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A linguagem e a estruturação da sujeito pela mão de Alice

Lia Silveira

Gostaria de agradecer ao Aleph pelo convite ao Fórum do Campo Lacaniano de


Fortaleza por esta oportunidade de estar aqui hoje falando com vocês. Tivemos uma
reunião para saber quem poderia vir representando o fórum e o tema dessa mesa me
instigou a aceitar a proposta, pois tem afinidade com algo que já venho trabalhando há
algum tempo no seminário que sustento lá no Campo Lacaniano. Então é sempre mais
uma oportunidade de aplicar na escrita aquilo que desenvolvemos pela fala.

E é a um outro escrito que recorro para articular o que pretendo falar hoje. Um escrito
que em julho de 2015 estará completando 150 anos. Refiro-me à Alice de Lewis
Carroll, personagem de seus dois textos mais conhecidos: “Aventuras de Alice no país
das Maravilhas” e “Através do espelho e o que Alice encontrou por lá”.

Charles Lutwidge Dodgson, nasceu na Inglaterra em janeiro de 1832 e morreu em 14


de janeiro de 1898. Lewis Carroll, como ficou mais conhecido, foi pastor, professor,
lógico e matemático. Dizem que suas aulas eram monótonas e chatas e que na
matemática não deixou grandes contribuições. Como escritor, no entanto, fascinou e
continua a fascinar gerações e gerações de crianças e adultos que se encantam com
suas obras. Talvez porque tenha sido na literatura que ele pôde conjugar a lógica
(através dos jogos de linguagem e problemas semânticos) àquilo que lhe causava
paixão (objeto que toca o mal-estar e o júbilo singular e que para ele encarnava-se na
menina). Como diz Lacan, “é claramente da conjuração das duas posições que nasce
que brota essa maravilha ainda indecifrada, e para sempre deslumbrante: sua obra”
(Homenagem à Lewis Carroll, p. 09)

Alice, personagem principal desses dois textos, é essa menina curiosa e inventiva que
se interroga sobre o mundo e sobre assuntos um tanto complexos: sua identidade, o
corpo, o tempo, a alteridade. Temas que também interessaram bastante à psicanálise,
diga-se de passagem.

Seja caindo num poço, seja atravessando o espelho, Alice cai em uma outra dimensão
espaço-tempo, onde as leis da consciência não garantem mais a lógica da significação.
A lógica da significação, sabemos desde Lacan, é a lógica fálica, já que o falo é o
“significante destinado a designar em seu conjunto os efeitos de significado, na
medida em que o significante os condiciona por seus efeitos de significante.”
(Significação do falo, p.687)

O que Carroll promove com Alice, então, é uma desmontagem da lógica fálica,
revelando o nonsense que permanece velado por toda significação, mas que ao mesmo
tempo funciona como ponto de onde pode advir toda a criação. Ponto que ancora a
inexistência da relação sexual, a impossibilidade de fazer dois com o um.

Assim, nosso objetivo neste texto vai ser, recorrendo ao artista, tentar dizer um pouco
mais sobre essa articulação entre o significante e aquilo no que ele vem incidir, que
tem como consequência o advento do sujeito.

“Insetos não me agradam”, Alice explicou, “porque tenho


bastante medo deles... pelo menos dos grandes. Mas posso lhe
dizer os nomes de alguns.”

“Claro que eles atendem pelo nome, não é?” o Mosquito


comentou irrefletidamente.

“Nunca soube que o fizessem.”

“De que serve eles terem nomes”, disse o Mosquito, “se não
atendem por eles?”

“Não servem de nada para eles”, disse Alice, “mas é útil


para as pessoas que lhes dão nomes, suponho. Senão, para
que afinal as coisas têm nome?” (Alice Através do Espelho,
p195)

Para que afinal as coisas tem nome? Retomamos a pergunta de Alice, que,
como pergunta infantil aponta sempre para algo radical, que nos remete à questão
sobre a origem, ao “criançamento” das palavras, lá onde elas ainda urinam na perna,
diz Manoel de Barros.

A psicanálise nasce de uma questão também acerca das palavras. Através do


método da associação livre, Freud, não sem a ajuda de suas pacientes, descobre que,
pela fala alguma coisa se limpava, desentupia, caía. Freud chega a apontar que para
um leigo parece até que se trata de uma mágica! Palavras, palavras, palavras...como
diz o personagem shakespeariano.

Com Lacan, vamos perceber que essa relação entre a linguagem e aquilo sobre
o que ela incide segue uma lógica, uma lógica que, diferente daquela regida pelo
significado que ordena os pensamentos conscientes, parte da incidência do
significante. Assim como nas dimensões fantásticas para as quais Alice se transporta,
o que vai importar no inconsciente é a besteira do significante, sua babaquice, que
aponta também para o sem significante do órgão feminino.

No diálogo nonsense que Alice estabelece com o mosquito, ela lhe dá a lista
de insetos que existem de onde ela vem e ele lhe retruca com os exemplos de insetos
que existem através do espelho. É impossível não rir frente ao sentido criado
simplesmente pelo efeito metonímico da passagem de uma significante a outro.

Alice diz, bom, temos as moscas (horse-fly). Certo diz o mosquito, bem ali
naquele arbusto você vai ver uma horse-fly. Não sossega, passa o dia se balançando
de galho em galho. E o mosquito prossegue, rastejando aos seus pés você pode “Você
pode observar uma borboleteiga (butterfly). Suas asas são fatias finas de pão com
manteiga, o corpo é de casca de pão, a cabeça é um torrão de açúcar. E o que ela
come? (pergunta Alice). Chá fraco com creme.” (p. 196-197)

Assim como em nossos sonhos, elementos podem se combinar criando seres


estranhos, a partir, não de seu significado, um inseto, colorido, que voa, por exemplo,
mas a partir de associações significantes, manteiga, pão, chá, creme. O que vai
interessar ao inconsciente está relacionado à uma outra cena.
Como diz Alice, há toda uma lógica diferente para além do espelho, onde as coisas
mudam de lugar. Em Através do espelho encontramos também o mais famoso poema
nonsense da literatura, o Jaberwocky (ou Pargarávio, como foi traduzido no
português), que apesar de não ter sentido algum, produz um efeito de significação:
“Solumbrava, e os lubriciosos touvos

Em vertigiros persondavam as verdentes;

Trisciturnos calavam-se os gaiolouvos

E os porverdidos estriguilavam fientes.”


Efeito este que aponta para um impossível, ou na fala de Alice: “De todo modo,
alguém matou alguma coisa: isto está claro, pelo menos.”

Entre a linguagem e a morte, desde Freud temos que considerar que há, de
saída, uma divisão estrutural do sujeito, acarretada pela entrada deste na cultura, ou
em termos lacanianos, pela entrada na linguagem. Este sujeito, não existe desde o
início. Ele se estrutura incialmente se alienando ao outro materno, aos seus cuidados,
seu toque e suas palavras.

Em Freud, temos na experiência primordial de satisfação algo que poderíamos


considerar o momento mítico de constituição do sujeito. A sensação de fome que
inerva a parede do estômago faz com que o bebê emita um grito, grito este que vai ser
tomado pelo outro, nebemensch, como um apelo. Esse outro comparece então com o
seio que vai proporcionar a primeira experiência de satisfação. Dessa experiência,
resta um traço que vai se inscrever e que vai ser “ativado” da próxima vez que a fome
se apresentar. O outro lado da moeda dessa experiência é que, concomitante à
inscrição do traço como afirmação (bejahung) temos a expulsão (austossung) de algo
que vai ser rejeitado como estranho. O complexo do nebemensch se divide agora “em
dois componentes, dos quais um produz uma impressão por sua estrutura constante e
permanece unido como uma coisa, enquanto o outro pode ser compreendido por meio
da atividade de memória – isto é, pode ser rastreado até as informações sobre o
próprio corpo [do sujeito].”(Freud, projeto, p. 448)
Temos então a situação em que agora, o bebê não mais espera a intervenção do Outro,
mas busca satisfazer-se investindo esse traço mnêmico, ou seja, alucinando. No
entanto, o objeto alucinado que o bebê investe não se sustenta como experiência de
satisfação já que não existe na realidade. Mais uma vez ele chora, mais uma vez o
outro comparece com o seio. Só que agora já se instalou aí uma diferença abissal
entre o que ficou registrado como traço e o que se encontra na realidade como objeto,
sempre insatisfatório, sempre deixando “a desejar”.
Mas a relação mãe – filho já se coloca desde o início como triádica, tendo em visto
que o falo já se coloca ai como terceiro elemento. Na subjetividade da mãe, o filho
que vem ao mundo é tomado como substituto fálico e, pelo menos parcialmente,
ocupa no desejo da mãe esse lugar. Temos então a situação em que o bebê é tomado
no “engodo cooptativo” que o faz identificar-se ao falo imaginário materno. No
entanto, como diz Lacan, a noção de falicismo implica por si mesma o
desprendimento da categoria de imaginário, pois é por uma espécie de reviramento
que ele passa a ocupar o seu lugar na dialética subjetiva, não enquanto órgão real, mas
enquanto significante.
Isso porque o de que se trata aqui não é do órgão real, mas do falo da mãe, aquele que
só é descoberto enquanto faltando em seu lugar, no lugar em que era esperado, e essa
é a própria definição de significante já que ele não é outra coisa senão “o símbolo de
uma ausência”. (carta roubada , p.27)
É assim que, por um movimento que se inicia com as presenças-ausências da mãe, a
criança vai se dando conta de sua incompletude.
Em meio a sua trajetória , Alice se depara com a necessidade de atravessar
um bosque escuro e sombrio , que lhe causava medo. Era o “bosque em
que as coisas não tem nome” e bastou entrar lá para que se esquecesse de
todos, inclusive do seu próprio.

Vimos que o movimento do desejo vai ser o de tentar reencontrar o objeto perdido.
Mas essa tentativa só pode se dar através da única via possível, aquela da demanda. A
demanda implica em colocar aquilo que se apresenta como necessidade nas trilhas do
significante, dirigindo-as ao outro. (figura 01) Estamos no domínio da reivindicação,
onde espera-se que o Outro possa responder. Mas, no horizonte, o que se espera que o
Outro responda é, não pelo objeto da demanda, mas pelo objeto do desejo, aquele
perdido e que se busca reencontrar. (figura 2) O desejo é exatamente aquilo que surge
nessa “margem onde a demanda se rasga da necessidade”(Lacan, subversão, p. 828)
A frustração, é, para Lacan, a versagung, quebra da promessa, onde o Outro não
responde. Não responde, claro, porque do desejo ele também nada sabe. Mas o
neurótico é aquele que não se conforma com que o Outro não saiba. (sem IX, p. 215)
Uma das consequências da frustração assim experimentada, é que o sujeito vai tomar
o desejo enigmático do Outro como integrante do circuito das demandas, e vai fazer
do seu próprio desejo uma demanda no Outro. (figura03) No Seminário “A
identificação”, Lacan recorre a dois toros que se entrelaçam para demonstrar essa
relação que ocorre a partir de uma inversão: desejo num, demanda no outro; demanda
de um, desejo do outro, que é o nó onde se atravanca toda a dialética da frustração. A
segunda consequência é que esse vazio que corresponde ao desejo do outro, vai, em
parte, ser reduzido a um significante, o falo, que passa a ser agora “o objeto
metonímico de todas as demandas”. (Sem IX, p.200)
Nesse lacuna que se abre, marcada pela falta no Outro é que o sujeito vai
passar a se perguntar sobre o desejo: o que esse outro quer? E mais, o que ele quer de
mim? É frente a esse pergunta feita ao Outro que o sujeito vai se escrever como
resposta.

"Quem é você?", perguntou a Lagarta.


Não era uma maneira encorajadora de iniciar uma conversa.
Alice retrucou, bastante timidamente: "Eu - eu não sei muito
bem, Senhora, no presente momento - pelo menos eu sei quem
eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho
mudado muitas vezes desde então.
"O que você quer dizer com isso?", perguntou a Lagarta
severamente. "Explique-se!"
"Eu não posso explicar-me, eu receio, Senhora", respondeu
Alice, "porque eu não sou eu mesma, vê?"

Na neurose, é sobre esse movimento que a operação da castração vem incidir para,
fazendo atravessar-se ai o registro da Lei, que irá permitir com que o sujeito escape à
essa relação de engodo. Ela implica em que a demanda do Outro seja tomada como
desejo pelo sujeito, e essa demanda, Lacan a explicita, se formula assim: “tu não
desejarás aquela que foi o meu desejo.” Isso tem uma função de corte. É isso que o
mito do Édipo vem a ocupar, sendo necessário que, doravante, seja o pai morto quem
venha desempenhar essa função de Lei, que permite o advento do desejo.
O neurótico, ao se defrontar com a falta, com o impossível de dizer, recorre ao
pai para interditar aquilo que supõe correr o risco de gozar. No entanto, é essa própria
impossibilidade que impõe a criação do mito do pai gozador, seu assassinato e
consequente instauração do pai simbólico. Todo o mito é construído, afirma Lacan,
para velar essa falha, fazendo com que aquilo que era impossível, surja como
interditado.

É por isso que o Outro enquanto coisa interditada e o Outro enquanto Lei são a
mesma coisa, porque o Outro só existe enquanto efeito de linguagem e é por uma
operação de metáfora que ele constitui ao mesmo tempo, a coisa interditada e a lei a
que a interdita. (figura04)

. "Cuidado, ó filho, com o Pargarávio prisco!


Os dentes que mordem, as garras que fincam!
Evita o pássaro Júbaro e foge qual corisco
Do frumioso Capturandam."

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