Joel R. Beeke
PUBLICAÇÕES EVANGÉLICAS SELECIONADAS
Caixa Postal 1287 10159-970-São Paulo-SP
Ao irmão, amigo e conselheiro, Olin Coleman, grande incentivador da literatura reformada e puritana.
Aos que batalham pela fé reformada, que desejam ver um dia estabelecidas, nesta nação, as antigas
doutrinas da graça, uma reforma na igreja brasileira e a prática de uma evangelização bíblica sem adições ou
subtrações.
ÍNDICE
Prefácio
PREFÁCIO
Após 40 anos no evangelho, defrontei-me com a literatura puritana e reformada. Tal foi o impacto em minha vida que
me senti como alguém que vai reclamar seus supostos direitos e se depara, para sua surpresa, com a realidade de que estava
errado, e que seus direitos eram falsos. Senti-me envergonhado do movimento evangélico superficial, humanista, vivenciado há
tanto tempo em nosso meio e que não considera a soberania de Deus, mas coloca no homem o poder de realizar.
Ao ler a literatura puritana e reformada os meus olhos foram abertos para ver o caminho que trilhava. Percebi logo
que boa parte do movimento evangélico moderno, mesmo falando da graça de Deus, não a compreende como ela é apresentada na
bíblia. Afirma que, pela graça, todos os homens têm a capacidade de crer e aceitar o evangelho; é uma decisão deles. Por isso Dr.
M. Lloyd-Jones afirmou: "Embora comecem com a graça, na seqüência a negam". Percebi que o movimento evangélico moderno
fala da Bíblia como a única regra de fé e prática mas não compreende o significado de Sola Scriptura, como os reformadores a
ensinavam, e era vivida pelos puritanos de forma madura.
Muito do movimento evangélico moderno tem feito acréscimos, adições às Escrituras, como fizeram os judeus na
época de Jesus, quando citavam mais de 600 leis que não estavam naTorah, ou mesmo como a igreja católica romana, com toda
sua tradição maligna, que tem levado milhões de pessoas à condenação, por causa de ensinos apócrifos, antibíblicos, esquecendo-
se de que Deus trará maior juízo àqueles que ensinam falsidade (Tiago 3:1). Recentemente um grupo de congressistas questionou
um famoso líder americano e professor de missiologia sobre suas práticas na área de batalha espiritual e missões. Sua resposta foi:
"É verdade que não está na Bíblia, mas funciona". Creio que é exatamente este pragmatismo religioso, não bíblico, que domina
em grande parte nosso movimento evangélico, nossa prática cristã e especialmente nossa evangelização. Os métodos
evangelísticos não bíblicos, se estão funcionando, são considerados válidos. Será que estamos esquecidos das palavras de Jesus
que serão proferidas no dia do juízo contra aqueles que evangelizaram de forma condenável, mesmo que bem sucedidos: "Nunca
vos conheci"? (Mat.7:23).
Um dia comecei a ler sobre Pelágio, o herege dos séculos IV e V, que fora tão combatido por Agostinho e por fim
condenado pelo Concilio de Éfeso. Pelágio não só ficou conhecido por negar o pecado original, mas especialmente pelas suas
idéias do livre--arbítrio fundamental do homem, que o faz capaz de querer e fazer (até mesmo o bem espiritual). Pelágio pensava
a respeito da graça como sendo apenas uma ajuda externa de Deus, do Espírito Santo, para a alma humana; um tipo de ação que
persuade o homem pela razão e o faz usar seu livre-arbítrio, sua capacidade de obedecer ou não a lei de Moisés e os ensinos de
Jesus. Para Pelágio, a predestinação divina é algo que opera apenas de acordo com as qualidades das pessoas, as quais Deus prevê
que terão. É algo baseado no mérito das pessoas. Dessa forma a fé não é um dom, e sim, uma obra meritória para levá-las à
salvação. Assim, o homem pode tomar uma decisão por Cristo na dependência apenas de sua própria vontade, independente de
Deus. Ou seja, tudo depende do homem.
Quando tomei conhecimento de tudo isso, comecei aperceber que muita da nossa evangelização é calcada em cima
desses princípios, com apenas algumas mudanças (semipelagianismo), como o reconhecimento do pecado original do homem, sua
enfermidade moral. Entretanto, continua defendendo que o homem é que dá o primeiro passo em direção a Deus, com suas
próprias forças e, que por isso, Deus o recompensará. Todo o sistema de apelo por decisões está baseado nestes princípios, e não
foi sem razão que Finney (pelagiano declarado) tenha sido o iniciador desse sistema de convidar pessoas a virem à frente, usando
o livre-arbítrio, como demonstração de fé e conversão. Falar contra estas coisas hoje é provocar a ira de muitos. Os grande
pregadores e missionários batistas, congregacionais e presbiterianos do passado sempre condenaram estes princípios não bíblicos,
e a Igreja foi tremendamente abençoada por serem defensores das antigas doutrinas da graça, defensores de um evangelho
centralizado na soberania de Deus, um evangelho que diz ser Deus o iniciador e consumador da nossa fé e da nossa salvação.
Infelizmente o semipelagianismo defendido por Armínio espalha-se no nosso meio e é praticado por quase a totalidade
da evangelização moderna. A situação é tão grave que raramente se vêem programas de rádio e televisão, ou mensagens (com
raras excessões) que pudessem ser aprovados pelos reformadores e puritanos (congregacionais, batistas e presbiterianos) do
passado; nossos pais espirituais. Percebo que é algo natural, que vem da natureza humana corrompida, da "sabedoria da carne",
como dizia Martinho Lutero, a idéia de que o homem pode exercer fé por si mesmo para ser justificado; que pode usar seu livre-
arbítrio para ser salvo; que Deus não pediria algo de nós (crer, arrepender--se), se nós não pudéssemos realizá-lo. Isto é pensar
como Pelágio (esquecem do Salmo 127:1-2; Mat.l6:17; 19:26; Joãol:13; 3:27; 6:44-65). Toda esta visão doutrinária e prática é
incompatível com o pensamento do maior pregador da Inglaterra no século XVIII, George Whitefield, que não temia afirmar que
o homem natural já nasce arminiano.
Preocupado com esta visão distorcida da evangelização, e a ironia e desprezo da parte de muitos para com o ensino
bíblico calvinista, praticado pelos grandes missionários batistas como William Carey ou congregacionais como Robert Kalley
(chamado de "O Lobo Calvinista") e presbiterianos como Ashbel Green Simonton e os grandes pregadores do passado, o projeto
Os Puritanos realizou o seu simpósio anual em 1995 sobre o tema da evangelização bíblica e puritana. Para isso foi convidado o
Dr. Joel Beeke, pastor reformado em Grand Rapids, Michigan, Estados Unidos, doutor e mestre, estudioso da história e do ensino
reformados desde os nove anos de idade, para abordar este tema tão importante que é a evangelização reformada.
O Dr. Joel Beeke apresenta de forma simples e piedosa, a necessidade da evangelização fundamentada na soberania de
Deus, e que enfatize a responsabilidade do homem. Neste aspecto Calvino nos ensina a sermos evangelistas e que a doutrina da
eleição não leva à passividade na evangelização; pelo contrário, nos leva à atividade. O autor afirma que nós não somos
responsáveis pelos resultados da nossa evangelização, e sim, pela fidelidade da mensagem e pelos métodos que usamos. Disso
prestaremos conta. Portanto, o que devemos fazer é lançar a semente e esperar no Senhor. Os resultados pertencem a Deus, é
verdade, mas temos de ir em busca das ovelhas de Cristo. A eleição não exclui os meios pelos quais Deus chama os Seus de forma
eficaz. No túmulo de David Livingstone está escrito o que o motivou ser missionário na África: "Ainda tenho outras ovelhas, não
deste aprisco; a mim me convém conduzi-las" (João 10:16). Assim como Jesus veio ao mundo em busca de Suas ovelhas e por
elas morreu, Livingstone foi à África em busca das ovelhas do Senhor.
Este livro pode ser um grande orientador de como podemos evangelizar para a glória de Deus e nos despertar para
sermos verdadeiros evangelistas, obedientes a Cristo e ganhadores de almas. Que possamos levar esta tocha da evangelização
como os cristãos primitivos, como os reformadores e puritanos fizeram.
Agradeço a Deus ter conhecido e ouvido o Dr. Joel Beeke; suas palavras eram carregadas de amor, piedade e firmeza
doutrinária. Todos nós do Projeto Os Puritanos aprendemos muito com o Dr. Beeke sobre o que é ser um evangelista como a
Bíblia recomenda.
Caro leitor, aproveite das palavras escritas neste livro e, com a ajuda de Deus, seja um evangelista fiel.
Manoel Canuto
Coordenador do Projeto Os Puritanos
1
A Tocha da Evangelização Acesa no Novo Testamento
"Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei
discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as
cousas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos." - Mateus 28:18-20
"E assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura: as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas. Ora, tudo
provém de Deus que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo, e nos deu o ministério da reconciliação, a saber, que
Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a
palavra da reconciliação. De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio.
Em nome de Cristo, pois rogamos que vos reconcilieis com Deus. Àquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós;
para que nele fossemos feitos justiça de Deus." - 2 Coríntios 5:17-21
Introdução
Evangelização Reformada é um tema bastante vasto. Muitas pessoas chegam a negar a sua existência, pois não crêem
que exista tal coisa. Nossa esperança é, por um lado, não exagerar a força da evangelização reformada, e por outro, não diminuir
as suas fraquezas. Este assunto pode melhor ser apresentado através de uma ilustração. Na América existiu um pastor que era um
homem de Deus, mas tinha um problema terrível. Gostava de constantemente exagerar nas sua afirmações. Seu conselho se
reuniu, e procurou conversar com ele sobre o problema. O pastor estava consciente desta sua falha e via que precisava de ajuda.
Após conversarem, chegaram ao seguinte acordo: quando o pastor, do púlpito, exagerasse em alguma coisa, um dos presbíteros
daria uma leve tossida. Então o pastor saberia que deveria "maneirar" um pouco nas suas afirmações, pois estaria além dos limites
da realidade. Quando chegou o domingo ele teve a sua chance de ser testado com este sistema. O pastor começou a pregar sobre
Sansão. Descrevia como ele pegara trezentas raposas e como amarrou suas caudas. Estava muito envolvido na descrição desta
cena e disse que quando Sansão tomou as caudas das raposas para amarrá-las, estas caudas eram do tamanho dos braços abertos
de um homem (ele fez este gesto). Nesta hora o presbítero deu uma tossidinha. O pastor, então diminuiu o gesto na tentativa de
dizer que as caudas eram menores, mas mesmo assim ainda exagerava. O presbítero novamente tossiu. Ele diminuiu o tamanho,
porém ainda estava exagerando. Nova tossidinha. O pastor, então, não se contendo, perguntou: "Irmão, afinal de contas qual era o
tamanho das caudas das raposas?".
Algumas pessoas dizem que a evangelização reformada não tem "cauda" e outros dizem que sua "cauda" é imensa.
Queremos lidar de uma forma bem realista com os pontos fortes e os pontos fracos da evangelização reformada. Focalizaremos
alguns princípios neo-testamentários de evangelização. Eles estão de fato no Novo Testamento. Como foi que Calvino construiu
em cima destes princípios a sua própria evangelização, sendo pai da sistematização da verdade reformada e também da
sistematização da evangelização reformada? O que os puritanos têm a nos dizer sobre a evangelização reformada? Como
podemos tomar esta tocha da evangelização reformada, hoje, e passá-la adiante às nossas comunidades e à nação?
Definindo a evangelização
O que é a evangelização? Há muitas definições que são dadas. Poderíamos passar muito tempo só definindo-a. Mas quero
dizer algumas coisas. Em primeiro lugar não devemos definir a evangelização nos termos daqueles que vão receber a mensagem.
Isso pode nos levar a comprometer a mensagem e a mudá-la. Em segundo lugar, também não devemos definir a evangelização em
termos dos seus resultados. Pois dessa forma, você diria que William Carey não estava fazendo evangelização nos primeiros anos
em que ele esteve na índia, porque por muitos anos ele não viu nenhum convertido. Em terceiro lugar, não devemos definir a
evangelização em termos dos métodos usados. Dessa forma, se pensarmos assim, os fins vão justificar os meios e nós vamos
terminar naquilo que é tão comum hoje, a chamada "evangelização pragmática". Essa "evangelização" está mais preocupada
com os números do que com a verdade. Nós precisamos definir a evangelização em termos do significado da própria palavra.
Evangelização vem de uma palavra grega que significa "boas novas". Assim, poderíamos definir a evangelização como
sendo a proclamação das boas novas, a proclamação do evangelho. Nele buscamos, pela graça de Deus, a conversão de pecadores.
Num sentido mais amplo podemos dizer que inclui a edificação dos filhos de Deus. Inicialmente, a evangelização procura a
conversão de pecadores e no sentido mais amplo, procura o discipulado daqueles que já nasceram de novo. Esta palavra grega
aqui referida, euaggélion, está registrada 124 vezes no Novo Testamento. Portanto, a Bíblia é um livro evangelístico. Nosso Deus
é um Deus evangelístico.
A quem evangelizar?
A grande comissão responde a uma segunda pergunta. A quem devemos evangelizar? Mateus nos diz que devemos ir a
todas as nações. Ide e ensinai a todas as nações. Há algo maravilhoso neste mandamento para a evangelização reformada, porque
o evangelista reformado não fica apenas vendo a soberania de Deus no ato de eleger, pois este ato não é algo que impede o
sucesso da evangelização, e sim, algo que o confirma. Quando Cristo nos envia a todas as nações, Ele vai reunir delas, aqueles que
vão servi-lo e temê-lo na Sua própria Palavra. Ele vai usar a loucura da pregação para salvar aqueles que devem e precisam crer.
Que encorajamento maravilhoso para nós evangelizarmos, pois onde formos passando no meio desta torrente de depravação
humana, não há nenhuma expectativa em nós ou na semente em si. Algumas sementes vão cair em solo rochoso ou à beira do
caminho, e a nossa única esperança de que Deus Se agrade é que Ele venha a usar-nos como barro em Suas mãos para cumprir o
Seu propósito de amor e soberania em termos da eleição. Dessa forma, Deus vai atrair pecadores a Si mesmo.
Em Marcos 16:15 ("Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura") a grande comissão diz algo um pouco
diferente. Pregar o evangelho a toda criatura! Mateus disse, "a todas as nações". Marcos particulariza a grande comissão. A ênfase
é que o evangelho deve, não só ser levado a todas as nações, mas a todo homem, mulher, moço e moça que habitam nelas. O
evangelho é o oferecimento de Deus aos pecadores. São as boas novas de Cristo e está disponível para todos. São boas novas de
que Cristo os está convidando a virem a Ele como estão. As boas novas, entretanto, não consideram que cada pessoa tem força em
si mesma para ir a Deus. As boas novas não afirmam que a pessoa é salva meramente por uma "decisão" por Cristo. A mensagem
das boas novas não é que você vai declarar a cada um que ele está salvo. Não significa contar a cada um, que definitivamente
Cristo morreu por você, não é simplesmente levar as pessoas a saberem que Cristo morreu por elas. Muitos pregadores pregam
assim. Eles dizem: "Jesus morreu por todos e tudo que você tem de saber é crer que Ele morreu por você ". O que está errado com
isso? No momento em que eu creio que Cristo morreu por cada um, então, eu posso concluir que há uma espécie de acordo que
afirma: se Ele morreu por todos, então, morreu também por mim. Os pregadores que pregam assim, persuadem as pessoas a
pensarem que estão salvas, mesmo sem ter recebido nenhum toque do Senhor. Contudo, apenas um assentimento intelectual sem
essa bênção da fé salvadora, não salva.
Uma fé salvadora pessoal, um arrependimento pessoal, uma convicção pessoal dos pecados e uma rendição diante de
Deus de todas as suas justiças que são trapos diante de Deus, são ingredientes necessários para que você encontre a real salvação.
Se você não compreende o que é ser um pecador perdido e condenado perante Deus, como pode apreciar a riqueza do evangelho?
Dessa forma, a grande comissão nos encoraja a levar o evangelho a todas as nações, ao homem como um ser integral. Não leve o
evangelho a pressionar apenas a vontade do homem, pois o evangelho afeta a vontade, as afeições, a totalidade do ser humano.
Posteriormente veremos como os reformadores e puritanos praticaram esse tipo de evangelização. Quando eles apresentavam a
Cristo de uma forma integral para um ser integral, acabavam proclamando todo o conselho de Deus.
Onde iniciar?
Finalmente, a grande comissão certamente inclui que o evangelho precisa ser levado de preferência às ovelhas perdidas
da casa de Israel, como lemos em Mateus 10:6. Assim, quando Jesus deu a ordem de evangelizar aos Seus discípulos, Ele
começou com Jerusalém e de lá deviam levar o evangelho a Samaria, Judéia e até os confins da terra. Traduzindo a idéia para os
dias de hoje, esta ordem diz que nós não devemos apenas evangelizar os judeus mas devemos começar em nossos lares, em nossas
igrejas. Dentro do ministério pastoral devemos enfrentar o fato de que dentro da Igreja de Deus há muitas pessoas que não São
verdadeiramente salvas. Talvez tenham até sido batizadas, talvez sejam membros comungantes, vivam uma vida decente, todavia
não foram salvas. Podem até ter um bom conhecimento bíblico e até serem professores de Seminários, pastores, ou presbíteros,
mas não são diferentes de Nicodemus que foi um mestre em Israel e no entanto não havia nascido de novo. Jesus diz ainda hoje a
cada um de nós e a nossas igrejas: "vocês precisam nascer de novo". É possível que nossa a evangelização, às vezes, seja muito
fraca porque há pouca experiência do que significa nascer de novo.
Jesus passou a Sua tocha da evangelização para Seus apóstolos e discípulos e a acendeu de forma maravilhosa no dia de
Pentecoste e nas semanas que se seguiram. O mundo precisa ser colocado em chamas por esta tocha da evangelização. No dia de
Pentecoste Deus vindicou a Sua própria Palavra conforme lemos em João 3:16: "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que
deu seu Filho unigênito para que todo aquele que nele crê não pereça mas tenha a vida eterna". Milhares de pessoas foram
feridas nas suas consciências e foram levadas a um arrependimento autêntico naquele dia, depositando sua fé em Cristo. Mas a
novidade que começou no dia de Pentecoste foi disseminada e começou a usar de uma forma poderosa o apóstolo Paulo para levar
avante a tocha da evangelização.
Paulo, o evangelista
Paulo foi de modo peculiar qualificado para esta tarefa, talvez mais do que qualquer pessoa da sua época. Ele entendia
tanto a — mentalidade hebraica, quanto a mentalidade helênica. Ele teve um "seminário" de três anos na Arábia, durante o qual
Deus o treinou e o moldou para ser o apóstolo dos gentios. A atividade evangelística de Paulo, levando a tocha da evangelização,
foi e ainda é amplamente expandida hoje. Ele levou o evangelho aos seus irmãos na carne, levou-o até a Ásia, Europa, e pela
inspiração do Espírito Santo, trouxe a tocha até nós em suas Epístolas. É muito importante tomarmos um pouco da evangelização
de Paulo. A evangelização é algo muito importante no ministério de Paulo e precisamos nos "agarrar" ao seu padrão de
evangelizar. De uma coisa nós não podemos fugir, quando lemos suas cartas: Paulo evangelizava de uma forma doutrinária e
teológica. Não evangelizava contando anedotas ou pequenas histórias. Há, hoje, pessoas que afirmam que temos de colocar a
doutrina de lado para podermos evangelizar. Pensam que quando evangelizamos não devemos ser didáticos. Paulo rejeitou isso de
forma prática. Grandes porções de suas Epístolas estão preocupadas, por exemplo, com a lei. Ele faz com que uma apresentação
da lei seja seguida pela apresentação do evangelho e então aplica esta realidade à vida dos seus leitores com ensinamentos éticos e
experimentais. Esse é o padrão da evangelização de Paulo.
Queremos apresentar aqui algumas ramificações deste padrão de evangelização que Paulo usava.
Consciência teísta
O primeiro resultado do seu padrão evangelístico é: Paulo pressupõe, em todas as suas cartas, uma consciência teista em
cada pessoa. Na tradição reformada, somos profundamente devedores a João Calvino e a Cornelius Van Til porque eles
estabeleceram o que nós hoje chamamos de teologia préssuposicional. Calvino afirma que a semente da religião está em cada
homem. Dessa forma, o pensamento reformado sempre entendeu que cada pessoa no mundo tem certo sentimento de Deus. Este
conhecimento nato pode ser muito distorcido, misturado com pecado, mas aquela semente, no entanto, está lá. Tanto Calvino
quanto Van Til tiram estes pressupostos teológicos de Paulo. Paulo argumenta de forma muito clara, por exemplo, na sua carta aos
Romanos e ele parte de uma posição de pressuposição que afirma que, mesmo os pagãos têm alguma consciência de um ser
supremo. O que aprendemos disso é o seguinte: nós não devemos gastar muito tempo discutindo com uma pessoa sobre a
existência de Deus. Antes, enquanto evangelizamos, pressupomos que, no fundo do coração, eles têm consciência da existência de
Deus. Os reformados afirmam que não existe a condição do ateu genuíno. Um ateu é alguém que deseja se convencer que não
existe Deus. Já tive duas vezes oportunidade de conversar com duas pessoas que afirmavam que eram atéias. No entanto, o que era
estranho é que exatamente os dois queriam conversar sobre Deus. Dessa forma estavam querendo se convencer de que Deus não
existia.
O que Paulo está dizendo é o seguinte: quando você estiver lidando com uma pessoa que não crê e fala do seu
relacionamento com Deus, o que você precisa fazer é apresentar a Deus, como está em Romanos, capítulo primeiro. Você não
deve colocar como alvo provar filosoficamente que Deus existe. O que deve ser feito é apelar para a consciência da pessoa. Paulo
diz em Romanos, capítulo 1, que esta consciência está apertando, fazendo desaparecer o conhecimento de Deus. Quando nós
pregamos o evangelho, evangelizamos pessoas que têm uma consciência teista como seres humanos.
Mensagem de despertamento
Em segundo lugar, Paulo ensina que nossa mensagem evangelística precisa ser uma mensagem de
despertamento. Quando Paulo dirige-se a alguém que está evangelizando, ele começa a falar a respeito do pecado e da grande
necessidade do ser humano. Ele sempre procura construir um sentimento de necessidade por parte da pessoa. Então, seu alvo é a
consciência. Esta não é uma tarefa fácil e sem o Espírito Santo é uma tarefa impossível, porque é necessário o poder divino, o
Todo-poderoso, para quebrar um homem e reduzi -lo a nada. Assim o homem vê o seu pecado e enxerga que não é outra coisa
senão um grande pecador e não pode dizer outra coisa senão:
"Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!". Isso é exatamente o que Paulo procura fazer em Romanos, capítulos 1, 2 e
3, trazendo, tanto judeu como gentio, a um sentimento de culpa diante de Deus, para que toda boca seja fechada e todo o mundo
seja considerado culpado perante Deus. Por isso, Paulo pregava a lei a fim de trazer o evangelho. Com a evangelização eficaz nós
vamos levar pecadores, pelo Espírito, a serem confrontados face a face com a realidade de um Deus vivo e santo, que Se ira e que
executa julgamento; na realidade da maldição da lei que vem contra todos que a transgridem. Precisamos levar pecadores ao Deus
do Sinai, ao Deus de Isaías, capítulo 6, para podermos levá-los ao Deus do Calvário. Nosso alvo, portanto, é levá-los a Cristo e a
única maneira de levá-los a Cristo é mostrar a maneira como Cristo Se torna apreciado e válido no coração daqueles que dEle
precisam.
2
A Tocha da Evangelização Reacesa pela Reforma
O destaque de Calvino
Entre os reformadores, João Calvino teve um destaque especial. No primeiro capítulo, falamos daquele pregador que
exagerava no tamanho da "cauda da raposa", na história de Sansão. No caso de Calvino, muitas pessoas acham que ele não teve
nenhuma "cauda de raposa", no que diz respeito à pregação do evangelho. Com isso querem dizer que ele não teve destaque
algum em evangelização. Outros estudiosos, entretanto, dizem que Calvino tinha uma "cauda de raposa" muito grande, falando de
sua evangelização. Chegam a dizer que ele foi o pai teológico de todo o movimento missionário moderno. O ponto de vista de
Calvino quanto à evangelização tem sido obscurecido, especialmente por três tipos de estudiosos:
O primeiro grupo falha porque, ao invés de ler os escritos de Calvino, lê o que outros escreveram sobre ele. O segundo
grupo, quando analisa Calvino, não compreende o contexto no qual Calvino exerceu sua evangelização. O terceiro grupo, que
joga também uma luz negativa na evangelização de Calvino, traz seus próprios pressupostos negativos ao ler Calvino e conclui
que ele não deu ênfase à evangelização. Estes estudiosos, partem da doutrina da eleição e concluem desta doutrina, que é um ato
soberano de Deus, que Calvino negou qualquer ênfase à evangelização, a qualquer esforço evangelístico. Desse modo, para
avaliar o verdadeiro calvinismo em relação à evangelização, queremos fazer três coisas. Ao fazer estas três coisas, espero ter o
quadro completo da posição de João Calvino quanto à evangelização.
Primeiro vamos dar uma "olhada" rápida na vida de João Calvino. Em segundo lugar vamos olhar seus ensinamentos
quanto à evangelização, nos seus próprios escritos (as Institutas, seus comentários, seus sermões, e suas cartas). Em terceiro lugar
olharemos Calvino como um praticante da evangelização reformada. Vamos analisar isso em quatro círculos concêntricos: no seu
próprio pensamento, na cidade de Genebra, na França e no Brasil. Espero que, quando chegarmos ao fim, tenhamos uma visão
mais correta do pensamento de Calvino sobre a evangelização.
Sua vida
Primeiramente iniciemos com uma visão rápida da sua vida. Lutero tinha 25 anos de idade quando Calvino nasceu. Em
certo sentido, Calvino representa quase que uma segunda geração de reformadores. Ele teve a vantagem de poder usar os escritos
de Lutero e de outros pensadores reformados antes de escrever o seu próprio pensamento. Calvino foi além de Lutero pelo menos
em quatro áreas. Em primeiro lugar, em relação à Ceia do Senhor. Calvino negou a presença corporal de Jesus na ordenança, nos
elementos da Ceia. Em relação à vida da Igreja, Calvino concluiu que aquilo que não estiver na Bíblia, não deve estar na vida de
adoração da Igreja. Lutero admitia que, o que não fosse expressamente condenado na Bíblia, podia ser usado no culto. Calvino
esteve também à frente de Lutero, na maior interrogação que todos eles fizeram. A grande pergunta de Martinho Lutero era esta:
como pode um homem ser feito justo perante Deus? Calvino também fez essa pergunta, mas foi além e fez a seguinte indagação:
como pode, aquele que já foi declarado justo pela graça, viver agora uma vida para a glória de Deus? Finalmente, Calvino foi
além de Lutero porque ele começou a olhar como seria possível evangelizar todos os povos, em toda a terra.
Calvino viu um exemplar da Bíblia pela primeira vez em sua vida quando tinha 14 anos de idade. Era seu desejo, como
adolescente, tornar-se um padre, um sacerdote. Ele ficou muito interessado, enquanto ainda jovem, no debate que estava em
andamento entre católicos e protestantes. Seu pai, no entanto, interrompeu os seus planos, pois teve uma discussão muito séria
com um padre na escola onde Calvino estudava. Isso motivou a retirada dele daquela escola e o seu pai o colocou para estudar
direito. Aos vinte anos de idade Calvino já tinha se formado em advocacia. Na Sua providência, Deus usou esse treinamento para
que ele pudesse ter um pensamento claro e lógico em sua teologia. Quando Calvino tinha 21 anos seu pai morreu e ele
matriculou-se novamente numa escola de teologia.
Calvino foi convertido quando tinha entre 24 e 25 anos de idade. Diferentemente de Lutero ele falou muito pouco a
respeito de si próprio. Em mais de cem volumes escritos, Calvino fala a respeito de si uma ou duas vezes. O lugar onde ele fala
com maior detalhe a seu respeito é no prefácio aos seus comentários dos Salmos. Ali ele escreve o seguinte, lembrando os dias de
sua conversão: "Eu comecei a entender como se alguém me houvesse trazido uma luz, revelando em que tipo de erro eu tinha
estado laborando até então. Eu me tornava cada vez mais sujo, e percebi que estava num estado deplorável, mas Deus, por uma
conversão súbita, me elevou e me colocou dentro de um paradigma no qual eu me tornava ensinavel, educável. Eu tive de desistir
de mim mesmo e entregar-me aos caminhos de Deus". A vida de Calvino mudou completamente de uma forma imediata. Um ano
ou dois mais tarde, ele escreveu a primeira edição da sua famosa obra, As Institutas. Esse foi o livro mais famoso em termos de
teologia reformada que jamais havia sido publicado. Calvino desenvolveu sua teologia bíblica durante toda a sua vida. A primeira
edição das Institutas tinha apenas 6 capítulos, com cerca de 120 páginas. A última edição tinha 80 capítulos e 1200 páginas.
Calvino deixou a França por causa de uma perseguição em potencial e foi para Basiléia na Suíça. No seu caminho a
Basiléia, ele foi interceptado por Guilherme Farei. Farei persuadiu Calvmo a ficar com ele em Genebra para que juntos pudessem
reformar a cidade. Eles trabalharam arduamente por três anos e foram rejeitados pelo povo de Genebra, pelo menos pela maioria
do povo e a maioria dos que compunham o Conselho da cidade. Assim, em 1538 ele foi banido da cidade de Genebra por decisão
do Conselho daquela cidade. Foi para Estrasburgo onde passou os quatro anos mais silenciosos e quietos de toda sua vida. Lá foi
pastor de uma igreja reformada. Em 1541 foi chamado de volta a Genebra pela primeira vez. Naturalmente ele rejeitou esse
chamado - mas insistiram. Ele escreveu dizendo que jamais voltaria a um lugar de tanta perseguição. Eles o chamaram pela
terceira vez. Depois de muita luta Calvino aceitou e escreveu o seguinte: "Quando considero que não estou debaixo da minha
própria autoridade, eu quero oferecer o meu coração como uma vítima a ser morta em sacrifício para o Senhor".
Nos últimos 24 anos de sua vida Calvino trabalhou em Genebra. Os primeiros 15 anos de seu trabalho foram uma
batalha contra seus inimigos. Lutou como quem luta contra um inimigo que vem colina abaixo, e ele lutava de baixo para cima.
Somente nos últimos nove anos do seu ministério a maioria do Conselho da cidade e o povo, estava ao seu lado. Calvino suportou
muita perseguição. As pessoas jogavam armas e objetos dentro de sua casa e até colocavam o nome Calvino em seus cachorros.
Todavia ele perseverou com a graça de Deus. Foi nos últimos nove anos que a Reforma progrediu de uma forma notável. A
Academia de Genebra foi estabelecida por Calvino com a ajuda de seu sucessor, Teodoro de Beza. Nos últimos nove anos da vida
de Calvino, 1600 jovens foram treinados para o ministério reformado. Muitos deles foram queimados vivos na França, mas outros
foram espalhados pela Europa divulgando a fé reformada. Alguns deles, como John Knox e Gasper Oliviana, se tornaram
famosos.
Calvino trabalhou de forma dedicada e formou um movimento em Genebra que veio a influenciar toda a Europa. Ele
trabalhou até o último dia da sua vida e com 55 anos de idade morreu. Certo estudioso e pesquisador analisou que 83 diferentes
enfermidades estavam "minando" seu corpo. Esta afirmação é uma "cauda de raposa" muito comprida, deste pesquisador.
Contudo, o ponto é que Calvino, mesmo sofrendo grandes dores, perseverou até o fim. Ele disse àqueles que estavam ao redor do
seu leito de morte: "Senhor, eu retenho a minha língua porque sei que isto vem de Ti. Eu estou chorando como um cão. Tu tens
me moído e me transformado em pó, mas isto me basta porque compreendo que é a Tua vontade. Quero oferecer-Te meu corpo e
minha alma de forma pronta e sincera". Calvino fez apenas um pedido ao morrer: não colocarem nenhuma na sua sepulura, porque
dizia que não era digno e merecedor de nenhuma honra, de nenhuma glória. Assim viveu, assim morreu defendendo as doutrinas
da graça soberana de Deus. Ele teve suas falhas como qualquer um de nós. Teve seus erros, mas foi um homem de Deus, salvo
pela graça de Cristo
Seu ensino
Vejamos, em segundo lugar, seus ensinos sobre a evangelização. Façamos esta pergunta: será que seus ensinos trazem
aquela dinâmica interna que leva os seus leitores e seguidores à evangelização? Nossa resposta é "sim", e bastante. Em todos os
seus ensinos Calvino enfatiza a universalidade do reino de Cristo e a responsabilidade dos crentes em colocarem como alvo a
expansão deste reino. Calvino ensinou que a motivação para isso está no próprio Deus triúno. Todas as três pessoas da santíssima
Trindade estão envolvidas na expansão do reino, assim ensinou Calvino. Ele disse: "O Pai, não apenas mandou a Sua vontade para
uma parte da terra, mas também para a outra extensão da terra". Sobre Jesus, escreveu que Jesus estende Sua graça sobre todos.
Em um sermão sobre o Espírito Santo ele disse que este Espírito deseja alcançar até às extremidades da terra. Ele escreveu: "O
triunfo de Cristo será manifesto em todos os lugares da terra". Como pode Deus estender o Seu reino maravilhoso em toda a
extensão da terra? A resposta de Calvino conjuga a soberania de Deus e a responsabilidade humana. O trabalho de um evangelista,
disse Calvino, é o trabalho de Deus e não do homem. Mas Deus derrama sobre Seu povo a honra e o privilégio de serem usados
como o barro na mão do Oleiro. Dessa forma, Calvino chama o povo de Deus de cooperadores com Ele. Calvino inclui no seu
ensino sobre a soberania de Deus, os meios pelos quais Ele cumpre essa soberania. Esses meios seriam aqueles que crêem e que
são usados para expansão do reino de Deus. Assim, no ensino de Calvino sobre a evangelização, o esforço humano nunca tem a
última palavra, mas Deus Se agrada em usar seres humanos, simples, para levar o Seu reino. Esta inter-relação entre soberania e a
participação da responsabilidade humana tem pelo menos quatro inferências.
Em primeiro lugar, dizia Calvino, isso nos chama à oração. Ele disse que o cristão deve orar e desejar que Deus reúna,
em torno de Si mesmo, igrejas em toda a face da terra. Em segundo lugar, não devemos ficar desanimados pela falta de sinais
visíveis de sucesso. Calvino escreve: "O nosso Senhor exercita a fé dos Seus filhos quando Ele não realiza imediatamente as
coisas que prometeu. Se Deus passa um dia ou um ano sem proporcionar frutos, não devemos desistir, porém devemos orar mais
e não duvidar que Ele está ouvindo a nossa voz, mesmo quando não vemos os frutos" . Em terceiro lugar, Calvino ensinava que
devíamos trabalhar diligentemente pela extensão do reino de Cristo sabendo que, no Senhor, nosso trabalho não é vão. Podemos
colocar isso de outra forma. A nossa salvação nos obriga a evangelizar. Calvino disse: "Não é suficiente, para qualquer homem
ocupar-se consigo mesmo. O nosso zelo deve ir além de nós mesmos e atrair outras pessoas a Cristo. Precisamos atrair todos os
homens à Pessoa de Jesus Cristo com todo nosso esforço". Será que isso não é uma indicação do tamanho da "cauda de raposa"
do evangelista que era Calvino? Para Calvino, a evangelização não era uma coisa opcional, era parte de sermos cristãos. Em
quarto lugar, nesse relacionamento entre soberania e responsabilidade humana, Calvino mostra muitos motivos pelos quais
devemos evangelizar. Já consideramos algumas motivações no capítulo anterior, e vou, portanto, apenas relacionar estas sem fazer
referência a todas as citações de Calvino, para sermos sucintos.
Nos seus sermões e comentários, Calvino apresenta sete motivos diferentes para evangelizar:
1. Jesus nos mandou evangelizar.
2. Devemos estar motivados pelo exemplo do próprio Deus como evangelista.
3. O nosso desejo de manifestar a glória de Deus deve nos motivar a evangelizar.
4. Já que o cristão valoriza aquilo que agrada a Deus, e evangelizar agrada a Deus, então devemos evangelizar.
5. É nossa responsabilidade e nosso dever evangelizar.
6. Uma forte compaixão pela condição dos pecadores deve motivar-nos a evangelizar.
7. Profundamente gratos a Deus pela alegria da nossa própria salvação, nós devemos evangelizar em amor ao próximo.
O cristão, diz Calvino, é aquele que diz assim: "Já que Deus pôde me salvar Ele pode salvar a qualquer um na face da
terra". Calvino disse: "Nada é mais incoerente com a natureza da fé do que aquela mortificação que leva a pessoa a desconsiderar
seus semelhantes, e assim, de uma forma errônea, guardar a luz e a graça de Cristo somente no seu peito". Portanto, Calvino
ensinou que a evangelização é a tarefa de todo cristão. Assim, cada cristão deve trabalhar e buscar pecadores para Cristo; essa é a
sua tarefa sacerdotal. Cada cristão deve instruir outros no caminho da salvação; essa é a sua tarefa profética. Cada cristão é
chamado a discipular outros; essa é a sua tarefa real. Calvino, no entanto, pensou e ensinou que essa tarefa, que é sacerdotal,
profética e real, é preferencialmente ligada àqueles que foram chamados e ordenados por Deus para o ministério. Calvino sempre
desejou ligar a evangelização com a Igreja. Dessa forma, cristãos que ainda não tinham conhecimento próprio, completo, não
iriam evangelizar de forma correta, agindo como se não devessem prestar contas a ninguém e acabariam ensinando coisas erradas
ao povo. O que Calvino jamais fez, foi pegar o novo convertido e dizer que ele estava por "conta própria", e que devia partir para
evangelizar. Esta alerta de Calvino tem feito com que ele receba um "rótulo", da parte de alguns, como se ele fosse contrário à
evangelização. Calvino não era contra à evangelização, mas era contra à evangelização errada. Era contrário, por exemplo, à
evangelização individualista que pudesse levar a um caminho errôneo.
Aspectos práticos
Vejamos em terceiro lugar, os aspectos práticos de Calvino quanto à evangelização reformada. Calvino operava a
partir do seguinte princípio básico: onde quer que o Senhor abra uma porta, ainda que seja uma pequena brecha, precisamos ver a
necessidade de atravessarmos esta abertura para levar a mensagem do Seu reino. Ele diz que não devemos rejeitar qualquer
convite que Deus nos faça. Se porventura Deus nos lança lá fora e fecha a porta, não devemos resistir a Sua soberania tentando
abrir uma porta que foi trancada por Deus. Calvino não ensinaria, todavia, que deveríamos simplesmente deixar de olhar as
diferentes oportunidades e seguir aquelas que nós julgamos ser as melhores. Ele estava simplesmente falando de situações,
quando as portas estão completamente trancadas. Sem dúvida ele estava pensando, no fundo da sua mente, na sua experiência em
Genebra, quando foi expulso da cidade. Vejamos os quatro círculos onde Calvino exercitou a sua evangelização. Assim como
quando você joga uma pedra dentro de um rio e as pequenas ondas formam aqueles círculos concêntricos, da mesma forma
Calvino operou em quatro círculos concêntricos diferentes.
3
A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos
1. Quando pregavam a doutrina do pecado tinham a coragem de chamar pecado de pecado mesmo. Eles pregavam o
pecado como uma rebelião moral contra Deus, uma rebelião que traz um sentimento de culpa e, se não houver arrependimento e
perdão, a conseqüência será a condenação eterna certamente. Pregavam a respeito de pecados específicos; pecados de omissão e
pecados de comissão; pecados por palavras e ações; falavam do quanto foi horroroso o nosso pecado original em Adão e Eva;
falavam à congregação que eles tinham um referencial muito ruim e um coração mal por natureza; que o homem natural não pode
amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo; ensinavam de forma "aberta" que uma reforma, apenas externa
na nossa vida, não é suficiente para salvação eterna; a reforma interna produzida pelo Espírito Santo é absolutamente necessária e
por isso pregavam como aquela regeneração podia ser experimentada e então vivida.
2. Outro exemplo se vê na sua pregação. Pregavam de uma maneira muito forte a doutrina de Deus. A evangelização
deles era construída em cima de forte base teísta; pregavam Deus no Seu ser majestoso e em todos os Seus atributos gloriosos.
Não só deixavam Deus ser Deus, mas declaravam que Deus é Deus. Os puritanos colocavam Deus em uma posição bem elevada -
como deve ser. Quando se aproximavam de Deus em oração não falavam com Ele como quem fala com o vizinho pela janela, ou
como um vizinho que pode ajustar seus atributos de acordo com suas necessidades e desejos pessoais. O puritano sempre exaltou
a majestade de Deus e, quando se aproximava de Deus, você podia perceber aquele sentimento profundo de reverência. O Deus
que o puritano pregava era o Deus da Bíblia. Talvez um dos versículos mais importantes, na Bíblia, para um puritano, seria
exatamente Gênesis 1:1 - "No princípio, Deus". E de Deus que emanam e se desdobram todas as coisas neste mundo. Todas as
coisas são preparadas, iniciadas,projetadas e feitas para a glória de Deus!
3. A evangelização puritano também proclamava de forma completa e plena a doutrina de Jesus Cristo. Pregavam o
Cristo integral para o homem integral. Recusavam-se em separar os benefícios que advêm de Cristo, da própria Pessoa de Cristo.
Um dos grandes puritanos, Joseph Alleine, em seu clássico livro originalmente intitulado, An Alarm to the Unconverted
(Publicado no Brasil pela PES, como Um Guia Seguro para o Céu), disse que o ser de Cristo integral é aceito por aquele que é
realmente convertido. Os verdadeiros convertidos não aceitam apenas as recompensas de Cristo, mas a própria obra de Cristo.
Não amam apenas os benefícios de Cristo, e sim também o "fardo" de Cristo ("...tomai sobre vós o meu jugo..."). Amam não só
tomar os mandamentos, mas também, a cruz de Cristo. Por outro lado, o falso convertido recebe Cristo pela "metade". Ele quer os
privilégios de Cristo, porém não quer se inclinar diante do senhorio de Cristo. Ele divide os ofícios de Cristo e os benefícios de
Cristo. Esse é o problema dos "crentes" de hoje.
Freqüentemente Jesus tem sido apresentado na evangelização de hoje como alguém que está aí para satisfazer todas as
necessidades e desejos dos homens. Na pregação de hoje, Jesus é apresentado como alguém que não exige que o homem ofereça o
seu coração completo e a sua vida completa. Quando os puritanos pregavam, instavam com os pecadores a se voltarem para Jesus
e avisavam que eles precisavam avaliar o preço de seguir a Jesus, e o preço era perder a sua vida; morrer diariamente por amor a
Cristo, negar-se a si mesmo, tomar a cruz e segui-lO. Os puritanos tinham horror àquilo que hoje é chamada "a graça barata",
porque, na verdade, essa não é uma graça verdadeira. Graça barata significa que eu aceito Jesus na minha própria força; Ele
reforma um pouco a minha vida por fora, porém eu continuo agindo com os princípios egocêntricos no meu ser interior. A graça
barata me leva a pensar que, por um lado, eu tenho a Jesus, que estou a caminho para o céu, mas, por outro lado me permite
continuar vivendo uma vida mundana. Na verdade, eu estou mesmo no meu caminho para o inferno. Os puritanos apresentavam
Jesus como um Salvador completo para um pecador completo. Um puritano disse: "O pregador que é o seu melhor amigo, é
aquele que vai dizer mais verdades sobre você mesmo". Eles não estavam preocupados em causar dano ao amor próprio dos
ouvintes das suas congregações. Eles estavam mais preocupados com Cristo do que com os ouvintes. Estavam preocupados com a
Trindade. O cristão encontra o seu amor próprio a medida que ele ama ao Pai que o criou, ao Filho que o restaurou através da
cruz, e no amor ao Espírito Santo que mora nele e que faz com que sua alma e seu corpo sejam templo do Espírito Santo.
4. A doutrina puritana expandia e explanava com detalhes a doutrina da santificação. A vida inteira do crente era para
ser colocada aos pés de Deus. Ele tinha que trilhar a vereda do Rei no caminho da justiça. Ele precisava conhecer a vida de uma
forma experimental. Precisava conhecer essas "irmãs siamesas" que são, a vida e a experiência. Quando o ministro prega sobre
santificação, você precisa saber o que está sendo requerido de sua parte. Você não pode entender estas coisas sem doutrina e isso
nos traz à terceira característica da pregação dos puritanos.
Em terceiro lugar, destacamos que a pregação puritana era experimentalmente prática. A ausência de uma pregação
experimental e prática é uma das grandes falhas no culto e na evangelização de hoje. O que significa uma pregação experimental?
A palavra experimental vem da palavra experiência. Em termos de cristianismo, a religião experimental significa que a Palavra de
Deus e suas doutrinas precisam ser recebidas não apenas na mente (os puritanos chamavam isso de conhecimento na cabeça,
apenas), mas também precisam ser experimentadas e vividas no coração. Isso eles chamavam de "conhecimento do coração". Eles
baseavam este tipo de ensinamento, por exemplo, em Provérbios 4:23: "Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração,
porque dele procedem as fontes da vida".
Para os puritanos os pensamentos precisam fluir das Escrituras e as experiências do coração, fluem do ensino da doutrina
e das Escrituras. Dessa forma, experiência não é alguma coisa mística, separada da Bíblia. Isso eles rejeitavam totalmente! Ao
mesmo tempo, eles também rejeitavam completamente o tipo de religião que se satisfaz com o conhecimento apenas na cabeça,
que é só racional. Estas doutrinas sobre as quais falamos resumidamente, a doutrina de Deus, de Cristo e do pecado, para os
puritanos deviam ser tão reais quanto as cadeiras em que sentamos. Estas doutrinas precisam ser transformadas numa realidade
que queime dentro de minha alma. Elas precisam influenciar toda a minha vida, todo o meu estilo de vida. Dessa forma, os
puritanos acreditavam em viver, na prática, o que eles experimentavam. Sempre eles traziam suas experiências às Escrituras para
terem a certeza de que estavam sendo totalmente bíblicos - até nas suas experiências. Para os puritanos doutrina seria algo vazio se
não fosse acompanhada pela experiência. Toda experiência verdadeira leva a uma experiência pessoal com Cristo. Por isso é
necessária a pregação da Pessoa de Cristo e esta pregação será honrada pelo Espírito Santo, porque Ele toma estas coisas e as
aplica aos pecadores.
Os puritanos, na sua pregação, incluíam o que chamavam de "marcas de um auto exame". Estas marcas de exame eram
os sinais que distinguiam a Igreja do mundo. Distinguiam os verdadeiros crentes daqueles que eram crentes nominais ou apenas
por professarem a fé. Os puritanos faziam distinção entre fé salvadora e fé temporária. Muitos livros têm sido escritos a respeito
deste assunto. O mais famoso deles foi escrito por Jonathan Edwards: Afeições Religiosas. Também o livro de João Bunyan, O
Peregrino, contém tais marcas. O que nós hoje, desesperadamente precisamos, é de uma volta a este estilo de evangelização
reformado-puritano que sempre está pesquisando e sondando o coração. Os puritanos nunca diziam de uma forma "leviana" que
os pecados do povo estavam perdoados, mas pregavam de forma profunda o que realmente o pecado é e como ele tem afetado as
pessoas. Eles procuravam tirar do pecador todo o seu sentimento de justiça própria para, então, levá-lo ao Senhor Jesus Cristo.
Alguém disse que a religião da América, hoje, tem 2.000 km de comprimento por 3.500 Km de largura (essas são as
dimensões do país), mas com uma profundidade de mais ou menos 12 centímetros, apenas! O problema, em todos os lugares no
mundo, hoje, é que a evangelização freqüentemente começa num lugar errado. Poderíamos dizer muitas coisas sobre as diferenças
entre a evangelização moderna e a puritana, em relação à experiência do povo de Deus. Pois bem, quero apenas destacar um ponto
e este é a resposta a uma pergunta: quando olhamos atrás para a história da Igreja, e também na história bíblica, observando as
épocas de avivamento verdadeiro, não produzido pelo homem, qual era o elemento evidente naquela época que hoje está
claramente ausente? Respondemos sem hesitação que é a ausência de profunda convicção de pecado. Este é um grande problema
nos nossos dias.
Convicção de pecado
Hoje há muito pouca convicção de pecado entre os não salvos. A maioria dos chamados "cristãos" contemporâneos, vive
de maneira tão descuidada em sua vida, que é muito difícil alguém diferenciá -los de homens não convertidos. O problema é que
freqüentemente o pecado não é pregado como pecado para as pessoas; o horror do pecado não é enfatizado às pessoas. Isso nos
leva a uma pergunta ainda mais profunda: por que as épocas de avivamento realizado pelo Espírito Santo foram períodos de
profunda convicção de pecado? A resposta é que o Espírito Santo, como Jesus nos diz, vem para convencer do pecado, da justiça
e do juízo. Assim, o convencimento do pecado é o caminho pelo qual Deus age para abrir espaço no coração do pecador. Quando
o homem vê a realidade de Deus e a realidade do pecado contra Deus, ele se humilha até o pó. Só então, ele vai apreciar o que
aquele Deus-homem, Jesus Cristo, fez por nós pecadores. Foi o que aconteceu com Isaías quando ele chegou à presença de Deus:
"Ai de mim porque sou um homem de lábios impuros..." O mesmo aconteceu com Jó ao chegar à presença de Deus. Por cerca de
quarenta capítulos no livro de Jó ele estava mais ou menos se defendendo, estava lutando para entender o que Deus havia feito
com ele. Mas ao se sentir na presença de Deus, o Senhor Se tornou tão grande e Jó tornou-se tão pequeno, que perdeu todas as
suas defesas. Então Jó falou: "Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem. Por isso me abomino, e me
arrependo no pó e na cinza" (Jó 42:5-6). Ele já havia ouvido falar de Deus antes, porém agora ele "viu a Deus", pela fé e perdeu
tudo que estava do seu lado e se lançou como um pobre pecador, tão somente na misericórdia de Deus. É isso que está faltando na
evangelização moderna. Não se vêem pecadores chegando até a cruz e clamando como aquele publicano que disse em sua oração:
"Ó Deus, tem misericórdia de mim pecador".
Vocês vêem o que é realmente o pecado, e quem é Deus? Se assim acontecer seremos levados à cruz e, quando
experimentarmos pela fé a beleza e plenitude de Cristo na cruz, não precisaremos de nenhuma explicação da parte de Deus por
aquilo que Ele está fazendo em nossa vida. Nós nos inclinamos diante dEle e dizemos que seja feita a Sua vontade. Deus nunca
explicou a Jó por que Ele fez tudo aquilo com sua vida. Entretanto, veio de Deus o poder para que Jó fosse justo aos Seus olhos.
Avivamento
Isso nos leva a outra questão. Se a falta de convicção de pecado é um problema tão sério, como pode esse tipo de
convicção ser restaurado à Igreja hoje? Novamente aqui a história da Igreja nos dá uma resposta muito clara. O Espírito Santo
encontra um homem caído, quebrantado; este homem chega diante da cruz e encontra a plenitude da salvação em Cristo Jesus, e o
Espírito envia esse tipo de homem para pregar o pecado e a conversão aos outros. Em outras palavras, Deus está levantando
homens que sejam santos, que sejam humildes, homens de oração para usá-los; homens que odeiam o pecado e que amem a Deus;
homens que estejam tremendamente convictos da necessidade da salvação de almas; homens que estejam orando sempre por um
avivamento bíblico, um avivamento do Espírito Santo. Deus usa este tipo de homem para trazer avivamento. Lembrem-se que o
avivamento começa com uma convicção experimental de pecado.
Arrependimento
Isso nos leva a outra questão. Quando Deus Se agrada em levantar esse tipo de homem, será que alguma coisa específica
em sua pregação tem conexão com a convicção de pecado? Creio que a resposta é sim! É esse tipo de homem, que de forma
incisiva, se dirige à convicção da consciência, de uma forma bem aguçada. Eles mostram aos pecadores de forma clara a
necessidade de arrependimento e o Espírito Santo Se agrada em honrar e abençoar a Sua Palavra quando este homem prega de
forma convincente. O que aconteceu com João Batista quando ele começou a pregar com convicção? Os homens começaram a
fugir da ira vindoura. O que aconteceu quando Pedro pregou com profunda convicção no dia de Pentecoste? O Espírito Santo
desceu sobre os que ouviam a sua palavra.
Evangelização moderna
Por isso minha tese é: a evangelização moderna está se levantando como um obstáculo frontal, com raras exceções, à
verdadeira convicção de pecado, ao arrependimento e ao verdadeiro avivamento. A evangelização moderna tem uma visão
superficial de pecado; fala tão pouco de um assunto que a Bíblia tanto menciona. Por que a evangelização moderna fala tão pouco
a respeito do pecado? A evangelização moderna tem medo de falar às pessoas as verdades a respeito delas mesmas; tem medo de
perdê-las. Ensina que nós não devemos ofender as pessoas, e sim, sempre conquistá -las. A razão humana diz que não vamos
ganhar as pessoas se lhes falarmos do pecado. A evangelização moderna não nega que o homem esteja morto nos seus delitos e
pecados; não nega que a Bíblia diz em Romanos 8:7, que a mente carnal está em inimizade contra Deus; não nega que está escrito
em 1 Coríntios, capítulo 2, que o homem natural não aceita, não compreende as coisas de Deus, mas a evangelização moderna diz
que textos assim são apenas afirmações doutrinárias. Diz que esses textos são relevantes para os crentes, todavia não seriam
relevantes para os não salvos. Dizem: "Como podemos ganhar as pessoas se dissermos que elas não podem se salvar a si
próprias?" Concluem, assim, que qualquer ensino que retira da mente dos ouvintes a capacidade de responder imediatamente ao
evangelho, na verdade é alguma coisa que impede a evangelização.
Dessa forma fazem do cristianismo alguma coisa bem simples e fácil. Dizem: "aceite a Jesus hoje, é simples, não
precisa se preocupar com seus pecados, Ele já lhe perdoou. " Mas eles não somam aí o que é que significa realmente ser
perdoado e quais os frutos de uma vida verdadeiramente perdoada. Por isso, a evangelização moderna produz cristãos muito
superficiais, com uma religiosidade de apenas "12 centímetros" de profundidade. O pastor batista, Erroll Hulse, trabalhou certa
vez em uma cruzada evangelística de massa com o Dr. Billy Graham e logo após, teve de escrever um livro intitulado, O Dilema
do Pastor, onde esclarece que menos de cinco por cento dos que vinham à frente, no apelo, mostravam frutos subseqüentes em
suas vidas. Se formos comparar por um momento, tudo isso, com o ministério do puritano Richard Baxter, que teve 600 pessoas
convertidas na pequenina cidade de Kidderminster onde foi pastor, fazendo-o dizer no fim de sua vida que ele não sabia de
nenhum que tivesse caído ao longo do caminho, perceberemos que há uma grande diferença. Há uma diferença entre uma
pregação superficial a respeito de Jesus e que ignora o pecado, e uma pregação que diz ao pecador que ele não vai saber valorizar
a Jesus enquanto não souber claramente o que é pecado. A evangelização moderna põe toda a pressão em cima da vontade do
pecador e o pecador precisa tomar uma decisão imediata. Um ato de decisão feito pelo homem usurpa o papel do Espírito Santo
em salvar pecadores.
Evangelização puritana
A evangelização puritana tem uma mensagem bem mais ampla sobre o que é o evangelho. O dever da fé é enfatizado,
mas outros deveres também são ressaltados. Os evangelistas puritanos vão dizer aos seus ouvintes, não salvos, que eles precisam
se arrepender, precisam parar de fazer o mal, precisam ser santos como Deus é santo, precisam amar a Deus de todo o coração e
precisam entrar pela porta estreita. Tudo isso é enfatizado na evangelização puritana. Noutras palavras,a evangelização puritana
apresenta a Bíblia como um todo para confrontar o incrédulo. Contudo, sejamos cuidadosos aqui. Eles não pregavam que o
incrédulo tinha capacidade de fazer estas coisas, mas pregavam a seus ouvintes as exigências das Escrituras, sabendo que o
Espírito Santo é quem faz tudo isso para mostrar aos pecadores que eles não podem cumpri-las por sua própria força.
O alvo do puritano era levar a alma não sal va a uma encruzilhada, quando duas estradas se cruzam. Uma dessas estradas
poderia ser chamada a estrada da necessidade e o pecador realmente convencido diria: "Eu preciso ser salvo, salvação é minha
necessidade!" A outra estrada poderia ser chamada a estrada da impossibilidade. O pecador diria: "Eu não posso ser salvo; eu não
consigo ser santo como Deus é santo; não posso ir a Jesus e me dobrar diante dEle por minha própria força". Qual era o alvo do
puritano? Era o de levar o pecador a esta encruzilhada e ao chegar lá descobrir que precisa ser salvo mas não pode. Dessa forma
ele vai clamar ao Deus todo-poderoso: "Faze por mim ó Senhor, o que eu não posso fazer por mim mesmo!". É isso que Paulo faz
nos capítulos 1,2 e 3 de Romanos; o mesmo fez João Batista quando pregava assim: "Arrependei-vos porque o reino de Deus está
próximo". João Batista não começou dizendo: "Eis o Cordeiro de Deus...", porém começou dizendo "arrependei-vos". Quando
Jesus começou Seu ministério pastoral, Ele não disse "tome uma decisão por mim", mas também começou dizendo "arrependei-
vos porque o reino de Deus é chegado". Como foi que Jesus evangelizou Nicodemus?Ele disse: "você precisa nascer de novo".
Como Jesus evangelizou o jovem rico? Ele disse: "Guarde os mandamentos". Por que Jesus lhe disse isso? Ele sabia que o jovem
não podia guardar todos os mandamentos no seu coração. Jesus estava colocando como alvo a convicção de pecado.
Os puritanos não faziam na sua evangelização nada que os apóstolos e o próprio Senhor Jesus não fizesse. Eles pregavam
a lei para que os pecadores se sentissem culpados perante Deus e aí pregavam Cristo, não um Cristo de 12 centímetros de
profundidade, e sim, Cristo completo na Sua altitude, na Sua amplitude e na Sua profundidade. Pregavam Cristo destacando Seus
ofícios, Seus nomes e Seus títulos. Pregavam Sua natureza e Sua Pessoa,pregavam-no plenamente. Isso nos leva a uma conclusão:
o que nós estamos precisando desesperadamente é de uma evangelização centralizada em Deus; uma evangelização centralizada
na mensagem; centralizada na Bíblia; não uma evangelização feita pelo homem, mas uma evangelização onde o Espírito Santo
está agindo na Palavra e por meio dela. Para este fim você e eu, como evangelistas, nós mesmos fomos restaurados para um
relacionamento mais vital e íntimo com Deus por Jesus Cristo. O que nós precisamos desesperadamente é de carregadores da
tocha, homens e mulheres que estejam em chamas por Deus. Não de homens que estejam em fogo por ensinos não bíblicos, mas
de homens inflamados pelo ensino da Palavra de Deus - sim, de homens cheios daquele temor filial a Deus. Você já percebeu que
todas as vezes que Paulo fala a pastores e presbíteros para dar-lhes algum conselho ele sempre diz, "Tem cuidado de ti mesmo e
depois do rebanho"?
Conclusão
Querido irmão, se você não odiar o pecado, se você não amar a Deus, se não estiver cheio do poder de Cristo, não deve
ficar surpreso de seu ministério ser tão infrutífero. Se as pessoas perceberem que viver religiosamente não é viver a realidade da
nossa vida, elas vão ser levadas a desobedecer as nossas mensagens. Um dos nossos grandes problemas hoje é que a nossa própria
casa não está em ordem. Que Deus nos leve a conhecê-lo de uma forma íntima e pessoal, seguindo-0 de forma incondicional e
pregando todo o conselho de Deus.
Queridos amigos, o tempo está curto, muito cedo vamos pregar nosso último sermão, fazer a nossa última oração,
participar da nossa última conferência, e a única coisa que realmente vai contar é a seguinte: conhecemos realmente a Deus e a
Jesus Cristo a quem Ele levou assunto aos céus? Que Deus nos faça portadores da tocha da evangelização puritana em nossa
geração.
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A Tocha da Evangelização Levada pelos Puritanos
1. Aceitação do pelagianismo. Embora certos elementos calvinistas estejam presentes, a evangelização moderna,
seguindo a teologia de Fnney, é essencialmente arminiana na sua apresentação do evangelho. Finney era confessadamente um
pelagiano (Pelágio foi um herege do século IV que sofreu dura oposição de Agostinho). Ele negava que o homem caído fosse
incapaz de se arrepender. Dizia que cada pessoa tem a liberdade e a vontade livre de arrepender-se e voltar-se para Deus; que cada
pecador pode resistir ao chamado do Espírito Santo, e que este Espírito apenas apresenta-lhe razões pelas quais ele deve ir a Deus.
O pecador, entretanto, é livre para aceitar ou rejeitar as razões apresentadas. Dessa forma, em última análise, a salvação não é uma
obra de Deus, é realmente um trabalho do próprio homem. Finney escreveu o seguinte: "Pecadores vão para o inferno apesar de
Deus". Finney negou os cinco pontos do calvinismo, e não subscreveu os ensinamentos de Jesus de que o homem precisa nascer
de novo, nascer do alto, doutra forma ele não pode entrar no reino de Deus.
2. Finney e a evangelização moderna colocam uma pressão indevida sobre a vontade humana. Se a vontade humana,
pecadora, é livre, segundo os evangelistas semipelagianos afirmam, apregação é reduzida simplesmente a uma batalha entre a
vontade dos ouvintes e a vontade do pregador. O resultado disso é que todos os meios que o pregador puder usar para persuadir os
seus ouvintes a aceitar a Cristo, acabam se tornando lícitos, mesmo que sejam baseados num excesso de emocionalismo do
auditório. O alvo principal nestes casos é mover a vontade do homem, e levá-lo a fazer uma decisão imediata. O contrário disso,
vemos no ensino de João 1:13: "... os quais não nasceram do sangue nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas
de Deus."
3. Finney e a evangelização moderna reduzem o processo de conversão a um espaço curto de tempo. Isso não é
bíblico! A Bíblia apresenta a conversão como sendo um processo por vezes demorado. Entretanto, para a evangelização moderna,
a conversão é um processo de mais ou menos dez minutos. Recentemente foi escrito um livro sobre evangelização que faz com
que o evangelista caia em profundo sentimento de culpa, se demorar mais de dez minutos para converter alguém. Chegamos a
conclusão que, para muitos evangelistas modernos, a salvação não é mais aquele trabalho miraculoso, soberano e misterioso do
Espírito Santo de Deus, e sim, o trabalho calculável da ação do homem. Isso é contrário ao que lemos em João 3:8: "O vento
sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito ". O
que realmente tem acontecido nos últimos 175 anos, é o seguinte: Finney e a evangelização moderna perderam o sentido de
conversão bíblica; perderam o conceito de conversão como uma obra miraculosa; perderam o sentimento daquela dependência
total do homem em Deus, na sua conversão.
4. Grande parte dos resultados da evangelização moderna é questionável. Diversos estudos têm provado que a
evangelização de massa, utilizado em grande parte nas cruzadas, em que o próprio homem decide a sua salvação, leva, finalmente,
a um cristianismo muito superficial, que quase não dá fruto. Isso não quer dizer que não existam certos indivíduos a quem Deus
realmente converteu em tais tipos de reuniões. A Bíblia diz que Deus pode fazer com que uma vara torta se torne reta. Entretanto,
esse fato não nos isenta da responsabilidade em apresentar aos nossos ouvintes uma evangelização bíblico e saudável, uma
evangelização que tenha uma profundidade maior, uma evangelização que começa, centraliza-se e termina em Deus. É isso que
descobrimos quando nos voltamos para o método dos puritanos.
1. Usavam um método racional de pregar. Eles pregavam a criaturas racionais. Trabalhavam arduamente para mostrar
aos pecadores a loucura de não buscar o Senhor. Eles procuravam mostrar às suas congregações o aspecto racional de todas as
doutrinas da graça. John Owen, por exemplo, expunha à sua congregação como a doutrina da eleição era racional e lógica. Eleição
é a primeira coisa do lado de Deus, mas é a última coisa que é conhecida do lado daquele que crê. Eles usavam este tipo de ensino
para alcançar a mente e também a consciência. Labutavam para conduzir cada ouvinte a esta conclusão. Seria totalmente ridículo
não buscar o Senhor. Ridículo em função do julgamento que há de vir, mas também em termos da maneira como vivemos nesta
vida presente.
2. Tinham uma pregação afetuosa, apaixonada. É uma coisa rara nos nossos dias encontrar um pregador que tanto
alimenta a mente dos ouvintes com substância bíblica sólida, quanto também mova os seus corações, com um calor afetivo. Mas,
esta combinação era coisa comum aos pregadores puritanos. Falavam com amor e com convicção. Pregavam com uma chamada
clara à fé e ao arrependimento. Pregavam com paixão o terror do pecado. Pregavam com calor a respeito de Jesus Cristo.
Derramavam do púlpito suas próprias almas em seus sermões. Eles praticamente davam suas vidas pelo seu povo. Suplicavam aos
seus ouvintes que se reconciliassem com Deus, não porque pensassem que eles podiam se reconciliar com um Deus santo, mas
porque eles sabiam que o Deus todo-poderoso usa a loucura da pregação para salvar aqueles que realmente vão crer. Sabiam, pelas
Escrituras, que somente o Cristo onipotente podia vivificar um pecador espiritualmente morto e mortificar a sua pecaminosidade,
separá-lo dele mesmo, fazendo -o desejoso de abandonar o seu pecado e voltar-se para Deus e para a salvação completa por Ele
oferecida. A pregação puritana apresentava todas estas verdades com paixão.
4. A evangelização puritana se caracterizava por fazer uma análise específica de temas bíblicos. Se um puritano
pregasse sobre o inferno, o sermão inteiro seria sobre o inferno. O mesmo aconteceria se pregasse sobre o céu, todo o sermão seria
sobre o céu. Noutras palavras, eles pregavam o seu texto o tempo todo. Calculavam que assim, após certo período de tempo,
teriam coberto cada assunto principal da Bíblia. Assim, procuravam edificar o seu povo em todo o conselho de Deus,
demonstrando sua apreciação por todo o ensinamento das Escrituras. Quero dar alguns exemplos. Os títulos que vou dar agora são
de um livro de um puritano: "Quantos Já Experimentaram Uma Vida Seriamente Identificada com Deus?"; "Qual o Melhor
Preservativo Contra a Depressão Espiritual"; "Como Podemos Crescer no Conhecimento de Cristo?"; "O Que Precisamos Fazer
Para Evitar Orgulho Espiritual?"; "Como Devemos Lidar Com Doutrinas Que Não Podemos Compreender Completamente?";
"Como Podemos Conhecer de Uma Forma Melhor o Valor Real da Nossa Alma?". Espero que vocês estejam percebendo quão
específicos eram os puritanos ao pregarem o seu texto bíblico, e como depois de certo período de tempo eles conseguiam falar a
respeito de todo o conjunto de verdades espirituais.
Os puritanos reforçavam os seus sermões com uma evangelização catequética. O pastor puritano típico visitava o lar dos
membros da sua igreja pelo menos uma ou duas vezes ao ano. Eles catequizavam cada criança em cada lar e estas crianças
também vinham para a aula de catecismo na igreja. Eles treinavam os pais em cada família para que também fizessem o estudo do
catecismo com suas crianças no culto doméstico. Normalmente levavam 30 a 40 minutos por dia para essa atividade. No domingo
à noite davam treinamento aos pais para que pudessem analisar o sermão do dia com as crianças por duas razões: para levar o
sermão ao nível de uma criança e também para levar o pai a lembrar o sermão. Os puritanos tinham como alvo evangelizar a
família inteira. Eles não estavam buscando convertidos de "dez minutos'' ou uma decisão momentânea do coração. Eles
procuravam convertidos que permanecessem convertidos a vida inteira, cujas mentes e corações tivessem sido vencidos, tornando-
se cativos pela Palavra de Deus.
Vida coerente
Os puritanos buscavam uma vida coerente com a Palavra de Deus em qualquer lugar que estivessem. Um pastor puritano
escreveu o seguinte: "A minha oração diária é que eu possa ser tão santo na minha família, e nos momentos que eu passo sozinho
com Deus, como eu pareço ser quando eu estou em frente ao meu povo, no púlpito da minha igreja". Os puritanos buscavam
santidade em todas as áreas da sua vida, todavia uma santidade que não era baseada em méritos pessoais. Eles sabiam que não
possuíam tais méritos. Eles buscavam, uma santidade que era fruto daquilo que Deus fizera por eles. Por isso se destacaram na
história da Igreja como inigualáveis na vida particular de oração, na perseverança em manter o culto doméstico, nas orações em
público, e na pregação.
Perguntamos: será que costumamos orar individualmente como McCheyne e os puritanos? Será que nós, de forma zelosa,
até ciumenta, cuidamos de nossa vida de comunhão com Deus? Será que estamos convictos que parar de vigiar e de orar é estar
esperando um desastre espiritual na nossa vida? Será que estamos submissos com nosso coração e mente à disciplina da Palavra
de Deus? Será que temos em nossa vida diária aquele mesmo espírito dos puritanos que os tirou do mundo, colocando seus
corações nas coisas eternas, especialmente no próprio Deus? Será que estamos movidos, como os puritanos, com aquela paixão
que eles tinham de glorificar a Deus e magnificar o nome de Jesus Cristo, falando contra o pecado e buscando a santidade? Será
que temos sede da glória de Deus? Não é suficiente ter livros puritanos nas nossas prateleiras, nem mesmo é suficiente lê-los.
Espero que sejam lidos, pois são amigos maravilhosos e grandes mentores espirituais. São aquilo que Lutero disse: "Alguns dos
meus melhores amigos já morreram há muito tempo, mas eles ainda falam comigo através da página impressa".
Eu sei pessoalmente o que isso significa, pois comecei a ler os puritanos quando tinha nove anos de idade. Costumava
ficar até tarde da noite lendo-os. Freqüentemente minha mãe determinava que eu parasse de ler para dormir. Eu desligava a luz
do meu quarto, porém ia para a escada para observar a luz que saia por baixo da porta do quarto dos meus pais. Quando ela se
apagava, eu voltava ao meu quarto e continuava a ler! Lia com um livro dos puritanos aberto diante de mim e a Bíblia aberta, ao
lado. Lia devagar, fazendo cinco ou seis orações por cada página que lia. Conferia nas Escrituras cada texto que eles citavam. Os
puritanos acabavam me levando sempre de volta à Bíblia - e ela sempre me levava aos puritanos. Muitas vezes estava chorando
enquanto lia, um choro de alegria pela salvação plena que se acha em Jesus, mesmo um pecador como eu era e ainda sou. Eu
chorava com aquele desejo imenso de ser mais santo, de ser mais parecido com Cristo e de ter mais daquela disposição interna
dos puritanos. Precisamos desta religião vivenciada por eles. Eles tinham suas falhas, e seus escritos não são a Bíblia, mas eles nos
ajudam a entender a Bíblia, e a sua piedade vital é um grande exemplo para nós.
Conclusão
Dessa forma vamos nos desafiar uns aos outros para crermos no Deus dos puritanos. Quem tem a coragem de ir além de
uma simples leitura dos escritos dos puritanos? De ir além de uma apreciação das idéias dos puritanos e viver uma vida como eles
viveram, levando avante a obediência e a santidade a Deus? Embora amemos a Cristo, como os puritanos O amaram, será que
estamos servindo a Deus como eles O serviram? O Senhor nos fala em Jeremias 6:16: "Assim diz o Senhor: ponde-vos à
margem no caminho e vede, perguntai pelas veredas antigas, qual é o bom caminho; andai por ele e achareis descanso para as
vossas almas".
5
A Tocha da Evangelização Passada para Nós
"Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que penetrou os céus, conservemos firmes a nossa
confissão. Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, antes foi ele tentado em todas
as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado. Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça, afim de
recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em
ocasião oportuna. " - Hebreus 4:14-16