & de Roma do comeco da era crist, mas sim & do homem de 3,000 anos antes de Cristo. Da mesma forma que o homem pré- hist6rico, levantamos os olhos ¢ enfrentamos um mundo completa 10 Avirtude do egeisme mente novo.’* Um sistema de vida vai chegando ao fim e um novo surge, adequando-se A realidade e as necessidades de hoje. Todos nés no- tamos que as respostas tradicionais, que nunca solucionatam na- da, deixaram de ter qualquer efeito; que fazer falta conceitos no- vos, sdlidos, coerentes, que ponham fim & defasagem intelectual entre 0 colossal avanco tecnoldgico ¢ o confuso conjunto de idéias atavicas que © homem moderio continua aceitaudo somente por tradigao, Aperceber-se disto, naturalmente, gera nos homens uma sensa- cao de inseguranca ¢ angtistia. Eo medo do novo, do desconheci- do, Presos em seus pequenos ¢ — para a maioria — desconfortd- veis ninhos, as pessoas se agarram a eles temendo o momento de abrir suas asas © voar. A mudanga ja estd presente. Herber Read, fildsofo britanico da arte, disse que: “‘Nestes tempos participamos de uma mudan- a tio fundamental, que devemos retornar um longo percurso pa- ra encontrar um paraleio, Talvez somente comparavel mudanga verificada no término do perfedo paleolitico e na transigio para © neolitico.”” ‘Estruturas arcaicas sao derrubadas. Da mesma forma que aque- las drvores que crescem ¢ mudam com cortes, também o homem terd de abandonar suas idéias, suas crencas e suas vivéncias total- mente esclerosadas, mais adequadas a um ser irracional ¢ indefe- so do que a sua condigo de explorador do espaco e do dtomo, criador e modificador da vida, conquistador da Natureza, Estas novas idéias, csse moderno fundamento de existéncia exigido pela realidade atual, foram concebidos por Ayn Rand, quem Jangou ao mundo, entre 1933 1982, sua Filosofia Objetivista, Com uma clareza de raciocinio que a converte em gigante da filosofia, elaborou, com precisio matemdtica ¢ simplicidade qua- se inaudita, a perfeita concatenagio de um sistema filaséfico racio- nal carente de contradicées, estritamente baseado na légica e na realidade, e coerente com a natureza do homem, Suas idéias, combatidas e condenadas por intelectuais, pseu- do-intelectuais misticos aferrados a antigas estruturas decadentes, foram passo a passo abrindo caminho nos circulos intelectuais, mais flexiveis, predispostos a mudancas, especialmente entre estu- Prefécio @ edigdo argentina 11 nen nntennattne nt dantes universitétios. Hoje em dia se comegam a notar os efeitos, Na Noruega, o politico Anders Lange declarou publicamente que a plataforma de seu partido se funda na filosofia de Ayn Rand, Igualmente os “tibertarios”” dos Estados Unidos reconhecem nela a fonte ¢ 0 guia, Colaboradores da pensadora, tais como 0 econo- mista Aisn Greenspan, atuaram como conselheiros do Presidente Ronald Reagan. As recentes vitadas editoriais nos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha Federal, Suécia, Austria, indicam que as idéias de liber- dade ¢ de direitos do individuo — coluna vertebral da Filosofia Objetivista — comegam a firmar-se, A obra filoséfica de Ayn Rand abarca os cinco ramos que compéem a filosofia: metafisica, em seu livro Philosophy: Who needs it; epistemologia, a ciéncia do conhecimento, em Iniroduc- tion to Objectivist epistemology; ica, neste livro; politica, em Capitalism, the unknown ideal, eestética, em The romantic manifesto, Outros livros da autora so seus romances Quem é John Galt? (Atlas shrugged)*, We the living, The fountainhead, Anthem, The night of January 16th, The new left: The anti-industrial revolution e For the new intellectual. As idéias de Ayn Rand apresentar-se- o ao leitor como um verdadeiro desafio, uma filosofia absoluta- mente nova, integra e sem claudicagies. Conheeé-la é imprescindi- vel e, afinal, inevitavel. Bertrand Russell, que ja nao concordaria com as idéias de Ayn Rand, disse, em sua obra Fundamentos de filasofia: “Nenhu- ma filosofia pode passar sem prestar atengdio as mudancas nas nossas idéias da mundo fisica que os homens da cigncia acredita- ram necessério introduair: pode-se dizer, com razio, que todas as filosofias tradicionais serio descartadas, e que teremos de comecar de nove com o menor respeito possivel pelos sistemas do passado. Nosso tempo penetrou mais profundamente na natureza das coi- sas como nenhum outro, ¢ seria inadequadamente modesto sobres- timar o que ainda pode-se aprender com metafisicos dos séculos XVII, XVIII ¢ XIX.” “alas skiueged foi publica em portususs sob o titulo Quem & John Gait? (Rio de Je acito, Exped, 1987). (N.T) 12 Avirtude do egoisme ca E_J. Bronowski, 0 sdbio autor de A ascensdo do homem, advertiu em 1973: “© conhecimento é uma responsabilidade pela integridade do que somos, primordialmente come criaturas éticas. E nao podemos manier essa integridade se deixamos que os de- mais dirijam o mundo por nds, enguanto nos dedicamos a viver com base numa moral vinda de crengas passadas. Daqui a cinqtien- ta anos, se 0 conhecimento da origem do homem, sua evolucao historica € seu progresso, nao for lugar comum nos livros-texto, entio no existiremos mais.”” A seguir, como breve biografia de Ayn Rand, estd transerito parte de meu artigo Ayn Rand ¢ a Filosofia da Razdo, que, co- mo uma homenagem e coincidéncia com o primeito aniversério de sua morte, foi publicade em 6 de marco de 1983 no jornal La Prensa, de Buenos Aires. A sra. Ayn Rand nasceu em 2 de fevereiro de 1905, em Sio Petersburgo, hoje Leningrado, no seio de uma familia judia de clas- se média, Graduou-se na Universidade em 1924 enquanto enfrenta- ‘ya 0s horrores da revolucio comunista. Em 1926 consegniu emigrar para os Estados Unidos, dirigin- do-se a Hollywood para trabalhar como extra de cliema e ajudan- te de roteitista. Ao longo da década de trinta, iniciou sua carreira de roteiris- ta para a Universal, Paramount e MGM. Também redigi seu pri- meiro romance We the living — uma obra comovedora, ambienta- da na Rissia, sobre ss condigées de vida dos habitantes submeti- dos a um sistema de governo totalitirio, Sobre esta obra diria: no é um romance sobre 4 Riissia Sovittica. I um romance sobre © individuo contra o Estado. O tema bisica é a sacralidade da ve da humana, no no sentido mistico, mas sim no de “valor supre- mo”. Durante o governo de Mussolini foi filmada uma versio pi- rata desse romance — protagonizada por Alida Valli e Rossano Brassi —-, a qual foi seqiiestrada peto proprio governo fascista que havia autorizado a filmagem, ao se dar conta de que a obra néo apontava contra uma ditadura em particular, mas sim contra to- das elas em geral. We the living, entretanto, a0 ser publicada em 1934, foi des- trocada pela critica literdria da época — jd entiio substanctalmen- te invadida pela intelectualidade esquerdista — ¢ teve que esperar | | Prefacie & edigdo argentine 19 até 1966, quando a primeira reimpressio alcancou 400.000 edpias, Floje ew dia a obra ja vendeu milhdes de exemplares e foi traduzi- da para os principais idiomas. Pouco antes de publicar We the living Ayn Rand apresentou a sua primeira obra teatral — Noite de 16 de janeiro —, que se converteu emt um dos clissicos do teatre norte-americano. Em 1938 ela publicou —- na Inglaterra — o romance Anthem, sobre uma sociedade que proibiu o uso da palavra “eu”, trocan- do-a por “nds”, e a longa e penosa luta de um homem psra redes- cobri-la. Em 1943 velo & luz The fountainhead — outra obra que atin- giu cifras milionérias de vendas em todo o mundo —, uma epo- péia de um arquiteto que faz voar para os ares sua propria criagdo ao descobrir que 0 seu. desenho fora adulterado. Essa obra foi le- vada para as telas do cinema através da interpretagao de Gary Co- oper ¢ Patricia Neal. Sua principal obra foi publicada quatorze anos depois. Atlas shrugged & um dos clissicos da literatura norte-americana, haven- do j4 amplamente superado os 10 milhdes de exemplares na versio de iingua inglesa, A partir desse momento, e devido ao extraordi- nario interesse que despertaram suas idéias, principalmente entre 0s jovens universitérios, Ayn Rand se dedicou — com 0 apoio de colaboradores como Nathaniel Branden, Robert Hessen e Leonard Peikoff -- a popularizar sua filosofia através de livros, revistas ¢ conteréncias em universidades, etc. A Sra. Rand morreu na cidade de Nova lorque, em 6 de mar- go de 1982, Manfred F. Schieder AZREEADELEEEEERUSAEDEUELLLL SAU EEEEATEUEEAEELELLELUEELEELITA INTRODUCAO © titulo deste livro pode despertar o tipo de pergunta que ouce de vez em quando: “Por que voce utiliza a palavra ‘cgois- mo’ para denotar qualidades virtuosas de caréter, quando esta pa- lavra cria antagonismo entre tantas pessoas para quem cla nao sig- nifica o mesmo que para voce?” Para aqueles que fazer esta pergunta, minha resposta é “Pe- a razio que faz vocé ter medo dela.” ‘Mas ha outros que ndo fariam esta pergunta, sentindo a co- vardia moral que a mesma acarreta, e que silo, contudo, incapa- zes de formular minha razo real ou identiffear a profunda ques- 180 moral envolvida. Para eles é que darei uma resposta mais explicita. ‘Nao é uma mera questo semantica, nem um problema de es- colha arbitrétia, O significado atribuido pelo uso popular @ pala- vra “egoismo” nao estd, simplesmente, errado: representa uma te- niversacdo intelectual devastadora que é responsdvel, mais do que qualquer outro fator, pelo restrito desenvolvimento moral da humanidade. ‘No uso popular, a palavra “egoismo”’ é um sindnimo de mal- dade; a imagem que invoca é de um brutamontes homicida que pisa sobre pilhas de cadéveres para alcangar seu proprio objetivo, que ndo se importa com nenhum ser vivo ¢ persegue apenas a re- ‘compensa de caprichos inconseqitentes do momento imediato. Porém, significado exato e a definicdo do diciondrio para apalavra “egoismo” é: preocupacdo com nossos préprios interesses, Este conceito nio inclui avalingao moral; nao nos diz se a pre ocupagio com os nossos préprios interesses € hoa ou md; nem nos diz 0 que constifuem os interesses reais do komem, E tarefa da ética responder a tais questées, a 14 Intwodestio 15 cnc. A ética do altruismo criou a imagem do brutamontes, como sua fesposta, a fim de fazer os homens aceitarem dois prineipios desumanos: (a) que qualquer preocupacao com nossos préprios in- ieresses é nociva, ndo importando o que estes interesses possam representar, e (b) que as atividades do bratamontes so, na ver- dade, a favor dos nossos préprios interesses (que o altruismo im- pée a0 homem renunciar pelo bem se seus vizinhos). Para uma visdo da natureza do aitruismo, suas conseqiiéncias ea enormidade de corrupgdo moral que perpetra, recomendo a lei- tura de minha obra Adias shrugged ~— ow a qualquer uma das man- chetes dos jornais de hoje. © que nos preocupa aqui ¢ a omissiio Go altruismo no campo da teoria da ética. Hi dois questionamentos morais que o altruismo reine den- zo de um tinico “pacote’: (1) © que,siio valores? (2) Quem deve set 0 beneficidrio dos valores? © altruismo substitui 0 primeiro pelo segundo; ele foge da tarefa de definir um eddigo de valores morais, deixando 0 homem, assim, na verdade, sem diretriz moral. ‘O altrufsmo declara que qualquer aco praticada em beneficio dos outros boa, e qualquer agao praticada em nosso préprio be- eficio € ma, Assim, o henefieidrio de uma ago € o nico critério de valor moral — ¢ contanto que o beneficidrio seja qualquer um, salvo nés mestnos, tudo passa a ser valido. Daf a imoralidade assustadora, a injustica cronica, os grotes- cos padres duplos, os conflitos e as contradicées insohiveis que tém caracterizado os relacionamentos humanos ¢ as sociedades hu- manas através da historia, sob todas as variantes da ética altrufsta, ‘Observe a indecéneia do que se consideram julgamentos mo- rais atualmente, Um industrial que produz uma fortuna e um gan; ster que rouba um banco sio considerados igualmente imorais, ja que ambos procuraram fortuna para 0 seu proprio beneficio “ego- fsta", Um jovem que desiste de sua carreira para sustentar seus ‘pais € nunca sobe além do posto de empregado de mercearia ¢ con- siderado moralmente superior aquele que suporta uma luta dificil ¢ conquista sia ambicdo pessoal. Um ditador ¢ considerado mo- ral, desde que as indescritiveis atrocidades cometidas tenham tido a intenc&o de beneficiar *“o povo”, nfo a ele mesmo. Observe 0 que este critério morai, que considera apenas o be- neficitio, faz 4 vida de um homem, A primeira coisa que ele apren- 16 Avirtude do agoismo we de é que a moralidade ¢ sua inimiga: no ganha nada com ela, apenas perde; tudo o que ele pode esperar so perdas auto-impos- tas, dores auto-impostas ¢ 0 manto cinzento e deprimente de uma obrigaco incompreensivel. Ble pode esperar que os outros pos- sam, ocasionalmente, sacrificar-se em seu beneficio, assim como ele se sacrifica de mé vontade, em beneficio deles, mas ele sabe que tal relacionamento 56 produziré ressentimentos muituos, nao prazet — e que, moralmente, esta busca de valores serd como uma troca de presentes de Natal nao desejados ¢ niio escolhidos que nenhum deles se permite, moralmente, comprar para si mes- mo, Exceto nos momentos em que conseguir realizar algum ato de auto-sacrificio, ele carecerd, como pessoa, de qualquer significa- do moral: a moralidade ndo toma conhecimento dele ¢ ndo tem nada a dizer-lhe como orientag3o nas questdes cruciais de sua vi- da; esta € somente sua vida pessoal, privada, “egoista”” ¢, como tal, € considerada, ou maléfica ou, na melhor das hipoteses, amoral, Dado que a natureza néo prové o homem com uma forma automiatica de sobrevivencia, dado que ele tem de sustentar sua vida através de seu propria esforgo, a doutrina que diz que a pre- ‘ocupacao com nassos proprios interesses € nociva significa, conse- qiontemente, que 0 desejo de viver do homem é nocivo — que a vida do homem, como tal, é nociva. Nenhuma doutrina poderia ser mais nociva do que esta. Todavia, este € 0 significado de altruismo, implicito nestes exem-~ plos que igualam um industrial a um ladrao. Ha uma diferenga moral fundamental entre um homem que vé seu auto-interesse na produgdo ¢ um outro que o vé no roubo, A maldade de um la- rao milo repousa no fato de que ele persegue seus proprios interes- ses, mas no que ele considera como sendo seu proprio interesse; ndio no fato de que ele busca seus vaiores, mas no que ele escolheu para valorizar; naio no fato de que cle deseja viver, mas no fato de ele querer viver num nivel sub-humano. (Veja A ética Objetivista.) Se for verdade que o que quero dizer com “egoismo” néo & ‘© que significa convencionalmente, entdo esta € uma das piores acusacées que se pode fazer contra o altrufsmo: significa que o al- truismo nao permite conceito algum sobre um homem que se au- to-respeita e & independente economicamente — um homem que sustenta sua vida através de seu préprio esforco e nem se sacrifi- Introduséo 17 ca pelos outros nem sacrifica os outros por si. Isto significa que © altruismo nao permite outra visio dos homens, que ndo seja a de animais para sacrificio ¢ beneficiérios-do-sactificio alheio, co- mo vitimas ¢ parasitas — que ndo permite 0 conceito de uma coe- xist@ncia benevolente entre os homens — que néio permite 0 con- ceito de justign, i Se vocé se pergunta quais so as razdes por tras da feia mistu- ta de cinismo ¢ culpa na qual a maioria dos homens desperdica suas Vidas, estas so as razdes: cinismo, porque eles ndo praticam nem aceitam a moralidade altruista — cnlpa, porque eles no se atrevem 2 rejeité-la. Para rebelar-se contra um mal tao devastador, € preciso rebe- lar-se contra sua premissa basica, Para redimir ambos, o homem € 2 moralidade, & 0 conceito de “egoismo”” que se tem de redimir, O primeira passo é defender o direito do homem a uma exis- téncia moral racional — que é reconhecer sua necessidade de um cédigo moral para guiar o rumo e a realizagio de sua propria vida. Para um breve esboco da natureza e da validade de uma mo- ralidade racional, vela minha palestra sobre A ética Objetivista, gue segue. As razdes pelas quais o homem precisa de um eddigo moral dirdo a voc’ que © propésito da moralidade é definir 0s in- teresses ¢ valores adequados ao homem, que @ preoeupacio por seus préprins interesses ¢ a esséncia de uma existéncia moral, © que o homem deve ser 0 beneficidrio de seus préprios atos morais. Dado que todos os valores tém de ser ganhos e/ou mantidos pelas ages do homem, qualquer brecha entre o ator ¢ o benelicia- tio implica uma injustiga: o sacrificio de alguns homens em favor de outros, dos que ages em favor dos que nao agem, dos que tém moral em favor dos imorais. Nada poderia jamais justificar tal brecha, ¢ ninguém nunca o fez. A escolha do beneficidrio dos valores morais ¢ meramente uma questo preliminar e introdutéria no campo da moralidade. Nao € um substituto para a moralidade, nem um critério de valor moral, como é apresentado pelo altruismo. Nem é tampouco um fundamento moral: ela tem de ser derivada de e validada pelas pre- missas fundamentais de um sistema moral. A ética Objetivista sustenta que o ator deve ser sempre 0 be- neficiario de sua agdo, e que o homem deve agir para seu proprio 18 A virtude do egolime ow auto-interesse racional, Mas seu direito de fazer tal coisa ¢ deriva- do de sua natureza como homem e da funeao dos valores morais na Vida humana — ¢, por conseguinte, ¢ aplicavel somente no can- texto de um cédigo de prineipios morais racional, objetivamente demonstrado ¢ validado, que defina e determine seu real auto-ime- esse. Nao é uma licenca “para fazer o que Ihe agrada”, endo é aplicivel a imagem altruista de um brutamontes “egoista”, nem a qualquer homem motivado por emogées, sentimentos, impulsos, desejos ou caprichos irracionais. Isto é dito como uma adverténcia contra o tipo de “egofstas nietzschnianos”” que, de fato, so um produto da moralidade al- truista e representam 0 outro lado da moeda altrufsta: os homens que acreditam que qualquer ato, ndo importando sua natureza, € bom, se pretendido em beneficio proprio. Do mesmo modo que a satisfacde dos desejos irracionais dos demais ndo € um critério de valor moral, ndo 0 é também a satisfago de nossos proprios desejos irracionais. A moratidade nao ¢ um concurso de caprichos. (Veja artigos de Branden, Individualismo falsifiendo e Néo somos todos egoistas?, que seguem.} Um tipo de erro similar é cometido pelo individuo que decla- ra que, j4 que o homem deve ser guiado por seu préprio julgamen- to independente, quaiquer ato que ele escolha realizar é moral, contanto que ele o faca, Nosso proprio julgamento independente €0 meio pelo quai nds devemos escolher nossos atos, mas no € um critério, nem uma justificativa moral: somente a referéncia a um principio demonstravel pode validar nossas escollias. Assim como o homem nao pode sobreviver por quaisquer meios alestérios, mas deve descobrir e praticar os principios que sua sobrevivéncia requer, assim tampouco pode 0 auto-imeresse do homem set determinado por desejos cegos ou caprichos arbitra- rigs, mas tem de ser descoberto e conquistado sob a diretriz de prinefpios racionais. F por isso que a ética Objetivista é uma mora- lidade de auto-interesse racional — ou de egoismo racional. Dado que o egoismo é “‘preocupagio com nossos préprios in- teresses", a ética Objetivista utiliza este conceito no seu sentido mais puro ¢ exato. Nao € um conceito de que se possa render-se gs inimigos do homem, nem aos falsos conceitos, distorgdes, pre- conceitos e medo dos ignorantes ¢ dos irracionais. O ataque ao “e- Introducéo 19 goismo” € um ataque & auto-estima do homem; render um é render o outro. Agora unta palavra sobre o material deste livro. Com exeegiio da conferéncia sobre étiea, trata-se de uma colegdo de ensaids pu- blicados em The Objectivist Newsletter, am periédico mensal de idéias, editado e publicado por Nathaniel Branden ¢ cu. Este bole- tim trata da aplicacdo da filosofia do Objetivismo as questoes problemas da cultura atual — mais especificamente com aquele nivel intermedidrio de interesse intelectual que repousa entre as abstracdes filoséficas e as idéias jornalisticas concretas do dia-a- dia. Seu objetivo é prover os leitores com um marco de referéncia filosofica consistente, Esta colegdo ndo é um tratado sistemdtico de ética, mas uma série de ensaios sobre aqueles temas éticos que precisavam de escla- recimento, no contexto atual, ou que tinham se tornado confusos pela influéncia do altrufsmo. Voeé pode observar que os titalos de alguns ensaios esto na forma de pergunta, Estes vém de nos- so “Departamenta de Munigao Intelectual’’, que responde as per- gunias enviadas pelos nossos leitores. Ayn Rand (Nova Torque, setembro de 1964) P.S. Nathaniel Branden nao é mais ligado a mim, a minha filo- sofia ou ao The Objectivist (antigamente The Objectivist Newsletter). (ova Lorque, novembro de 1970) RELEEEYADUELENERUQUGEALTLEIIEEAEITEE LE YLEAELEATLELEXEIZIAELEZE AETICA OBJETIVISTA Ayn Rand J4 que vou falar sobre a ética Objetivista, posso comegar citando seu melhor representante — John Galt, em Alas shrugged: “Durante séculos de flageios ¢ desastres ocasionados pelo seu cédigo de moralidade, voces gritaram que seu cédigo foi quebra- do, que os tormentos eram punigdes por ndo havé-lo respeitado, que os homens eram fracos ¢ egoistas demais para derramar todo © sangue exigido. Vocés amaldigoaram 0 homem, amaldicoaram a existéncia, amaldigoaram esta terra, mas nunca se atreverara a questionar seu codigo... Vocés continuaram clamando que o seu cédigo era nobre, mas a natureza humana no era boa o suficien- te para pratica-lo. E ninguém se levantou para perguntar: bom? = por qual critério? ‘Vocés queriam saber a identidade de John Galt. Eu sou 0 bo- mem que fez aquela pergunta. Sim, esta & uma era de crise moral... Sen cédigo moral alean- cou seu climax, um beco sem saida ao final do seu trajeto. E se voo8 deseja continuar vivendo, o que precisa agora no é retornar & moralidade... mas descobri.ta.”! © que é moralidade, ou ética? E um eéddigo de yalores gue orienta as escolhas e as agGes do homem — escolhas ages estas que determinam propésito ¢ o rumo de sua vida. A ética, co- mio ciéncia, trata da descoberta ¢ da definigdo deste cédigo. A primeira pergunta que deve ser respondida, como uma con- dicdo prévia de qualquer tentativa para definir, para julgar ou pa- ra aceitar qualquer sistema especifico de ética, é por que o homem 20 A ética Objetiviste 21 precisa de um cédigo:de valores? Deixe-me ressaltar isto. A primeira pergunta nao é que od digo especifico de valores o homem deve aceitar? A primeira per~ gunta & 0 homem precisa de valores, afinal — ¢ por qué? * Serd 0 conceito de valor, de ‘Bem ou Mal", uma invencdo humana arbitraria, ndo relacionada, nao derivada, e no sustenta- da por nenhum fato da realidade — ou esta ele baseado num fa- to metafisico, uma condicao inalterdvel da existéncia do homem? (Urilizo a palavra “‘metafisica’” significando: aquilo que diz respei- to A realidade, & natureza das coisas, a existéncia.) E decreto de uma converico humana arbitréria, de um mero costume, que 0 homem deve orientar seus atos por um conjunto de prinefpios — ou existe um fato da realidade que exige isto? A ética ¢ o territé- rio dos eaprichos: das emocdes pessoais, convengdes sociais e reve- lagdes misticas — ou é 0 tertitério da razio? A ética € um Inxo subjetivo — ou uma necessidade objetiva? No triste registro da histéria da ética da humanidade — com pouucas, raras e malogradas excegdes — os moralistas tém conside- rado a ética como wm territério dos caprichos, isto : do irracio- nal. Alguns deles o fizeram explicitamente de propésito — outros implicitamente, por omissdo. Um **capricho"” ¢ um desejo experi- mentado por uma pessoa que ndo sabe ¢ no se importa em desco- brit sua causa. Nenhum filésofo deu uma resposta racional, objetivamente demonstrével e cientifica, & pergunta do porqué do homem preci- sar de um cddigo de valores. Enquanto esta pergunta permaneceu inrespondida, nenhum cédigo de ética objetivo, racional e cientifi- co pode ser descoberto ou definide. © maior de todos 0s filéso- fos, Aristételes, ndo considerava a ética como uma ciéncia exata; ele baseou seu sistema ético em observacdes a respeito do que os homens sdbios e nobres de seu tempo escothiam para fazer, deixan- do sem resposta as perguntas: por que eles escoihiam fazé-lo, ¢ por que ele os considerou nobres e sabios. ‘A maioria dos fildsofos consideravam a existéncia da ética co- mo certa, como um dado, como um fato histérico, ¢ no estavam interessados em descobrir sua causa metafisica ou sua validacdo objetiva. Muites deles tentaram quebrar 0 monopélio tradicional do misticismo no campo da ética para, supostamente, defini uma moratidade racional, cientifica e nfio-religiosa. Mas suas tentativas consistiram em aceitar as doutrinas éticas dos misticos tratando de justificd-las sob fundamentos sociais, meramente substituindo Deus por Sociedade. Os misticos declarados sustentavam a arbitraria e inexplicdvel “vontade de Deus" como o padre do bem ¢ como a validagao de sua ética. Os neomisticos substituiram-no por “a bem da socie- dade’, caindo assim na circularidade da definicdo de que “‘o crité- rio do bem é aquilo que € bom para a sociedade”. Isto significou, na idgica — e, hoje, na prdtica no mundo inteiro —, que a “‘socie- dade” mantém-se acima de quaisquer principios de ética, ja que ela ¢ a fonte, o padrao ¢ o critério de ética, j4 que “o bem’ & tu- do 0 que a sociedade deseja, tudo o que ela pode reclamar como sendo seu proprio bem-estar e prazer. Isto significou que a “socie~ dade” pode fazer o que ela quiser, j& que “Yo bem’ & tndo aqui- Jo que ela escolhe fazer simplesmente porque ela escolheu faz8-lo. F, jd que nao existe uma entidade tal como a “‘sociedade”, ja que a sociedade é apenas um numero de individuos — isto significon gue alguns homens (@ maioria ou qualquer gangue que reclame ser seu porta-voz) esto eticamente autorizados a perseguit quais- quer caprichos (ou quaisquer atrocidades) que desejem perseguir, enquanto outros homens estéo eticamente obrigados a passar suas vidas a servigo dos desejos desta gangue. Isto dificilmente poderia ser chamado de racional, no entan- to a maioria dos fildsofos decidiu agora declarar que a razdo fa- Shou, que a ética esté fora do poder da razAo, que no hé ética ra- cional que possa ser definida, e que no campo da ética — na esco- Iha de seus valotes, de suas ages, de suas ocupagdes, das metas de sua vida — 0 homem deve ser guiado por algo mais do que a razao. Pelo qué? Fé — instinto — intuigdo — revelacdo — senti- mento — gosto — impeto — desejo — eapricho. Hoje, como no passado, a maioria dos filésofos concordam que o padrdo titimo da ética € 0 eapricho (eles 0 chamam de “postulado arbitrério” ou “escotha subjetiva””, ou ainda ‘“compromisso emocional””) — ea batalha apenas sobre a questo: o capricho de quem 7: seu proprio ou da sociedade ou do ditador ou de Deus, Mesmo discor- dando entre si sobre outros temas, os moralistas atuais concordam que a ética € uma questao subjetiva ¢ que as trés coisas proibidas scecag Adtica Objetivista 23 ao seu campo so: razdo — consciéncia — realidade Se vooe se perguntar por que o mundo hoje esta afundando em um inferno cada vez mais profundo, esta serd a razzo. Esta ¢ a premissa da ética moderna ~- ¢ de toda a bistéria da ética — que deve desatiar, se voc® quer salvar a civilizagio. Para desafiar a premissa basica de qualquer disciplina, deve- mos comecar pelo inicio. Na ética, deve-se comegar perguntando: © que séo valores? Por que ¢ homem necessita valores? “Valor” é tudo aquilo pelo qual alguém age para conseguir ¢/ou manter. O conceito de “valor” nao é um conceite primédrio; ele pressupde uma resposta A pergunta: de valor para quem ¢ pa- rao qué? Ele pressupde uma entidade capaz de atuar para atingir um objetivo frente a uma alternativa. Onde nao existem alternati- vas, nao sio possiveis nem objetivos ener valores. Cito do discurso de Galt: “Hd apenas uma alternativa funda- mental no universo: existéneia ou ndo-existéncia — e ela pertence a.uma tinica classe de entidades: a dos organismos vivos. A existén- cia de matéria inanimada é incondicional, a da vida no: depende de um curso especifico de aco. A matéria é indestrutivel, ela mu- da suas formas, thas no pode parar de existir. Somente um orga- nismo vivo enfrenta uma alternativa constante: a questo da vida ou morte. A vida é um processo de ado auto-gerada e auto-susten- tada. Se um organismo falha nesta apo, ele motre; seus elemen- tos quimicos permanecem, mas sua vida cessa de existir. E somen- te 0 conceito de ‘Vida’ que faz 9 conceito de ‘Valor’ possivel. E apenas para uma entidade viva que as coisas podem ser boas ou ms.”” Para tornar este ponto totalmente claro, tente imaginar um rob6 indestrutivel, imortal, uma entidade que se move ¢ age, mas que no pode ser afetada por nada, que néio pode ser mudada em qualquer aspecto, que ndo pode ser danificada, machucada ou destruida. Tal entidade néo seria capaz, de ter quaisquer valores; ndo teria nada para ganhar ou para perder; ela nao poderia consi- derar nada come sendo a seu favor ou contra, servincdo ox amea- gando seu bem-estar, preenchendo ou frustrando seus interesses. Ela ndo poderia ter nenhum interesse ou objetivos. ‘Apenas uma entidade viva pode ter objetivos ou origind-los, E somente um organismo vivo tem capacidade para realizar agdes auto-geradas ¢ dirigidas a um objetivo. Ao nivel fisico, as fungSes 24 Avirwde de egatsme eke rennet de todos 05 organismos vivos, do mais simples a0 mais complexo ~ da funcao nutritiva na célula unica de uma amebe & circulagdo do sangue no corpo de um homer —, sao ages geradas pelo pro- prio organismo e dirigidas a um tinico objetivo: a conservagao da vida do organismo.? A vida de um organismo depende de dois fatores: o material ou combustivel que ele necessita do lado de fora, do seu meio am- hiente fisico, © a acao de seu proprio corpo, de utilizar este com- bustivel apropriadamente. Qual € 0 critério que determina o que é apropriado neste contexto? 0 critério € a vida do organismo, ‘ou: aquilo que ¢ exigido para a sobrevivencia do organismo, O organismo nao possui nenhuma opedo nesta questo: acui- Jo exigido para sua sobrevivéncia ¢ determinado pela sua nature- za, pelo tipo de entidade que & Muitas variagdes, muitas formas de adaptagdo ao meio ambiente so possiveis a um organismo, in- cluindo a possibilidade de existir durante um tempo numa condi- 0 de incapacidade, de mutilacao ou doenga, mas a alternativa fundamental de sua existéncia permanece a mesma: se um organis- mo falha nas tungdes basicas exigidas por sua natureza — se 0 protoplasma de uma ameba cessa de assimnilar comida, ou se 0 co- racio de um homem péra de bater —, ele morre. Num sentido fundamental, a néo-agio ¢ a antitese da vida. A vida pode ser mantida na existéncia apenas por um proceso constante de ago de auto-sustentacao. O objetivo desta ago, 0 valor supremo que, para ser mantido, deve ser ganho através de cada um de seus mo- mentos, é a vida do organismo, Um valor supremo é aqueie abjetivo final para o qual todos 08 objetivos menores so meios — ele estabelece 0 critério pelo qual todos os objetivas menores séo valorados. A vida de um or- ganismo € 0 scu padrio de valor: aquilo que promove sua vida é © bem, aquilo que a ameaca é 0 mal. Sem um objetivo ultimo ou fim, nao pode haver objetivos ‘ou meios menores: uma série de meios que avangam em uma pro- gressio infinita aa direco de um fim inexistente é uma impossibi- lidade meiafisica ¢ epistemoldgica. E somente um objetivo tiltimo, um fim em si mesmo, que faz possivel a existéncia de valores. Me- tafisicamente, a vida é 0 tinico fendmeno que é um fim em si mes- mo: um valor ganho e mantido por um processo constante de Aética Objetivista 25 aio. Epistemologicamente, 9 conceit de “valor” & genetivamen- te dependente ¢ derivado do conceito antecedente de “vida”, Fa- lar de ““valor”” separadamente de “‘vida’’ é pior do que uma con- tradigo em termos, ““E somente 0 conceito de ‘Vida’ que toma possivel @ conceito de “Valoc’. Em resposta aqueles fildsofos que argumentam que nenhu- ma relagdo pode set estabelecida entre os fins ou valores iltimos ¢ os fatos da realidade, deixe-me ressaltar que o fate de entidades vivas existirem e fancionarem necessita a existéncia de valores ¢ de um valor tiltimo, que para qualquer entidade viva é sua propria vida. Consegiientemente, a validacio dos julgamentos de valores deve ser obtida baseando-se nos fatos da realidade, O fato de que uma entidade viva , determina 0 que ela deve fazer, Isto é 0 sufi- ciente no que se reftere & questo da relacdo entre o “ser” €0 “‘dever””. Agora, de que mancira um ser humano descobre o conccito de “valor”? Por quais meios ele se torna pela primeira vez, cons- ciente da questo do “bem ¢ de mat” na sua forma mais simples? Mediante as sensac6es fisicas de prazer ou dor. Assim como as sen- sages so 0 primeiro passo no desenvolvimento de uma conscién- cia humana no terreno da cognigio, assim também o sfio no terre- no da valoragiio. 7 A capacidade de experimentar prazer ou dor inata no cor- po do ser humano; é parte de sua natureza, parte do tipo de enti- dade que ele &, Ele nao tem escolha a este respeito, assim como ‘tampouco tem escolha sobre o critério que determina 0 que o fa- 1 experimentar a sensagdo fisica de prazer ou dor. Que eritério é este? Sua vida, “© mecanismo prazet-dor no corpo de um homem — e nos corpos de todos 03 organisms vivos que possuem a faculdade da consciéncia — serve como um guardiio automatico da vida do or- anism. A sensacdo fisica de prazer € um sinal indicando que 0 organismo esta perseguinda o curso certo de ago. A sensagio fisi- ca de dor ¢ um aviso de perigo, indicando que o organismo esta perseguindo o curso errado de acdo, que algo esta interferindo na fungio adequada do seu corpo, o que requer uma acdo corretiva. ‘A melhor ilustrago disto pode ser vista nos raros ¢ monstruosos casos de criancas que nascem sem a capacidade de experimentar dor fisica; tais criancas ndo sobrevivem por muito tempo; elas ndo 26 Avirtude de egaismo wake tam meios de descobtir o que pode feri-las, nenhum sinal de adver- tncia, e, conseqiientemente, um corte insignificante pode desen- volver-se numa infecgdo mortal, ou uma doenga grave pade perma- necer sem ser detectada até ser tarde demais para combaté-la A consciéncia ~~ para aqueles organismos vivas que a pos- suem —~ € 0 meio basico de sobrevivencia, Os organismos mais simples, como as plantam, podem sobre: viver por meio de suas fungoes fisicas automaticas, Os organismos superiores, como os animais ¢ o homem, nao: suas necessidades sio mais complexas, ¢ 0 seu raia de acao € mais amplo. As fun- ses fisicas de seus corpos podem executar, automaticamente, so- mente a tarefa de utilizar 0 combustivel, mas néo podem obter es- te combustivel. Para obté-lo, os organismos superiores precisam da faculdade da consciéncia. Uma plania pode obter sua comida do solo no qual ela cresce. Um animal tem que cacd-la. O homem tem que produzi-la. Uma planta nao tem escolha de aco; 0s objetives que ela persegue sao automiaticos ¢ inatos, determinados por stia nature- za, Nutricéo, agua, luz solar sao valores que sua natureza determi- nou que procurasse. Sua vida € o critério de valor dirigindo seus atos, Existem alternativas nas condigdes que encontra ci seu meio ambiente fisico — como calor ou frio, seca ou enchente —, ¢ ha certas agdes que é capaz de executar para combater condisdes ad- versas, como a habilidade de algumas plantas de crescerem ¢ raste- Jarem por debaixo de uma pedra até aleangarem a luz solar. Mas sejam quais forem as condicdes, nao fa alternativa na funcdo de uma planta: ela age automaticamente para promover sua vida, cla nao pode agir para sua propria destruicao. A complexidade de agdes requeridas para a sobrevivéncia dos organismos superiores é mais ampla: ela é proporcional & comple- xidade de sua conseiéneis. As espécies conscientes inferiores pos- suem somenie a faculdade da sensaco, suficiente para direcionar suas ag6es © abastecer suas necessidades. Uma sensacao é produzi- da pola reac automatica de um éraao do sentido a um estimulo proveniente do mundo exterior; ela dura pela extensiio do momen- to imediato, contanto que o estimulo permanega, e nia mais do ue isso. AS sensagdes so uma resposta automitica, uma forma automatica de conhecimento que uma consciéneia nao pode procu- pe SB ee vis Bae, a | nance onotine a rar, nem da qual se evadir, Um organismo que possui apenas a fa- culdade da sensaco ¢ orientado pelo mecanismo prazer-dor de seu corpo, ou seja: através de um conhecimento automatico e um co- digo de valores automitico. Sua vida é o critério de valor qué diri- ge seus atos. Dentro da gama de acdes que The so possiveis, ele age austornaticamente para promover sua vida e nao pode agir pa- ra sua propria destruicao, a Os organismos superiores possuem uma forma muito mais potente de consciéneia: a faculdade de reter as sensacdes, que é a percepedio. Uma faculdade da “percepeao”” é-um grupo de sensa- Ges automaticamente retidas e integradas pele cérebro de um or- ganismo vivo, que Ihe confere a habilidade de ser consciente, nao de estimnlos isolados, mas de entidades, de coisas. Um animal nao & guiado meramente por sensagdes imediatas, mas por percepsies. Suas agdes nfo sdo respostas isoladas ¢ separadas a estimulos isola- dos ¢ separados, mas sim dirigidas por uma consciéncia integrada da realidade pereeptual com que se confronta. Ele é capaz de com- preender a realidade perceptual do presente imediato € € capaz de formar associagdes perceptuais automaticas, mas ele nao pode ir mais adiante, Ele é capaz de aprender certas habilidades para lidar com situagdes especificas, como cagar ou esconder-se, que os pais, dos animais superiores ensinam a seus filhotes. Mas um animal no tem escolha sobre o conhecimento ¢ as habilidades que adqui- re; ele pode apenas repeti-los geracdo apés geracéo. Um animal tampouco nao tem escolha no critério de valor que dirige seus aos: seus sentidos o provém com um cédigo de valores automiti- co, um conhecimento automético do que ¢ bom ou mau para si, ‘© que beneficia ou compromete sua vida. Um animal nfo tem 0 poder-de ampliar seu conhecimento ou evadir-se deie. Nas situa- ges em que seu conhecimento ¢ inadequado, ele perece — como, por éxemplo, um animal gue fica paralisado nos trithos de uma ferrovia no caminho de um trem em alta velocidade, Mas contan- to que viva, um animal age segundo seus conhecimentos, com se- guranga automatica e sem poder de escolha: ele nao pode suspen- der sua propria conscigncia — ele no pode escolher no perceber — dle niio pode evadir-se de suas préprias percepedes — ele nio pode ignorar seu proprio bem, ele ndo pode decidir escolher 0 mal ¢ agir como seu préprio destruidor.

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