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O principio da analogia na constituicao do léxico: regras sao clichés lexicais Margarida Basilio* Abstract In this work the adequacy of the principle of analogy is discussed as an alternati so WERs in the description of lexical phenomena. The author concludes that the principle ef analogy is theoretically preferable and suggests that WFRs are mere statistic statements The proposal has an interestig consequence for linguistic theory. as analogy is not saguistically specific. Introducao Existem pelo menos trés proposigées definidas para a representacao do fenémeno das relagées lexicais e formagio de palavras. A primeira € a do estruturalismo americano, em que itens lexicais sao coneatenagées morfémicas. Na segunda, implfcita no tratamento da gramtica tradicional e em uso corrente explicito na teoria gerativa,o léxico tem um componente de Regras de Formacao de Palavras, que operam sobre palavras previamente existentes, interpretando sua estrutura e/ou formando novas palavras. A terceira possibilidade € o princfpio classico da analogia, proposto por Saussure para o tratamento das relag6es ¢ produtividade lexical. No primeiro caso, considera-se apenas a concatenagao de morfemas em formas ja feitas, como em in-con-stitu-cion-al. No * Pontificia Universidade Cat6lica do Rio de Janeiro Veredas: rovisia de estudos lingussticos, Juiz de Fora, vol. I,m t= p. 9-21 10 Margarida Bastio segundo, Regras de Formagao de Palavras analisam formas jé feitas ou executam uma operagao fonoldgica sobre uma base especificada, com um produto previsivel em termos sintéticos ¢ semanticos, como em doleiro ou micreiro, a partir da regra de adig&o de -eiro a substantivos; € no terceiro, a partir da interpretagao prévia do principio de formacao subjacente a um par de itens lexicalmente relacionados, construfmos a forma que corresponde a incdgnita da quarta proporcional, como em Hegel:hegeliano :: Labov:x, donde x=laboviano. Neste trabalho pretendo examinar a conveniéncia de se adotar 0 principio saussureano da analogia para dar conta de fenémenos de Telagdes e produtividade lexical em substituigdo a Regras de Formagao de Palavras. De inicio, discuto a possivel diferenga empftica entre as duas abordagens, detendo-me na andlise de diferentes formagdes e seu impacto na adogao de uma ou outra das abordagens. Em seguida, analiso a questo tedrica envolvida ¢ suas conseqiiéncias para a teoria linguistica, em geral, e, em particular, para a teoria lexical.” 1. Analogia e Regras: Diferenca Empirica? Do ponto de vista empirico, poderfamos pensar que as duas hipoteses so equivalentes, j4 que qualquer forma analisada como produto de uma Regra de Formagao de Palavras (doravante RFP) também. pode ser analisada como produto do princfpio de analogia (doravante PA). Por exemplo, se dizemos que micreiro € formado a partir de uma regra de adigao de -eiro a substantivos, do mesmo modo podemos dizer que micreiro foi formado por analogia ao par, digamos, viola/violeiro. ‘Como nao podemos conceber RFPs sem a existéncia prévia de formas lexicalmente relacionadas, estas estariam disponiveis para formacdes por PA, de modo que qualquer produto de RFPs poderia também ser analisado como formagao analégica. Mas, seria verdadeiro 0 reverso? Ou seja, toda formagao analdgica também pode ser analisada como produto de uma RFP? A. Tesposta a esta pergunta traz a tona um problema sempre presente, mas pouco falado, em relagao ao estabelecimento de regras, a saber, quando € que postulamos uma RFP? Por exemplo, a partir de um par como acrescer/acréscimo, devemos estabelecer uma regra de adicfo de -imo a verbos? Ou seria necessaria mais "Uma versio embrionéria deste trabalho foi apresentada no V Encontro de Gramatica Gerativa, ‘em Julho de 1997, na UFRJ. Meus agradecimentos ao Prof. Stephen Andersonpor suas dividas ¢ comentarios sobre minha proposta, que me levaram a uma descrigdio mais detalhada dos exemplos © um exame cuidadoso da questao da diferenga empirica entre as duas propostas. Veredas: revista de estudos lingdsticos, fir de Fora, vol 1m, 1 p9-21 © principio da analogla na constituigdo do Iieo:regras so cliches lexcais de uma ocorréncia para nos garantir a condigdo de regra, como em terra/ terrestre e pé/pedestre? Deveria essa recorréncia ser mais transparente, como em rocha/rochedo ¢ drvore/arvoredo? Existe, entio, uma RFP de adig&io de -edo? E seria essa regra a mesma que opera ou se depreende na formagio de brinquedo e folguedo, a partir de brincar e folgar? Sao perguntas dificeis de responder de uma maneira bem fundamentada. Esta questo nos leva, no fundo, a perguntar o que é, exatamente, uma Regra, quando falamos de Regras de Formagio de Palavras.” A diferenga empirica entre as duas abordagens, no que concerne acasos do tipo acima, depende do que tivermos instituido como critério para a proposigio de uma REP. Afirmar que nao hé diferenga empirica entre PA. e RFPs corresponde a postular RFPs para todo e qualquer caso em que se reconhegam dois signos numa construgao morfoldgica; ja admitir outros critérios e definigdes para a postulagio de RFPs determinaré diferencas precisas entre formagGes analégicas e produzidas por RFPs, Naturalmente, qualquer decisdo sobre este ponto passa por uma cuidadosa discussfo sobre o que seriam RFPs. Aqui vou pautar minhas consideragées na pratica de andlise vigente na rea, e considerar que uma REP define construgées lexicais possiveis pela postulagio de uma operagao fonolégica sobre uma base categorial, morfologica © semanticamente especificada, que tem como produto um item lexical morfologica, semantica e categorialmente especificado. Dentro desse quadro, pelo menos um fator nos induz a postular uma diferenga empirica entre as duas abordagens: é 0 fato de que para operarmos com o PA nfo precisamos de elementos delimitados ¢ categorizados nos moldes estabelecidos pelas RFPs. Enquanto mecanismo légico, a quarta proporcional pode operar com quaisquer elementos que se conformem A estrutura basica; esses elementos podem, em certos casos, nao corresponder a expectativa da gramatica bem comportada.” Mais especialmente, o PA parece estar na base das formagdes de reestruturagdo morfolégica que tanto podem criar novos elementos morfoldgicos quanto produzir palavras de efeito retérico ou poético, rompendo momentaneamente as barreiras da linearidade que aprisionam a expressdo nas estruturas lingufsticas de cunho sintagmitico. Neste sentido, o PA serviria no apenas para dar conta da produtividade lexical, mas também da criatividade. Por exemplo, ‘A pergunta é retérica e tem, t#o somente, 0 objetivo de chamar atengSo para o problema da utilizago indiseriminada do termo “regra”” em Ling&ifstica. No caso especifico do Iéxico, nem sempre se distingue bem o mecanismo formal da freqincia de uso ou da aceitagio ou nto de formas por razes extra-linguifsticas Saussure, entretanto, s6 usou exemplos previsivels, o que pode eventualmente significar que ele rio contemplaria exemplos como os que serio aqui analisados. Veredas: revista de extudos lingisticos, Juiz de For, vol. 1.9.1 p.9-21 weak Margarida Bas io uma formagao de Guimaraes Rosa como enxadachim tem uma origem analdgica Gbvia: espada:espadachim::enxada: x. No entanto, nao haveria sentido em estabelecer uma regra de adigdo de -chim a substantivos indicadores de instrumento, mesmo porque tal regra, sobre desvairada, enquanto regra nao teria 0 poder de evocagao que a formagao analégica apresenta. Para a construgdo de uma forma por PA, 0 mfnimo necessario é © conhecimento prévio de duas palavras que tenham uma parte em comum, de modo que, pela subtragao da parte em comum, possamos inferir a significagao/fungdo da outra parte; ou entdo o conhecimento de uma tinica palavra, tendo uma das partes em comum com idéntico significado em muitas outras, de tal modo que, pelo mesmo processo, possamos inferir o significado e estrutura da parte desconhecida. E importante, neste caso, conhecer a relagdo significante/significado em ambas as palavras, para que seja claramente reconhecida uma instincia do “mesmo” na recorréncia de um dos elementos identificados, Por exemplo, conforme observado em Basilio 1981, podemos identificar carpint - como base presa pela recorréncia em carpinteiro ¢ carpintaria. Yé em mosteiro ¢ bueiro, esta recorréncia nao se verifica, de modo que nao temos condigses para isolar uma parte da palavra como base. Assim, embora estas formas terminem em sequéncia fonolégica idéntica a do sufixo -eiro, nao so analisadas como formas morfologicamente complexas. O ponto fundamental, nesta diferenga, € que saibamos 0 significado tanto de carpinteiro quanto de carpintaria, pois s6 isso nos permite reconhecer a relacio -eiro “agente’’/ -aria “locativo”’, e, portanto, carpint- “trabalho em madeira” A identificagao morfo-semantica parece ser, alids, mais importante que a recorréncia: no caso de uma palavra como corretor 0 significado do sufixo € nitidamente depreensivel do significado total da palavra, de modo que o conhecimento da palavra, mesmo na auséncia de outra forma, € suficiente para reconhecermos -or como agente e portanto corret- como relativo a idéia de venda, enquanto em mosteiro e bueiro nao temos elementos semAnticos que possam corresponder aos significados de -eiro. Ou seja, a identificagio de uma base presa numa construgao morfolégica depende das condigdes de identificagao morfo-seméntica de pelo menos uma das partes da construgao. Uma base presa pode ser identificada se uma parte da palavra pode ser interpretada morfo- semanticamente como afixo, caso em que, por exclusio, podemos atribuir identidade morfo-semAntica a base; ou se, por recorréncia em outras construgdes, ocorréncia como forma livre ou re-estruturagao, podemos atribuir identidade morfo-semAntica a base, isolando-a, portanto, do afixo. Vereda: revista de estudos lingstcos, Juiz de Fora, vol. Ion. 1p 9-21 © principio a analogia ma constitu do Kéxico:tegras st clichtsleicais Naturalmente, a identificagao de bases livres em construg6es morfolégicas é sempre garantida, dada a propriedade das formas livres de ocorrer isoladamente; ¢ isso, por sua vez, garante a identificagao do afixo como tal. Em terra/terrestre, por exemplo, uma vez que se saiba que terrestre corresponde a “relativo A terra’’, so constatadas simultaneamente a recorréncia da raiz e a identificagao do afixo de formagdo de adjetivo. Temos, portanto, a base para a proporcional ferra:terrestre::campo: x. Uma outra maneira de interpretar os dados seria dizer que do par terra/terrestre abstraimos Xestre e, portanto, campestre. O Ieitor iniciado poderd observar, entdo, que a alegada base para a formacao analdgica € praticamente a mesma que a de uma regra de redundancia do tipo apresentado por Jackendoff 1975. Seria entio © caso de nao termos nenhuma diferenga relevante entre uma abordagem e outra? Nao ha divida de que a base do mecanismo de analogia é em esséncia a mesma da de uma regra de redundancia, e isto é natural: as regras de redundancia foram postuladas para representar relagdes Iexicais ¢ é exatamente isto que o PA postula: havendo uma relagio lexical, podemos us4-la numa formagao analdgica. Entretanto, como foi colocado antes, existe uma diferenga empirica clara entre 0 PAc a postulacao de RFPs: o fato de que em RFPs um determinado tipo de estruturacio esté pressuposto, enquanto na formagao analdgica hé muito mais possibilidades do que as _contempladas pelas RFPs que conhecemos. Mais especificamente, da classe de construgdes lexicais possiveis, RFPs sao capazes de representar apenas 0 subconjunto das construgdes gramaticalmente funcionais ¢ pré-estabelecidas, ndo abarcando, portanto, as criagdes literdrias, os desvios estatisticos com objetivo de estranhamento, as proposigdes de cardter ret6rico, os mecanismos em jogo na formulagao de piadas, etc. As RFPs também nao sao adequadas para descrever fendmenos como a chamada “falsa etimologia”, as formagoes regressivas e criagées morfémicas que podem surgir no uso da lingua. No que se segue, prosseguimos a discussao analisando alguns exemplos. 2. Discussao de exemplos Tomemos, de inicio, criagdes do tipo sambédromo, camelédromo, namorédromo, etc., que tém surgido no Rio nos ultimos anos. Tais eriagdes, a partir do modelo hipddromo, em que a primeira parte é uma forma presa, podem ser facilmente explicadas em termos de PA:da mesma Veredus: rovista de estudos ingstcas, Juiz de Fora, vol. Lom. 9-21 ay , Margarida Bastio maneira que hipddromo € lugar de atividade de cavalo, camelédromo é lugar de atividade de.camel6, namorddromo é lugar para namorar, € assim por diante. O que peculiar, neste caso, € que temos de inicio apenas uma formagao, hipddromo, certamente de origem erudita, correspondendo a “lugar de corrida de cavalos”. Como poderia esta formagao tnica de origem erudita dar‘origem a construgées de uso generalizado, que pressupdem a identiftcagao dos termos? Nao devemos esquecer que também faz parte da competéncia lexical dos falantes cultos do portugués 0 conhecimento da estrutura de composi¢ao de modelo grego, em que a forma inicial termina em -o € corresponde ao especificador; ¢ a outra corresponde ao elemento, especificado. Assim, 0 falante culto. reconhece a estrutura Xo-Y “especificador-especificado”. Deste modo; é suficiente que o falante conhega 0 significado desta Gnica palavra. Dados esses elementos, é fécil reconstruir ocaminho: de Xo(cavalo)-Y(lugar) = “lugar de cavalo”, temos Wo(camel6)- Y(lugar) = “lugar de cameld”. Nesses casos, pressupde-se o conhecimento do significado da palavra, mas é 0 reconhecimento da estrutura que permite a andlise morfémica e a substituigdo de uma parte por outra, Caso semelhante, embora menos novo e mais discreto, € 0 que propiciou a formagio de discoteca, ‘mapoteca, ¢ até mesmo 0 esdrixulo xeracoteca , a partir da anélise estrutural de biblioteca. Vejamos agora a classica reestruturagio de hamburg-er como ham-burger em inglés, que originou cheeseburger, fishburger, etc. A andlise morfolégica inicial de hamburger € hamburg-er; entretanto, houve um reconhecimento de ham, possibilitado pelo reconhecimento de burger como uma parte, talvez a partir de modelos de reducao de compostos comuns no inglés, tais como milk-shake/shake ou earth- quake/quake, talvez pelo reconhecimento de uma estrutura geral de compostos no inglés, do tipo especificador-especificado, tal como no caso de hipédromo acima. A palavra hamburger corresponde a algo como “sandujche de bife de carne mofda””. A estrutura estabelece a fungao de especificador para a primeira parte, e de especificado (sandufehe) para a segunda, Dentro do reconhecimento da estrutura, o fato de que o ham- burger classico € de carne mofda e nao de presunto é irrelevante, na medida em que 0 reconhecimento do sanduiche no esté envolvido, ¢ sim © reconhecimento da estrutura, que permite a substituigdo de ham por cheese, fish, etc. Dada essa reandlise, burger passa a ser um radical base para formagGes posteriores do tipo fishburger, cheeseburger, e assim por diante. Nesses casos, a importancia do mecanismo de analogia é maior, na medida em que as formagdes so feitas a partir do reconhecimento de eredas: revista de estudoslingisticos, Jus de Fora, vl. 1. 1 p.9-21 © principio da analogia ma comstiuigso do lesico eg lementos que nao fazem parte de regras; sio formagdes esporddicas esmo, mas formagdes cujo entendimento, aceitabilidade e eventual ;ncia sio uma parte importante das estruturas lexicais; e formag6es como no caso em pauta, podem criar elementos morfoldgicos. Um outro caso dentro dessa linha, embora mais complexo, é o de gate, a partir de Watergate. Como sabemos, Watergate é 0 nome de condominio comercial em Washington. Pelo fato de ter sido “o lo- do crime” de Nixon, o termo virou simbolo da tragédia da canalhice fica, prestando-se a originar uma analogia dupla, em que temos uma logia no sentido mais metaf6rico, ao lado de outra a ser interpretada sicamente como a quarta proporcional. S6 assim podemos ‘mente interpretar Irangate, como “o escdndalo do Iri Mais especificamente, a estrutura Watergate € analisada por quer falante do inglés como especificador/especificado, enquanto a de uso migra da referéncia ao condominio para a referéncia a0 ndalo de Nixon”. Se temos uma estrutura composta Watergate ¢ significado “escAndalo de Nixon”, obviamente /rangate corresponde “esciindalo do Ira”. O que é interessante nesses mecanismos € que a tura geral se liga ao significado referencial, e nao ao significado mico; assim, a quarta proporcional se baseia nao no significado cada parte, mas na estrutura de duas partes morfémicas (X Y ) ena srutura semantica de duas partes (determinante/determinado). Ou seja, Watergate escdndalo de Nixon, Xgate é escndalo de X. No caso, X = Ira, donde Irangate. Pode-se observar, aqui, o mesmo que observamos iormente em relagdo a hamburger; a falta de correspondéncia en- ham ¢ 0 significado de bife de carne mojda é irrelevante na interpretacio de hamburger do mesmo modo que a falta de espondéncia entre Water ¢ Nixon é irrelevante no caso presente. 9 acontece porque os nomes esto sendo inicialmente usados em icia a objetos jé conhecidos pelos falantes como referentes globais, ndente do significado das partes. Todos os exemplos vistos até agora envolvem estruturas de mposigao. E necessdrio investigar também casos de derivagao, pois 0 Smeno que vimos analisando poderia ter sua situacio tima ou nica composig&io, em que o reconhecimento poderia ser mais facil por se 86 de radicais. © primeiro exemplo a ser considerado é 0 das chamadas vagdes regressivas, como em saramp@o—sarampo, citado em maticas normativas. Observe-se que nestes exemplos nao ha opriamente uma derivagao, mas uma reestruturagdo, ou seja, a terpretagao morfolégica de um vocdbulo primitivo como vado, e, portanto, a invencao de um radical derivante: anali- Veredas: revista Se estuds lingistcos, Juiz de Fora, vol. I,m. 1 p.9-21 Margarida Bastio samos sarampdo como sarampo+do, dat extraindo o radical sarampo, anteriormente inexistente. Dado que o resultado é a formagao de uma palavra por supressio de material fonoldgico, 0 caso é chamado de derivacao (uma palavra sendo derivada de outra), mas regressiva. O produto, realmente, pode ser chamado de derivacao regressiva. O que dizer, no entanto, do processo? Este abarca a reandlise do termo inicial sarampao, atribuindo-Ihe uma estrutura inicialmente ndo existente, 0 que envolve o PA. Terfamos algo como febrdo:febre. sarampdo:X , donde X = sarampo. Naturalmente, podemos pressupor a existéncia e papel da RFP de acréscimo de -do, mas neste caso terfamos que considerar esse caso como normal e nao como derivagao regressiva, 4 que haveria apenas 0 acréscimo ou retirada de um sufixo, ¢ isso pode acontecer em qualquer outra forma terminada em -do. Observe-se, de acréscimo, a formagao relativamente recente quinddo, a partir de um docinho tradicional, 0 quindim Neste caso, temos 0 reconhecimento da formagao X-im com o significado “X pequeno”, a partir da qual é feita a construgao quindao, que todos imediatamente reconhecem como “X grande” O interessante € que nao temos nada como ?quindo, 2quinde ou 2quinda ; isto é, a reandlise produz um radical preso comum a ambas as formagées, sem que tenha havido necessidade de criar uma forma livre no grau positivo. E possfvel que esta formagao tenha sido cunhada a partir de empadinha-empadao, em que verificamos na culindria fendmeno idéntico, ou seja, a versio aumentativa de algo pequeno. E, do ponto de vista da quarta proporcional: empadinha-empadao (X pequeno-Xgrande); guindim (X pequeno); donde, X grande = quindao. Outro caso melhor resolvido por PA. é o de empréstimos morfoldgicos ocasionais do tipo panelago, businago e outros, de uso recente € cunho politico, A partir de panelago “evento politico de protesto, caracterizado por barulho ensurdecedor feito por panclas”, businaco tem interpretacao 6bvia, do mesmo modo que qualquer outro instrumento que possa ser colocado na mesma posi¢ao (como em apitago). Idéntica explicagao pode ter a denominagao carreata a partir de passeata; ¢ € possivel que termos como presidencidvel, prefeitdvel ¢ outros sejam tradugdes analdgicas da expressdo “papabile”.\* Oescritor Guimaraes Rosa é conhecido por suas criagdes lexicais, havendo muitas obras sobre esta faceta de sua singularidade.” Uma © Observe-se que termos como presidencvel, prefitavel, etc. comegaram a ser usados em portugués na situagdo politica em que as eleigdes nfo era diretas eos procedimentos no eram propriamentepiblicos. ®) Dopontode vista de RFPs, ver Gamarski 1988 e, sobretudo, Rocha 1992, de onde foram tirados rnossos exemplos, Sereda ovists de estos Hingusicos, Jui de Fors, vl. 1, 1 p21 CO principio da analogia na consitgdo do léico: egrass80 clichés lexis ‘grande parte das criagdes de Guimaraes Rosa consiste na troca de afixos. ‘Nestes casos, os produtos podem ser abarcados tanto por PA quanto por RFPs. Ha casos no entanto, sobretudo quando construgdes previamente existentes no autorizariam a postulagdo de uma RFP, ou quando uma palavra evoca outra, em que PA constitui a descrigao mais adequada. Dentre os exemplos mais claros esto criagdes como amargume, que ‘evoca azedume; verdoléncias (“os olhos 4gua-mel, com verdoléncias”) em que € clara a evocacao do par dolente/doléncia, ao lado da possibilidade alomérfica -ento~ -lento; a formagao regressiva homenzarros; formas como cascalharal, espumaral, etc, a partir do ‘modelo milho/milharal; dias chuvoentos, com a evocagao da névoa ie assim por diante. De especial interesse so formagdes como picaz, zombaz, voaz, sopraz, etc., em que Guimaraes Rosa parece “ressuscitar” um sufixo. Parece que, neste caso, acontece 0 mesmo que vimos nas construgdes ‘compostas do inicio. O conhecimento de uma forma como audaz, por ‘exemplo, com seu significado “ousado, que ous" ¢ 0 conhecimento da estrutura X-az “adjetivo”” (como em veraz, capaz, etc.) sio suficientes para embasar uma formagao analégica do tipo audaz : “que ousa” “que zomba”:x, onde x=zombaz. Ou seja, o mecanismo de analogia capta 2 competéncia do falante no sentido de recuperar o significado ¢ condiges de operacao semantica de regras, digamos, de morfologia ‘morta e semAntica viva. Claro, era necesséria a arqueologia de um Guimaraes Rosa para nos recuperar este achado; mas ele nao teria sucesso se, ainda que de acesso virtualmente bloqueado, 0 padrao nao fosse vivo. Este exemplo é importante porque, para além de possibilidades estéticas, ilustra empecilhos concretos na utilizagao das RFPS - neste caso, a permanéncia de condicdes semanticas, mas nao das ‘condigdes de disponibilidade de bases categorialmente previstas. Passando para a linguagem do dia-a-dia, um exemplo interessante surgiu como criagio esponténea, na semana passada, em referéncia a um virus de computador. Na situag%io em questo, uma aluna estava com problemas em relagdo a um virus e perguntou algo como “como é que faz, paradesvirulizar o sistema”? A produgio desvirulizar nio pode ser explicada por regras. Termos com a fonologia de virus, isto é, termos como dnus, bonus, dnibus, etc. so problematicos como derivantes por ‘causa da vogal dtona travada por -s. No caso em pauta, a eliminagado da sequéncia -us nao € uma estratégia vidvel: desvirar ou desvirizar desfigurariam a intengdo comunicativa. O falante foi entio intuitivamente buscar a relacio virus-virulento © a partir daf formou desyirulizar, Ou seja, terfamos a proporcional virus+ento:virulento:: eredas revit de extads linge, Jul de Fora, vo. 1.9.1 p9-21 7 oak, % Margarida Basio Este caso recente nos leva a uma ulterior vantagem do tratamento de fen6menos lexicais por analogia, em vez de RFPs: a possibilidade de explicar casos de alomorfia sensiveis a itens lexicais tais como em oprimir/opressdo, traduzir/tradutor, rodar/rotacao, propriedade/ proprietario, ¢ centenas de outros. As alteragdes sempre levam & formulagdo de regras torturadas de teor de produgo praticamente nulo; assim, a alternativa analdgica parece ser bem mais conveniente; e 0 caso contemporaneo, recente, ilustrado no paragrafo acima € bastante eloquent em relagdo a esta possibilidade. Um segundo exemplo na lingua falada do dia-a-dia foi criado por mim mesma, hé cerca de um més, numa conversa telefOnica, em que eu falava com uma colega sobre as atividades dela na Internet. Fazendo referéncia as possibilidades de comunicagdo pela Internet, comecei a formar 0 que seria o adjetivo internetal, mas que se transformou, no meio do processamento lexical, em internetdrio, atravessado que foi 0 processo pela formagao analégica planeta: net:internetério. A formagao resultante foi escolhida, em detrimento da primeira, por forga de seu poder de evocacao. Em resumo vimos até agora que (a) toda e qualquer construcao descrita por RFPs pode ipso facto ser descrita por PA: € (b) nem todas as construgdes por PA so adequadamente descritas por RFPs, a menos que se altere significativamente nosso entendimento do que sejam RFPs. Em consequéncia, a postulago de RFPs ou do PA para dar conta da produtividade lexical apresentam consequéncias empfricas diferentes. O ponto a se discutir, assim, & o de qual seria a classe de construgdes exicais possiveis que gostarfamos de determinar. Se nos ativermos a RFPs, teremos apenas configurado um léxico de formas bem- comportadas, apresentando fungdes. restritas e previsiveis e deter- minagio categorial estrita das bases e produtos de RFPs. Se pensarmos no PA, incluimos, além das formas previstas acima, também construgdes nfo lineares, em que modelos podem ser tomados para utilizagdes imprevistas ¢ nao enquadradas, dada a confluéncia de relagdes sintagmiticas ¢ relagdes associativas; e legitimamos 0 poder de criar ou ressuscitar elementos morfolégicos. Naturalmente, os Iégicos graméticos preferirdo a primeira possibilidade, enquanto os artistas, poetas ¢ revolucionérios - além dos lexic6logos - preferirao a segunda 3. A Questao Teé Passamos a discutir agora um outro angulo da questo, a saber, qual das duas abordagens seria mais adequada do ponto de vista Viredar revista de estado inguin, oir de For, vol Ih p92 (0 principio da aalogn na consi do eco: regras so clichés lesa te6rico. Dentro de uma perspectiva gerativa mais recente, em que regras foram virtualmente banidas no componente sintatico, o mesmo seria desejdvel no Iéxico. Nesta perspectiva, teoricamente preferivel lidar com o fendmeno de relagdes e produgdes lexicais pelo principio geral da analogia do que pelo estabelecimento de regras particulares. O PA seria considerado como um universal lexi- cal, explicando a utilizagao de relagbes lexicais para a aquisigao do Iéxico em qualquer lingua. Esta proposta , ao deslocar para o PA a estrutura fundamental do léxico, possibilita a unificagdio do que costuma parecer uma teia de semelhangas e convergéncias parciais projetando idéntica teia de miriades de divergéncias nos Iéxicos das varias Iinguas do mundo; € assim elimina o problema de processos que se assemelham mas nao so iguais em todas as linguas; significados gerais que se expressam morfologicamente em intimeras linguas mas nao em todas; e nunca da mesma maneira. Temos, pois, como consequéncias tedricas positivas da adogao do PA em lugar das REPs como elementos eruciais da constituigdo do léxico: a possibilidade de estabelecer um princfpio que, na descrigao do léxico de Iinguas particulares, da conta no apenas de todas as formagées existentes descritfveis por regras, mas também de formagdes motivadas, que, no entanto, nao sao adequadamente descritas por regras; e um principio proposto como universal, de tal modo que as divergéncias © semelhangas na formulagao de regras lexicais em Iinguas particulares deixam de ser um problema ‘Tais conseqiéncias tedricas so avaliadas como positivas dentro de um quadro gerativo, em termos da proposigao de Princfpios e Parametros. Entretanto, como o mecanismo da analogi um mecanismo légico, ¢ nao especificamente linguistico, terfamos © prinefpio fundamental da expanso e conhecimento lexical como um mecanismo geral cognitivo, e, portanto, nao especfficamente lingufstico, 0 que poderia parecer contrariar as proposigdes da Teoria Gerativa. Isto, entretanto, pode nao ser necessariamente 0 caso; afinal, sempre houve na Teoria Gerativa uma rejeigéo geral do léxico, que, dependendo da época, oscila entre 0 ostracismo ¢ 0 tratamento sintético. © que permanece como distingdo teérica entre as duas propostas é a formulacdo de um principio geral em oposigao & arrolagem de iniimeros casos especificos de aplicagao, sendo que 0 conceito de regra fica bastante diffcil de justificar no segundo caso, dentro de uma perspectiva formalista. A proposigao do mecanismo Vredar: evista de estado lingisticos, Jz de Fora, vol. Ln Lp 9-21 =. © ” Marguida Bastio de analogia 6, portanto, teoricamente superior. De fato, com a proposta do PA saimos da esfera de constatago de micro-pseudo- realidades particulares que se entrecobrem para o ambito da formulagao de um principio geral de que essas particularidades decorrem. O prego - a meu ver altamente desejvel - que pagamos por essa maior adequacao tedrica é que agora teremos que re-pensar todos os processos descritos por RFPs e mesmo, talvez, pensar pela primeira vez 0 que sio RFPs. Sim, porque, na medida em que colocamos um prinefpio geral dando conta das estruturagdes que podem garantir a interpretacao de formas ¢ a produgao de formas, a formulagdo de RFPs especificas torna-se descritivamente supérflua, ressalvadas as necessidades praticas, no sentido de se estabelecerem limites ou conhecimentos quantitativos. Terfamos, entdo, um quadro em que qualquer léxico é constituido a partir do PA; este principio opera de modos variados, sendo que poderfamos considerar mais provaveis alguns. seja por sua motivagao gramatical, seja por sua freqiéncia; para estes seria de interesse um registro estatistico, e provavelmente valeria a pena registré-los diretamente, como no caso dos clichés tipograficos. Outros poderiam ser acionados eventualmente, sem que houvesse raz para o registro. Poderfamos entao dizer que, de certa maneira, as RFPS seriam fossilizacdes, gramaticalizagdes ou burocratizagbes do uso do mecanismo de analogia em Iéxicos particulares. Neste caso, a descrigao das RFPs perde qualquer interesse teérico como definigao do conjunto de construgées lexicais possiveis e passa a ter apenas 0 interesse pratico de estudos estatisticos para fins determinados, desde a construeao de linguas pscudo-naturais até o ensino voltado para a aceitabilidade de padres em atividades de escrita ¢ tradugdo. O interesse se desloca, em termos teSricos gerais, para a identificaco do léxico como elemento de interface conhecimento/comunicagio/estrutura; e, dentro da teoria lexical, para a definigao do alcance da analogia e para a atuaciio relativa de fatores nao- lineares subjacentes & criatividade lexical. Referéncias Bibliograficas ARONOFF, MARK. Word Formation in Generative Grammar. L.1. Monograph I. TheMIT Press, Cambridge, MA, 1976. BASILIO, MARGARIDA. “Derivagdo Regressiva: Estudo Preliminar”. In: Linguagens, Série Linguistica/Estudos, n.1,p.19- 30. DIE/PUC-RIO, Rio de Janeiro, 1981 ered: fevists de estado ingdttico, Jus de Fora, vol. 1,9, 1p 9:21 (principio da analogia na consi do xo: epras st lich lexis GAMARSKI, LEA. A Derivagdo Regressiva: um estudo da produ- tividade lexical em portugués. CEGRAF, Goiinia, 1988. JACKENDOFF, RAY. “Morphological and Semantic Regularities in the Lexicon”. Language 51:639-71, 1975. ROCHA, LUIS CARLOS DE ASSIS. 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