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COLECAO DE ESTUDOS BRASILEIROS COLEGAO DE ESTUDOS BRASILEIROS iregho de Pinto de Aguiar SERIE MARAJOARA N. 24 SERIE MARAJOARA ‘A BAHIA DE OUTRORA (Baifo Huseade poe Cab © Lila) Manuel Quin ‘CORRESPONDENCIA DE RUY Sel € nous de CARLOS OTT ‘oxo Rey HISTORIA DA AMBRICA PORTUGUESA Shae Rocks Pi HISTORIA DO BRASIL (6 voluse) Fotee Soutey CONTOS TRADICIONAIS DO BRASIL Lids Chm Cocedo MISTORIA DE RUY BARBOSA abe Nope (05. HOLANDESES NO BRASIL A Varahaaea (© BEASIL (Edie ued) Fesdiowd. Denis NOTAS DOMINICAIS LR, Tolenae [A CIDADE DO SALVADOR — ASPECTOS SECULARES Albee Siva (CERAMICA POPULAR NA BAHIA (llusado) ©. Cosa erin HISTORIA Da INDEPENDENCIA NA BAIA —Gies do Anus se rare ger es Pré-Hist6ria da Bahia (0 FUTURO DO FOLIGONO DAS secAs 1 erin Bees NA BANIA COLONIAL La Monto PREHISTORIA DA BAHIA Carls Gr ABERTURA DOS. PORTOS de Agsiar SERIE CRUZEIRO |A ECONOMIA BRASILEIRA NO ALVORECER DO ana? bts Biec Gem ques po man BS BO Be oh. Sauerianmresae Eee ge ACRACA AFRICANA Manuel Quine SARA sas ace Se Ee BASIS BPE ioe seammon aia Ee tee” soc wanna ts ote SUR Bo caves es fai SS wr, oa wri Be a Dr bo ie ate Pu ea ratte Ss vo man SN Say he weak wa SRG AY iidhama mamas “it wes Ne AGUIAR & SOUZA LIDA. Livraria PROGRESSO Editora 1958 Praga da Sé, 95 — Salveder — Balla — Brail earn CP 2QGLEIIO” 10% Fence ies CONSULTA LOCAL f PUC-RG | GIBLIOTESA m DATA, ay | [OCSS = np oa aa iuisia — Row De. J. Seabea, 960 — Salvador Bahia INTRODUGAO. A maior parte das investigagées cientificas feitas entre nés, nos dltimos tempos, nos campos einolégico © arqueolégico, ocupou-se, quase ex- clusivamente, do litoral e aqui principalmente, com 0s vestigios de cultura africana. Cabe a Teodoro Sampaio 0 mérito de ter chamado a atencéo dos entendidos para os elementos de cultura indigena, escondidos na penumbra das eavernas ou sepultados no subsola do. sertée baiano. O indio que, na formacio do sertaneio, representa um contingente muito mais efici- ente do que o filho da Africa, foi quase esque- cido, pelo menos um tanto negligenciado. Em bora ainda existam, no Sul do Estado da Bahia, alguns representantes da assim chamada “rac vermelha”, podemos dizer que, hoje em dia, 0 estudo dos aborigenes baianos s6 nos é possivel por meio de achados arqueoldgicos e pela ani- lise do eardter e dos costumes locais. A psique baiana ¢ predominantemente indigena e inti- meros objetos e trabalhos, até hoje, continuam aser feitos & maneira pré-histériea. Mas a mio devastadora do tempo continua a apagar os caracteres déste alfabeto ideogréfico. A mis- tura do sangue torna ilegiveis paginas preciosas, eseritas nos coracdes e sentimentos humanos sobre o eariter e os costumes de um povo desa- parecido, Devemos, pois, salvar para a posteri- CARLOS o7T dade os restos destes documentos inéditos, que a influéncia deletéria do tempo deixou intactos no arquivo da natureza. A primeira parte do presente livra ocupa- se com a distribuicéo geografica dos aborigenes baianos no tempo em que entraram em contacto com a civilizacao branca. Este contacto foi 2s- tabelecido por algumas tribos desde o século XVI, por outras simente no decorrer do século XVI ou mesmo XVIII. As lutas provocadas, ora pelo portugués e seus auxiliares, ora pelo indigena na defesa dos seus territérios contra a invasdo estrangeira, ficaram refletidas no espelho dos documentos histéricos. B’ nestas fontes que encontramos as referéncias as tribos dos sertdes baianos, das quais, porém, os cro- nistas geralmente pouco se ocupavam, A res- Poito das tribos mais gucrreiras ¢ agressi como os Pais , Marae e Camaca encontrar-o3 assim uma vasta documentagio; de outras hi apenas um ou outro documento, senio uma simples menedo. Os elementos reunidos de tais fontes no bastam para deserever a cultura ea- racteristica de cada tribo; mas permitem orga- nizar um mapa da sua distribuico geografica na Bahia. Os achados arqueolégicos das diver- sas regiées 6 que vo nos contar algo sobre a vida dos indigenas que ai viveram. E assim talvez possamos reconstruir em grande parte a sua vida pré-histériea. Na segunda parte se apresentardo artefatos indigenas de pedra, argila e madeira, encontra- dos dispersos no territério baiano, em lugares que provavelmente foram acampamentos dos homens pré-histéricos. Nao podemos determi- nar a idade déstes objetos. Sabemos que, 10 PRE-HISTORIA DA BAHIA periodo que imediatamente precedeu a chegada do homem branco, houve um movimento mi gratério muito intenso entre as tribos indige- nas, principalmente as do grupo lingiiistico ‘Tupi: os Tupinamba, Tupiniquin, Tupinaé, To- bajara, Amoipiré e outras menores. A grande massa dos aborigenes baianos pertence, porém, aos grupos lingitisticos dos Cariri e Gés que habitavam o territério havia milhares de anos, e, como a vida humana na América do Sul néo remonta a mais de 20-30 mil anos, de acordo com a opiniao predominante no momento, de- vemos atribuir a éstes dois altimos grupos a maior parte dos elementos arqueolégicos até agora descobertos na Bahia. E’ preciso contar também com grupos pré-Botocudos que apa- rentemente foram os primeiros e mais primiti- vos habilantes di Babi. Infelizmente a zona que éles ocupavam nic forneceu ainda achados arqueolégicos, ao passo que de outras regides JA possuimos algumas dezenas © até centenas de achados. B pelo estudo déstes artefatos ou desenhos rupestres que podemos penetrar um pouco neste perfodo longinquo mergulhado- no esquecimento a mingua dos documentos eseri- tos. Os objetcs mais comuns so instrumentos e armas de pedra, geralmente polida, poucos de pedra laseada; néo se pode avaliar a idade déstes objetos, pois no Brasil os dois métodos de fabricar artefatos de pedra néo foram suces sivos e sim simultaneos. Os objetos de madeira so muito rarosi alguns cachimbos tubulares ‘encontrados em urnas funerdrias. Nem todos os machados de pedra foram feitos para serem encabados, servindo muitos de cunhas de mo, raspadores ou instrumento universal, tanto para adultos como para criancas. Em outros CARLOS OTT machados aparecem sulcos circulares ou semi- cireulares, entalhes Iaterais ou proeminéne:as; a primitiva indistria humana preparou éetes para serem eneabados. Outros machados cha- mam a atengdo do estudioso pela sua forma ca- racteristica de crescente ou de ancora, que constituem prova de indiistria litiea bem dese volvida entre os aborigenes do sertéo baiano; deixam-nos adivinhar finalidade magica e so- cial, confirmados com 0 auxilio de informacies etnograficas antigas e modernas. Era nas roi- tes de Iuar que homens e mulheres se dedica- vam & fabricacic dos machados em forma de crescente, enquanto as mécas e os meninos dancavam em honra a luz benfazeja, divindede que pairava sibre as chocas construidas 2m toro de uma praca de forma semilunar. Du- ranto o dia, as mulheres indigenas dos tempos préhistéricos socavam milho em almofarizes que @ aco continua da agua criara nos roche- dos & beira das fontes ou mesmo nalgum slzno- fariz fabricado com um seixo rolado; ow jovens indigenas de seios tirgidos trabalhavam com mios de piléo de forma filica no preparo do alimento dos filhos reeém-naseidos. Vemos ai © indio vislumbrar 0 mistério da fertilidsde humana, assunto sdbre o qual os cronistas ca- Jam, deixando que a pedra muda nos transmni- tisse uma noticia tio eloatiente. Os cronis:as tampouco perceberam 0 verdadeiro significado do. tembeti, tomando-o como enfeite, quando nao passava de amuleto contra a impoténcia. Além de numerosos. tembetis dos habitan:es préhistoricos da Bahia, apresentamos um amu- Ieto em forma de ra estilizada; apenas pelo confront com idéias conhecidas do indio ama- zonense podemos aventurar-nos A suposi¢éo de PRE-HISTORIA DA BAHIA tratar-se de um melo magico para ter mais sorte na caca. E pela caca que se garante em grande parte a subsisténcia da vida selvagem, rardo por que os animais da mata néo podem ser mortos senfo para conservar a vida huma- na. Esta idéia sobrevive no folelore baiano na figura do “caipora”, protetor dos animais ¢ ini- migo dos cacadores inescrupulosos: legislacdo indigena, transformada em lenda para impor respeito aos animais do mato, Vemos assim que por intermédio de informacées etnograficas ou de idéias pré-histérieas conservadas no fol- clore chegamos a descobrir 0 verdadeiro signi fieadio e uso de objetos arqueolégicos que & primeira vista pareciam vazios de sentido, des- cobrindo-se até a crenca numa vida além da morte, ag verios 0 aborigene incluir os ca- chimbos instrumentos do amigo ou parente a ser enterrado. Na terceira parte do livro apresentamos 0 indio pintor em intima ligacéo com a ceramics € os motives ornamentais que nela empregava © indio que risea nos rochedos figuras hum: nas, geralmente mal estilizadas; entretanto ha também desenhos de mulher perfeitamente Iangados, 0 que mostra ter sido o homem o autor déstas pinturas rupestres. As mulheres fabricavam a louga primitiva, recobrindo al- guns vasos ¢ pratos de pintura bastante fina e, as vézes, riscando com as unhas desenhos re- gulares na massa ainda mole. O mito da cobra grande, que sobrevive no folelore baiano, dei- xou também alguns vestigios na arte primitiva do homem préhistérico da Bahia, ainda que tenhamos de recorrer aqui, outra vez, a mito- logia amazonense para a sua interpretacéo Nao faltam motivos félicos na decoracio da 10 CARLOS oTT cerdmiea, nem nas pinturas rupestres, pois 0 indio ndo vé razao de encobrir a origem da vida humana com véus hipécritas. As idéias toté- micas eram quase desconhecidas a0 aborigexe bbaiano; quando encontramos animais copiados tOscamente da natureza ou meio estilizados, de- vemos pensar antes de tudo em trabalhos de passatempo, Os motives decoratives empregs- dos tanto na ceramiea como nas pinturas ru- pesites, levam-nos a procurar sua origem nas areas culturais circunvizinhas as zonas que dio preferéncia ao losango ou & grega como o alto- Xingu e Tapajés. Tentamos deseobrir por éstes confrontos o significado que davam aos motivos ormamentais da cerémica; a inspiracdo vinha quase téda da arte do trancado e devido & pre- (eréncia dada as f6thas de palmeira os desenhos 2ram geralmente retilineares Assim a vida real do indio pré-histérizo baiano reaparece viva e colorida aos nossos olhes como um filme de tempos idos que a er- queologia nos permitiu reconstruir; deixando ainda poucas laeunas que sio preenchidas pelas noticias etnogréficas e folelériess, Jé mostramos, xno nosso livro sébre 0 “Folclore baiano” como 6 indio continua a viver nos costumes e na vida do povo baiano. No presente livro focalizare- mos de preferéncia elementos arqueologicos inanimados para reconstruir a vida animada do homem pré-hist6rico baiano OS ABORIGENES BAIANOS © baiano, o brasileiro em geral, ndo tem esta veneracéo pelo indio de que éste goza na Europa. La 6 um dos assuntos favoritos da lei- tura juvenil. Chateaubriand, na Franca, e Karl May, na Alemanha, criaram em seus romances © indio como um tipo humano ideal, o amigo verdadeiro, 0 homem corajoso, 0 cavaleiro in- superdvel. José de Alencar, entre nés, nio lo- grou tais éxitos literdrios ou psicolégicos. Nao por falta de personagens indigenas de grande valor, capazes de inspirar um poeta. Os antigos cronistas mencionam diversas figuras impo- nentes como 0 Ararigbéia no Rio de Janeiro, 0 Mataroa na Bahia e outros de diversos estados brasileiros De fato, 0 indio em estado de transicdo para a cultura européia, nfo é figura que entu- siasme. Apitico, esfarrapado, sentado beira dos regatos, representa antes o tipo do homem, veneide e abandonado, doentio e decadente, digno de léstima, poucas vézes apresentando-se como heréi que possa inspirar um poeta. O in- dio é daqueles tipos raciais que o simples con- taeto com o branco condena 4 morte pela tu- berculose, pelo sarampo, pelas doencas vené- reas e pelos efeitos da aguardente. A destruigéo 6 0 seu destino irrevogavel, por mais que hoje se esforcem por salvar 0 que resta dos abori- 2 CARLOS ort genes para a nacéo brasileira. Mais cedo ou mais tarde sucumbiré como, priticamente, ja sueumbiu 0 indio norte-americano, Faz pena que assim seja, pois 0 indio é de fato um tipo humano muito simpatico, dotado de étimas gualidades que compensam as menos boas. Em outras partes das Américas geralmente exter- minaram o indigena a ferro e fogo; mas no Bra- sil, e especialmente na Bahia, no se seguiu éste sistema, embora existam numerosas e: cecées que confirmam a regra. O seu extermi- nio aqui teve cutra motivacéo. Ao que parce © indio brasileiro nao chegara ainda a aclima- tarse completamente ao ambiente tropical quando o portugués apareceu, razéo por que era uma raca fraca, de prole pouco numerasa € dotada de pouca resisténeia fisiea contra o in vasor. Nao creio que o homem americano te- nha sdmente eérea de 12.000 a 15,000 anos, no maximo 20.000 anos de vida neste Continents, como até ontem geralmente se admitia (1). ‘Mas, mesino aerescentando mais alguns milha- res de anos ao periodo, certamente no se pode ‘comparé-lo ao de centenas de milhares de ancs que a raga negra teve para aclimatar-se a vida nas regides tropieais. O indio parece ter sido um tipo humano formado em clima nérdico ou moderado, estando perfeitamente aclimatado nas regides andinas e no México, onde sobrevi- veu perfeitamente invasio do homem branco, nfo por causa da sua cultura mais adiantada (da qual pouco se salvou), mas por estar bem adaptado ac clima Embora nao sobrevivesse fisicamente na Bahia, 0 aborigene sobreviveu culturalmente. @) Veja W. Keickeberg, 17 PRE-HISTORIA DA BAHIA Em que consistia a cultura indigena, antes da chegada de Pedro Alvares Cabral 4 Bahia? Para determiné-la, devemos estudar primeira- mente a distribuicio geografica dos indios no tempo da descoberta e da exploracao do sertao. Sabemos algumas coisas a respeito dos i digenas que habitavam o atual Estado da Bahi na época do descobrimento e da colonizacéo do sertao. Qs cronistas restringem porém as suas noticias quase exclusivamente aos indios do li- toral, tendo 0 eolono aprendido apenas a lingua tupi. Ora, o tupi dominava 0 litoral, havia poueo tempo, tendo precedido o portugués ape- nas um ou dois séculos. Primitivamente, 0 li toral e 0 interior era ocupado pelos Tapuias, como 05 chamavam cs cronistas; esta denomi- hacéo era dada a um grupo de numerosas tribos de linguas diferentes. Algumas delas foram bem estudadas como a dos Cariri, do nordeste, dos Botocudos e Camacd, do sul do Estado; ¢ eles conhecemos também varios elementos cul- turais; porém a grande maioria das tribos que ccupavam o sertéo central e as margens do S. Francisco nao sobreviveram nos livros dos ero- nistas; de muitas nem se registraram os nomes. E’ simente através de documentos esparsos que tratam das guerras aos indios que conhecemos ‘a sua existéncia e sabemos que nomes tinham e, fs vézes, temos algumas noticias de elementos culturais. Nestas informagdes € que nos funda- mentamos ao tentar reconstruir a distribuicéo geogrifica dos indios na Bahia. Em primeiro lugar mencionaremos os bem conhecidos Tupinambé que habitavam o litoral, de Sergipe a Camamu, ocupando uma estreita faixa de 5 a 10 léguas de largura. Dai até 0 13 14 CARLOS OTT Espirito Santo estendia-se o tertitério dos Tu- piniquim; em virtude das incursdes que so- friam das tribos do hinterland, o seu territério, era provavelmente ainda mais estreito que o dos Tupinambé ao norte. ‘Nao eram estas duas as inicas tribos per- tencentes ao grupo lingiistico tupi, embore se- jam as mais conhecidas; constituiam as. migra- gées mais recentes de plagas remotas, tendo vindo os primeiros, provavelmente, do norte ou do interior e os segundos do sul. Antes déles, éste territéric era habitado pelos Tupinaé ou ‘Tobajara que falavam uma variacéo dialetal do mesmo idioma tupi. Rechacados para o sertéo pelos conquistadores tupis, obrigados A luta com tribos de lingua diversa, foram acs pouco: se extinguindo nestas guerras continuas. As pou- cas aldeias que ainda existiam ao tempo da co- lonizagéo, foram levadas pelos missiondrics e pelos mamelucos a virem estabelecer-se no lic toral, onde os Tupinambas e os Tupininguim jé sucumbiram ao impacto mortifero do europeu @ Algumas aldeias de Tupinaé encontravam- se bem no interior, pois através de uma carta de Pedro Barbosa Leal sdbre a entrada de Bel- quior Dias sabemos que éste passou ao Rio Verde e dai ao Paramirim, a procura da aldeia dos Tobajara, residentes no sitio entiio chamado de Periperi (3) Outra tribo do grupo lingtiistico dos Tupi, localizada no sertdo baiano, era a dos Amoipiré, “(@) G- Soares de Sousa, 37, 45.54, 361-868, 408; F. Candim, 172; Frei Vicente do Salvador, 82; 8. de Vasconcelos, vol. 1, XLVILXLIX, 20; Jaboatio, 19-20, 32.38; A. Métraux (1) « @) Folishalo Freire, 73. — Frei Vicente do Salvador (216.218) localiza outros Tupinaé no Rio de Centas. PRE-HISTORIA DA BAHIA assim chamados pelo nome de um dos chefes da tribo. E? provavel’ que fizessem parte da onda migratéria dos Tupinamba que invadiu a Bahia pelo interior e fixou residéncia na zona de Pe- trolina, na margem esquerda do Séo Francisco, rio acima, numa extensio de cem léguas, sé gundo Gabriel Soares de Souza. Naturalmente esta informacdo no é de grande valor, pois foi obtida de segunda mao, de seu irmAo carnal, nesse tempo pouco se sabia sébre aquela regio. ‘Nas lutas do século XVII pela posse da terra, no se menciona mais esta tribo. E’ possivel que os Amoipiré a tivessem emigrado para 0 litoral, atraidos pelas promessas dos brancos, embalados na esperanca de encontrar a terra onde no se morria, que era a meta almejada e jamais encontrada das migragSes dos Tupi, feitas sob a influéncia de motivos mitolégicos. @. Vejamos agora as zonas do territério baiano ocupadas por tribos que nao falavam dialetos tupis. Comegando pelo sul do Estado da Bahia, desde as fronteiras dos Estados do Espirito Santo e Minas Gerais até além do Rio Pardo localizavam-se os Aimoré ou Botocudos, também chamados Guerém. © primeiro nome foi-lhes dado pelos Tupi, o segundo pelos Por- tuguéses por causa dos enormes botoques de madeira ou de pedra que usavam nos I6bulos e nos beigos; o terceiro, ao que parece, era o nome que se davam a si mesmos, pelo menos a uum grupo. Os Botocudos ainda se estendiam muito fora da Bahia, sem que houvesse qual- quer ligagéo social entre as varias tribos. Nu- ‘merosas fontes mostram que, antigamente, éles @ A, Méteaux «@) 15 16 CARLOS ort se estendiam ainda mais para o norte, para além do Rio Pardo, pois of cronistas ¢ numero- 0s outros documentos falam, até o século XVIII de incurs6es déstes indios nas regiées de Cairiie Jaguaripe, Nao creio, entretanto, terem sido sempre Botocudos éstes invasores e sim outras tribos de linguas diferentes que logo co- nheceremos. Antigamente nao se determinava com exatidao a lingua dos indios e, por outro lado, a denominacdo “Botocudo” teve na Bahia uma aplicagéo tio generalizada quanto no sul do Brasil a de “Bugres”. Esta generalizacio veio dificultar mais tarde a identifieacio da tri- bo. Os Botocudos pertencem camada humana mais arediea do indio brasileiro, eujos ances- trais foram provavelmente as hordas primisivas que se derramaram ha milhares de anos pela Serra do Mar. Constituem, tanto cultural, como antropalogicamente, uma das nagées indigenas melhor estudadas (5) Dentro da area ocupada pelos Botocudos encontrames tribos menores de linguas dife- rentes que, desde o tempo da colonizagio portu- guésa, freqiientemente, buscavam a protecéo do bbranco contra o seu feroz adversirio indigena. Simio de Vasconcelos ja os menciona, sem to- davia indicar exatamente que rea ocupavam (6). So 05 Pataché que se subdividiam em Co- poché, Panhame, Machacali e Macuni, O Principe Maximiliano de Wied-Neuwied, no co- miéco do século pasado, localizou-os nas flores- tas préximas do Mucuri. Os Machacali, durante © século pasado, mudaram varias vézes seu habitat. Foram encontrados pelo dito Prixcipe A. Métraux @ H. Ploetz (2); A. Métraux (0; Doe. hist., vol. LXXV, 106. (@) S. de Vasconcelos, vol. I, Li PRE-HISTORIA DA BAHIA nas margens dos rios Itanaem e Jucurueu (7); em 1939, Kurt Nimuendaju Unkel (8) visitou- os no rio Ttanaem, perto da fronteira de Minas Gerais, afirmando que ainda conservavam lin- gua e religio prépria além de outros elementos de sua cultura, como a “casa dos homens”, su- nidores, mascaras, etc., elementos culturais que geralmente néo se encontram no nordeste bra- sileiro, 0 que vem mostrar @ ligacdo intima des- ta tribo com as do Brasil central. No mesmo ano, Nimuendaju encontrou no pésto indigena “Paraguassu”, as margens do Rio Cachoeira, 16 Pataché, dos quais os mais velhos ainda fala- vam a sua lingua Outra tribo numerosa e forte & a dos Ca- mac, a mais cultivada das que encontramos entre 0 Rio Pardo e Rio de Contas; em docu- mentos antigos denominamna Mongoid, No- goi, Gongaid e Crancaié. Tribes aparentadas aos Camaca so 0s Cutachd e Menien, habitan- do os primeiros a regio oriental entre 0 Rio Pardo € 0 Rio dos Théus, e os segundos Bel- monte; éstes tiltimos chamavam-se a si mesmos de Camaca. Outrora, viviam no alto Jequiti- nhonha, donde foram desalojados pelos Paulis- tas. Os que escaparam, fugiram rio abaixo, es- tabelecendo-se em Belmonte, onde, ja em 1816, a maioria nao se lembrava mais de sua lingua. Nimuendaju encontrou os iltimos miseraveis restos dos Camacd, nacdo antigamente tao forte © numerosa, no pésto indigena “Paraguassu”, em 1939 (9}. Os Camaca séo uma das tribos baianas melhor estudadas, tanto lingliistica DM. de Wied.Neuwied, 179, 205, 208, 411; veja também Martius (2), 149. (8) Conforme carta particular de Curt Nimuendaju Unkel a0 Sr. Frederico Edelweiss (@) idem. @ sl is CARLOS OTT como culturalmente, gracas ao Principe de Wied-Neuwied (10), Frederico von Martius (11) e J. B, Douville (12). Parece que eram éles 0s “Botocudos” que inimeras vézes invadiram as zonas de Cairu e Jequirica, avancandc, as vézes, até 0 Paraguassu, liquidando tudo o que encontravam no caminho. Intimeros brancos pretos eafram vitimas de suas flechas certeiras, © que contribuiu, em grande parte, para des- pertar contra éles um 6dio implacavel, resha- cando-0s néo sémente com as armas na mao, mas dissemninando germes de doencas contagio- sas (como variola) entre éles. Convencidos de serem os donos mais antigos das suas terras, defenderam-nas palmo a palmo, como resulta de numerosos documentos histéricos. Impedi- ram 0 progresso cultural da area que habitavam por séculos, mas defenderam os seus direitos Ninguém se atrevia 2 viajar de Ihéus para ‘Minas Gerais, atravessando o seu territério. E 86 em 1807, 0 Coronel Joao Gongalves da Cos- ta, depois de lutar sem tréguas durante varios anos, conseguiu vencé-los, pacificando-os e fun- dando a cidade de Vitéria da Conquista (13). Hoje em dia, nas feigbes dos matutos do stl do Estado da Bahia, em cujas veias corre o sangue daqueles bravos defensores da sua terra, obser- vam-se tracos indigenas. ‘Vizinhos dos Camaca, ao norte, eram os Maracd que, em 1586, j4 sio mencionados por Gabriel Soares de Souza (14). Ocupavam o (10) Wied-Neuwied, 952, 260, 410-410, (GD Martius @), 140.148 a2) J. B. Dowville, passim (18) Vela M. de Wied.Nenvvied, 428-430, 410; efr. tam- bém Anais do Arquive Publ. da Bahia, abo It {Bai 18i9) 22; Tha. ano TV € ¥.CBahla 1018) (1 G. Soares, 415.418, PRE-HISTORIA DA BAHIA vale do Paraguassu, a serra do Sincoré, sendo © Rio de Contas o limite meridional, para o lado do poente talvez a serra da ‘Tromba e para © lado do sul as serras do Cactité. Bste nome, que Ihes deram os Tupi, sobrevive na atual dade de Maracas. les mesmos nfo se denor navam assim, e, embora nao o saibamos com certeza, parece serem os mesmos Paiaié (cha- mados “Paiaiazes” nos documentos antigos). Os indios assim denominados ocupavam o vale do Paraguassu setentrional, principalmente a serra do Orobé, a Chapada Diamantina, Morro do Chapéu e Jacobina. $30 numerosissimos os do- cumentos, tanto os publicados como os ainda sepultados nas poeiras seculares dos arquivos, que falam das guerras contra os indios no vale do alto Paraguassu, chamendo-os ora Maracé, ora Paiaia, ou ainda Maracanassu, o que signi- fiea @ grande nacéo dos Maraca. Geralmente os indios residentes ao sul do Paraguassu eram de- nominados Marae, sendo os que habitavam ao norte déste rio mais comumente designades por Paiaié (15). Existiam no seu meio pequenos grupos que falavam tupi (16). ‘Tratava-se, sem diivida, de uma nagio for- te © numerosa e é provavel que existissem liga- Ges sociais entre varios grupos, pois de outra maneira ndo se explicava a sua resistencia con- tra o portugués numa regido de vegetacdo re- lativamente fraca, onde néo havia a exuberante selva que tao eficazmente protegia os Camacé ¢ Botoeudos. GS) Anais do Arquivo Publ. da Babis, sno Ti, 181 185; 1 Accloli — B. Amaral, vol. Il, 30-88; Dee. Hist., vol. VIII, 310.318, 973.374: Ibid., vol. XXV, 307-408 ibid; vol. VW," 825; ibid, vol Cxxkvm, 230, (10) Doe. hist., vol. V. $25; vol, ‘VIN, 388-886; 1bid., 321335. 19 20 CARLOS orT Parece que ja em 1558 Mem de Sa viuse ‘compelido a guerred-los duramente, embora ro se meneione seu nome; mas a julgar pela loza- lizacéo nao seriam outros (17). Os Tupinamba, no baixo Paraguassu, néo ocupavam sendo uma 4rea muito estreita e as tribos de rio acima sempre mantiveram 0 acesso ao mar, vindo em determinadas épocas do ano & pesca das tainhas, com as quais preparavam farinha de peixe que misturada com a de mandioca constituia um ¢os seus alimentos (18). Os Paiaié, embora va rias vézes veneidos, néo deram trégua aos ¢o- onos, durante quase todo 0 séeulo XVII. Em 1612, invadiram o distrito e engenho de Capa- nema. Em 1621, ngo deixaram viv'alma nos campos do Apora. E nao tendo mais em que satisfazer seu instinto de vinganca, assaltarem 0s moradores de Itapororocas, passando depois a atacar as nascentes vilas de Cachoeira e Ma- ragogipe, e indo até a zona de Jaguaripe e quirigd (19). Receberam o Crvitao-mor Gaspar Rodrigues, enviado, em 1655, para reprimi-los, om as armas nas maos, vendo-se éle obrigaio a recuar diante da decisio e do ntimero de guerreiros (20). Varias vézes fizeram-se trala- dos de paz com éstes indios que ocupavam una das terras mais férteis do sertéo baiano, 0 que atraia os eolonos para estas zonas. Mais de uma vez, 0s bandeirantes provocaram a ira dos filhos livres das selvas tentando escravizé-los; e os Paisid pegavam novamente em armas. Em 1669, resolveu-se na Cidade do Salvador fazer guerra de exterminio aos Paiaié e Maraca. Nio 7) §. de Vasconcelos, 1, 142-144. (0) Cte COW (2), 47 419) J. Accioli — B. “Amaral, vol. 11, 30. 20) Ibid. 31. — Doe, Hist, vol. V, 267-272, 210-277; ibid.. voi. TV, 57.59, PRE-HISTORIA DA BAHIA havia soado todavia, a iltima hora déstes bra- vos defensores da sua terra, passando-se ainda alguns anos de traicées e guerrilhas até que f6s- sem definitivamente exterminados pelos Pau- listas que empregavam sem escripulos métodos mais radieais que os baianos, levando consigo ‘0s tiltimos prisioneiros que haviam escapado 20 fio da espada ou a fome e ds doencas (21). Dés- te modo, o vale do Paraguassu é uma das regides bbaianas, onde se véem poucos tracos fisionémi- os indigenas no habitante de hoje e onde so- breviveram menos elementos culturais indige- nas do que em outras regides baianas. A mesma nacio dos Paiaié parecem per- tencer os Sapoid ou Sapuid que, em 1657, séo mencionados entre os antigos moradores de Ja- cobina Velha ou da Missio do Sahy (situada en- tre Campo Fermoso ¢ Bonfim) (22), Devem ser fidénticos ao Sabujé, tribo aparentada a dos Cariri, visitada por Martius, no comégo do. sé- culo passado, em Caranguejo, lugarejo perto de Nazaré (23). ste deslocamento de indios de sua terra natal para aldeamentos muito distan- tes, foi sistematicamente praticado pelo Go- vérno baiano, no século XVIT. Assim, em 1676, foram aldeados indios Paiaia no distrito de Ma- ragogipe (24) e em outros lugares do litoral. Arrancavam-nos do seu ambiente, para melhor dominé-los em outras regides que Ihes eram desconhecidas e onde ficassem isoladas (21) Doc, Hist., vol. VIM, 249, 282.958, 989-206, vol. IX. 3435, 76; ibid., vol. IV, 161.16 vol. XE, 164; sbia., voit LXIL, 365, (22) Doc. Hist., vol. 1, 277; ‘bid, vol. XLL, 168-168; Ibid, vol. 1, 306, 22) Martius (2), 40 (24) Doc. Hist, vol. IV, 161-162; thid., vol, Xl, 298. 309; ibid., vol. ELT) 164-166 ibia., ibid, at 22 CARLOS OTT utras tribos, como os Sacacarinhé ¢ Ca- cherinhen, que Pedro Barbosa Leal menciona como residentes em Jacobina (terra antiga dos Paiaid), em 1725, nao parecem pertencer ao srupo lingiiistico dos Carini e sim ao dos Gés (25). Mas os Caimbé que, em 1758, J. A. Caldas (26) enumera entre os moradores dos aldeamen- tos de Jacobina Nova, da Missio de Sahy e de Joizeiro ainda pertencem a familia lingilistica dos Cariri, Hl, porém, iniimeros outros nomes de tribos mencionadas nos mapas das aldeias de indios, existentes até 0 fim do séeulo passa- do, cuja identificacdo lingiiistica €, por ora, praticamente impossivel ou muito duvidosa por falta de documentos (27). O colonizador bran- 0, freqiientemente, colocava individuos de di- versas linguas no mesmo aldeamento para obri- silos ao uso da lingua portuguésa para enten- dimento mittuo. © nordeste baiano, onde tanta somatica como culturalmente se nota grande influéncia indigena, apresenta um problema difieilimo quando tentamos classificar as muitas tribos que ai se conhecem. Parecem perteneer ao gru. po lingtifstico cariri, 0 que ndo implica, ja se vé, em serem tédas as tribes do mesmo grupo. Primitivamente, 6 provavel que assim fésse; mas 0 aldeamento indiscriminado e a mistura Uingiistica procedida, criou uma confuséo inex- (25) Anais do Arquivo Pibl. da Bahia, ano TV, 383 384, 100. (2H JA. Caldas, 60a: Mapa geral de todas as Mis. és, Ne, 15-18, (2D Inventirio dos documentos relatives 20 Brasil fexistentes no. argulvo de marina e ullramar de Lisbos, vol. 1, Ne vol. V, Ns_ 261380, 26.394; vol: MI, 15.795-15.1 voja também 6 Arquivo Publ. da 14/17, 1634-1087 (documentos inéditos). PRE-HISTORIA DA BAHIA trineével, Em Mirandela (antiga aldeia do Saco de Morcegos) Alfredo Métraux (28) anotou nos ‘iltimos anos um vocabulério que entra em franca oposicéo tradicéo de serem Cariri os indios ai aldeados. O idioma déstes esta bem estudado (embora ainda aguarde a classificacao dentro dos grupos lingtisticos brasileiros); en- tretanto 0 vocabuldtio recolhido por Métraux nada apresenta de comum com a lingua cariri. Este etndlogo declarou-me também pessoal- mente que nao conseguiu descobrir a que grupo lingitistico possa pertencer © vocabulério de Mirandela, embora houvesse consultado Chest- mir Loukotka, Paul Rivet e outras autoridades que se ocupam dos problemas lingiiisticos sul- americanos Nas minhas proprias pesquisas de campo, em Lajes dos Caboclos, antiga aldeia de indios, perto de Serrinha, em 1942, tive ocasido de achar ainda alguns voeabulos do dicionario ca- riri. Assim um velho de 70 anos lembrava-se da palavra “Bauzé” ou “Badzé” significando fumo. Realmente “Badzé” significa fumo bem como um de seus deuses, segunda Lucien Adam. (29) A lingua dos Cariri foi bem estudada, es- peeialmente por Frei Bernardo de Nantes e seus companheiros os Capuchinhos franceses que, durante a segunda metade do século XVII, to- mavam conta das aldeias de indios situadas nas margens e ilhas do S. Francisco, acima da Ca- choeira de Paulo Afonso (30). Igualmente con- tribuiu muito para o conhecimento desta lingua A, Métraux 0) @8) L. Adam, 19 ¢ 99; L. V. Mamiani, 13; C, ott @, 4 (20) Martin de Nantes, 41.42 23 24 CARLOS OTT © Jesuita Jodo de Barros, que assistiu na Missio do Sehy, ¢ © Padre Jesuita Luis Vineéncio Ma- miani que na aldeia Geru, de indios Cariri, sic tuada em Sergipe, escreveu a primeira grami- tica déste idioma (31). E devemos ainda certos conhecimentos a Martius que esteve com os Cariri aldeados om Pedra Branca, perto de Ca- choeira (32), ja localizados neste lugar por J. ‘A. Caldas (33), em 1758 O sertao de Rodelas j nio estava ocupado pelos Cariri, pois os Missionarios do século XVII, durante muito tempo, nao foram até 14 por ignorarem a lingua daquelas tribos (34). No entanto, ja podemos dizer que os Rodelas, assim denominados pelos portuguéses pela for- ma de seus escudos, pertencem ao grupo lin- giistico dos Gés, tratando-se dos Acroa e Procé dos quais possuimes vocabuldrios pequenos. Nas caatingas do Rio Salitre, Martius en- controu restos dos Massacard ¢ recolheu déles um pequeno vocabuldrio que os coloea no gru- po lingitistico dos Gés, apresentando parentesco com os Camaca. Aqui porém convém observar que os documentos histéricos, ao falarem das guerras sustentadas pela Casa da Térre e pelos Paulistas contra os indios do Rio Salitre, ja mais usam 0 nome de “Massacara” e sim o de “GI) Serafim Lelte (4), 3; idem, (2) (22) Martius @), 40; dem, @) (2) J. A. Caldas, 60a: Bapa geral de tedas as Mis. sabes, Nr. 26 (A) 0 Pe. Joto de Barros, depois de ajudar a fundar 5 aldeias dos Carini, “passou mais adiante che- ou cos Acarases ‘aos Procases, constituindo 0 rupo de cinco Aldelat que, modifleadas mals farde, flearam-se a conhecer na histéria, com. 0 ome de Missbes de Rodelas, nag margens do RIO Sao Francisco” (Serafim Leite (#), 3) exses Ace. ‘ages Procases, evidentemente, $50 08 Acrol € Procé, dos quais falaremos depeis, PRE-HISTORIA DA BAHIA Galaches ¢ Ocren. Mas esta discordancia talvez, encontre explicagdo na afirmativa de Martius (85), de ter sido 0 nome “Massacara” uma aleu- nha dada pelos Tupi e que significa galo. As margens do Rio S. Francisco vivia uma nagdo forte e belicosa que deu muito trabalho aos bandeirantes, principalmente aos Paulistas, 08 maiores desbravadores dessas regides. Eram os Anaié, “Ayayé” ou Caiapé que ainda se en- contram hoje no Brasil central; restos, talvez, dos antigos habitantes do Sio Francisco, Ao ‘que parece séo os mesmos “Ubirajaras” de Ga- briel Soares (36), denominacao tupi que signi- fica “senhores dos paus”, pois usavam, como ar- mas de atremésso, paus de trés palmos de com- primento, agucados de ambos os lados. Nesta zona foram encontrados instrumentos de pedra de formato semelhanle, de que falaremos em seguida, Em 1679, fala-se duma aldeia de in- dios “Cajayé” (provivelmente érro de leitura em vez do Caiapé), junto a0 Rio Sao Francisco (37). A atual povoacdo de Carinhanha foi ini- cielmente uma aldeia de indios déste nome. Os Caiapé eram antropéfagos (o que nao se pode dizer dos Cariri) e até ofereciam sacrificios hu- manos (38). E’ bem provavel que, em 1555, 0 Jesuita Joio de Azpileueta Navarro jé tivesse chegado até os seus territérios (39). Certo é que combateram sem temor os invasores bran- (85) Martius (2), 288 GD, vol. 1, 144. — Doo. Hist. Arquivo PGbl. da Bahia, ano IV, 202; ibid., and Im 80. (36) G, Soares de Souse, 412-413. Gn ©. ow amt (@8) Doc. Hist. vol. XIL, 22-28; ofr. também Anais do Arquivo Publ. da Bahia, ano TV, 202; @ mame carta de 1608 fala-se de “Curapée' Gbid., ano IL ‘100), provavelmente idéntieos aos Calapé. (0) Cartag-Avulsas, 148-149. 25 26 CARLOS OTT cos, opondo resisténcia tenaz aos guerreiros de Francisco Dias d’Avila, em 1674, queimando fazendas e destruindo currais (40). Finalmente, em 1677, © Govérno baiano, desesperado de subjugar os Anaié ou “Ayayé”, chamou os Pau- listas que também tinham contas a ajustar com les, soando entdo a tiltima hora da existéncia desta nagdo forte e corajosa (41) Entre Minas do Rio de Contas e Caetité en- contramos os Aracapa (42) A regitio compreendida entre 0 rio Cari nhanha, a fronteira de Goids e a serra do Gur- gueia, era ocupada pelos Chieriaba e Acroa, tri. bos aparentadas aos Anaié e, como éstes, per~ tencentes & grande familia dos Gés centrais. Nos documentos histéricos, anteriores ao séeulo XIX, até agora publicados, néo encontrei sendo poueas alusées a éstes indios da zona mais oci- dental e até hoje menos conhecida do Estado da Bahia, de maneira que até poucos anos os mapas regionais desta zona apresentavam erros gravissimos. Possuimos apenas algumas fontes do século pasado. Martius (43), que viajou por essas regides, considera os Chicriaba a mais nu- merosa tribo, ainda nfo civilizeda, que ocupa as regides abandonadas entre as nascentes do rio Gurgueia e do Rio Grande, afluente do S. Francisco. Acrescenta que so perigosos aos colonos estabelecidos af bem como aos tropeiros. que viajam pelo Duro, de Piléo Arcado para (40) Doe. Hist., vol. XIN, 18.19; Felishelo Freire, vol. (41) Boe. Hist., vol. 2X1, 78-75, 148 (42) Inventério "dos documentos relatives ao Brasil @cistentes no arquivo de Marinha e Ultramar de Lisboa, Y (Rio 1913) Nr. 3479 (43) Martius (2), 208; idem CD, vol. 1, 278 PRE-HISTORIA DA BAHIA Golds. Em outro lugar (44), 0 mesmo autor ainda menciona os indios Acroa nos territérios mais ocidentais do sertéo baiano, levando vida nomade, Nos documentos histéricos, essas tri- bos errantes sio designadas simplesmente de “gentio de corso” ou ““Tapuias” Numa Carta Régia de 2 de dezembro de 1698, vém enumerados como habitantes do alto S. Francisco da Bahia, do Rio Préto ¢ Rio Grande, os indios “Acoroazes e Mocoares Rode- leiros” (45). ‘Trata-se evidentemente da forma aportuguesada de Acroa; mas ignoramos ainda se os Mocoares (ou “Mocases”, de outros docu- ‘mentos) so os mesmos Chicriabé ou alguma ou- tra tribo desta zona como os Proca (46). A t6- das estas alusoes, bastante vagas, acrescentare- mos ainda uma carta inédita, encontrada por nés no Arquivo Publico da Behia, eacrita pelo Capuchinho Frei Casimiro de Militello (47); tra- ta-se de indios que, em 1872, ainda viviam em estado selvagem, no alto Rio Préto, na regido vizinha & fronteira de Goids. Embora néo men- cione o nome desta tribo, enumera 7 vocdbulos usados pelos indigenas na sua lingua por néo saberem o portugués e que séo: Amnao, Cres- cum, Tané, Maexié, Dotquié, Graxié e Sieria Ora, a tltima, Sierié, ov melhor Chierié, signi- fica “mao” na lingua dos Caiapé, e visto que éstes indios usavam o manguito para proteger a (44) Idem (1), vol. 1, 256. (45) Doe. Hist., vol.” XXXIV, 65-65, 94.95, 178, 296; ‘Anais do Avquivo Pabl. da Babla, ano IV, 329. (48) JF. de M. Mascarenhas, passim;’ Soratim Leite (& 3, ctr. iambém no Arguivo Publ. da Bahia, ‘08 documentos inéaitos da coleggo: Ordens Regias, vol. My, fo. Tr Gat) Carta 0 Presidente da Provincia da Bahia (Ar. guivo PObl. da Bable, Documentos inéditos: fo- ‘los 14/17, 184.1887, sem paginacao) . 27 28 CARLOS OTT mao contra a percussao da corda do arco, por isso, provavelmente, féssem chamados de “Chi- criabé”. J4 no coméco do século pasado, Mar- ‘ius localiza os indigenas déste nome no muni- cipio de St.® Rita. O nome dos Acroa deriva- va, segundo alguns, do seu costume de usarem uma faixa abaixo do joelho, e, segundo outros, da sua qualidade de arqueiros insuperdveis, en- venenando, as vézes, as flechas, uso geralmente desconhecido entre os Gés. Martius ainda en- controu em Joazeiro os Geieé que tém paren- ‘tesco lingiiistico com os Acros (48) Finalmente restam-nos dizer algumas pa- lavras sobre os aborigenes que ocupavam as regides baianas limftrofes do Piaui. Na se- gunda metade do século XVII e no coméco do século XVII, hordas indigenas desciam fre- iientemente da serra da Gurgueia e da serra do Piaui, destruindo as poveagées a0 longo do S. Francises, matando colonos e incendiando casas para depois desaparecerem. Em docu- mentos de 1647 e 1675, ésses indios sio chama- dos “Guaesguaes” (49) e numa carta de 1678 fala-se da nacio dos Guesgues, habitantes das margens do riacho Pajaa (50). Lingitisticamen- te séo parentes dos Acro’. Bm 1675, deram muito trabalho a gente da Casa da Torre, que estava interessada nas terras do Piaui, opondo- Ihe @stes aborigenes os maiores obstéculos & realizacao de seus planos cobigosos (51). Os {indios nfo se intimidavam por muito tempo e, (48) Martius (2), vol, 1, 287, 270-279, 281, (49) Doe. Hist., vol. XLT, 251; ibid, vol. XU, 918. 315, 915-816, 896; ibid., vol. XII 19. (90) Doe. Hist, vol. 1X, 60. — Martiue (1), vol, 1, 240. (D Doe. Hist., vol, XIII, 19; ibid., vol, XLT, 247, 249, 251, 994, 835.399. PRE-HISTORIA DA BAHIA em 1720, as suas incursées tornaram-se de tal maneira insuportaveis que se Ihes féz rija guerra, fundando-se naquela zona um aldea- mento de indios eristianizados para servir de eseudo contra as invasdes (52). Nestas guerras, salientou-se 0 Matarod-pai, chefe indigena va- lente e pouco escrupuloso, que recebeu do Go- vémo baiano em recompensa dos seus feitos 0 titulo pomposo de “Gavernador dos indios” das aldeias do S. Francisco, e de quem ja tratei em outro lugar (53). Em 1743, enumera-se entre as misses dos Jesuitas no Maranhio a de “Goegoe” e somos informados, em 1748, que o Pe. Jodo Rodrigues, da mesma Ordem, falecido neste iltimo ano, dedicara téda a sua vida a cristianizagao do gentio “Guégué” (54). Nao sa- bemos se eram indios baianos emigrados ou al- guma ramificacdo da mesma tribo, residente no Maranhao. E assim localizamos as tribes indigenas mais importantes no territério baiano. E? bem Provavel que a publicacdo de outros documen- tos ainda desconhecidos venha a esclarecer cer tos pontos obscuros ¢ talvez traga alguns ele- mentos lingiiisticos que tornariam mais facil a classificacdo das tribos, de grupo lingilistico ora ignorado Deixando de lado a classifieagao lingtiistien de Chestmir Loukotka (55), ainda nao aceita por todos, € seguindo a anterior mais aceita de Karl von den Steinen (56) ¢ Lucien Adam, dis- (62) Doc. Hist., vol. XLIV, 1-6 (a) C. ott 6) (4) Seratim Leite (1), vol. Ul, 154, (3) Ch. Loukotica, 149-168 60) Karl von den Steinen (2), 195-195; idem, (1), 341- 340, 365-372, 29 30 CARLOS Orr tinguimos entre 0s indios baianos trés grupos Linguisticos: O Tupi, 0 Cariri e 0 Gés. Aos pri- meiros pertencem os Tupinamba, Tupiniguim, Tupinaé ¢ Amoipira. O segundo, dos Cariri (cuja posiedo entre as linguas indigenes brasi- leiras ainda continua a ser um grande enigma) é formado na Bahia pelos indigenas do nordes- te, desde os Maracd, Painia e Sabuja até os do Rio Sao Francisco. Os do sertéo de Rodelas do Rio Salitre, para o lado do Rio Sao Fran- cisco, por conseguinte: os Rodelas, Galaches, Ocren, Proca, Geieé, Chicriaba, Acro’, Anaié ou Caizopé, assim como os do sul do Estado: os Camaca, os Pataché e grupos menores aparen- tados a éstes, como também os Botocudos, per- tericem a0 grupo lingitistico dos Gés centrais. No que diz respeito a origem e & form: da cultura caracteristica aa grupo lingiiistico dos Tupi, podemos afirmar, depois dos estudos = inuciosos feitos por Alfredo Métraux (57), ter- s¢ originado entre o alto Xingu e ¢ alto Tapa- jo2. Diversas migragées puseram-nos em con- tez!o com outras culturas indigenas brasileiras mz's ou menos adiantadas endo faltou a in- flu3cia, embora talvez s6 indireta, das cultu- ras ardinas. Sendo os Tupi antes de tudo guer- reiros e no colonizadores, a sua cultura esta- cionca num nivel bem primitivo, que nem de Jonge se compara & dos Aruacas, grupo lingitis- tico Cos indios brasileiros mais avancados, resi- dentes, principalmente, no vale do Amazonas € produtores da ceramica de Marajé. Foram os elementos culturais dos Tupi que sobreviveram no litoral baiano para o folclore local. As outras tribos baianas, como os Camaci, embora lin- OD A. Métraux (), 290.318. PRE-HISTORIA DA BAHIA gilisticamente pertencentes a familia primitiva dos Gés, assimilaram, no correr dos tempos, di- versos elementos culturais dos Tupi, valendo 0 mesmo em eseala mais reduzida também para 05 Cariri, Do outro lado, os Tupi no ficaram isentos de influéncia cultural dos Gés, receben- do dos Maraca tembetis ¢ machados Os Gés e os Cariri pertencem camada cultural mais primitiva dos indios brasileiros, sendo entre éles os Botocudos os mais atrasa- dos, Sdbre 0 berco da formacio e o centro da invadiagdc destas culturas pouco sabemos, em vista dos escassos dados que possuimos. Os an- tigos cronistas ocupavam-se muito pouco déles, j& que, geralmente, nao thes entendiam a lin. gua e nao chegaram a visitar as areas por éles, ccupadas. Quando os bandeirantes se puseram em contato com éles, néo foi sendo para exter- mind-los, sem 0 menor interésse em transmitir & posteridade observacies sobre a sua vida Certamente 6 por isso que ninguém até hoje se aventurou a fazer um estudo sdbre a origem ¢ formagio de sua cultura, e se alguém o fizer, provavelmente no podera apresentar resulta- dos tio positives e bem documentados como os que A. Métraux conseguiu reunir sobre os Tupi € os Guarani. Em vista das informagées escas- sas dos Cronistas sobre os Cariri e os Gés, au- menta 0 valor de achados arqueolégicos, j4 que éstes, freqiientemente, representam os tinicos elementos culturais do homem pré-histérico de certas regides do hinterland baiano de que te- mos noticia, Partindo do estudo comparativo déstes elementos culturais, determinar-se-d, aos poucos, a que cultura indigena pertenciam os indios do sertéo da Bahia, j4 que no campo cul- ural as diferencas nao sio tao marcantes entre 31 32 CARLOS OTT as diversas tribos como no campo lingliisties & 05 limites lingliisticos ndo coineidem com 0s li- mites culturais. Bstes fltimos so, antes de tudo, decorrentes do ambiente geografico. As- sim é que distinguimos as culturas indigenas brasileiras, essencialmente, em duas apenas. A primeira € a que se encontra ou se encontrava nas regides de mata virgem tropical, que lhe condicionou a forma da sua agricultura de mui- tos utensilios, armas e industrias, sua habita- gia, seus métodos de caga e até os conceitos mi- toldgicos. A segunda cultura é das regides abertas, de pouca vezetacio como sao as do sertéo baiano, do nordeste brasileiro e de varias regides do Brasil central, onde a agua & escassa e ha pouca possibilidade de plantar-se mandioca, razo por que os indios destas regides séeas se alimentavam geralmente de milho, fei- jo, mel de abelha sururueu, umbus e outras frutas silvestres. E visto que a caatinga quase no oferece cage, viviam em constante migracio fixando-se apenas enquanto esperavam em qua- tro ou cinco meses a colheita do milho e do fei- jf, a0 paso que a mandioea prendia ao solo a0 menos um ano, Outros, como 0s Botocudos, a0 menos em tempos préhistéricos, no pratica- yam agrieultura nenhuma, s6 a aceitando, aos poucos, em tempos post-cabralinos, Dai naseeu a forma diferente da habitacio: o guarda-vento, fo rancho ea maloca. Os Tupi e em parte os Camaca pertenciam a primeira cultura deserita, a0 passo que outros Gés dos sertées baianos, como os Cariri, séo tipicos representantes da se. gunda. Querendo, pois, reconstruir a vida do ho- mem pré-histérico baiano, nao é preciso que nos limitemos as informacées diretas ou indiretas, PRE-HISTORIA DA BAHIA que nos fornecem os achados arqueolégicos. Ai faltam quase por completo instrumentos ¢ ar- mas de madeira como obras da arte de trancado, destruides pelos efeitos deletérios do tempo. Devemos levar em consideragio 0 ambiente geo grifico e as noticias etnograficas de areas cul- turais semelhantes ¢ limitrofes. E’ evidente que as conclusdes daf tiradas nem sempre podem ser certas, mas muitas vézes apenas provavels. A arqueologia ou a pré-histéria pertence ao grupo das ciéneias histérieas que no nos podem dar certeza matemética e sim somente relativa Eo be PERNAMBUCO é OBJETOS ARQUEOLOGICOS P. C. Teschauer, baseando-se nas investi- gagées do Sr. Cristovéo Barreto, jé, em 1907, advertiu que a arqueologia balana néo somen- te denota suas propriedades caracteristicas, mas, além disso, ainda poderd Janear nova luz & so- luedo de problemas arqueolégicos de outros Es- tados brasileiros (58). Nao é de admirar que 0 territério baiano, tendo, de um lado, o mar, © de outry a maior parte do zeu hinterland rogado por intimeros Trios e riachos, tenha sido, em to- dos os tempos, disputado por varias nagées abo- rigenes ¢ assim diversas ondas migratérias dei- xassem ai seus vestigios. B, no entanto, apesar de jé terem aparecido alguns trabalhos sdbre a arqueologia baiana, a Sra. Heloisa A. Torres, ei 1942, ainda péde dizer, com téda a razio, que a arqueologia do nordeste do pais é uma “piigina quase branca” (59). Com excecio da Bahia, isto até hoje vale para o nordeste bra- sileiro, embora saibamos que p. ex. em Pernam- buco ¢ no Rio Grande do Norte existem co- legdes arqueolégicas, sem contudo serem apro- veitadas em publicacdes. A Bahia é hoje um dos Estados brasileiros sébre cuja pré-historia te- mos nogées mais claras; e ndo duvido que a arqueologia brasileira ficaria bastante enrique- (58) Teschauer, Antropos, vel. 2, 505. (60) Heloisa A. Torres, XCIX, 38 CARLOS OTT cida se fossem publicados os espécimes mais im- portantes das diversas colecdes existentes. Em Tesposta a perguntas que formulamos em tra- balhos anteriores, por intermédio de cartas par- ticulares que recebemos, soubemos por exem- plo que no Rio Grande do Norte existem ma- chados em forma de crescente, Entretanto quan- do pedimos os desenhos para comparacao e a perinissio de usa-los em publicacées ulteriores, ndo mais nos responderam. Cada Faculdade de Filosofia que se fésse criando nos centros mais populosos, deveria apresentar os resultados dos estudos arqueolégicos dos seus Estados, Aos pou- cos terfamos composto assim um quadro bem satisfatério do Brasil pré-histérico. 1. Artefatos de pedra H. von Ihering, um dos homens mais emi- nentes que se dedicaram & arqueologia brasilei- ra, estabeleceu a tese fundamental: “Nada hé que mais perturbe as discusses do que a apli- cacao ilimitada de nocdes teérieas, como ada- plar, por exemplo, os resultados dos estucos da arqueclogia européia a nossa. E’, pois, errada- mente que falam de uma época paleclitica ou neolitica na América do Sul. Como pude obser- var, até agora, no Rio Grande do Sul, encon- tram-se indistintamente reunidos instrumentos de pedra, quer lascada, quer polida, dando-se o mesmo no Uruguai, na Argentina e nos samba- quis do Brasil... Ao contrério do que acontece na Europa, na América do Sul e, em geral, em téda a América, os dois tipos (de pedra laseada € polida) coexistem, ao paso que na Europa um seguiu 0 outro. Na América, as pontas de fle- cha e as hasteas sao em geral de pedra lascada, go assunud pasteles CONTA carne ESTAMPA Il, Mapa dos achsdos arqueol6gicos feitos no Estado da Bahia TAWEL I. Achaeologische Fundorte im Staat Bahia PRE-HISTORIA DA BAHIA a0 passo que os pildes, maos de pilo, bolas e em geral os machados, so de pedra polida. Sé 08 machados da Patagénia so sempre de pedra laseada” (60). Isso também se verifica no Es- tado da Bahia. a) Machados de pedra Carlos Frederico Hartt (61), Ladislau Neto (62) @ H. von Thering (63) foram os prineipais cientistas que esereveram sébre machados de pedra encontrados no Brasil. Infelizmente, nem sempre puderatn indicar a localidade, e, outras vézes, nem o Estado onde foram achados 0s ob- jetos que estudaram. Fomos nés quem apresen- tou um trabalho maior sébre a distribuicdo dos diversos tipos de machados de pedra nn Rstado da Bahia. Entretanto, nao foram trabalhos de- finitivos, pois o niimero de tais artefatos (in- cluida a iiltima aquisiego da Faculdade de Filo- sotia da Universidade da Bahia; cérea de 700 exemplares), até agora conhecidos, é relativa- mente pequeno e grande parte provém de Amar- g0sa ou de seus arredores. Nao conhecemos ma- chados das zonas que vio do Rio Pardo ao Es- tado do Espirito Santo, do Rio Sao Francisco a Goids, bem como do nordeste do Estado: e sia rarissimos os exemplares achados no litoral, E estas justamente, sto ércas mais habitadas anti- gamente, Como é sabido, na fabricagéio de machados de pedra, a nefrite representa papel importan- te, © isso nfo sdmente na América, mas tam- (GOH. von Ihering (2), 61 (GD Fr. Hart, 45.53, (62) Ladisiau Neto), 478-499, (63) H. von Thesing (2), 67-89; 2) 519-588. CARLOS OTT bém na Asia e na Ea.opa, sendo por isso mesmo chamada “pedra de maclado”. Até o ano de 1984, jazidas naturais de nefrite s6 eram ce nhecidas na Asia, razio por que foram aventa- das as hipdteses mais extravagantes sdbre a origem de machados ¢ outros objetos feitos de nefrite, encontrados na Europa e na América Afirmaram mesmo que todos os objetos trabs- Ihados nesse material tiveram berco na Asia ¢, peregrinando através de milhares e milhares de léguas, chegaram & América do Sul (64) Quando, porém, a nefrite foi descoberta, em estado natural, tanto na Europa, como em a Nova Zelandia (65) e na América, cairam por terra todas aquelas teorias fantisticas. O Sr. Cristovao Barreto encontrou blocos de nefrite em bruto no municipio de Amargosa, Estado da Bahia (66). Por isso é bem compreensivel que machados de nefrite ou pedra nefritica néo se- jam muito raros em territério baiang, pois é sa- bido que tals objetos passavam pelo comércio de uma a outra tribo, de sorte que se encontra- ram machados de nefrite om regides balanas onde, por ora, nfo temos noticia de existirem jazidas naturais desta pedra Que a nefrite oferece excelente material para a fabricagio de machados, mostra-o terem ficado tais artefatos em uso quase até os nossos dias. Refere o Principe Maximiliano de Wied- Neuwied que os Botocudos, embora jé possuis- sem machados de ferro, serviam-se ainda do (Gb HL. yon Thering (8), 596.357, (65) Vide Reinhard Brauns, 832, (6a H. von Ihering (B), 555. Bstampa III. Machados de Campo Formoso Tofel UI. Steinbelle von Campo Formoso PRE-HISTORIA DA BAHIA chamado “Carutu’, feito “de uma nefrite dura de cér verde ou cinzenta. Depois de conveniente- mente afiada, podiam com ela abrir ramos troneos ocos de dureza ndo muito grande; para isso, ora seguravam-na sé com a mio, ora amar- ravam-na sdlidamente entre dois paus, grudan- do-a depois com céra” (67) Ja os gregos ¢ romanos conheciam macha- dos de pedra, descobertos por camponeses na la- voura, Chamavam-nos “Keraunia”, i. instru- mentos com que o deus do trovao mata a gente. Consideravam ésses machados como amuletos Plinio conhecia duas espécies de tais instru- mentos: uma preta e outra vermelha. Sendo preta e redonda, ajudava, segundo a crenea dos antigos, a expurgar cidades e vencer esquadras Era conhecida ainda uma teresira categorie, bem rara e mui procurada por magos persas, pois exa encontrada s6 em lugares onde houves- se eaido © raio. Por isso o general Galba, gue vira cair um raio num lago de Cantabria, man- dou “pescar éstes raios” e acharam-se doze ma- chados de pedra, para éle augirio de que Ihe era destinada a coroa imperial, para nés indicia de que, em tempos remotos, provavelmente, 14 existiam casas sobre estacas. Até na Tdade Média, ésses “coriscos” eram muito estimades. No ano de 1081, 0 Imperador bizantino Alexis Komnenos mandou ao Impera- dor Henrique IV um désses machados ricamente emoldurado. E ainda em 1670, ¢ embaixador francés de Marcheville fz entrega de um ma- chado de nefrite ao Principe Francisco da Lo- rena, bispo de Verdun (68). (67) M. von Wied-Neuwied, 293.294 46 CARLOS OTT Bste culto yelos machados de pedra, prin- cipalmente de nefrite, estendeu-se ao Novo Mundo depois do descobrimento da América. E no ha nenhum candomblé na Bahia onde nao se encontre tal pedra, sinal que na Africa exis- tiu a mesma supersti¢ao, nao se podendo dizer se dependente ou independente de influéncia européia, Muito provavelmente remonta a am- bas as influéncias chamarem os nossos sertane- jos a tais machados de pedra, encontrados fre- Giientemente no interior (69), “coriscos” ou pe- dras de raic, por acreditarem que elas caem do céu, durante as tempestades, enterrando-se pro- fandamente no solo. ‘Tanto o Museu do Estado, como a Facul- dade de Filosofia da Universidade da Bahia e 0 Instituto Geografico e Histérico da Bahia pos- euem diversos machadoe de nefrite, mas ne- nhum déles é reproduzido no presente livro por ser éste material, hoje em dia, de pouco inte. résse. Na escolha dos exemplares aqui estuda- dos orientamo-nos por sua procedéneia, preocu- pando-nos mais ainda sua preparagio para uni- 303 a0 cabo. Infelizmente, os cronistas antigos transmi- tiram-nos mui poucas informacées sdbre o feitio dos machados de pedra. Por ai se vé, como ain- da hoje acontece, que os indios, entrando em contato com os brancos, em primeiro lugar abandonaram seus machados de pedra, antes trabalhados com tanto esméro, pois a nenhum escapou a grande vantagem oferecida pelos ma- chados de ferro. A lei do menor esférgo falou to alto que ninguém Ihe péde fechar os o- vidos. (09) M, de Wied-Neuwied, 178 PRE-HISTORIA DA BAHIA Pero Vaz de Caminha, em 1500, desereve © grande interésse dos indios a0 observar 0 uso de instrumentos de ferro na fabricagio da pri- meira cruz na terra descoberta. Diz éle: “E, en. quanto nés faziamos a lenha, faziam dois car- pinteivos uma grande cruz, de um pau, que se ontem para isso cortou; muitos déles (dos in dios) vinham ali estar com os carpinteiros, ¢ creio que o faziam mais por verem a ferramen- ta de ferro, com que a faziam, que por verem a cruz, porque éles nao tém coisa, que de ferro seja e cortam sua madeira e paus com pedras feitas como cumhas, metidas em um pau, enti duas talas mui bem atadas, e por tal maneira gue andam fortes, segundo os homens que on: tem as suas casas foram, diziam, porque Ihes viram 14” (70). No tempo em que se escreveu o “Tratado da terra e gente do Brasil”, os indigenas do li- toral baiano ja possuiam ferramenta e apenas se lembravam de como seus pais e avés, com muito suor, derrubavam Arvores, munidos de “cunhas de pedra” (71). Pode-se dizer que pelo fim do século XVI, apenas as tribos habitantes de lugares mais afastados do litoral trabalha- vam ainda com instrumentos de pedra, como conta Gabriel Soares dos Amoipiri, da familia dos Tupi, que ocupavam a margem esquerda do Rio Sio Francisco, numa extensio de mais de cem léguas acima da Cachoeira de Paulo Afon- so. Diz éle: “Na terra onde éste gentio vive es- ‘tao mui faltos de ferramentas, por no terem co- méreio com os portuguéses; ¢, apertados da ne- cessidade, cortam as rvores com umas ferra- mentas de petra, que para isso fazem;.com 0 (10) Pero Var de Caminha, IX, (i) Fornge Cardim, 187. a CARLOS orT que, ainda que com muito trabalho, rocam 0 mato para fazerem suas roeas, do que também se aproveitava, antigamente, toda o outro gen- tio antes que comunieasse com gente branca” (72) Assim “gastavam muitos dias em cortar uma Arvore” (73) e troncos maiores s8 conse- guiam derrubar “ajudando-se do fogo” (74), pro- cesso éste que E. Stradelli ainda péde obser- var, nos tltimos tempos, no alto Uaupés. Des- creve-o assim: “O machado serve para fazer um. primeiro entalhe todo em redor da arvore, ma- chucando antes de que cortando a casca. Feito {sso e passados alguns dias, para o lugar ma- chucado seear ou ao menos murchar, aglomeram em tomo da arvore uma porcdo de mato séco e depois the dio fogo. A parte machueada, por isso mesmo que, se ndo teve tempo de secur, pelos menos murchou, naturalmente pega fogo de preferéncia ao resto. Apagado o fogo, com © machado fazem saltar a camada de carvéo que ficou desta primeira operacdo, e péem a madei- ra a nu, logo em seguida ateando novo fogo & fazendo, apagado éste, saltar a nova camada de carvéo, e continuando assim até conseguir a queda da arvore” (75). Passemos agora A descricio dos machados de pedra aqui reproduzidos, para formarmos ama idéia dos diversos tipos désses instrumen- tos empregados pelos aborigenes baianos A fig. 1 denota o tipo predominante dos machados indigenas baianos, e, por sinal, 0 pre- (72) Gabriel Soares de Sousa, 411; veje também Ivo Evreux, 101 (73) Frei Vicente do Salvador, 55 i) F. Cardim, 187 (75) B, Stradelll, 815, PRE-HISTORIA DA BAHIA sente exemplar, fabricado de nefrite (indica o péso especifico de 2,95), foi encontrado na pré- pia Capital do Estado da Bahia (atualmente da colecdo da Faculdade de Filosofia da Universi- dade da Bahia). Tem as seguintes dimensGes: comprimento 68 mm, largura 50 mm, espessura 17 mm Ao mesmo grupo pertencem os machados, provenientes do Municipio de Campo Formoso, que publicamos em outra parte (vide estampa Ill) (76). EB déste género so a maior parte dos machadinhos de Amargosa, existentes no Mu- seu do Estado da Bahia. Fig. 1. Cunha de mio de nefrite da Cidade do Salvador ‘Abb. 1. Feustleil aus Nephi ge- junden in der Hauptstadt ‘Bahia's (76) G. Ott G@), prancha VI. 50 CARLOS orT Figs. 2 ¢ 8. Cunhas de mio de Casa Nova Abb. 2u, 3, Faustkelle von Casa Nova Nas figs. 2 € 3 aparecem dois machados fei. tos de pedra de ferro ou hematita (Rolleisen- stein), bem polidos, ambos provenientes da Casa Nova, & margom esquerda do Rio Sao Francis- co. Sao da colecdo particular Frank Naegeli A fig. 2 tem as seguintes medidas: comprimen- to 55 mm, largura 40 mm, espessura 22 mm; ea fig. 3: comprimento 82 mm, largura 55 mm © espessura 22 mm. Noutra oeasiiio (77) publi- camos um exemplar fabricado do mesmo mate- lal, encontrado no municipio de Campo For- moso, onde alids so freqiientes essas pedras no tamanho do punho de um homem. ‘Tomando em consideracio a procedancia de machados feitos de hematita, existentes no Museu do Es- tado da Bahia, na Faculdade de Filosofia e no Instituto Geografieo e Histérico da Bahia, po- demos notar que indigitam para o alto sertéo baiano, onde, como é sabido, nfo falta éste mae (77) Thidem PRE-HISTORIA DA BAHIA terial (78). Um olhar sobre a colecao de macha. dos baianos mostra que os exemplares proveni- entes de Amargosa e de seus arredores so fa- bricados, na maior parte, de jadefte e um bom numero de nefrite, ao passo que nos machados oriundos de outras regiées baianas, éstes mate- riais sdo raros, predominando néles 0 diorito. © que caracteriza os machados por ora des- ctitos é a falta absoluta de preoeupacao com problema de eneabé-los; e certamente se usa- varn mais sem cabo do que com éle. E’ pois, a tipiea cunha de mao, térmo éste, hoje em dia, fora de uso entre nés, mas ainda empregado pelos antigos cronistas como vimos acima, em- bora éles s6 falassem em “cunha”. Propomos voltar outra vez. a empregar éste térmos na for- ma comum na Europa (Faustkeil). E certamente ésses machadinhos ou cunhas de mao nem sem- pre serviram como instrumentos de cortar ob- jetos, mas também como raspadores e tanto nas mics de homens, como de mulheres e eriancas. ‘Vejamos agora machados em que comeca a aparecer a preocupacao de meté-los no eabo Ai temos primeiro 0 exemplar bem polido que aparece na fig. 4, que encontramos na Vila Fig. 4. Machado da Vila de Sio Francisco Abb. 4 Steinbell von Vila de So Francisco de So Francisco do Conde, no recéneavo baia- no., E’ fabricado de jadeite (seu péso especifice indica 3,2). Medidas: comprimento 128 mm, largura (maior) 56 mm e espessura 28 mm. (78) Ctr. Martius (1), 30, 208 51 52 CARLOS OTT Fig. 5. Machado de Caitité Aub, 5. Steinbeil von Caiteté Fig. 6. Machado de Ttuacté Abb, 6, Steinbeil von Ttuact Fig. 7. Machedo de Tuacit Abb, 7. Steinbeil von Ituagi PRE-HISTORIA DA BAHIA © machado de punho pontiagudo (fig 5) & feito de diorito ¢ provem de Caiteté. Pertence & colegéo do Museu do Estado da Bahia (nr 272). Dimensdes: comprimento 135 mm, largura no gume 65 mm ¢ na ponta 20 mm, espessura 20 2 30 mm. A mesma categoria pertencem os das figs. 8 e 7, ambos de Ituagti e existentes na colecéo da Faculdade de Filosofia da Bahia, Dimensées Ao primeiro: comprimento 240 mm, (maior) lar- gura 120 mm, espessura 30 mm. Dimensées do segundo: comprimento 265 mm, (maior) largura 125 mm, espessura 30 mm. E ainda existem diversos machados déstes tipos no Museu do Estado da Bahia. Encabando éstes machados, seja num talo de palmeira, seja num pau perfurado, o seu uso niio os largava to f&cilmente como os machs- dinhos de mao, acima descritos; e sendo enca- bados pelo segundo método, até ficavam mais firmes quanto mais se usavam. Em seguida, temos um terceiro grupo que chamamos de dois gumos; no que todos éles te- nham de fato duas partes cortantes, mas, ao que parece, a finalidade era esta, Introduzimos aqui esta nova categoria (ndo enumerada em traba- Uhos anteriores), visto que recebemos outros exemplares déste género. A sua forma nasceu da preocupacéo do indio de amarrar melhor 0 machado ao cabo, principalmente a um talo de palmeira, que era a maneira mais répida de en- cabé-lo, pois até perfurar um pau para éste fim, © aborigene com seus instrumentos primitivos Jevava um tempo enorme. Com os exemplares que agora possuimos 4 podemos observar per- feitamente a evolucio deste tipo de machados. 53. 54 CARLOS OTT Fig. 8. Machado de Jibbla fe Teused Abb. 8. Steinbeil von Jibéia ae Tested Ai temos, em primeiro lugar, a fig 8 que re- produz um machado de diarito, proveniente de Jibbia de Itacu. Suas dimensées; comprimen- to 125 mm, largura do gume 90 mm e 63 mm na parte oposta, espessura 20 a 30 mm. Eo nr. 269 do Museu do Estado da Bahia. ‘Nas figuras 9 e 10 vemos aumentar-se a Fig. 9. Machado de Ituaga Abb. 9. Steinbeil von Ttuaed PRE-HISTORIA DA BAHIA Fig. 10, Machado de Ituses Abb, 10, Steinbeil von Ttuaca parte superior (porque éstes trés possuem umn gume somente}, até quase ficar de igual largura 4 outra (cfr. a fig. 10), estreitando-se a parte central, sem contudo nascer um suleo propria- mente dito, Ambos éstes machados provém de Ttuagu. O primeiro tem estas dimensées: com- primento 130 mm, (maior) largura 85 mm, es- pessura 20 mm, E 0 segundo: comprimento 150 mm, (maior) largura 100 mm, espessura 20 mm, Sfo da Faculdade de Filosofia da Bahia. ‘Mas néo possuimos exemplares dést2 gé- nero apenas de Ituaeu. Na fig. 11 apresentamos um machado de pedra de dois gumes, bem po- ido, feito de diorito e proveniente do Merra do Chapéu (nr. 277 do Museu do Estado da Bahia). As dimensdes so as seguintes: comprimento 175 mm, largura (maxima) 135 mm, no meio ‘72 mm, espessura 13 mm. Tem, & primeira vis- ‘ta, a aparéncia de um lamina de ferro. A colegio do Instituto Geografico e Hist6- rieo da Bahia conta mais trés exemplares désse mesmo género, denotando, porém, com exceciio do gume, a mesma espessura, tanto na parte in- 56 CARLOS OTT Fig. 11. Machedo do Morro 40 ‘Chapew Abb. 11. Steinbell von Morro do. Chapéu ferior como na superior. Procedem de Con- detiba (nr. 135), Remanso (nr. 24) ¢ Haberaba (ar. 66) E’ outra vez o cuidado indigena de amar- rar com a maior seguranca possivel 0 machado 0 cabo que, das trés categorias anteriormente descritas, faz naseer a dos sulcos, entalhes @ proeminéncias Taterais. Qual déstes métodos surgiu primeiro, 6 dificil dizer. Quer-me parecer, porém, que devemos co~ ocar em primeiro lugar os machados de proe- minéncias laterais Ai temos, em primeiro lugar, a fig. 12 que reproduz um machado déste género, provenien- te de Ttuacu, denotando proeminéncias ainda poueo selientes. Suas dimensies: 130 mm, maior) largura 90 mm. E’ 0 nr. 48 da colecéo arqueolégica da Faculdade de Filosofia da Ba- hia; mas na mesma colegio (nr. 52) existe outro machado de feitio e procedéncia igual. PRE-HISTORIA DA BAHIA Tig. 12. Machado de ttuapt ‘abb. 12 Steinbeil von Itoaga, 37 As proeminéncias laterais j4 sio bem vi veis nas figs. 13 e 14. Infelizmente nao sabe- mos 0 lugar exate da procedéneia déstes ma- chados sendo ambos da coleséo particular de Frank Naegeli, Consta, porém, que foram encon- trados no Estado da Bahia. Dimensées do pri- meiro: comprimento 140 mm, largura -maxinia) 85 mm, espessura 40 mm. E’ um instrumento Fig. 18. Machado do Estado da Baia’ Abb. 18. Steinbell von Staat Babia CARLOS OTT Pig. 14 Machado da Bahia Abb. 14. Steinbeil von Bahia forte ¢ bem polido, de diorito, ¢ possui, mais ou menos, @ mesmo feitio de um exemplar de oli- sto cuja publicagdo devemos a Ladislau Neto (79). As dimensées do segundo sio: compri- mento 85 mm, largura (méxima) 60. mm (no suleo subterminal 45 mm de largura) e 28 mm. de espessura. O gume do presente artefato (coms 0 da fig. 12) esté fracionado e a superfi- cie j4 no se acha em estado polido, provavel- mente em conseqiiéneia da influéncia deletéria da atmostera. © Museu do Bstado da Bahia possui mais um original déste género (nr. 368), ainda que relativamente menos comprido: provavelmente @ de procedéncia baiana. As prosminéncias 1a- terais, todavia, so ainda mais elaborados, do que mostra a nossa fig. 13. Dai ao tipo de ma- chados com suleo cireular subterminal (0 que ‘temos na nossa fig. 14) foi apenas um passo, de sorte que néo ha necessidade de consideré-lo um 9) L, Neto (2), 488, PRE-HISTORIA DA BAHIA Fig. 18. Machado de Remenso Abb, 15. Steinboil von Remanso tipo essencialmente diferente do machado de Proeminéncias laterais. ‘Em seguida colocamos os machados de sul. cos, sejam éstes circulares completos ou incom: pletos, colocedos mais para o meio ou para a extremidade oposta av gume. No podemos di- zer que representam grande progresso téenico no feitio de machados; mas pelo nimero de exemplares por ora conhecidos, devemos dizer que © indio baiano nao fazia freqitentemente fais sulcos. Entretanto, como jé observamos cima, 0 material de comparacéo ainda é tao pe- queno que ainda nao podemos falar na raridade de determinado tipo nem tampouco organizar mapas de sua distribuicao geogratica, o que fica reservado para tempos futuros. Um machado, proveniente de Remanso (nr, 32 da coleco arqueolégica do Instituto Geografico e Historico da Bahia) que reprodu- zimos na fig. 15, possui o suleo circular com- pleto e bem profundo (3 a 4 mm). Suas medi- das: comprimento 150 mm, largura 82 mm, es- 59 60 CARLOS OTT pessura 36 mm, Na mesma colegéo do Insti- tuto Geogréfieo e Histérico da Bahia (que aliés 6 a colegio de tipos de machatlos mais diferen- tes, existentes na Bahia) ha outro exemplar (nr. 45) de Sento Sé com suleo igualmente profun- do, embora se aproxime do centro; 0 lado opos- to av gume parece ter servido de martelo. H. Beuchat figura trés artefatos do mesmo géne- To, provenientes da indtistria dos “cliff-dwel- lers” (80). Podemos ainda acrescentar um ter- ceiro machado da categoria dos de suleo per- feito, embora neste seja o suleo menos pro- fundo do que nos anteriores; éste vem de Chi- que-Chique (nr. 94 do Instituto Geogratico Histérico da Bahia) Os seguintes dois machados, reproduzidos nas figs. 16 € 17, nasceram do segundo tipo acima deserito, de extremidade pontiaguda acrescentando-se ainda para maior seguranca um suleo de trés quartos, ficando num mais para a extremidade, noutro mais para meio. A fig. 16 representa um colossal machado po: lido, cujo manejo exigia forgas hereiileas, uten- silio proveniente da Ilha de Cairti e fabricado de granito (colegio Frank Naegeli). Tem 280 mm de comprimento, 100 mm de largura (méxima) € 60 a 70 mm de espessura. O sulco pouco pro- Fig. 19. Machado de Cairt Abb. 16. Steinbell von Calrt Fig. 37. Machado de ‘Chigue-Chique Abb. 17. Steinbell von ‘cnigue-Cnique (20) H. Beuchat, 215. PRE-HISTORIA DA BAHIA - fundo atravessa apenas 3/4 da largura de am- bas as faces. Se a forma pontiaguda da extremi_ dade oposta ao gume 6 influenciada pelo segun- do tipo de machados, ja descrito, ou se simples- mente condicionado pela pedra escolhida, nao se pode resolver. Na Argentina, onde tais ma- chados séo comuns, a sua extremidade superior é arredondada (61). O mesmo sulco apresentado pelo machado anterior, ainda que fique mais para o centro, exibe a fig. 17. E feito de diorito fe vem do alto sertéo baiano (Chique-Chique). Suas dimensées sio: comprimento 225 mm, ler. gura (maxima) 105 mm, espessura 50 a 60 mm (nr. 274 do Museu do Estado da Bahia). Do mesmo feitio sao dois exemplares pertencentes ao Instituto Geografico e Histérico da Bahia, um proveniente de Maracas (nr. 145) e outro das Lavras Diamantinas (nr. 151). Aliés, essa tendéncia de calocar o sulco mais para 9 meio do machado do que para a extremidade, pré- pria aos tiltimos exemplares referidos, observa- se também em diversos artefatos argentinos dessa categoria (82) E finalmente chegamos aos machados de entalhes laterais, por ora rarissimos na Bahia. E’ a nossa fig. 18, que representa um exemplar de dois gumes, sondo a parte inferior mais lar- Fig. 18, Machado de Condediba ‘Abb. 18. Steinbeil von Condeubs (GD B. Homan est. 3 — Carlos Bruch, 14. (82) B. Boman est. 8, figs. 6, 10, est. 9 fig. 19, 61 62 CARLOS orT ga ea superior de forma pontiaguda. Vem de Condeiba (nr. 34 do Instituto Geografico © His- torico da Bahia) ¢ é feito de diorito. Dimen- ses: comprimento 123 mm, largura 83 mm, es- pessura 27 mm, Por ora, s6 conhecemos da Ba- hia éste machado de um entalhe lateral de cada Jado, sendo desconhecidos outros de dois enta- Ihes laterais, tao comuns no Amazonas. ‘Chegamos agora ao quinto grupo da nossa nova classificagio dos machados baianos, a0 qual atribuimos os de ancora, semilunares ou em forma de erescente que, talvez, seja melhor chamarmos machados de ceriménia, visto que no possufam finalidade pratica como instru- ‘mentos ou armas, e sim antes social ou magica. Anteriormente nés os atribuimos 4 primeira ou 4 quarta categoria, levando em conta exclusi- vamente 0 método de amarra-lox 20 eaho, com ou sem proeminéncias laterais. Achamos, po- rém, melhor deixar de lado aqui éste ponto de vista e deixar prevalecer o seu carter religioso 2 cerimonial. De varios exemplares déste género que existem, tanto no Instituto Geogritico e Hist rico, como na Faculdade de Filosofia da Bahia, apresentamos apenas um de cada tipo} pois te- ‘mos ai machados com e sem proeminéncias la- terais. ‘Um exemplar de machado em forma de crescente sem proeminéneias laterais, aparece na fig. 19 (6 0 nr. 275 do Museu do Estado de Bahia). Foi encontrado em Chique-Chique e se aproxima da fig. 30 da Est. VI de Ladislau Neto, machado éste proveniente do Para (83) € (9) L, Neto WD, 1. PRE-HISTORIA DA BAHIA que flea de permeio nos artefatos reproduzidos por C. Fr. Hartt nas suas figs. 5 (de Piaui) ¢ 10 (sem indicacdo de procedéneia) (84). O nosso machado é fabricado de gneiss-granitoso (85). ‘Suas dimensées sio as seguintes: comprimento 130 mm, largura do punho 80 mm e da ancora 165 mm, espessura do punho 15 mm e da parte superior da ancora 23 mm. A ancora ou o corpo em forma de crescente é separado do punho por um declive abrupto, o que se observa também no exemplar dos indios Gaviées publicado por Evans (86). © punho é arredondado em ambos os Jados © sua espessura na eabeca é até um Pouco menor do que no meio, © que torna difi- cil compreender como podia ser amarrado ao Fig. 19. Machado semi-lunar de Chique-Chique Abb. 19." Ankevast yon (Chigue-Chiaue (G8) C. Fr. Hartt, 40.50 © estampa 7. — O Instituto Geogritico © Wistorico da Bahia possui oulre ma- chado de ancora do mesmo feitio da fig. 3 dec Er. Hart, proveniente de Carecol (Piau) (Nr. 160) (85) Martius (2) 215 da resi uranito é 2 formacio dominante numa clreunte- ‘éneia do mais de uma légua": o mesmo éle ft ‘aha notado na Serva de Montes Altos “euja for- magio dominante é de granito finamente granu. lado, muito denso e de gnelss-granitoso” (ibid, 8) (66) Ctr. C. Fr. Hartt, 45; voja também A. C. Sides aa Silva (1), 749. de Sudzelro: “0 63 64 CARLOS OTT Fig, 20. Machado semi-lunar ‘de Remanso Abb, 20, Ankeraxt von "Remanso cabo com seguranca. Mas jé que se tratava, an tes de tudo, de uma insignia, esta circunstancia no tinha grande importincia, O Instituto Geogratico e Histérico da Bahia possui mais trés exemplares do mesmo feitio que 0 ante- riormente descrito, todos provenientes do vale do Rio Sio Francisco (os ns. 154 ¢ 157 provém de Remanso, e nr. 153 traz apenas a indieacio “Rio de S. Francisco”). Enquanto, porém, to- dos ésses machados em forma de crescente sio instrumentos fortes, 0 Museu do Estado da Ba- hhia (nr. 323) possul um modélo que, tendo 0 ‘mesmo tipo, representa, entretanto, um artefato muita delicado; 0 punho é mais comprido, nao 6 polido como os outros, sendo, no entanto, des- conhecida a sua procedéncia A colegio do Instituto Geogratico e Ti t6rico da Bahia ainda pertencem quatro exem- plares da mesma categoria dos machados de Ancora, denotando, porém, a particularidade de saliéncias laterais nas extremidades do eabe. ‘Trés (ns, 152, 155 e 156) trazem simplesmente 2 indicacio “do Rio S. Francisco”, ao paso que PRE-HISTORIA DA BAHIA © quarto exemplar (nr. 158) traz pormenori- zada a sua proveniéneia, a saber, “Remanso” ¢ 60 que reproduzimos na fig. 20. Tem estas me. didas: comprimento 135 mm, espessura 15 a 20 ‘mm, largura da ancora (cujas pontas estilo que- bradas) 150 mm, largura do punho 75 mm e, na extremidade que se aplica ao cabo 78 mm, B’ natural que um machado déste género desde os tempos da colonizacio chamasse aten- Go, tanto por causa de sua forma como pela técnica extraordindria empregada na sua fabri- cacéo Entre os cronistas que tratam dos Tupi néo encontramos referéneia a tal machado em for- ma de crescente. Nao ignoramos que A. Thevet (87) figura tal instrumento em mios de um in- dio, ainda que no texto nao se refira a isso Seria, porém, de admirer se tal machado tivesse passado desapercebido aqueles homens curiosos. Entretanto, na obra de Ivo d’Evreux en- contra-se um trecho bem interessante que nos esclarece sébre 0 uso e a significacio de seu fel- tio em forma de erescente. O bom do Capuchi- nho refere que, um dia, os Tremembé — geral- mente considerados como a tribo mais seten- trional da familia dos Cariri (88) — surpreen- deram um grupo de Tupinambé do Maranhéo, sendo uns mortos, outros aprisionados. Poucos sobreviveram para levar a triste noticia a seus companheiros na Tha do Maranhio. Quando, entdo, 05 Tupinambd, acompanhados por alguns franceses, foram ao encalgo dos Tremembé, che- gados 20 campo de batalha, acharam um dos (BD A. Thevet, 202. (G8) Vide Rodolfo Garsia, 268. — Ctr, também Cléin- dio @Abbeville, 189°, 65 66 CARLOS OTT seus irméos que se salvara do massacre e se ti- nha escondido numa drvore Gea. Este ensinou, como Ihe permitiram suas foreas, o lugar onde jaziam mortos seus companheiros, que foram ‘encontrados com as cabecas rachadas, e sdbre seus corpas os machados de pedra, instrumentos desses atrocidades, por ser costume entre éles nunca se servirem duma arma com que j4 ma- taram um inimigo. “Caruatapyran, um dos Principais de Coma, trouxe-me um dasses machados de pedra, ainda tinto de sangue, com alguns cabelos aderentes, e com um pouco do eérebro do Principal Ianua ran, que com éle foi morto, o que se soube por ser encontrado sobre seu corpo. “Caruatapyran pegando um désses macha- dos, feito em forma de creseonto, onsinou-me 6 que eu néo sabia, dizendo-me terem os Tremem- ‘bé o costume mensal de velar téda a noite, fa- zendo seus machados até ficarem perfeitos, em_ virtude da supersti¢ao, que nutriam, de que indo para a guerra armados com tals instru- mentos nunca seriam vencidos, mas sempre ven- cedores. “Enquanto os homens e as mulheres se en- tregavam a ésse trabalho, dancavam as mégas 08 meninos & frente das choupanas, ao luar do cerescente” (89). ’ possivel que Elias Herekman tenha tido diante dos olhos © mesmo tipo de machado em forma de crescente, quando fala das armas dos ‘Tapuias da Capitania de Paratha, pertencentes, ‘mesma familia dos Cariri como os Tremembé. Diz éle: “Usam ainda de pequencs machados (GB) F, von Hochstetter, 22 PRE-HISTORIA DA BAHIA de mo com uns cabos compridos, como arma contra 0 seus inimigos” (90). E verdade que nao expliea se ésses machados foram feitos de pedra, ou se ja se tratava de machados de ferro, importados pelos portuguéses ou holandesos, pois o testemunho de Elias Herckman 6 de 1639. Além disso, o autor citado fala de “pe- quenos machadas”, ao passo que a maioria dos exemplares por nés estudados (com uma ou ou- tra excecdo que de fato so pequenos), ndo se podem classificar desta maneira, Alias, Luis da Camara Cascudo comunicou-me possuir varios machados semilunares (91), encontrados nas re- gides a que se refere Elias Herckman. No coméco do séeulo passado Martius (29) JA observava que entre as tribos, onde se em- prega o machado em forma de ereseente, o cults da lua ocupa um Iugar importante, chegande até a falar de adoracdo. Lesc corresponde bem a mentalidade dos ‘Tremembé, conforme a infor- E do mesmo tempo cinda possuimos uma valiosa comunicaedo de J. £. Pohl (93), pols dle observou entre os indios Poracramecra (do grupo lingtiistico dos Gés), do Maranhao, que “como insignia de sua dignidade, o capitio e o seu subchefe trazem debaixo do braco um ma- chado formado de granito. Déste machade em forma de meia lua, de 7 polegadas de compri- mento e fixado num cabo curto de 7 polegadas, pendem cordées de algodio tingidos de verme- tho. Por meio de um delgado cordao préso a (80) B. Herckman, 282 (OL) Litie da Ciara Caseudo, 28 de margo de 1945 (62) Martius (2), 258-255, 268, 282.206; veja também H. von Thering (2, 67-68 (95) J.-E. Pokl, 153-154. o7 68 CARLOS OTT ambas as extremidades do eabo, 0 machado & fixado ao ombro. $6 a muito custo e com a me- diagdo de Carvalho e em troca de outro pre- sente, constante de varias facas, consegui rece- ber um désses machados. Deram-no muito a contragosto, pois preparé-los é muito trabalho- so. Na guerra, éles manejam com muita habi- lidade éste machado, empregada de preferéncia para fender a cabeca dos inimigos” Sendo, pois, 0 machado em forma de eres- cente considerado como insignia e instrumento de culto, compreendemos que W. Kissenberth, entre os Mekubengokra-Caiapé nao conseguisse deseobrir nenhum désses objetos preciosos, re- cebendo dos indios a informacdo de que esta- vam sepultados nas suas plantagées; o mesmo autor observou uma veneracéo, téda especial, & lua, entre ésses indigenas (94) C. Fr. Hartt achou que “éstes instrumen- tos sio, na maior parte, suficientemente pesa- os € munidos de um gume para torné-los ar- mes eficazes, sendo alguns déles, provavelmen- te, usados como tomahawks ou machados de combate. Contudo, alguns so tdo leves, finos ¢ frageis que oferecem muito pouca resisténcia, @ éstes, como talvez mesmo os mais fortes, po- dem ter sido meras insignias de autoridade, nao destinadas a uso real” (95). A opiniao comum dos etnélogos é ter ser- vido ésse machado em forma de crescente ge- ralmente s6 como insignia (96). Entretanto Ri- chard Andree também admite ter sido usado, (Ga) W. Kissenberth, 58-59 (05) C. Fr. Hartt, 46. (6) Cte. Georg Buschan, vol. 1, 200.291. — 1, Neto (@, 487-400, — W.' Kisconberth, 58. PRE-HISTORIA DA BAHIA casuaimente, como arma de guerra (97). E. ‘Ferdinand von Hoehstetter j chamou a aten- do para 0 fato de se encontrarem tais macha- dos de ancora s6 pelo interior do Brasil, e niio no litoral (98). © etnélogo sueco Stig Rydén (99) até de- dicou um trabalho todo especial a forma e a distribuigdo geogréfica dos machados semiluna. res, encontrados no Brasil, reproduzindo iné- meros exemplares, tanto encabados como sem cabo. No mesmo artigo (que o autor teve a gen- tileza de oferecer-me, depois de recebida a nossa “Contribuieio 8 arqueologia baiana”) que 86 agora temos a5 méos, observamos que no mapa da distribui¢go dos machados de ancora, por éle organizado, ainda nao péde colocar ne- nhum exemplar no Estado da Bahia, o gue agora j4 se nfo dé. Neste mapa (cujas lacunas enchemos com as nossas publicacées) notamos que a distribuicio dos machados semilunares geralmente coincide com o territério antiga- mente ocupado pelos Gés e Carini. Resumindo 0 que dissemos sdbre os ma- chados de pedra encontrados na Bahia, damos a seguinte classificacao (um tanto diferente da- quela dada em trabalho anterior) (100): 1) Ao primeiro grupo pertencem os exem. plares reproduzides nas figs. 1, 23. O ca- racteristico déstes machados é no denotarem suleo ou proeminéncia para fixa-los a0 cabo. © punho é, algumas vézes, um pouco mais es- treito, outras vézes, mais largo na extremidade, (1) R, Andree, 18, (98) Ivo d'Bvreux, 179.100 (88) Stig Ryden, passim 00) ¢. Ott 1), Bas 69 70 CARLOS OTT © que, porém, parece condicionado pelas pedras empregadas na fabricacio déstes artefatos; em geral tém forma quadrangular ou retangular ¢ conservam em todo o instrumento a mesma largura e espessura. Outra particularidade digna de mencionar 6 a de serem aplanados 03 Tados de alguns instrumentos desta primeira ca~ tegoria (101), pois a maioria dos modelos conhe- eidos, que provém principalmente da zona de Amargosa, tém os flancos arredondados. Visto que, evidentemente, muitos désses machados munea foram encabados, mas usados simples mente na mio como instrumento universal para coriar e raspar, propomos voltar ao térmo em- rregado pelos antigos cronistas e donominé-los ‘cumhas de pedra’" 2) No segundo grupo déstes artefatos j4 aparece a tendéneia de preparar a pedra para fixd-la melhor a0 cabo. A extremidade do pu- nho é agueada, atravessando, dessa maneira, 0 cabo perfurado no momento do ajuste e entran- do cada vez mais dentro do cabo, ao ser usado o machado. A esta categoria pertencem as nos- sas figuras 4, 5, 6 e 7, além de bom mimeré do mesmo género, existente no Museu do Estado da Bahia (102). 3) 0 tereeiro (e aqui novo) grupo de ma- chadas @ 0 de dois gumes, ainda que nem todos tenham duas partes cortantes igualmente bem trabalhadas. E’ 9 mathado que ndo se enca- bava num pau perfurado ¢ sim num talo de palmeira, dobrado em redor da parte central (01) G0 03 mimeres 37, 108, 119, 124 @ 184 do Museu do Estado da Bahia, todos procedenies de Amar- 080. (102) Trata.se dos mimeros 183, 247, 251, 252, 258, 329, 315, 316 © 380, PRE-HISTORIA DA BAHIA da pedra e amarrado por fibras vegetais, como J4 0 desereve Hans Staden (103). A éste grupo pertencem as nossas figs. 8, 9, 10 e 11. 4) Do quarto grupo séo os machados do- tados de proeminéncias ou saliéncias laterais (nossas figs. 13 ¢ 14), de suleos circulares eom- pletos (como a nossa fig. 15), ou incompletos (como nossas figs. 16 e 17) e finalmente os ma- chados de entalhes laterais, um de cada lado (como a fig. 18). Machados de 4 entalhes (dois de cada lado) laterais do tipo bem comum na re- gido amazénica (104), ndo nos consta tere sido eneontrados no Estado da Bahia. 5) © quinto grupo é constituide pelos ma- chados de ancora ou em forma de lua crescente que (contra a nossa classificagao em trabalho anterior), por causa de seu carater sagrado, li- gado ao culto da lua, servindo, por isso, mais como insignia do que arma, preferimos chamar de machados de ceriménias. Na diviséo, torna- mos, porém, a empregar 0 métode de amarra-lo ao cabo, distinguindo, pois, machados sem sali- éncias laterais (como a nossa fig. 19) e outros dotados de tais proeminéneias (como a fig. 20). Da distribuigéo geografica pelo Brasil, do liltimo grupo, j4 possuimos estudos pormenori- zada3, 20 passo que no se dit 0 mesmo caso (08) Diz Hans Steden: “Tinham antigamente, antes de ‘cf virem os navios, @ ainda o tem om muites 1u- gates do pais, onde navio algum chegou, uma es Décie de pedra azuleda, a que davam a ‘forma de cunha, euja parte mals larga é mal cortante, com mais ou menos um palmo de comprimento, dois ‘dedos do grossura e 2 largura de uma mao, Umes 30 melores, outras menores. ‘Tarai depois um au que vergam ao redor da pedra.e amarram com fibras de embira” (140). "— Cf. tambem ‘Var de Caminha, TX, e Wied-Neuwied, 203.204. (10H von Thering (8), C71-872, —E, Stradell, 514. 1 72 CARLOS orT com os machados dos outros grupos, pois de- vido as suas formas menos extravagantes néo chamaram tanto a atencio dos evlecionadores, sendo, por isso, o material de comparacéo pu- licado relativamente menor. Com os poucos exemplares, por ora conhecidos na Bahia, do se~ gundo, terceiro e quarto grupos (nfo interessa aqui 0 primeiro, por causa de seu feitio pouco extraordinario), nao se pode organizar ainda um mapa de sua distribuicdo geografica, havendo, por ora, a impresséo que os Maracd e Paiaia, de um lado, como os Caiapé, do outro, foram. os melhores técnicos na fabricacéo de macha- dos de pedra de feitio mais dificil. Em alguns ‘casos chamamos a atencéo para as ligacdes exis- tentes entre machados baianos e outros encon- trados no Sul do Brasil, na Argentina, no Ama- zonas ¢ até na América do Norte. Evidente- mente nio é preciso logo pensarmos em influ- éncia e dependéncia; mas em algumas particu- laridades de invenego mais rara, sempre deve- mos pensar em tais possibilidades, tanto mais (como em baixo ainda veremos em outros exem- los) que nas Américas, devido & idade de. 20.000 anos, néo devemos contar com tantas variedades culturais como em outros Continen- tes, onde o homem jé existe desde centenas de milhares de anos. Certas descobertas como a de perfurar 0 préprio punho do machado, o que as vézes tor na-dificil distinguir um exemplar do neolitico europeu dos machados de ferro, ndo se fizeram aqui no Brasil. b). Moletas e almofarizes Jé que grande parte dos indios ndmades do sertéo baiano dedicava-se ao plantio de milho, PRE-HISTORIA DA BAHIA devia-se esperar de antemio a existéncia de mo- Jetas e almofarizes de pedra. Evidentemente faziam-se éstes instrumentos mais de madeira Entretanto, o indio, que fazia machacios semilu- nares, ndo encontrava dificuldade nenhuma em fabricar moletas e almofarizes de pedra No que diz respeito as moletas de pedra por ora encontradas na Bahia, temos que dis- tinguir dois grupos © primeiro é constituido por moletas que possuem uma ou ambas as extremidades cor tantes, sendo, porém, tao compridas que ja nao podem ser designadas como machados, mas que serviam tanto para cortar come para triturar. © segundo grupo & formado por moletas de extremidades arredondadas Ao primeiro grupo pertencem as nossas figs. 21, 22 € 23 A fig. 21 reproduz uma moleta de dois gu- mes, razio por que, em trabalho anterior, a enumeramos entre os machados. E’ 0 nr. 131 da colecio arqueologica do Instituto Geogrétieo © Histérico da Bahia ¢ fol encontrada em Monte Alto. Medidas: 260 mm, diametro 70 mm. Apa- rentemente, lembra um pau cilindrico apontado ‘em ambas as extremidades. Aliés, no é 0 tni co exemplar desta espécie que conhecemos, pois no Museu do Estado da Bahia existem outros dois do mesmo feitio; um (nr. 276) proveniente Fig. 21. Mo de pildo de ‘Monte Alto ‘Abb, 21. Mostserstoessel von ‘Monte Alto 73 ted CARLOS orT de Fortaleza (Norte de Minas Gerais) e outro (ar. 291) de uma localidade desconhecida do territério baiano. Este artefato de pedra serd uma imitaedo de certa arma, usada no vale do Rio S. Francisco, (embora esta fésse fabricada de madeira)? Diz Gabriel Soares: “Pelo sertio da Bahia, além do Rio de Sao Franeisco, par- tindo com os Amoipiré da outra banda do ser- t4o, vive uma certa nacdo de gente barbara, a quem chamam Ubirajaras, que quer dizer se- nhores dos paus... A peleja dos Ubirajaras é a mais notével do mundo, porque a fazem com uns paus tostados mui agudos, de comprimento de trés palmos, pouco mais ou menos eada um, € so agudos de ambas as pontas, com os qi atiram a seus contrérios como com punhais; e sii tio certos com éles que nao erram tiro, com > que tém grande chegada; e desta maneita matam também a caca, que se Ihes espera o tiro, nao Ihes escapa, 0s quais com estas armas se defendem de seus contrérios tio valorosa- mente como seus vizinhos com arcos ¢ flechas” (205). © péso eo material fragil do presente exemplar no permite, porém, a suposigao de ter side usada como lanca de arremésso, razdo Por que supomos que servia como moleta ou como cavador, © mesmo vale quanto aos exemplares re- produzidos nas figs. 22 e 23. O primeiro tem 0 comprimento de 252 mm e foi achado em St.° Fig. 22. Mio de pildo de St. Antonio ‘de Azguim (Castro. Alves) ‘Abb, 22. Moerserstoessel von ‘St. Antonio de Arguim (Castro Alves) (105) G_ Sosres de Sours, 412 PRE-HISTORIA DA BAHIA Antonio de Arguim (Castro Alves). E’ o nr. 149 do Institute Geogréfico e Histérico da Bahia, A cextremidade inferior esta bem aflada, podends assim servir tanto de machado como de cava- dor, e a outra extremidade de triturador. O exemplar nr. 161 do mesmo Instituto, apesar de quase uma vez mais comprido, é do mesmo fei- tuo; foi encontrado na fazenda Bom Gosto, da Vila de S. Sebastiao, perto de Feira de Santana, artefato reproduzido na fig. 23 foi esca- vado na Cidade do Salvador (atualmente é da Colegio da Faculdade de Filosofia da Bahia). Dimensdes: comprimento 232 mm, diametro 63 mm. A parte inferior est um tanto estragada; a superior tem a forma caracteristica das mo- letas. Cheyamos ay moletss do segundo grupo, de extremidades arredondadas. © tipo comum de mao de pildo usado pelos aborigenes baianos & representado na fig. 24, sendo uma das extremidades mais larga e outra mais apontada. Suas dimensées séo: compri- mento 385 mm, diametro 40 a 60 mm (nr. 167 do Inst. Geogr. e Hist. da Bahia) e provém do Rio Braco do Norte (municipio de Una). A Fae culdade de Filosofia, iltimamente, adquiriu um exemplar muito parecido a éste, proveniente de Ttuacu. © segundo exemplar déste grupo, repro- duzido na fig. 25 (nr. 168 do Inst. Geogr. ¢ Hist. “ig. 28. Mao de piléo da ‘Cidade do Salvador Abb. 22. Moerserstocstel ‘aus der Haupstadt ‘Bahie'e 76 CARLOS orT a Bahia), foi encontrado na fazenda Sambaiba, no munieipio da Barra do Rio Grande. Ja foi descrito por T. Sampaio, mas, por um descuido qualquer eseapou 8 publicacdo o desenho a que le se refere. O ilustre tupinélogo baiano deu a seguinte descriedo: “O artefato, que a nossa fi- gura representa, é uma mio de gral, belo exem- plar de aparelho culinario indigena, feito de Giabase ou melafiro, do péso de 5.850 gramas, comprimento de 61 cme de 7 1/2 de maior did- metro. E’ uma boa lasea de pedra polida, de forma cilindréide, com uma gola e remate en. talhado no extremo superior, e, a parte inferior, arredondada pelo uso, no mister de triturar 0 grao que se lanca no gral. Para se utilizar désse instrumento, a mulher indigena tomava-o, com a mao esquerda, pela parte superior, aplicando 0 dedo polegar no entalhe curvelineo, que bem claro se vé no desenho e, com a méo direita, se- garando a0 meio, imprimia um movimento ro- tatérfo parte inferior, 0 que bastava para, com 0 péso da peca, triturar o contetido do pilao ou gral. Bscusado é dizer que com isso conse- guiu a mulher indigena efeito tio satisfatério como o obteria com a mé do moinho mais per- feito” (106). E’ de estranhar que Teodoro Sam- Fig. 24. Mio de pilfo ‘de. Una Abb. 24." Mocrserstocseel ‘yon Une Fig. 25. 3ko de pilio em “forms falica da’ Barra ‘Jo Rio Grande Abb. 25, Moerserstoessel ‘in Phallve-rarm von Barra do Rio Grande G06) 7, Sampaio (1), 26-29. PRE-HISTORIA DA BAHIA paio nao percebesse a forma falica do presente instrumento. H. von Ihering ainda viu um exemplar maior de mao de pildo, na colecdo do Sr. Cris tévdo Barreto, a saber, de 1,38 m de compri- mento, achado em Feira de Santana, em uma ‘exeavacdo de 6 m de profundidade. Ainda restam a dizer algumas palavras @ respeito de almofarizes Evidentemente o indio dava preferéncia a almofarizes de madeira, de mais ficil fabrica- gdo do que os de pedra, ou se servia de covi- nhas feitas pela propria natureza. Alfredo de Carvalho (107) designa “buracos feitos perto agua, em grandes pedras, pelos indigenas, para moerem 0 milho” como pildes, e acreseen- ta: “muitos désses pildes foram por mim acha- dos ao pé do Pio de Acticar, sobre o rio de S. Francisco; so abertos na superficie elevada de grandes fragmentos de rochedos, préximos do rio”, Pildes déste genero obsérvei também no municipio de Campo Formoso e na Vila de Sao Francisco. Supomos, porém, antes ter sido a forca da agua que produziu éstes almofarizes, sendo talvez ainda aperfeicoados pela mao in- digena Outros almofarizes eram feitos de seixos rolados como 0 que reproduzimos na fig. 26, encontrado no municipio de Mhéus e perten- (107) A. de Carvalho, 114, anotagZo (S). — A. Métraux (G1), 105 #@ tratow da dietribuicgo de pilee de pe- Gra’ e de madeira entre as tribos do xrupo Ling Heo ‘dos uph (40s) L Neto (1), 506-510. — H1, von Thering (2), est. XGXIT, némeroe 20 ¢ 30 e pig. 599 8 CARLOS OTT vente ao Instituto Geogrifico e Histérico da Ba. hia (nr. 271), Tem na face cncava o diametro de 140:150 mm (por ser de forma oval), 38 mm de profundidade e uma espessura de 15 a 20 mm. De outros Estados brasileiros sio conhe- cidos diversos exemplares de tais almofarizes, feitos de seixos rolados (108), e 0 mesmo género 6 igualmente encontrado na Argentina (109). (109) E. Boman pl. XX e XXIV, pag. 310 Fig. 26. Amotariz de pedra ‘de Theus Abb. 28. Moerser aus Stein ‘von Tineus PRE-HISTORIA DA BAHIA ©) Pontas de flecha e de langa e outros artefatos de pedra Nao conhecemos nenhuma ponta de flecha feita de silex, proveniente do Estado da Bahia, ja publicada anteriormente aos nossos traba- thos. Podemos apenas apresentar dois exem- plares déste género O maior exemplar reproduzido na fig. 27 vem do Sul do Estado da Bahia, da érea acupada pelos indios Aimoré, sendo porém desconhecida localidade onde fol encontrado. O material, de que é fabricado, é quase transparente. Seu péso especifico indica 2,61. Ao que parece, tra- ta-se de quartzo, cér de laranja, liso e mostran- do nos lugares onde a pedra foi lascada, conca- vidades em forma de concha (110). ‘Tom as so- guintes medidas: comprimento 62 mm, largura maior 38 mm, espessura 3 a 4 mm. Exibe a mesma forma que duas pontas de flecha, uma proveniente do Estado de Séo Paulo (111) e ou- Fig. 27. Ponta de flecha pro- vvenlente do Sul do ES ‘ado da Bahia Abb. 27. Preilspitze von ‘sueden Bahia's Gio) Cte. R. Brauns, 268.200 (UD) H. von Mheving (3), 386, st 2 CARLOS OTT PRE-HISTORIA DA BAHIA 83 tra do Rio Grande do Sul (112) publieadas por ig 2. Ponta de ange de St Antonio H. von Ihering. Ladislau Neto apresenta um | exemplar semelhante, sem, porém, indicar-Ihe ahh, Le aarp ‘St. Antonio } a procedéncia (113). E recentemente foram pu. blicadas varias pontas de flechas de feitio idén- tico cu semelhantes, encontradas no Vale do Rio das Velhas (Minas Gerais) (114). A segunda ponta de flecha que apresenta- } mos na fig. 28, foi encontrada numa gruta da i caatinga de Camisio. Tem 30 mm de compri- mento, 25 mm de largura e 4 mm de espessura. B fabricada de silex. Ambos os exemplares pertencem & colecéo arqueologica do Instituto Geografico e Histérico da Bahia, sendo o primeiro registrado sob o nii- mero 180 ¢ o segundo sob 181 © mesmo tipo de pontas de flecha encon- trou-se também nas sepulturas de Fuerte Quei- ‘mado e Molino del Puesto, na Argentina (115). ‘Um exemplar de artefato indigena, repro- duzido na fig 29 e representando uma ponta de langa, & 0 tinico déste género, por ora encontra- do no Brasil. B’ da colecdo arqueolégica da Fa. culdade de Filosofia da Bahia e foi encontrada na antiga aldeia de indios de St® Anténio de Jaguaripe. Dimensées 210 mm, maior largura 85 mm, espessura 5 mm Ainda que, no séeulo XVI, esta zona tivesse (A ueditbo dorwmon atctiic cat we tam sido ocupada pelos Tupinamba e anteriormente oat ! pelos Tobajara ou Tupinaé, contudo foi uma re- ido infestada da parte do sul pelos Grem ou Fig, 28. Ponte Ge fleche de Guerem ipertencentes ao grupo lingiiistieo dos wii. a ne ven Botocudos) e do interior da Bahia pelos Sebuja, ‘Camisac ‘Maraca e Paiaia (todos trés pertencentes ao gru- Sn tiles, 0a Pa lingiistico dos Cariri). Ao que parece, deve- 13) L. Neto (1), 503 mos atribuir esta ponta de lanca a éstes tltimos, PB, Siva 28 pois & ponta de flecha, reproduzida na fig 28, = CARLOS orr vem igualmente da zona dos Paiaié, E macha- Jos de pedra, acima apresentados, fabricados pelos mesmos ou pelos Maraca, mostram que eram mestres na técnica litica, Na fig. 30 reproduzimos uma roda de fus3, feito de pedra. Encontrou-se em Remanso, nay margens do Rio Sao Francisco, Tem o diametro de 37 mm e a espessura de 2. 3 mm. O Insti- Fg, 30. Fuso de peara tuto Geografico © Histérico da Bahia, além ‘de Remanso désse exemplar (nr, 172), ainda possui outro, do Abb. 30. Steinerne Garn- Mesto feitio, embora um pouco maior, prove ‘spite von Remanso niente do Estado de Sergipe. E na mencionads colecdo da Faculdade de Filosofia da Bahia existe outro exemplar déste género, embora seja desconhecida a sua procedéncia ‘As nossas figs. 31 e 32 representam pegas so- melhantes As quais Ladislau Neto designa como eabecas de berbequim (116). © primeiro é feito de diorito bem potido e tem 0 comprimento de 5) mm, 32 de largura e 28 de espessura. O se- ode pedra undo tem 45 mm de largura e 23 mm de espee Fig, 2. Apito de ped Sura, Ambos slo perfurados até © melo, possu. indo um orificio de 6 mi. © primeira é de eo. “Shs Sian iaiio" leoio Frank Naegeli; provém do Bstedo ee hia, mas € desconhecida a localidade onde ee achou. O segundo exemplar é da coleqao an queolégica da Faculdade de Filosofia da Univer- sidade da Bahia e foi encontrado em Ituagu. © Museu do Estado da Bahia possui diversos exemplares do mesmo género, provenientes, on parte, de Amargosa O material empregado em alguns désses ar- Pig. 92, Apito de pedra fefatos, a saber, esteatite mole que se perfurava ‘de Muse Togo ao todo, se fosse cabega de berbequim, nan Abb, 92, Signal-Pteite aus Stein von Tung (6) L, Neto , 507 PRE-HISTORIA DA BAHIA 85 deixa de eriar sérias diividas sobre a afirmacéo citada de Ladislau Neto, razdo por que damos preferéneia & opinigio de H. von Ihering, tratan- do-se éstes objetos de apitos. Entretanto, pode~ mos perguntar outra vez: tratar-se-A de apitos, para o uso magico ou para a vida real? R. Kar- sten certamente defenderia a primeira hipdtese (117). Mas, enquanto nao formos melhor infar- ‘mados sdbre a mitologia dos aborigenes baianos, preferimos atribui-los a0 uso real, pois 0 exce- ente conhecedor do indio sul-amerieano Her- bert Baldus nota que nunca ouviu um indigena asobiar com os labios ou com félhas e coisas se- melhantes, ¢ sim com apitos feitos de madeira ‘ou ossos (118). E é mais fécil fabricar um apito désse género de pedra-sabao Aliiis, objetas feitos de ossos, por ora ndo se encontram nes colegées arqueolégicas da Ba hia, Mas, certamente os aborigenes baianos fa- bricaram também instrumentos € armas (como facas e pontas de flecha) de tal material, pois tais objetos foram encontrados em nfimero rela- tivamente clevado no Estado de Minas Gerais, vizinho & Bahia (119) ) Tembetis No que diz respeito a0 Estado da Bahia, H. von Ihering ja registrou trés tembetas pro- venientes de Amargosa e um de Machado Por- ‘ela (120), e Ladislau Neto (121) tornou conheci- dos diversos exemplares achados no vale do Rio (117) R. Karsten, 120, — Veja também B, Nordenskioeld (1), 268.268, aie) H. Baldus ©, 106 (119) E, silva, 29. 20) H von Thering (3), 552, 553. G2) L. Neto (1), 528, est. 8, 11 dem (2), 105-164, Fig, 38. Tembeté de Abb. 88. Lippenptioek von Pig. 34. Tembetd de tisha Abb. 84. Lippenpfock von CARLOS OTT 8. Francisco, sem indicacio, porém, das toe: dades de proveniéneta, devendo-se, por isso, tal- ver, atribuir a Minas Gerais ou a Pemambuco, sendo a Sergipe ou Alagoas. A nossa fig, 33 representa um tembeta bem elegante e sem defeito, proveniente de Con- quista. Foi fabricado de alabastro branco, cujas velas escuras sio bem visiveis, cireunstancias que the deviam ter dado valor extreordinario ‘0s olhos dos aborigenes. Suas dimensées: 41 mm de comprimento, 20 mm de largura (maior), ¢ 8 mm de diametro na parte cilindrica m diana. E’ da colecdo Frank Naegeli Bem perto de Conquista, Martius verificou a existéncia de alabastro em rachedos inteiros (122). Em outro trabalho nosso (123) publicamos um tembeta do mesmo género, proveniente do municipio de Campo Formoso, fabricado de quartzo branco e tendo as extremidades um tanto quebradas. Estes dois exemplares possuem a forma de um prego, e constituem 0 primeiro grupo da nossa classificagao. A fig. 34 reproduz um bclo tembeti verde, feito de amazonita, proveniente de Itidba. Tem 29 mm de comprimento, 15 de largura na boca e 7 mm de diémetro na parte eilindrica F da colecéo do Instituto Geografico e Histé- rico da Bahia. (122) Chr, Martius (1, 15.10; na pag. 16 aerescenta; “Esta rocha recomenda.se pela sua alvura e pureza © exporta.se om grande quantidade para Bahia, fonde com ela eseulpem Imagens de santos e 0b: Jetos semetnantes” (228) €. Ot G), prancha VI, fig, VE PRE-HISTORIA DA BAHIA Na fig, 35 ainda reproduzimos um tembeté do mesmo grupo, como a figura anterior pro- veniente de Ituacu e pertencente 4 Faculdade de Filosofia da Bahia. Tem estas dimensées: comprimento 85 mm, maior largura 20 mm. BH fabrieado de quartzo verde. E a mesma co- leedo ainda possui outras quatro fragmentos, feitos do mesmo material, sinal de que os abo- rigenes davam preferéncia & pedra verde para os tembetis Hstes duas figuras (24 e 35) representam 0 segundo grupo da nossa classifieacio (am tanto diferente da anteriormente apresentada). Estas pedras labiais possuem, mais ou menos, a forma de um dedo da mao humana. Em trabalho an- terior publicamos outro tembeti déste feitio, proveniente do municipio de Campo Formoso fabricado de amazonita (pedra verde) (124). terceiro tipo representado pelas figu- ras 36, 37 © 38. O primeiro, fabricado de quar- tzito verde, velo de Remanso’e pertence ao Ins- tituto Geogr. e Hist. da Bahia (nr. 174). Suas dimensdes: comprimento 15 mm, largura (na parte que se enfiava no labio) 25 mm, diametro da parte cilindrica 14 mm. A fig. 87 denota as seguintes dimensdes comprimento 13 mm, maior largura 26 mm, dia- metro da parte eilindrica 14 mm, Provém de ‘Tingui, municipio de Macatibas; recentemente doado & Faculdade de Filosofia da Bahia (nr. 98). BY feito de quartzo verde Ainda que o exemplar representado na fig. ‘38 termine na parte cilindrica em forma cénica, no hé razdo de atribulo a outro grupo. Fol (028) Tid. fie. Vv Fig. 35, Tembeta de Ituset Abb. 35. Lippenpflock von Fig. 36. Tembeté de Abb. 96, TLippenpfloek von 88 Fig, 88, Tembeté de ‘Aroia Abb. 38. Lippen. pllock von Arela CARLOS orfT Fig. 37. Tembetd de Macasbas Abb. 37. Lippenpflock von Macaubas encontrado na fazenda Urucu, no municipio de Areia, ¢ é fabricado de quartzo branco. Tem as seguintes dimensoes: comprimenta 25 mm, lar- gura 35 mm, diametro 15 mm. E’ do Inst. Geogr. ¢ Hist. da Bahia Estas iltimas trés figuras representam, ois, o tembeté chamado “botio labial”. “"O quarto tipo, chamado “diseo labial”, é representado pela fig. 39, proveniente do mu- nicipio de PogGes, no sul do Estado da Bahia E’ feito de quartzo verde e provivelmente foi usado por um Botocudo cujos avantajados en- feites labiais sio bem conhecides, sendo, porém, geralmente fabricados de madeira (125). Tem 85 seguintes dimensdes: comprimento 28 mm, largura 61 mm, diametro da parte cilindrica 30 mm. E’ um tembetd pesado, muito mais do que 05 outros até agora descritos, e nio se compre- ende como podia ter sido usado. Pertence & co- Jegéo do Inst. Geogr. Hist. da Bahia (nr. 178). (125) Ctr, Mf. von Wied-Neuwied, est, 17, 276.277. PRB-HISTORIA DA BAHIA Fig. 39. Tembeta de Poooes Abb, 89. Lippenpflock von Portes Ladislau Neto (126) registrou um exemplar dés- te Gltimo género, atribuido aos antigos indios de Pernambuco. ‘Demos assim quatro tipos de tembetas: 1) O que possui a forma de um prego, re- presentado pela nossa figura 33 ¢ outra publi- eada om outro trabalho 2) As figs. 34 © 35 representam o segundo tipo, parecido @ um dedo da mio humana 3) O terceiro tipo, denominado “botao la~ bial”, por ter aparéneia de um botéo, quando colocado no beigo (127), € representado pelas nossas figs. 36, 37 e 38. 4) B finalmente 0 quarto tipo, denominado “disco labial”, por ter a forma dos botoques de madeira usados pelos Botocudos, aparece na nossa fig. 39) No que diz. respeito A cdr do material em- pregado na fabricacdo das pedras labiais, vemos predominar o verde, sendo, porém, algumas brancas. Ao material usado na fabricacio dos G26) L. Neto (1), est. 8, fig. 10 27) Vide A. Métraux (1), 165. — E. Nordenskioeld GD, Abb. THe pag. 211, 89 90 CARLOS OTT tembetas, enumerado por A. Métraux (128), podemos acrescentar o alabastro branco, de que, alias, j4 deu noticia Hans Staden (129) Ainda que todos os tembetis, conhecidos até agora, sejam provenientes do interior do Estado, nao ha diivida a respeito de seu uso en- tre os Tupinamba e Tupininguim (130). Mas & provavel que os tembets feitos de pedra tives- sem sido mais usados no sertéo, onde havia abundancia do material empregade no seu fa- brico, prineipalmente da pedra verde (131) ¢, como geralmente se admite, os habitantes do litoral recebiam do sertéo os exemplares neces- sarios (132), quando nfo os faziam de ossos ou madeira. Além disso, é bem significative que Gabriel Soares, dando uma descricéo da manei- ra por que se fabricavam os tembetis, se refira aos aborigenes dy serido balano. Diz éle: “Tra- zem os beicos de baixo furados, e néles umas pedras verdes rolicas © compridas, que lavram_ devagar, rocando-as com outras pedras tanto até que as aperfeicoam & sua vontade” (133) Surge agora outra questo: qual a origem © 0 significado do tembeta? Os primeiros cronistas queriam explied-lo como enfeite (134) ou distintive de grandes 120) A. a4étraux (1), 106 (129) HE. Staden, (ed. alemé, Frankfurt a Main 1925, pig. 1 430) A. métraux (1), 168.160, 3D Ctr. Gandavo, 59. — G. Soares de Sousa, 416 (132) Cir. A. Thevet, 164 © 280, — Ivo d'Evreux, 04: 98. — Veja também Metraux (1), 277; Metraux e Hi. Plocts, 128 (188) G. Soares de Sousa, 418; cfr. também 429. (134) ‘Cir. Gandavo, 38. — G. Soares de Sousa, 317, 416 =F. Cardim 153, — Frei Vieente do Salvador, 59. PRE-HISTORIA DA BAHIA guerreiros (135). Mas estas explicagées nAo sa- tisfazem; sendo, como compreender a tenaci- dade com que os indios, mesmo depois de por muito tempo conviverem com os europeus, con- servavam 0 costume de perfurar os labios? Essa atitude mental j4 de antemao permite supor um fundamento religioso para aquéle habito Bas fontes literérias realmente se pronunciam por tal suposi¢io. Parece que no foi destituido de senso > iato de que a perfuracdo labial, e mais ainda facial, se procedia, ou ao menos terminava, en- tre muitas tribos, com a entrega do tembet verde ou de outra pedra trabalhada para és3e fim, 20 tempo da puberdade ou do casamento, pois nas tribos em que os meninas costumavam. usar 0 botoque, era éste fabricado de ossos ou madeira (126). Rnfre alguns indias, era o pajé ‘quem perfurava os labios e as faces, sendo isso considerado como uma espécie de rito de inicia cao (137) e os tembetas “os sinais da virilidede” (135) Vela_ S$. de Vasconcelos, vol. I, LXXXYVI, LXXXIIL — Dislogos das’ Grandezas do. Brasil, 280. — Ivo @'Evreu, 82. (138) Cee. Cl. a’Abbevitle, 268-260. — J. Lary, 101 "fans Staden, 148. — Veja também E Nor ‘enskioeld (D), 211 137) oulox Baro: ...en ms pretence perctrent la fevre de dessous, et les orelfles 2 un petit enfant, cet mirent, dos chevillos do bois dans les trous ‘Crest une forme de baple:me parmy eux, donnant fen cette rencontre le nome & enfant...” (286-235) "Pou de tamps apres vindrent buict_ garcons sjoliver de differents fuelllages, comme les filles, fulvis de huiet ieunee hommes robustes, qui = {ant srriver devant Yombrage faiel & Tandhuy de fuellle, de Papay, lampapés, ot Baioue, s'y ass vent, et tecevrent chacun um de ces garcons & leur col, gui sy feliolent volontairement. Tacontinent fin’ soreler ayant une broche de. bois pointue, perea la Tovre de dessous et les orellles Aces en” fonts, mettant dang Jes trous dea pierres blanches, puis Tes prit et les porta sous Yombrage, oi ils 91 92 CARLOS or? (138), razio por que grande parte dos tembetis possuia forma falica. Os que tendo atingido a idade viril nao trouxessem ésses sinais, eram tidos em pouea estima e consideragio (139), se- néo como impotentes. ‘Mas tudo isso até af aduzido fala mais em favor da signifieacao social do que sexual do tembeta. Quem nao o possuia, deixava de ser encarade como homem 0 fato relatado por H. H. Manizer ser en- io esporddieo ou nos conduzira a origem e 2 significagao primitiva do tembeté? Conta ésse autor que os Botccudos receavam depor seus otoques, temendo serem castigados por seu deus Maret-Khmakniam (Maret —o anciio) a quem atribuiam a origem de seus tembetas. E’ éle quem manda no sol e na lua, ¢ seu caracte- ristico € um pénis enorme, 6 que bem signi- ficativo (140), sendo, pois, considerado como 0 Geus da fertilidade. Seria por isso que os Boto- cudos, como também os Suid e Gamelas (141), davam a seus enfeites labiais tio dilatadas pro- orgBes? Parece que sim foram estas as tri- ecevrent da benediction du Diable, qui estoit dans la ealabasse; c'estoit 18 leur baplesme” (230- 240). — Cir. também Barlous, 252. — Maregrave, a1, 288 (4138) ©. Horckman, 204.285. — Teualmente merece ser ‘mencionado que enire algumas tribes, como of Suid © Caiapo, 0 hotoque exelusivamente Usado ppeles homens, Cir, Karl von den Steinen, 247 = G. Busenan, vol! 1, 288 (189) Cfr. E. Herckman, 223. — Vide et R, Karsten, mas (140) 1. HL. Manizer, 254, 267-270. — E posstvel que alguns dos desenhos rupestves publicsdos por Sampaio (2), estejam em relacio com ate init (oft. estempa 1, fg. 1e pag. 15, est. 2,e pag. 22) (14) Cir” Kart von den’ Steinen, 247, — G. ‘Busehan, vol. 1, 288 PRE-HISTORIA DA BAHIA bos que conservaram elementos de cultura ma- terial dos mais arcaicos. O mesmo podia ter acontecido com elementos mitolégicos ¢ reli- giosos ja desaparecidos entre outras tribos bra- sileiras, pois justamente entre os povos mais primitives € muito comum ser chamado de “aneido” 0 Deus Supremo (142). Acresce o testemunho do Pe. Bernardo de Nantes, referindo-se aos indios Cariri, aldeados nas margens do Rio S. Francisco, poueo acima da cachoeira de Paulo Afonso. Segundo 0 que explica, ésses indigenas agiientavam a dor da perfuracio dos labios e usavam o tembet para ‘obter a ajuda do seu deus Politao, na caca e na pesca (143). O tembeta nao era, pois, outra coisa senio um amulets Figs. 400 — Amuleto_batra. ‘auiforme do Stl do Bstado ‘aa Bahia Abb, 40a — Amulett in Frosch. Form (von oben und von der ‘Seite yeschen) (182) Cir. W. Schmidt, passim (149) B, de Nantes, 212: “...0 vosso antigo Deus Poli. tio, que finkels por um formosissimo mancebo, & lum’ deus fslso: euldaveis que éle tinha © poder de vos deparar com a caga, de vos fazer afortuna- ‘dos para a pescaria; nfo hi tal... Politdo vor fa. dda levar & Sua marca de boloque nos beicos, que ‘vos mandava furar com. sensiveis dozes emn sinal de’ vossa escravidio, 93 94 CARLOS oT Com isso no queremos dar como resolvida ‘a questo do principio ¢ significado do tembeta, pois néo é apenas uma propriedade dos indios brasileiros sul-americanos (144); era também conhecido, ao menos em tempos remotos, em todo o Continente americano (145). Por isso, 0 problema da origem ¢ signifieago do tembeta nao podera ser resolvido, senao, talvez, pelo es- tude da literatura ctnolégica pan-americana. €) Amuloto batraquiforme Que aos indios da Bahia no eram desco- nhecidos os amuletos, demonstra a nossa fig, 40 (a eb) que representa uma ra estilizada. Pou- ees anos faz, ainda pendia do pescoco de um. indio da area compreendida entre o Rio Pardo e © Riv de Cunlas. Certo Sr. Schramm socorrera éste indio e éle, querendo mostrar seu reconhe- cimento ao benfeitor, nao possuindo outra coisa valiosa, a seu modo de ver, tirou o amuleta do Abb. 49 — Amulett in Frosch. Guiforme do Sul do Estado da Bahia Abb. 40 — Amulett in Frosch. Form (von oben und von eer Seite eschen) (14 Cte, R. Karston, 108.115. — Nordenskioeld (2), vol. 2, 11-77. — Ploetz e Métraux. 190 (445) Ctr, G. Buschan, vol. 1, 255, 282, 287, 268, 201 SNS 892, 382, 966. 305, 80, 174,175,210, 21, 7, PRE-HISTORIA DA BAHIA poscoco ¢ Ihe entregou espontineamente. Das méos do Sr. Schramm passou a colecio do Sr Frapk Naegeli. As dimensdes déste amuleto séo as seguin- tes: comprimento 48 mm, largura 37 mm, es- pessura 14 mm, As paredes laterais esto fu- radas atrés dos olhos, (como se pode observar na fig. 40b), para ai deixar passar 0 cordao que 0 segurava ao pescoco. A béca e até as na- rinas da rA so bem elaboradas. E’ fabricado de pedra-sabao. ‘Ao que somos informados, até agora néo foi publicado um amuleto désse género provenien- te do Estado da Bahia; todos os exemplares eo- mhecides no Brasil provém do Amazonas, prin- sipalmente da regio de Santarém (146). A fi- gura da estampa 39 de Nordenskiold (147) apre- senta grande semelhanga com 0 nosso exem- plar, sendo, porém, mais estilizado 0 amuleto balano. Nao ignoramos que tais objetos, as vézes, fazem grandes peregrinagdes, 0 que, po- rém, em o nosso caso, dificilmente se poderd admitir, porque os indios da Bahia hé mais de ‘um século se acham inteiramente isolados dos indigenas de outros Estados brasileiros Entre os aborigenes baianos havia tribos de bom gésto artistico e de grande tendéncia para a estilizacio (148). Nao haveré, pois, difi- culdade em admitir que talvez um Camaca te- nha esculpido o presente amuleto (146) Ctr. B. Nordenskloeld (), pl. XXVI—IKTX. — Neto (D, est. 7, 11. iJ. Barbosa Rodrigues, vol, Test. Ie 3. — F., Spelser, 216 e est. 75, Br 7, (1g7) Vigo B. Nordenskioeld (4), pl. xxx (148) ML, de Wied.Neuwied, 416 95 96 CARLOS oTT Mas, qual seré a razio de escolher a ra como espitito protetor? Infelizmente, possuimos. ‘bem poucas informacées sdbre a mitologia da- queles aborigenes. E’ sabido, porém, que se encontram os mesmos elementos mitolégicos entre tribos separadas por distancias enormes & pertencentes a diferentes grupos lingilisticos (149), A etnologia moderna jé perdeu o médo das grandes distancias © presente amuleto parece ter sua origem no género de fébulas que tratam das armas mi- gieas. W. E. Roth relata dois mitos que inte- Fessam 0 nosso assunto: um, colhido entre os Warrau; e 0 cutro, entre os Aruacas, nos quais se conta que a rf oferecera a um homem uma fecha encantada que, atirada & toa, nunca er- rarla 0 alvo desejado, até que, um dia, o feliz possuidor revela o segrédo e, nu mesmo instan- te, desaparece a frca milagrosa (150). Os indios da Bahia, que viviam entre o Rio Pardo e 0 Rio de Contas, eram prineipslmente cacadores (151, e, por isso, Ihes havia de ser bem deseja- vel possuir uma amuleto que lhes trouxesse sorte na caga (149 Chr, Koch.Griimberg, vol, 2 298, — P. Ehren reich, passim (180) Vide Koch-Grinberg, vol. 2, 25, 293.208, — ‘Walter B. Roth, 213, 215, — Sobre o3 amuletos lusidos pelos Ashuslays na caca cfr. E. Norden iota cb, 52.58 G51) Cir. ML. de Wied-Neuwied, 360, — Martie, 121 4. B. Douville, 255-254. CERAMICA INDIGENA BAHIANA Se consideramos bem escassos os artefa- tos de pedras dos aborigenes baianos, que per- fazem algumas centenas, 0 que diremos da ce- ramnica indigena encontrada em territério baiano e conservada em colegées, se temos & disposicc' minguadas dezenas de cbjetos? Tra- ta-se de alguns vasos e de certo niimero de cs- chimbos. E desde logo notamos que é um tanto incerto o terreno que estamos a palmilhar, pois, ‘embora os artefatos de pedra acima apresenta- dos no féssem encontrados por ocasiao de esca- vacées cientificamente dirigidas, conservam seu valor e ninguém os reduziria & influéneia européia, © mesmo nic se di com a coramica, que, embora fabricada em época post-cabralina, ‘com métodos indigenas, aceitou novas formas novos desenhos até entdo desconhecidos. Esca- vando objetos de ceramica, os olhos vigilantes de geélogos e arquedlogos poderiam distinguir as diversas camadas culturais. Possuimos, po- rém, varios objetos correspondentes, encontra- dos em outros Estados brasileitos ou americanos por homens de competéncia, 0 que nos permite, embora com diversos graus de firmeza, determi nar com alguma probabilidade a origem indi kena de objetos de ceramica provenientes do territério baiano. CARLOS OTT A respeito da cerfimica das tribos indigenas que ccupavam os sertdes baianos, as informa- es fornecidas pelos viajantes so bastante es- cassas, ¢ 86 de data recente. O Principe Maxi- miliano de Wied-Neuwied nota que os Camaci, por éle encontrados na vizinhanga de Conquista, fabricavam louga com argila cinzenta (152) e Martius nos dé a mesma informacdo sobre os Camaea de 8. Pedro de Alcantara (153). A. Mé- traurx, baseando-se nestes e em outros autores, chega & seguinte concluséo: “A ceramica que encontramos entre 05 Gés orientais é de origem recente, cla ndo aparece senao entre algumas tribos, e nao sai de um certo estado primitiva, © que, melhor que qualquer argumento, prova que éstes indios estavam bem poueo familiari- zados com esta indiistria” (154). Tal conclusio de A. Métraux parece-me, porém, precipituda, pois as informagées que Ihe servem de base £0- ram quase tédas colhidas entre tribos indigenas ja em plena dissolucdo de sua vida e costumes primitives, os segredos do subsolo baiano ain- @a sao desconhecidos. Achados arqueolégicos, que poderiam lan gar nova luz para a solueéo do problema, ou nao foram feitos ou, ao que mais suponhe, nao chegaram a0 conhecimento do mundo cientifi- co. Excelente material de estudos, neste campo, forneceriam as igacabas em que, como é sabido, 05 indigenas costumavam sepultar os seus mor- tos. Mas é digna de ser mencionada a nota feita por Teodoro Sampaio a respeito disso: “Nessa regio séea”, diz éle, “onde dominaram outrora os Cariri, os Gés e outros Tapuias, as urnas (152), Wied-Neuwied, 418, 419. (458) Martius, 150. (134) H. Ploetz — A. Métroux, 171 PRE-HISTORIA DA BAHIA funerarias se deparam com freqtiéncia, as mais, das vézes quebradas, ¢ no geral, dostruides pelos que as encontraram soterradas, na falsa suposicdo de que sdo tesouros escondidos ou fei- tigos de negros fugidos. Esta idéia errénea ¢ dominante entre 0 povo do sertéo, tem muito concortido para dificultar ¢ estudo da gente pri- mitiva que dominou outrora nestas paragens” (155). © mesmo pude ou verificar no municipio de Campo Formoso ‘Tive ocasido de ver e examinar os restos de uma urna funerdria, bem perto da estrada que Jeva de Campo Formoso a Buraco d’Agua, numa fazenda chamada “Molungu”, na vizi- nhanca de Pogos. O dono da fazenda, o Sr. An- ténio Marques, teve a bondade de me acompa- nhar ao lugar onde — segundo me tinham con- tado— fora envoutrada “uma panela de indios, cheia de ossos”, como diziam os sertanejos. Foi mais ou menos em 1920, quando, um dia, cagan- do tatu, toparam com aquela igacaba. Na espe- ranca de encontrar ouro cu outros tesouros, des- pedagaram a urna funerdria, a qual, porém sé continha ossos. Quando fomos ao lugar, acha- mos ainda uns seis pedacos da urna— sem si- nais de pintura —e alguns ossos, quase petrifi- cados, que, provavelmente, foram restos do in- dio ai sepultado, Tudo isso hoje se encontra na colecdo arqueolégica da Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia. Os pedacos da urna permitem tirar a conclusdo de que se tratava de uma igacaba barriguda, ficando na abertura mais estreita e, provavelmente, bem fechada por uma tampa, pois, de outra maneira, os os- Sos nao se teriam conservado tanto tempo. O 455) 1. Sampaio (1), parte 1, 563 {amon cont 99 100 CARLOS oTr lugar onde a igacaba fora encontrada ¢ terreno arenozo, ficando no declive de uma colina de pequena elevacéo, A urna era de fabricagio grosseira, de barro cinzento, medindo a louca, mais em baixo 25-30 mm de espessura, e em. cima 20 mm. Mas isso ainda nao permite a conelusao de que os aborigenes baianos foram maus cera mistas, pois j4 possuimos alguns exemplares bem interessantes (como abaixo veremos) que, embora fiquem aquém do nivel cultural alcan- sado pela ceramica marajoara, contudo nao dei- xam de denotar certo valor artistico A uns 400-500 mts, distante daquele lugar onde féra encontrada a igacaba na fazenda “Mo- Jungu”, 0 Sr. Anténio Marques mostrou-me um buraco, alguns dias antes aberto por al guém, certamente esperando achar ai um te- souro escondide que, porém, segundo as apa- rincias, nao era outra coisa sendo uma sepul- tura de indio. © profanador do sepulero tinha deixado intacta a sua forma interna, abrindo arenas, no terreno arenoso, um buraco de uns 80 em de profundidade. Assim era facil recons- truir a sua forma primitiva. Suposto tratar-se de um sepulero, os indigenas colocaram 0 cade ver em posi¢éo acocorada, como Rugendas teve ocasido de assistir e pintar a inumagio de indio (156). Mas 0 Galaches ou Ocrem que habita- vam esta zona conservaram, ao menos essen- cialmente, 0 prinefpio antigo de isolamento en- tre o cadaver e a terra sélta, pois circundaram © corpo com lajes de 30-50 mm de grossura, fo- chando as fendas com barro cinzento amassado que se empregava na fabricacdo de vasos, for- (136) JM. Rugendas, depols da pds. 166. PRE-HISTORIA DA BAHIA mando assim uma espécie de muro em redor do compo, resguardo que ainda estava bem conser- vado. Dos pedagos de barro amassado que es- tavam junto da cova, e das partes ainda intac- tas, em cima das lajes, de um diametro de 50 mm (na colegéo arqueolégica da Faculdade de Filosofia da Bahia existem alguns fragmentos ai xecolhidos por mim), foi possivel fazer a recons- trugio de uma espécie de abdbada de barro amassado, com que os selvagens tinham eoberto a eabeca do morto. De oss0s, ndo se obervava aenhum.vestigio Esta maneira de enterrar seus mortos alias corresponde perfeitamente, nos tragos essen- ciais, & descricéo dos primeiros cronistas. A forma redonda desta cova lembra a figura 23 de Hans Staden e a descrigao de Manuel da Né- brega (157) @ Jean de Léry (158). Fernio Car- dim (159), além disso, nos informa que cobriam cabeca do morto com uma cula, para impedir gue a terra caisse sobre o cadaver, e dai, fheil- mente, podia nascer a idéia de suplantar a cuia por uma cobertura feita de barro amassado. E’ provavel que os aborigenes da caatinga grande do Rio Salitre tivessem os dois conhe- cidos modos de enterrar seus mortos, um de se- pultar em covas redondas, e outro, o chamado ‘segundo entérro”, em igacabas. O sepuleru acima descrito da fazenda “Molungu” talvez contenha os restos mortais de um india pere- cido pouco antes da partida de sua tribo nestas paragens e que, por isso, ja nao recebesse 0 “segundo entérro”, numa igacaba, pois ¢ dono 57) Nobrega, 100 (150) J. de Léry, 223 e vela a pranchs 222 (159) P. Cardi, 156 101 102 CARLOS oT? da fazenda me contou que, mais ou menos em 1915, ai passaram alguns indios meio civiliza- dos que ainda se recordavam de seus antepas- sados terem morado nessa fazenda Ao que parece, os Galaches ou Ocrem (os ‘Massacara, segundo Martius) tinham os mes- mos costumes funerdrios dos seus parentes, os Camaca. © explorader franeés J. B, Douville (160) nos refere déstes iiltimos que enterravam seus mortos na terra, deixando-os ai quatro anos; passado éste tempo, os parentes mais proximos do morto jam exumar o$ 0880s para, depois de grandes festas, sepultd-los novamente numa igacaba E’ certo que, numa regio onde, segundo a voz do povo, se encontram tantas urnas funerd- Has devem também oxistir restos de outra lou- a, fabricada pelos aborigenes. Mas, enquanto nio se fizerem grandes colecées de igabacas ¢ outros fragmentos de cerdimica primitiva, disse- minada pelos sertées baianos, téda conclusio sobre cerémica dos aborigenes destas zonas parece precipitada, Est na hora de professéras primérias receberem algumas instrugdes sdbre a organizagao de museus escolares (tanto de ob- jetrs arqueoldgicos, histéricos eomo de ciéncias naturais) para, com 0 auxilio de seus alunos, fa- zerem colecées déste género, como existem em qualquer aldeia da Alemanha. Alids, os caboclos dos sertées baianos, como tive ocasiao de observar, ainda hoje fabricam a louca pelos mesmos processos primitives que adotavam os silvieolas nos tempos pré-colom- bianos e até os nossos dias seguem nas florestas (460) J. B. Douvite, 269, 272.274 PRE-HISTORIA DA BAHIA amazonicas e, alhures, na América do Sul (161). ‘Numa antiga aldeia de indios, perto de Serrinha, chamada “Lajes dos Caboclos”, vi como as mulheres, fabricantes da louca que se vende na feira daquela cidade, nao empregam nem térno, nem forno de oleiro. Sentadas no chao, & sombra da casa, tomam uma bola de parro cinzento, anteriormente preparado pelos homens, 0 qual, bem amassado, formar o fundo do pote, recebendo logo no meio, pequena con. cavidade. Colocam éste fundo numa espécie de prato, fragmento de um pote quebrado. En- tio comecam a formar as paredes da seguinte maneira: de um pedaco de barro fazem cilin- dros compridos (com um diametro de uns 30 mm) que entdo enrolam em cima do fundo, sen- do o movimento giratério executado da direita para a esquerda. Em térno da periferia do undo do vaso, o cilindro de barro 6, ao mesmo tempo, achatado pela presséo dos dedos da mio esquerda, fazendo-a assim aderir ao fundo do vaso e as espirais entre si. Assim, as paredes vaio crescendo. As mos, de vez em quando umedecidas na Agua, fazem desaparecer as i regularidades produzidas pelas réscas, e @ sU- perficie da parede é alisada por meio de um pedaco de cabaca ou coité, Mas, apesar déste proceso primitive, conseguem fazer elegantes exemplares de talhas de uns 60 em de altura. © mesmo método é também empregado pelos fabrieantes modestos das panelas escuras, preferidas na Cidade do Salvador até hoje para cozinhar uma boa feljoada, provindas de Mara- gogipinho (Recéneavo baiano) e de quase téda (61) Ctr, C. Fr. Hartt, 69.94. — P. Ehrenceich, 19. —"Angyone Costa, 1-37 103. 104. CARLOS OTT a parte do interior da Bahia, pois a louea preta ‘ou de caboelo se encontra em qualquer feira do hinterland baiano. ste enroseamento bem patentela a sua origem na arte do trancado, pois tem-se a im- pressiio de que ai se fabriea um césto ¢ nao um vaso, Mas a juncao déstes anéis de barro é tao bem feita que a inspecéo de um casco desta Jouca nao permite determinar o proceso se- guido na fabricacéo. Depois de pronto 0 vaso, deixam-no endu- yecer na sombra, ¢ entdo, por fora, é todo pin- tado com tinta feita de taud amarelo, e, tendo Preparado assim certo niimero de vasos, passa- Se ao proceso do cozimento, que é tio primi- tivo como o observado por Gabriel Soares entre 0s Tupinamb’. Embora trabalho penoso, é igualmente executado pelas mulheres, prova- velmente por motivos supersticiosos de origem indigena, pois — segundo a narracéo de Ga- briel Soares —créem éstes indios que se cozer esta louga, outra pessoa, que no seja a que a féz ha de arrebentar no fogo” (162). © mesmo assim ainda arrebenta a metade. Em “Lajes dos Caboclos” nao conhecem, até hoje, nem forno nem coisa parecida para éste fim (néo vi ai o forno redondo ao ar livre, de ori- gem portuguésa, como o encontrei em Minas do Rio de Contas para fazer piezinhos), mas fazem, em terreno plano, simplesmente uma fo- gueira aberta e colocam a louga a ser cozida em redor dela, virando os vasos de vez.em quando Este processo demora umes duas horas, saindo vermelhos, do fogo, 08 vasos que ali tinham en- trado pintados de taud amarelo. Desenhos pro- (162) G, Soares de Souss, 379 PRE-HISTORIA DA BAHIA priamente ditos, as-ceramistas de “Lajes dos Caboclos” néo conhecem, a ndo ser algumas im- pressies digitais, feitas em cima do béjo, em forma circular, e que igualmente remonta 4 influéneia indigena, como logo veremos. Pelo contrario, na feira de Ititiba, tive oca- slo de observar vasilhame bastante bem pin- tado com taua vermelho, amarelo e branco, pre~ dominando, nos desenhos, 0 motivo serpentifor- me dos aborigenes. ‘Vemos assim que estudos arqueologicos e {oleléricos esto intimamente ligados ¢ néo se pode ocupar com um campo, desconhecendo 0 outro, elucidando os iiltimos as observacées arqueolégicas que, as vézes, ficam um tanto no eseuro Assim podemos tirar também conclusdes no campo da arte do traneado. Nas urnas fune- rérias, por ora descobertas, nao foram achados restos dessa arte, Mas © povo, até hoje, usa, por toda a parte, 0 rocd, a esteira, o abano, as pe- neiras, 0 jiqui e, no litoral, o tapiti, para s6 fa- lar dos utensilios déste género mais importan- tes que remontam a influéncia indigena. A abundancia da pindoba, do uricurizeiro e de cutras palmeiras nativas fomecia ao indio vasto material para a fabricacio de céstos, al- céfas ¢ balaios, tao ‘iteis nas colheitas de frutas ¢ tubérculos. Hans Staden (163), Georg Mare- grave von Licbstad (164) e 0 pintor holandés Eckhout (165) transmitiram-nos as reproducées de alguns objetos déste género, feitos provavel- mente por tribos tupi. Mas Maximiliano de Wied-Neuwied encontrou entre os Puri, per~ (ass) H Staden, 1 13. (168) Maregrave, 272. 185) Chr, A. Métraux (D, pl. TX 105 106 CARLOS OTT tencentes & familia dos Gés orientais, as mes- mas alcdfas que éle assim descreve: “Sao feitas de félhas verdes de palmeira entrelacadas; em baixo, na parte que se aplica as costas, tém um fundo de esteira, e, dos Iados, uma berda alta do mesmo género, sendo geralmente abertas em cima. Carregam-nas as costas por meio de uma faixa pasando pela testa, e algumas vézes, por meio de uma tira passando pelos ombros" (166). Poucos anos faz, ainda vi passar pela Avenida do Jequitaia (Cidade do Salvador) dois indios Canelas, do Maranhao, carregando os seus tras- tes num saco pendurado por uma faixa na testa. Pareciam os habitantes pré-histéricos da Bahia que tinham voltado do outro mundo para ver seu antigo habitat, Cesta semelhante viu Augusto de Saint-Hilaire entre os Coiapé na sua viagem as nascentes do Rio S. Francisco (167) © Martius nos conta dos Camacd que éles “sabiam fazer bem sacos de fibras de palmeira ¢ bélsas de caca; tingiam de vermelho todo éste material com sementes de urucu, de préto com os frutos do jenipapeiro e de amarelo com a tatajiba (Bronsonetia tinctoria, Kunth)” (168). E assim, poderiam ser citados mais outros au- tores de tempos recentes, o que, porém, 6, su- pérfluo, pois, como nota P. Ehrenreich: “A arte do trangado ccupa o primeiro lugar nas in- astrias do indio por causa do inesgotavel ma- terial que a rica natureza da Sul-América tropi- cal pbe A disposicao do selvagem; digo mais: esta parte pode servir de norma segundo a qual se medira o grau de cultura destas tribos” (169), (148) Wied-Neuwied, 111 (187) A. de Saint Hilaire, vol. 11, 121 (168) Martius, 180, — Veja também a edigso completo, vol. TY, 38. (160) P. ‘Ehrenreich, 30. — Veja também at. Schmidt ), 990-371 PRE-HISTORIA DA BAHIA ‘Mas mesmo desta arte ficaram alguns ves- tigios pré-histéricos do indio baiano, nao na forma de objetos conservados, e sim em dese- nhos rupestres que reproduzem os negativos, deixados no fundo de um vaso meio mole, re- cém-fabricado colocado em cima de uma es- teira para secar, nascendo dai motives decora- tivos bem interessantes, de que falaremos de- pois, € que se observam igualmente na arte marajoara. Passemos a descri¢do dos objetos de cera- mica, encontrados na Bahia a) Vasos indigenas © mimero de vasos inteiros ou mesmo ape- nas de fragmentos de ceramica indigena, exis- tontes nae colecées baianas, & cxtremamente reduzido. © vaso de fabricacdo muito grosseira que se reproduz em a nossa fig. 41 vem da Serra do Orobs. ‘Tem a altura de 25 cm, 0 compri- mento de 47,5 cm e a largura de 29,5 em. A Fig. 41. — Uma funerérle da Serra do Orob6 ADD, 41. — Gefass von der Serra do Orobd 107 108 CARLOS orT grossura da parede varia entre 10 a 20 mm. E fabricado de argila escura e nfo apresenta ne- nhum desenho nem impressdo digital. Bo nr. 222. da colegio do Inst. Geogr. e Hist. da Bohia. De fabrieagdo grosseira é também a urna funeraria de Morro do Chapéu (nr. 214 do Ins- tituto Geogr. e Hist. da Bahia) reproduzida na fig. 42. Em seu bajo foram encontrados assos humanos bem conservados, que se guardam no mesmo Instituto, faltando, porém, atualmente © cranio. As dimensoes desta urna funeréria séo: altura 64 em, largura maior (por fora) 66 om, diametro da béca 49 cm, grossura da parede Fig. @2. — Uma funersria do Morro do Chapéu ‘Abb, 42, —Totenure von Morro do Chapéu. PRE-HISTORIA DA BAHIA 109 Fig. 43 — Urna funerdria da Fazenda Catt ‘muniefpio do Htapieura) Abb, 4 — Totenume von der Farm Catt (Beale Tapleard) 8 mm. Possuia, provavelment melhante & que aparece na fi uma tampa se- 44. ‘Morro do Chapéu pertence & zona central da regio antigamente ocupada pelos Paiaia, ‘Mesmo no nordeste baiano, geralmente ocupado pelos Cariri, nao faltam urnas funeri- rias. A Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia recebeu recentemente da fazenda Cati (municipio do Ttapicurd) (fig, 43) wna igagaba muito parecida & anterior. ‘Tem estas dimensées: altura 54 cm, diametro (da béca) 110 CARLOS orT 44 cm, espessura da parede 10 mm. Falta o fundo da igacaba. E na mesma fazenda foram encontradas outras urnas funerdrias. Estes achados arqueoligicos nao estéo em contradicao aberta com as informagées dos cronistas a respeite dos Cariri? Roulox Baro refere que os Tapuias do Rio Grande do Norte (provavelmente do grupo lin- gitistico dos Cariri) trituravam os ossos de seus mortos, ¢, misturando éste p6 com mel e fati- nha, enguliam-no (170), E Jacob Rabbi nos re- fere coisas semelhantes, dizendo ainda que jul- gam “sinal de grande amor sepultar os amigos entre as préprias visceras” (171) Do outro lado, Luis da Camara Caseudo (172) comunieou-me terem “sido encontradas igagabas com esqueletos em plena zona de Ca- iris, Seridé e oeste do Estado (do Rio Grande do Norte) (Caratibas e Mossoré)”. Como resolver esta contradicio? Creio aue devemos contar com duas hipé- teses. Em primeiro lugar, os cronistas, tendo observado alguns easos por éles descritos, gene. ralizaram éste costume. A. segunda hipdtese seria a que diria: os Gés como os Cari, ant. gamente, ndo conheciam a fabricacio de vasos de argila aceitando-a s6 em tempos relativa- mente recentes quando entraram em contacto com 05 Tupi; mas nem tédas as tribos chega- ram a assimilar éste novo elemento cultural, razio por que nao se encontram igacabas em (170) R. Baro, 212, 250-281, 285-256 AT) Vide Maregrave, 282 (172) Lda Camara Cascude, 1. ¢ PRB-HISTORIA DA BAHIA téda a parte. Que a urna funeréria de Morro de Chapéu, reproduzida na fig. 42, nao pode yemontar a tempos muitos antigos, confirmando assim a segunda hipétese, prova-o 0 fato de nela ter sido encontrado um cachimbo tubular de madeira pouco dura, mas em perfeito estado de conservacio; devemos, pois, supor que esta uma é de tempos post-cabralinos, quando os contactos culturais entre as diversas tribos indi- genas tornaram-se mais intensos do que em épocas anteriores Aliés, houve entre algumas tribos da gran: de familia lingllistiea dos Gés, também 0 cos- tume de enterrar os mortos em céstos, os quais ‘cram cobertos por uma tampa da mesma fabri- caco, como o Major Francisco de Paulo Ribeiro refere dos ‘Timbiré (173). Em tais regiées na. turalmente também faltaré material arqueolé- gico déste género, pois tais céstos evidentemen- te ho de se conservar pouco tempo debaixo da terra brasileira, em parte nenhuma tao arenosa € to séea como os desertos africanos que servi- yam de “arquivos” seguros para pergaminhos seculares Entretanto, podemos também reproduzir um exemplar de urna funerdria, usada por in- dios Gés. E’ verdade que foi encontrada no Fs- tado do Piaui, mas nas regides limitrofes & Ba- hia, no muniejpio de S, Raimundo Nonato, re- gido antigamente ocupada pelos Guaiguai. Esta urna ainda possui a tampa tipiea, como Nor- denskioeld a encontrou entre os Chiriguano (174). No presente exemplar, reproduzido na fig. 44 observamos as seguintes dimensdes: (173) F. de Paulo Ribeiro, 195, (74) B! Nordenskicela (1), fig. 113 1h 12 CARLOS OTT altura 58 cm, diametro da parte inferior 37 em, medindo a tampa 30 em, espessura da parede 829mm. Tédas as trés urnas aqui reproduzi- das possuem forma de péra (175). Nao sabemos se estas urnas serviram para o primeiro ou para 0 segundo entérro E’ evidente que trés exemplares nfo per- mitem organizar um mapa sobre a distribuicao do modo de enterrar os mortos entre os abori- genes baianos (176); e as noticias literrias so to escassas, principalmente sdbre 0 sertio Fig. 44 — Uma fumoréria do So Ralrmundo Nonato istedo do Pieul) Abb, 44 — Totenume von Sko Raimundo Nonato (Staat Pia) (7) Cir. HE. von thering (2), 77. (276) Ainda temos notielas da exisiéncia de outras ur nas funerarlas no municipio de Itapleurd. PRE-HISTORIA DA BAHIA baiano, que s6 achados arqueolégicos represen- tam elementos positives. Mas onde encontri los? Talvez nos murundus? Desde que, por oca- sido de uma viagem na estrada Rio-Bahia a Mi- nas do Rio de Contas, em 1950, tive oportuni- dade de observar o nimero imenso de murun- dus, na maior parte de origem natural, conven- cime da dificuldade de fazer af escavacdes Seria a mesma coisa como querer meter a pa arqueolégica em qualquer parte do vasto terzi- t6rio baiano, sem informagio anterior dos mo- radares locais de terem encontrado cbjetos dés. te genero. Ja viajei muito pelo interior da Ba- hia e procurei objetos arqueolégicos em intime- ros passeios, sem jamais ter encontrado qual- quer artefato indigena no campo, em grutas ou outros lugares onde provavelmente moravam indios. Todos os artefatos liticos e fragmentos de coramica por mim oferecidos & Faculdade de Filosofia da Bahia, foram encontrados pelos camponeses quando preparavam as rocas com a enxada. 5’ verdade que ainda nio tive opor- tunidade de visitar os murundus de Amargosa, onde Cristévdo Barreto (177) encontrou muito material arqueologico. Além disso, a constru- gio de tais murundus ainda foi observada, no sul do pais, hé pouco tempo. Bscreve 1. von Thering: “Sabemos dos Corosdos que enterra- ‘vam os seus mortos, construindo um monticulo de terra sobre a sepultura que era vigiada por algum tempo; a expedicao de Mabilde encon- trou uma destas sepulturas em “Cima da Serra”, Para os caciques, os montes das sepulturas eram ‘maiores; assim assevera Rath que viu 0 do ca- cique Condé nos campos dos Guarapuavos no Parané. Segundo muitos autores, também os G77) Cir. HL, von Ihering @), 851-552. 113 414 CARLOS OTT Pig. 52 — Fragmento ae contmica de Tapuie use) Abb. 452 — Bruchstuesk fines Gefaesses von To. pula tuset) Botocudos enterravam os seus mortos da mesma maneira, e parece que éste uso era comum entre todos os Grens” (178). Nunea devemos esquecer que o niimero dos aborigenes baianos era muito reduzido, nfo se podendo comparar com a ja superpovoada Europa pré-histérica, razio por que 0s achados arqueolégicos aqui sempre sio rarissimos e se alguém afirmar o contrério, des. conto logo 80% das suas afirmagées Por ora, s6 vimos objetos de cerémica que nao apresentamn vestigios de decoracio. Possui- mos, porém, alguns exemplares déste iiltimo género ‘Mencionamos aqui primeiro (por conside- rarmos a mais antiga) a louca enfeitada com impressdes digitais, método, alls, ainda hoje. sobrevivente em Lajes dos Caboclos, perto de Serrinha, como ja observamos acima. 78) Taem @, 91. PRE-HISTORIA DA BAHIA Fig. 45 — O Fragmento fle cerkmina anterior re ‘constrsido Abb, 45 — Das vorher. ‘Sehende Bruchstuecke ‘Vervollstaendit Aqui temos um fragmento reproduzido na fig. 45 a, representando a fig. 45 b a forma pro- vavel do vaso reconstruido e a fig, 45¢ 0 dese- nho desdobrade, feito por impressées digitais, método muito propagado na América do Sul (179). Bo nr. 44 da colecdo da Faculdade de Filosofia da Bahia. Foi encontrado em Tapuia, lugar a trés léguas de distancia de Ttuagu. Tem estas dimensdes: maior largura 27 em, altura 20 em, espessura da parede 15 mm. A argila empregada é escura, misturada com pedrinhas, sem possuir por fora massa mais fina, como 0 ‘observamos em outros fragmentos de cerémica de que logo falaremos. O desenho aplicado na borda do vaso é um tanto fora do comum, no se podendo, porém, dizer que remonta & influ- éncia européia, Nao faltsm pontos de contacto com a arte marajoara, mas com os elementos inais primitives que se observam também nas camadas arcaicas das culturas andinas Em seguida temos os vasos indigenas pin- tados Aqui temos, em primeiro lugar, 0 fragmen- to reproduzido na fig. 46 cujo desenho préto meio apagado ai representamos. Eo nr. 43 da (79) HE. Baldus (), 4-5: A. Métraux (d), 289. — EB. Nordenskoela 8). 40 116 Fig. 3c — Desenho des. ‘dobrado do fraumento ‘anterior ‘Abb, 450 — Abgerolite Zeichung desselben ‘Bruchstueckes| CARLOS OTT Faculdade de Filosofia da Bahia e provém do mesmo lugar que o anterior. Dimensdes: maior largura 22 em, maior altura 17 cm, es- pessura: 15 mm. ste objeto foi fabricado com argila quase preta, de massa grosseira, mistu- rada com pedrinhas. A camada que serve de funda & pintura é mais fina, O desenho é de trago muito fino, em parte apagado, de cér es- cura, quase preta, talver feita com suco de je nipapo. Em alguns lugares encontram-se poi tos mais grossos. Por ser tao incompleto, & mais dificil, do que no exemplar anterior, pro- curar qualquer ligacéo artistica com outras reas culturais Possuimos, porém, igualmente exemplaros de vasos indigenas com desenhos executados com trés céres diferentes. Ai mencionamos primeiro uma espécie de bacia de cerdmiea, reproduzida na fig. 47 PRE-HISTORIA DA BAHIA (nr. 218 do Inst. Geogr. e Hist. da Bahia) Foi encontrada a 1 m de profundidade, na Fa- zenda Sonhem, no munieipio do Morro do Cha- péu. Tem as seguintes dimensdes: altura 14 em, comprimento 61 cm, largura 41 em, gros- sura da parede 17-30 mm. Sébre fundo ama- relo aparecom desenhos que se repetem, sendo as linhas pintadas alternativamente de verme- Iho e préto, e 0s pequenos riscos transversais, igualmente de préto. Os desenhos jé esto um tanto apagados, sem porém deixar davida quan- to & sua forma. A borda interior esta pintada com as mesmas céres. As céres empregada so tipicamente amerindias. Fig. 48 — Desenho meio spagedo de um fragmen- to de cerirmica encontra- oem Tspula Muagd) Abb. 48 — Halb erlos: hone Zeichnung, eines Bruchstlekes von Tapuia ‘atuaci CARLOS OTT Fig. 47 — Vaso indigena do Morro do Chapéu Abb. 47 — Indisnergetsess von Morro do Chapéu. Quando publiquei éste exemplar, pela pri- meira vez, ainda deixei aberta a possibitidade de contar com influéneia européia, visto que 0 fundo do vaso denota motivos semelhantes a trés ou quatro félhas ou fléres ¢ geralmente se afirma que tais motivos vegetais nao foram usa- dos pelos indios brasileiros. No entanto, como abaixo veremos, ésses motives no faltam nos desenhos rupestres brasileiros e so freqiientes na antiga cerdmica dos Chimu, de maneira que antes creic térmos que retificar um tanto esta generalizagio e admitir certas excecdes. Além disso, nas proximidades da cidade de Séo Paulo foi encontrado um vaso, tanto na pintura como na decoragdo tao semelhante a0 nosso que fica fora de divida tratar-se, em ambos os casos, de cerdmica legitimamente pré-historiea. Ba nossa fig. 48 que reproduz 0 vaso paulists, re- metido @ nés em 1945 pelo Prof. Egon Schaden, justamente por causa da semelhanca com 0 nosso entéo publicado PRE-HISTORIA DA BAHIA Fig. 48 — Voso indigena encontrado nos arredores a Cidade de S. Paulo com decoracio parecida da ‘nossa fig. 47 (Museu Ipiranga) ‘App. 48 — Fin in der Umgogond der Stadt S. Paulo fefundenes Indianergefaess mit achnlicher Linlen- Tuehrung wie dle vorhergehende Abbildung 47 ‘piranga-Museum) 119 E finalmente ainda apresentamos uma peca, extremamente preciosa, na fig. 49, pro- priedade do Museu do Estado da Bahia e pro- veniente de Jequié, onde foi encontrado, em 1931, por ocasiio de exeavacées e junto com ossos. Alids 0 Instituto Geografico e Histérico da Bahia possui, sob o nr. 183, um fragmento que pode ser parte daquele prato do Museu, pois denota o mesmo género de desenhos e pro- vém do mesmo lugar. Certo é que se trata de uns dos fragmentos de cerémica indigena mais interessantes j4 encontrados na Bahia. Parece que as linhas onduladas déste fragmento de Je- quié representam a Cobra Grande, chamada “Boiassu” no Amazonas; os pontinhos so a3 manchas caracteristicas desta serpente. A dis- tribuigdo das céres corresponde bem & Ienda da Boiassu: 0 fundo é branco, 0 desenho pintado de préto e a ornamentagdo vermelha (180). (180) PC. Tastevin, 195: “... et 1a vieille montra & jeune forme comment on faisait pour peindre les ‘poteries. lle prit de Targile blanche et en cou- Ht Tes pots d'ume couche égale. Ensuite, avec de ls 120 CARLOS OTT Karl von den Steinen chegou a conhecer no Alto Xingu um desenho semelhante que, segun- do éle, representa a cobra aquatica sucuru ou anaconda (181). aay ‘ere jaune, de Ia terre brune e du roucou, elle essing de beauye dessins tres varlés", 196:" "En. fulte elle prit du macueu, peignit en noir et ft Teluir de nombreuses calebasses, Ensuite lle fsjouta: Maintenant, mon enfant, i faut que je ven sille. Quand tu voudras peindre la poitrine fe Boyusit prendg une calabasse, descend & la ri widre, venverse Ia calabaste, dans Teau et frappe dessus A petits coups, Li-dessus, je viendral te ‘montrer me poittine ef tu pourras dessiner d'aprés Te modéle”, 182: "J'ai voulu savoir quelle état la constellation qui représentalt Boyust au firma. ment, Pour mon narrateur, Béyusi n'est pas tine constellation: c'est une tache noire dans le lel, ou plus préclsément dang la ‘vole Tactée; son corps est parsemé de petits points brilants. Sa tete Youehe aux Polsons. Il est grimpé dans le sorbier Tequel est dessiné ‘per des étoiles, ot au pied du. quel on distingue le canot de Béyusii avec se= ‘nats, Sa proua, fon gouvernall. Le corps au canot est Une “nuage demiobscur", par conséquent une portion de la vole lactée, delimilée per des {toile Karl von den Steinen, $24, prancha 20 (Tafet VI, nr. 1'da edlgio alema) — Cir. também F. Car ‘iim, B7-88; "Sueurijubs — Fota cobra é a maior, fou dss malores que ha no Brasil, assim na. gran- fleza como na formosura: tomam-se algumes ce vinte © cinco pés, e de trinta em compride, ¢ qua {ro palmos em roda. Tem uma cadela pelo lombo de notivel pintura © formosura, que comera na feabeca eactba ia cauds". — Veja tambem G. Soares de Sousa, 308. — Gandavo, 55.57. — Se- undo parece, 0 mesmo papel que representa Dolassu ou a Cobra Grande na lenda emazonense, compete & sucura no Brasil central; e como lé, Segundo @ opinigo gersl, ttdas as cobras se trans. formam em boisasu (cfr, P. C. Tastevin, 172), assim ouvi também da dca do’ povo, no’ recén- ‘avo baiano (Engenho de Baixo, perio da Madre {de Deus): Cobra nao morre de vella, mas se trans. forma em "sucuridba’”! Fig. 49 — Fragmento de ccerdmica indigena encontra. {9 por ocasiao de excavagées feitas em Jequié App. 49 — Bruchstueck e+ thes Indlanergefaesses, das bbel Ausgrabungen in Je. ‘quie gefunden wurde PRE-HISTORIA DA BAHIA b) Cachimbos de indios A maior parte de objetos de cerdmica in- digena baiana, que se guardam nos Museus pit- blicos e em colecées particulares, siio cachimbos de indjos, des quais podemos apresentar uma série bem interessante. Participam do nosso e3. tude um modélo fabricado de madeira e outro de perra, que tomamos a liberdade de scres- centar acs exemplares de argila. H. von Ihering (182) j4 publicou dois ca chimbos de argila, provenientes de Amargosa; ¢, antes déle, Ladislau Neto tornara conhecidos trés objetos do mesmo género, do Estado da Bahia, sem indicar, entretanto, as localidades em que foram encontrados (183). Jé dissemos de antem&o que devemos dis- tinguir dois tipos de cachimbos indigenas da Buhia; ao primeiro pertencem os que tém o re- cepticulo do tabaco na mesma linha horizontal que 0 tubo, podendo ser, por isso, chamado ca~ chimbo tubular, ao passo que no segundo tipo a chaminé levanta-se, mais ou menos, em Angulo reto com o tubo pelo qual se aspira o fumo, sen- do, por esta razio, chamado cachimbo triangu- lar. Fig, 50 — Cachimbo tubular de madeira encontrado ‘numa urna funevéria em Morro do Chapeu Abb, 50 — Rohrfoermige Rauchpfelte aus Holtz; sie War den Gebeinen einer Totenume in Bfors0 do ‘Chapéu beigegeben 2 sa) A. von thering (2), 858, 552 (088) L! Neto C1), 448.449, 123 124 CARLOS OTT Fig. 51 — Cachimbo tubular de argila, proveniente 40 Sul do Estado da Hahia Abb. 51 — Robrfoermige Tonpfeite vom ‘Sueden Bahia's © tipico cachimbo tubular temos diante de nos na fig. 50, feito de madeira e proveniente do Morro do Chapéu. ‘Tom 0 comprimento do 85 mmm e 25, respectivamente 14 mm de diame- tre. Segundo nos afirmaram no Instituto Geo- grafico e Histérico da Bahia (é 0 nr. 184 desta colecio), ésse cachimbo tubular foi encontrado dentro da igacaba reproduzida na nossa fig. 42 Como tipo de transi¢aéo do cachimbo tu- bular ao triangular podemos considerar o exem- plar reproduzido na fig. 51, que vem do sul do Estado da Bahia, sem trazer a indicacio exata do lugar onde foi descoberto. E’ fabricado de argila escura, Suas medidas so: comprimento 113 mm, diametro externo do receptaculo de ta- baco 42 mm, grossura das paredes 6 a 8 mm. Pertence igualmente ao Instituto Geogrifico Histérico da Bahia (nr, 189) Outro padrao bem earacteristico represen- ta a fig. 52, feito de argila preta, bem grossa, misturada com pedrinhas braneas, sendo pas- CARLOS OTT Fig. 82 — Cachimbo indigena bahlane, feito do availa Abb. 52 — Aus on hergestelite Rauehpfeife ‘eines Indianers, 125 sada, ao que parece, uma camada de argila mais, fina em redor do objeto. Visto de lado, da a impressdo perfeita de um ramo cortado e aberto por cima do né, 0 que nao deixa de produzir certo efeito artistico. A mesma imitacao per- feita de ramos d’arvore em cachimbos feitos de argila aparece em dois exemplares publicados por Ladislau Neto (184) e igualmente proveni- entes do Rstado da Bahia, sinal de que nao se trata de uma imaginaedo momentanea, mas de lum tipo mais propagado. As medidas do nosso exemplar sao as seguintes: comprimento 140 mm, altura maior de 60 mm, diametro do re- 10) tem C1, 488, 489 126 CARLOS OTT cepticulo do fumo 25 a 26 mm, profundidade do fornilho 45 mm. Infelizmente 0 objeto sé traz a indicacao vaga de “cachimbo dos indige- nas da Bahia”. E’ propriedade do Instituto Geografico e Histérico da Bahia (nr, 190). Um cachimbo, de fabricacdo muito gros: seira, reproduz a fig. 53, feito de argila amare- leda ordinaria. Bste objeto foi encontrado na fazenda Cachoeira, no municipio de Nova Laje. ‘Tem as seguintes dimensdes: comprimento 150 mm, altura 60 mm, didmetro do fornilho cilin- drico (sem contar as paredes) 35 mm, grossura das paredes 10 a 12 mm, profundidade da cha- miné 60 mm, E’ o nr. 191 da colec&o arqueol6- gica do Instituto Geografico e Histérico da Bahia A fig. 54 reproduz um exemplar magnifico de cachimbo indigena, encontrado em Jagua- Fig, 58 — Cachimbo indigens de Nova Lage Abb. 53 — Indianerpfelte von Nova Lage PRE-HISTORIA DA BAHIA quara, E’ fabricacéo de terracota fina e bem cozida. ‘Tem 0 comprimento de 130 mm, altura 82 mm, diametro do fornilho (sem paredes) na parte superior 44 mm e na inferior 23 mm, grossura das paredes 7 a 8 mm, profundidade da chaminé 77 mm. Pertence a preciosa cole- Gio do Instituto Geografico e Histérico da Ba- hia (nr, 192) © cachimbo representado na fig. 55 (nr. 405 do Museu do Estado da Bahia) possui 130 mm de comprimento, sendo a base achatada © fornilho denota um diametro de 35 mm, em cima, estreitando-se até 25 mm, na parte termi- nal. A espessura da parede da chaminé é de 8 a 12 mm, medindo esta iltima uma profundi- dade de 55 mm; esta parede tem a sua parte lateral superior um tanto fragmentada. O tubo condutor do fumo (de 15 a 25 mm de largura), Fig. 54 — Cachimbo indigena Saguaquara, ‘Abb. 84 — Indianerpteite ‘von Jaguaquara 127 128 CARLOS orr Figs. 58 © 56 — Cachimbos Tndgenas de Amargosa segundo parece, foi destinado, como nos exem- plares anteriores, a ser introduzido diretamen- tena béca. E’ fabricado de argila grossa, pouco cozida (talvez de propésito, para assim melhor ser absorvida a nicotina). O presente exemplar provém de Amargosa. Abbildungen 88.1. 38 — ne ianerpfelfen von Amargosa Outro cachimbo, igualmente encontrado em. Amargosa (nr. 407 do Museu do Estado da Ba- hia), aparece na fig. 56. E’ fabrieado de argila quase preta, misturada com pedrinhas e mica. Comprimento da base, igualmente achatada, 85 mm, altura externa da chaminé 65 mm (interna 45 mm); espessura da parede do fornilho 8 mm. tubo pelo qual se aspira o fumo 6 um pouco’ mais largo, embora menos comprido do que no exemplar anterior Um exemplar de cachimbo indigena mui Precioso, ainda que ja esteja bastante estraga- PRE-HISTORIA DA BAHIA Fig 57 — Cachimbo feito de ‘pedra-sabio, de Amargoca ‘Abb. 57 — Indiancrpteite ‘fur Speekstein von Amar- rosa do, pois é feito de pedra-sabio, aparece na nossa fig. 57 (nr, 404 do Museu do Estado da Bahia) Veio igualmente de Amargosa. Dimensdes: comprimento: 87 mm, altura 49 mm, espessura da parede da chaminé 6 mm, largura do canal 5 mm, Nao conhecemos outro cachimba indi- gena fabricado de pedra que fésse encontrado em territério baiano. Uma particularidade muito interessante observamos na fig. 58, que exibe um cachimbo de quatro bécas. Foi encontrado na fazenda Caraiba, situada a margem do Itapicuru. Se por- ventura aqui se trata tio sémente da criacéo fantistica de um fumante europeu inveterado que j4 nao se contentava mais com um s6 cha- ruto e, de uma vez, queria sorver a nicotina de quatro rolos de fumo, ou se, realmente, temos diante de nés um eachimbo indigena, s6 futuros acbados poderdo resolver. Embora com certa relutancia, decidimos, no entanto, publicé-lo, por possuir uma particularidade que se ob- serva também nas nossas figuras 63-66, 6 uma espécie de sustentéculo na base do cachimbo, as vézes furada, outras vézes néo, como acontece no presente. Ao que pa rece, antigamente sempre estavam furados ésses_cachimbos, podendo ser assim factl- mente amarrados a0 pescogo do indfgena nu 129 130 CARLOS OTT Fig. 58 — Cachimbo de quatro hécas achado no munt. ‘pio de Vila Rice ‘Abb. 58 — Vierfoche Indianerpfeite vom Bezirk Vila Tica nas suas correrias pelo mato; do outro lado, creio ser precipitada a coneluséo de que exem- plares com tal base caracteristica, mas nao fu- rada, sejam de tempos post-cabralinos. As di- menses do presente exemplar sio as seguintes: comprimento 48 mm, diametro das quatro bé- cas 12 a 14 mm, sua profundidade 17 a 18 mm, havendo no fundo comunicacéo de uma para outra chaminé, didmetro do orificio em que se introduz a taquara 10 mm. E’ da eolecéo do Instituto Geografico e Histérico da Babia (nr 188). 0 cachimbo reproduzido na fig. 59 provém de um antigo aldeamento de indios no muni’ pio de Piléo Arcado (nr. 198 do Instituto Geo- grafico e Histérico da Bahia). E? feito de argila amarela, cuidadosamente cozida, denotando de- senhos riseados com certa perfeicio e gosto Suas medidas so: comprimento 56 mm, altura PRE-HISTORIA DA BAHIA 134 Fig. 59 — Cachimbp encontrado no municipio de Pilao Arcade ‘Abb. 59 — Indianerpfelte von Bezirk Pilgo Areado 42 mm, didmetro do receptéculo do fumo (sem contar a parede) na parte superior 27 mm, na parte inferior (ande é mais oval que redondo) 15 mm, diametro do canal da fumaca por fora 14 mm e por dentro do fornilhe 6 mm. A cha- miné traz sinais de muito uso. As figs. 60.2 © 60b representam um ca- chimbo proveniente de Minas do Rio de Contas, executado em argila fina eseura, muito bem ¢o- zida e trazendo sinais de ter sido usado por mui- 0 Figs. 60a e 60 — Cachimbo Abbildungen 60a uw, 60 — proveniente de Minas do KI Indianerpfeite von Minas do ‘Contas io de Contas 132 CARLOS OTT DODM ALD. a =o Lk _ = | My DNININING : ea to tempo. E’ o nr. 409 do Museu do Estado da Bahia, Tem as seguintes dimensées: compri- mento 48 mm, altura 41 mm, espessura da pa rede do fornilho 9 2 10 mm, didmetro da cha- y ming, na parte superior, 22 mm, na pete inte te tt Wy ft Mt rior 13 mm; o canal pelo qual se aspira a fumaca ® Ww = exibe por fora 13 mm e por dentro 4mm. A parte superior do fomnilho é cingida por dois en- » w feites paralelos, trabalhados em alto relévo, sendo 0 superior um pouco mais baixo que o in-~ Sit #F a ferior, e um tanto deteriorado pelo uso. = Aes e, re = ; i ae Sem diivida, pode-se discutir, novamente, %H 2 go “ 3 aie sdbre a origem pré ou post-cabralina déstes dois 7% faa Ultimos cachimbos que acabamos de descrever, pois nem os desenhos af empregados nem 0 seu. feitio e a sua forma denotam caracteristicas ex- clusivamente indigenas. Aliés, possuimos uma colecéo de 36 exemplares de cachimbos deste género, uns usados, outros no, que foram en- % contrades na zona do Morro de Sio Paulo, Gam- bboa e Caird, em lugares perto da praia de terra Xs preta, onde, segundo a tradig&o local do povo, \ antigamente havia aldeias de indios. Na fig 61 reunimos os desenhos prineipais, riseados na argila quando ainda mole, désses cachimbos s Todos 0s motivos decorativos ai empregados Au S$ N pertencem ao género dos que se encontram por toda a parte do mundo, de maneira que nesta bese nao pode repousar nenhuma argumenta- gio sobre a sua origem. Evidentemente & pos- sivel contar com objetos de importacio, fabri- YOM cados nas olarias portuguésas. Mas nao creio : 7 Fig. 61 — Motivos decorativos emprogados em 20 cachimbos encon- que, no presente caso, devamos ir tao longe, pois ‘radios em terra preta de Morro de Sio Paulo, Gambia e Calra 10 de coméreio sem luero ‘Abb Gi—in veldben Ton elngeriere Veraierungen an einer rea irhiemn aur ettaeme -cjameuli eee Sammlung von 36 Indienerpfeifen, die in schwarzer Era rar. O indio continuava a fabricar também na funden wurden, wo nach alter Ueberlieferung Indianerdoerfer época post-cabralina o seu cachimbo, como dava adden tn dor Gegend von Morze de S. Paul, Gambia preferéncia 4 louca feita 4 maneira de seus an- — 134 CARLOS OTT cestrais, ¢ isso de tal maneira que tanto os va- sos como os cachimbos pretos, hoje em dia fa- bricados e usados pelo povo baiano, néo negam a sua origem cultural indigena, embora feitos nos nossos dias. Nao se pode tracar um limite bem determinado entre a cultura baiana pré histérica e a atual, prineipalmente no campo da cerdmica, a nfo ser nos objetos fabricados no t6rmo, como as moringas. Tento a vida como as culturas estéo em continua evolucio ¢ sofrem sempre os efeitos de novas influéncias Chegamos aos cachitbos antropomorfos, de que possuimos certo mimero de exemplares, mas néo tio grande ou de tanta semelhanca que se tivesse de contar com influéncia de cultura européia Puramente indigena é sem diivida o cachim- bo antropomorfo reproduzido nas figs. 62a ¢ 62b. Este excelente exemplar é da coleco do Sr. Frank Naegeli e foi encontrado em Minas Figs, 628 © 620 — Cachimbo antropomorfo de Minas ‘do Rio de Contas Abbildungen 62a und 62 — Anthropomorphe India- nerpfelfe von Min~= 0 Rio de Contas PRE-HISTORIA DA BAHIA do Rio de Contas. As dimensées sfo as seguin- tes: comprimento 60 mm, altura 47 mm, espes- sura da parede do fornilho 5 a 6 mm, didmetro da chaminé (parte superior) 25 mm ¢ no fundo 12 mm, largura do canal, & entrada na chaminé, 5 mm, ¢ na parte externa, onde se introduz a taquara, 10 mm. Em térno da parte posterior do canal do furo, observam-se proeminéncias paralelas aneliformes que acompanham uma s- pécie de colar, cingindo © pescoco. Na frente, aparece uma cara humana, defeituosamente ta- Thada, com a boca demasiadamente grande e 0 nariz mal terminado (no esta quebrado). No meio de ambos os labios natam-se pequenas pe- ras, ai, segundo parece, embutidas de prop6- sito (184a), pois a argila, de que é fabrieado o ea- chimbo, € muito fina, ndo deixando aparecer, em outros lugares, tais pedrinhas. Do Iébulo da orelha esquerda parece pender uma argolinha, feita de argila; mas é mais provavel que se trate ai daqueles discos de madeira usados pelos Bo- tocudos nas orelhas, pois as figuras reproduzi- das pelo Principe Maximiliano de Wied-Neu- wied (185) dio a mesma impressio. Em redor da cabeca aparece uma coroa de cabelos, imi- tando @ de um frade franciscano. Segundo t6- das as aparéncias, esta peca foi encontrada na superficie do solo, pois 0 lado direito é de cdr mais clara, apresentando ligeiras fissuras como (18a) Provivelmente para sigoitlear 0 tembetd ou os ‘tembetis, pois, segundo G, Soares (371) “outroe Suram of Beigos de cima, também com os debaixo, onde também metem pedras redondas, verdes @ Dardes”, costume éste aliés observado igualmente fm outras egies da América do Sul. (ctr. E. Nordenskioeld (2), vol. 2, 187 — Veja tam. bém Pero Vax de Caminha, 1V; Antonio Pigafetta, 10-20; Cl, a’Abbeville, 260' x, Wled-Neuwied, est. iT (185) Veje Wied-Neuwied, est. 17. CARLOS OTT Figs, 68a © 636 — Cachim. Abb. 62a @ 63 — Anthro. ‘bo antropamorto de pomerphe “Rauchpeile von ‘Maseacar “aiassacer se tivesse sido exposta a influéneia deletéria do sol e da chuva, a0 passo que o lado esquerdo, em contacto com a terra, denota uma cdr mais escura (pardo-cinzento). E feito de argila bem cozida, o que contribuiu para conservé-lo em perfeito estado As figs. 63 e 63 b representam outro ea- chimbo antropomorfo encontrado em o nordes- te da Bahia, em Massacard, antigo aldeamento indigena. E’ fabricado de argila pardo-cinzenta, tendo na frente uma fisionomia humana bas- tante bem trabalhada, em alto-relévo, denotan- do, como as figuras 62 e 64, um nariz achatado que, segundo parece, correspondia ao ideal de beleza dos fabricantes (186). De cada lado do rosto observam-se estrelinhas (187) e outros en- feites pouco visiveis, que talvez sejam os nais caracteristicos empregados pelos oleiros nas suas pinturas corporais. Sob o pescoco nota- se um apéndice, que traz um orificio na parte central, talvez para a{ deixarem pender algum enfeite, como costumavam fazer os indios norte, (188) ©. aAbboville, 2627-2620 diz; “Pour le regard de ce quis ont ordinairement le nez camart, cela provient dela’ matrone qui leur enfonee ‘et le Torme ainst dés quile sont nouveau nals..." 28D Ctr. Martius 2), vol. 1, 382-888, «iz dos Coroa dos: “Auf den Wangen pilegen sie zur Zierde ein Slemchen oder Kreuzchen elazusstzen”, PRE-HISTORIA DA BAHIA americanos (188) ou, para depois de usado, pen- duré-lo ao pescoco (189), As dimensdes do pre- sente exemplar sfo as seguintes: comprimento 45 mm, altura 37 mm, didmetro do fomnilho (sem contar a parede) 28 mm, em cima, estrei- tando-se entdo, para baixo, em forma cénica © canal pelo qual se suga o fumo é bastante largo, denotando por fora um diametro de 10 mm e, dentro do fornilho, de 5 mm. A cha- miné preta mostra que foi usada. Parece que foi achado em campo aberto, como o exemplar anterior, pois o lado direito exibe uma cér par- do amarclada, a0 passo que a parte esquerda & de um amarelo mais claro. E’o nr. 195 do Ins- tituto Geogrifico € Histérico da Bahia. Possuimos um cachimbo quase igual ao re- produzido na figura anterior, achado na Vila de Sio Francisco, denotando a mesma cara enfei- tada, porém, com uma s6 estrelinha ou coisa pa- recida na face esquerda, faltando, porém, os enfeites como aparecem no pescoco da fig. 63 b Exibe 0 mesmo sustenticulo furado, como o exemplar anterior, natando-se igualmente a falta das orelhas. E 0 Sr. Menandro Rutten, além dos 36 exemplares, acima mencionados, trouxe-nos também dois eachimbos déste géne- ro dos antigos aldeamentos de indios da zona de Caira, senda num, pelo uso, 0 rosto jé pouco visivel, a0 passo que no cutro ainda aparecem todos os detalhes e enfeites, embora um pouco diferentes dos empregados nos exemplares ja descritos, mas possuindo uma espécie de cocar na testa. (aa) Cfo. Hi. Beuchat, 197, 138 (120) B. Nordenskield @), vol. 2, 98, reproduz um ea chimbo dos. Chiriguanos ‘com uma. proeminéneia furada na frente do fornllho para al passar 0 dedo. t37

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