Existe uma insatisfação geral com o nível dos programas e dos debates nas eleições de
2010. Será que estamos presenciando o fim da política ou o fim das ideologias? Parece
que o segundo caso é o mais verdadeiro. Pode-se dizer que, nas eleições gerais do Brasil
de 2010, a antiga discussão sobre a “sociedade sem classes” foi substituída pela bandeira
de uma só classe ou “sociedade de classe média”, definida não por sua posição no
processo de produção, mas sim no processo de consumo.
A desideologização da política, não é uma coisa nova e já havia sido tratada no livro “O
fim da ideologia” de Daniel Bell, de 1960. Para este autor, a sociedade capitalista e
liberal, de consumo de massas, possibilita o aplainamento dos antagonismos de classe
reduzindo as contradições entre capital e trabalho. Na sociedade sem ideologia, o papel
do Estado seria garantir a governança política e a eficiência econômica para reduzir a
pobreza e possibilitar uma melhor qualidade de vida para a população. A democracia
seria mais adequada ao capitalismo do que os regimes autoritários (fascismo, nazismo,
stalinismo, ditaduras militares, etc). O sistema capitalista, com “justiça social”, seria mais
eficiente do que o socialismo, o comunismo, etc.
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Professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Expressa seus pontos de vista
em caráter pessoal Tel: (21) 2142 4696 ou 2142 4689 E-mail: jed_alves@yahoo.com.br. Artigo publicado
em 28/08/2010.
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• Pelo monopólio do comércio exterior;
• Aliança dos trabalhadores da cidade e do campo e governo dos trabalhadores.
Porém não parece existir qualquer mobilização por tais ideologias, que aparecem para os
eleitores como anacrônicas e intempestivas. Por outro lado, alguns analistas consideram
que a pauperização do debate político ocorre devido à falta de profundidade do
diagnóstico e de clareza do receituário dos grandes partidos. A disputa plebiscitária
envolvendo PT versus PSDB ou Lula versus FHC, também reduz o escopo do debate.
Mas os temas políticos não desapareceram totalmente, pois, em geral, são tratados de
uma forma asséptica. Vejamos alguns exemplos:
Parece que a falta de projetos de longo prazo para a nação é um fato comum, tanto no
governo, quanto na oposição. No processo eleitoral, sequer foi debatido o projeto “Brasil
2022: o bicentenário da independência e o país que queremos” da Secretaria de Assuntos
Estratégicos (SAE). O embate de biografias ficou mais importante do que o embate de
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projetos. O populismo e a tutela tem ganhado terreno em relação à organização autônoma
dos trabalhadores povo. Não deixa de ser um processo em que o Estado substitui a
sociedade civil. Existe uma voz de cima prevalecendo sobre a cacofonia dos sons
fragmentados enviados por aqueles que vivem no “andar de baixo”. Mas o fato é que o
crescimento da classe média tem se tornado mais importante do que as disputas de classe.
Existe uma redução das diferenças entre as forças de direita e de esquerda, contribuindo
para a opacidade ideológica.
Mas como interpretar este processo de desideologização? Alguns dizem que o Brasil está
simplesmente rompendo com antigas tradições políticas próprias da América Latina e
ficando mais parecido com países do chamado Primeiro Mundo. Como analisar a nova
correlação de forças e as perspectivas para o próximo governo? O governo do Partido dos
Trabalhadores vai realmente “ensinar a fazer capitalismo neste país”, como disse o
Presidente Lula na epígrafe deste artigo?