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O BORDADO COMO REPRESENTAÇÃO SIMBÓLICA NO ATENDIMENTO


ARTETERAPÊUTICO

Erika Luiza da Fonseca1

RESUMO

Este trabalho tem o objetivo de apresentar ao leitor apossibilidade de utilizar o bordado


como recurso para representação simbólica no atendimento arteterapêutico. Sobressai
nesta pesquisa a possibilidade de associar as etapas da construção do bordado à
subjetividade de quem borda, e como resultado sugerimos que o indivíduo que vivencia
o atendimento arteterapêutico através do bordado, poderá revisitar os conflitos de sua
história ressignificando-os e, assim, observar que, cada etapa de sua construção é parte
essencial no processo de autoconhecimento e transformação.
Palavras-chave: Arteterapia, bordado, símbolo.

ABSTRACT

1
Erika Luiza da Fonseca é professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental I pela Prefeitura
Municipal de São Paulo. Licenciaturas plenas em Pedagogia pela Universidade de Santo Amaro e Letras
Português /Inglês pela Faculdade Interlagos de Educação e Cultura. e-mail: erikalfonseca@ig.com.br.

ARTEREVISTA, n. 5, jan./jun. 2015, p. 43-56


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This work aims to present the reader with the possibility to use embroidery as a resource
for symbolic representation in arteterapêutico. Stands out in this research the possibility
of associating the steps of construction of the embroidery on the edge of subjectivity,
and as a result we suggest that the individual who experiences the arteterapêutico
service through embroidery, you can revisit the conflicts of their history redefines them
and so, note that each step of its construction is an essential part in the process of self-
discovery and transformation.
Keywords: art therapy, embroidery, symbol.

1. PRIMEIRAS LINHAS

O trabalho manual é uma produção que aparece na sociedade desde os tempos


do homem primitivo. O ato de tecer, bordar ou costurar surgiu da necessidade humana
de se proteger, manter a espécie, e aos poucos foi associado à economia e a
representação artística.

O trabalho com bordado redimensiona a distribuição do tempo, a dedicação e a


minuciosidade do ato favorecem a introspecção que é necessária para o contato com o
subjetivo. As linhas e agulhas, unidas à produção manual formam uma trama,
desembaraçam e organizam ideias à medida que possibilitam a representação de um
objeto, de um símbolo.

(...) há um elo entre as mãos e o cérebro. Quando, por exemplo,


rezamos um terço, quando temos as mãos ocupadas em um trabalho
manual, quando temos alguma coisa entre nossas mãos, nosso mental,
nossa psique, se acalma (LELOUP, 2012, p.124).

Com as linhas e agulhas se pode aprendera planejar, selecionar, escolher,


imaginar e construir um objeto. Ao unir esses elementos a um objetivo simbólico se cria
o novo, algo que é íntimo e particular e, que por essa condição, pode ser revisto e
liberto.

O espaço de transformação entre o tecido, as linhas, agulhas e a pessoa que


borda é abstrato e, ao mesmo tempo, torna-se concreto pela ação do indivíduo que se
torna o agente transformador.

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DINIZ afirma que “Ao criar uma obra, estabeleço uma relação extrapsíquica
com esse objeto e, simultaneamente, uma relação intrapsíquica com o conteúdo que a
originou (...).”( 2009, p. 34)

Essas observações podem se relacionar com o complexo conceito de


representação simbólica que Carl Gustav Jung nos apresenta. O símbolo representa a
união de diferentes arquétipos que constituem o inconsciente, para Jung o indivíduo é
constituído da união do inconsciente e do consciente, que se inter-relacionam formando
o Self “(...) essa personalidade inata que vamos desvendando ao longo da vida e que
abriga a totalidade da vida passada e a essência para vida futura.” ( MONTEIRO, 2009,
p. 14)

Nessa perspectiva, este trabalho tem como desafiorefletir sobre o ato de bordar
comouma possibilidade de concretizar um símbolo tendo como metodologia de
pesquisa a revisão bibliográfica. Desse modo, esta pesquisa não se restringe à
apresentação de uma técnica manual, mas em algo que representa uma criação repleta
de subjetividade que pode ser utilizada com eficácia no atendimento arteterapêutico.

2. AS MÃOS QUE CONSTROEM

O trabalho manual tem seus primeiros registros datados de 12.000 anos. Na Era
Neolítica, os primeiros homens usavam o princípio da tecelagem entrelaçando pequenos
galhos e ramos para construir barreiras, escudos e cestas. Os pássaros construindo seus
ninhos e as aranhas suas teias serviram como fonte de inspiração para o homem que, a
partir da observação, criou uma técnica semelhante para construir objetos necessários a
sua sobrevivência.

Com o progresso das técnicas de cultivo e com a apropriação dos trabalhos


manuais os homens primitivos descobriram que as fibras vegetais como o linho
poderiam ser utilizadas para união de peças, facilitando a construção das roupas que
eram feitas com peles de animais e, assim, a tecelagem caracterizou-se como uma
atividade importante para a vida social deste período.

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Segundo Batt (2010) o linho foi provavelmente a primeira fibra vegetal


utilizada na fabricação de um tecido. Ele foi utilizado no túmulo dos egípcios e em
citações de trechos do Antigo Testamento indicando pureza e uma vestimenta sagrada:
“Farão o efod2 com ouro, púrpura roxa e púrpura vermelha, carmesim brilhante e linho
retorcido – obra de artista”.(Bíblia católica. Livro do Êxodo. Capítulo 28, versículo 6)

Sucedendo o linho, o algodão, conhecido antigamente como “lã de árvore” se


tornou a fibra mais utilizada no mundo. Referências históricas apontam seu cultivo
desde a antiguidade com os egípcios, incas e outras civilizações, mas os árabes são
responsabilizados pela sua expansão comercial. No Brasil, no início da colonização em
1.500 já havia diferentes espécies de algodão cultivadas pelos indígenas que aqui
viviam e já sabiam fiá-los e produzir tecidos.

Há uma lenda indígena, inclusive, no folclore nordestino, segundo a


qual, nos tempos da criação do mundo, os índios eram muito
atrasados, não sabiam criar os animais e, tampouco, cultivar a terra.
Eles ficavam no alto das árvores, ou em cavernas, para se proteger dos
animais ferozes. Foi, então, que surgiu um grande chefe sábio -
chamado Sacaibu - que os levou para um lugar onde havia caça. Lá, os
índios construíram suas malocas. O sagrado deus Tupã deu uma
semente a Sacaibu e pediu-lhe que a plantasse. Ele obedeceu ao
grande Mestre e ficou esperando sua germinação. Quando a planta se
desenvolveu, Sacaibu observou que, das suas flores, saíam tufos
brancos, que os indígenas teceram e fizeram cordas. Por intermédio
destas cordas, desceram um abismo e descobriram um povo de muita
cultura, que lhes ensinou a viver melhor, a cultivar a terra,os animais,
a fazer utensílios variados e a tecer as roupas, com o produto da
semente ofertada por Tupã: o algodão.(VAINSENCHER, 2014, p.1)

O trabalho manual com características artesanais utilizando fibras ou fios


vegetais vem de tempos tão remotos como o descobrimento do linho e do algodão. Fiar
e tecer são afazeres universais praticados em diferentes culturas e civilizações e as
mulheres, ao longo desse processo histórico de descobrimento, tornaram-se as
responsáveis por essa atividade. Fiando e tecendo as mulheres criaram tecidos para
vestimentas, utensílios para uso doméstico e outros objetos para a comercialização das
sociedades em que viviam, e essa prática tornou-se uma atividade necessária e
indispensável para economia da época.

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Efod: vestimenta sacerdotal

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De acordo com Machado (2003),

esse processo reforçou também as comunidades femininas de


mulheres que passavam o dia reunidas, tecendo juntas, separadas dos
homens, contando histórias, propondo adivinhas, brincando com a
linguagem, narrando e explorando as palavras, com o poder sobre sua
própria produtividade e autonomia de criação” (MACHADO,2003, p.
10) .

Essas vivências fazem parte de um histórico que fundamenta todas as


experiências que surgiram nos milênios, séculos e anos seguintes e que também compõe
o inconsciente coletivo de diferentes grupos sociais.

Com o aumento da demanda social a produção artesanal passou por um processo


de mecanização, daí surgiram os primeiros teares mecânicos que foram os antecessores
das máquinas e fábricas têxteis, porém a vivência e a experimentação da produção
artesanal na tecelagem e no bordado ficaram no inconsciente coletivo de diferentes
culturas e de forma atemporal através dos mitos, da literatura, das músicas e das mais
variadas representações artísticas.

3. O PANO DE FUNDO QUE PERMEIA A HISTÓRIA DO INDIVÍDUO

Diversos estudos apontam que a palavra e a imagem são associadas ao


desenvolvimento do homem e seu fazer histórico e cultural possibilitando que o
indivíduo se comunique e perceba aquilo que é explícito ou não. Na palavra e na
imagem temos um símbolo. Na palavra, que pode ser escrita ou falada, temos a
comunicação que atinge um grande número de pessoas e nas imagens o símbolo atua
como instrumento de comunicação. Ambos, palavra e imagem, permitem que o homem
expresse suas angústias, medos, anseios, alegrias e diferentes impressões e sentimentos
em relação a si mesmo e à sociedade, contudo, parte dessa complexidade de expressões
não é traduzida por essa forma de comunicação, e diante disso, a produção artística –
antecessora da escrita – desempenha um papel fundamental para a apresentação desses
conteúdos não ditos ou falados.

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Na palavra temos uma forma de expressão variante, na imagem uma forma


simbólica que aproxima das experiências anteriores, da vivência individual, por isso as
diferentes expressões artísticas são tão importantes para a humanidade. A imagem
representada num símbolo é atemporal e por essa condição atinge a alma, o que cada ser
tem de individual, o que nos diferencia e aproxima, a unidade humana.“A arte
possibilita tornar visível o que é invisível.”(DINIZ, 2009, p. 22); por isso, é tão eficaz
no processo da busca da identidade, da valorização dos sentimentos, das impressões e
expressões para a sociedade, em qualquer época histórica e em qualquer cultura.

3.1 Jung: o pesquisador da integridade humana

Carl Gustav Jung, psiquiatra e psicanalista suíço, fundador da escola analítica de


psicologia, a partir da década de 20, baseou suas pesquisas na constituição da
personalidade do indivíduo, ou seja, a psique.

Segundo Jung (1987), a psique abrange dois níveis: consciente e inconsciente. O


consciente está diretamente ligado à história do indivíduo, são os pensamentos, as
palavras, as lembranças, os gestos, as fantasias, as imagens possíveis de serem
lembradas com facilidade. É o consciente que atua na vida diária da convivência social,
abriga as condições para as relações sociais se manterem, estabilizando o indivíduo no
mundo e para o mundo que o cerca.

O inconsciente abriga tudo aquilo que é instintivo, potencialidades criativas e


artísticas, é a essência que nos irmana já que nascemos com conteúdos herdados de
nossos ancestrais.

O consciente e o inconsciente se comunicam o tempo todo, diretamente ou não.


A cada experiência vivida a psique é “alimentada” e transformada, dando ao homem a
capacidade de se relacionar em diferentes situações e com diferentes pessoas.
Respondemos conscientemente ou inconscientemente às situações que nos chegam
porque temos uma herança psicológica, emocional e social que nos orienta. Parte dessa
herança é arquivada no inconsciente, e parte é organizada e reorganizada através do
meio em que vivemos e das relações que estabelecemos.

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Na medida em que os cérebros humanos são uniformemente


diferenciados, (...) a função mental possibilitada é coletiva e universal.
Assim é que se explica o fato de que os processos inconscientes dos
povos e das raças, separados no tempo e no espaço, apresentam uma
correspondência impressionante, que se manifesta entre outras coisas,
pela semelhança fartamente confirmada de temas e formas mitológicas
autóctones.(JUNG, 1987, p. 22)

Ao nascer, a criança já tem atribuída inconscientemente uma série de


informações que pertencem a sua família e às pessoas que estão diretamente ou
indiretamente ligadas à ela. Através das relações que esta estabelecerá ao longo de sua
vida, essas informações poderão modificar-se, transformar-se, solidificar-se e perpetuar-
se em seus sucessores.

3.1.1 Inconsciente pessoal e inconsciente coletivo

Na psicologia junguiana o inconsciente é subdivido em inconsciente pessoal e


inconsciente coletivo. O inconsciente pessoal abrange camadas mais superficiais do
inconsciente, é formado pelas experiências que o indivíduo tem ao longo da vida e que,
por algum motivo, são armazenadas e resgatadas em situações semelhantes às
experiências vividas. Funciona como um arquivo pessoal, que tem registros
significativos e subjetivos.

Para Jung (1987, p. 22) “do mesmo modo que o indivíduo não é apenas um ser
singular e separado, mas também um ser social, a psique humana também não é algo
isolado e totalmente individual, mas também um fenômeno coletivo”.

O inconsciente coletivo é algo mais amplo, um conjunto de experiências que


tem o registro primitivo da humanidade, algo comum em todo o ser independente da
cultura, da raça, do tempo e do espaço físico. No inconsciente coletivo encontra-se o
self , “uma fonte inesgotável de energia” (SILVEIRA, 1997,p.68) que é impregnada de
simbolismo milenar.

No nível do inconsciente coletivo, encontram-se os instintos e


arquétipos – formas estruturantes comuns a toda espécie humana,
padrões de comportamentos coletivos que se manifestam em motivos
mitológicos nas mais diversas culturas e são o resultado do depósito
de impressões deixadas por certas vivências fundamentais, repetidas
incontavelmente por meio de milênios. ( DINIZ, 2009, p.25)

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É no inconsciente coletivo que os mitos, as histórias milenares, os instintos e


padrões de comportamento residem. Toda essa herança primitiva molda os símbolos
que permeiam nossos sonhos e idealizações conhecidas ou não.

3.1.2 Arquétipos e símbolos

Os arquétipos fazem parte da herança inconsciente de cada indivíduo, e


independem de etnia, de religião, de época para se manifestarem através da consciência.

Diniz (apud MONTEIRO, 2009) ressalta que os arquétipos são estruturas vazias
e por essa condição ligam-se à imagem que encontramos nos símbolos subjetivos que
estão acessíveis na consciência.

Os arquétipos podem ser associados às diferentes representações que a


humanidade perpetua através dos mitos, dos contos de fada, dos dogmas, da filosofia, da
arte e da religião e que, podem ser transformadas de acordo com o tempo e com a
cultura sem se desligar daquilo que é sua essência; que faz parte da herança que é
unificadora da humanidade.

Os arquétipos são formas estruturantes herdadas, comuns a toda


espécie humana, resultados do depósito de impressões superpostas
deixadas por vivências fundamentais, contendo padrões e
comportamentos coletivos que se manifestam em motivos mitológicos
nas mais diversas culturas. São padrões hereditários de
comportamentos psíquicos, revestidos de qualidades dinâmicas, tais
como: a autonomia e a numinosidade. (DINIZ, 2010, p. 14)

As características do arquétipo o transformam num pré-modelo que fica


armazenado no inconsciente pessoal, até o momento em que, a consciência ou a
intensidade de conteúdos internos, permitam seu aparecimento.

O arquétipo é uma estrutura complexa de representações que também geram os


complexos definidos por Jung como:

(...) feixes de conteúdos afetivos – sentimentos, lembranças, imagens,


padrões de comportamento e atitudes pessoais- aglomerados em torno
de um núcleo arquétipo que funciona como polo energético, atraindo
cada vez mais conteúdos referentes a ele. O complexo é dotado de
energia própria e tende a formar uma pequena personalidade, com
uma espécie de corpo e uma fisiologia particular (MONTEIRO,
2009,DINIZ,2009, p. 26, apud JUNG, OC V. XVIII/ I, parágrafo 149)

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Observado como polo de energia o complexo possibilita a movimentação da


psique e com isso o indivíduos e depara com uma demanda pessoal consciente que pode
ser negativa ou trazer-lhe novas possibilidades de aceitação e autoconhecimento.

Se nos arquétipos temos uma estrutura que pode ser composta por elementos
que envolvem as artes, a filosofia, as histórias e as religiões; os símbolos têm em si uma
complexa subjetividade que os caracteriza pela individualidade. “Os símbolos são parte
do processo de autoconhecimento e transformação, vão onde as palavras não pisam,
alcançam dimensões que o conhecimento racional não pode atingir.”( DINIZ, 2009,
p.13)

Os símbolos, para a psicologia analítica, são todo e qualquer objeto


natural/concreto ou abstrato que é revestido de um valor, de um sentimento ou de uma
história com quem se relaciona. No símbolo existe a valorização do subjetivo, daquilo
que é sentido e que pertence ao espaço do não-dito, do não-expressado.

O símbolo traz para a consciência imagens que representam uma essência


aparentemente desconhecida, mas que tem informações extremamente significativas
para aquele que o representa. A possibilidade de concretizar um sentimento, uma
sensação ou uma impressão através do símbolo é o que lhe caracteriza como pulsão de
vida, como parte essencial do todo que compõe o indivíduo.

3.1.3 Os símbolos e suas representações na consciência

Para a psicologia analítica, o símbolo pode permear toda e qualquer


representação de um objeto seja ele concreto ou abstrato.

Jung (2008) associa a ideia de símbolo a um conjunto de significações que nos


parece familiar embora tenha conotações que vão além do seu significado evidente e
convencional. Neste sentido, o símbolo atua como mediador entre a consciente e o
inconsciente, nascendo da própria alma, apresentando o sentido oculto de uma situação
concreta e dando-nos inúmeras interpretações até então desconhecidas.

O símbolo nasce da própria alma e surge do conflito psíquico inerente


a esta. Conjuga, de um lado, o arquétipo, fonte de numinosidade e em
si mesmo irrepresentável; de outro, apresenta uma imagem concreta,
retirada de seu contexto e que, os revestir e dar forma ao arquétipo, de
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certo modo também lhe dá existência, diferenciando-o do caos do


inconsciente de onde se origina, como que realizando o próprio ato
cósmico da criação. Por fundar-se na gênese da alma humana, o
símbolo adquire a capacidade de tocar interiormente o homem e
mostra-se carregado de afeto. (DINIZ, 2009, p.4).

A subjetividade do símbolo o torna íntimo daquele que o cria ou representa por ser
parte da sua história, dos seus sentimentos. Observando o símbolo seu autor se olha sob uma
perspectiva diferente e estabelece uma conexão de afeto com este que traz compreensão,
reciprocidade, aceitação e acolhimento.

4. A ARTETERAPIA COMO UM RECURSO PARA O SIMBÓLICO

Os estudos sobre arteterapia e símbolos mostram-nos que a construção de um


símbolo com toda energia de que é composto é uma atividade que demanda criatividade,
dedicação, disponibilidade e introspecção. Cada indivíduo que se debruça na ação de
descobrir-se precisa da predisposição de rever-se, reconhecer-se na sua integridade e na
complexidade de seus sentimentos e ações, aceitando suas especificidades sombrias ou
não. Nesse processo a representação de si através de um símbolo é uma estratégia de
autoconhecimento que pode ser feita a partir de recursos e técnicas artísticas como a
pintura, a modelagem, a tecelagem, as esculturas, a música e o teatro; ou seja, através da
arteterapia.

A arteterapia é uma atividade terapêutica que atua na prevenção, recuperação e


manutenção da saúde psíquica do indivíduo por mediar, através da utilização de
diferentes técnicas artísticas, a comunicação do indivíduo consigo mesmo. Por facilitar
a expressão das emoções através dos símbolos, a arteterapia é um recurso muito eficaz
na comunicação não-verbal, desvelando imagens sombrias que fazem parte do
inconsciente. “A arte despontecializa a carga emocional dessas imagens e facilita tanto
sua decodificação quanto a reorganização interna e a reconstrução da realidade.”
(DINIZ, 2009, p.6).

A arteterapia proporciona uma vivência simbólica daquilo que está aprisionado


ao inconsciente aprisionando o indivíduo e que é resultado de experiências e
sentimentos dolorosos que causaram bloqueios. Através dos materiais e técnicas
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artísticas o arteterapeuta lida com a capacidade simbólica da comunicação e assim


propicia ao indivíduo uma conscientização e uma ressignificação daquilo que lhe
aprisiona.

A construção do símbolo no atendimento terapêutico significa a concretização


do não falado, daquilo que foi doloroso. Ao olhar para seu símbolo o indivíduo adquire
a capacidade de olhar seu sentimento sob outra dimensão e com isso elabora outros
tantos sentimentos que podem acolher essa dor, aceitá-la para depois transformá-la
como parte de seu desenvolvimento, de sua superação.

4.1 O símbolo-bordado

O uso do bordado para representação de um símbolo é uma possibilidade que


não se vincula apenas à técnica que envolve linhas, agulhas, tecidos e pontos variados.
Todo processo da construção do bordado, quando este é elaborado no atendimento
arteterapêutico, resulta de escolha, observação dedicação, construção, minuciosidade,
atenção, insistência e principalmente do simbólico. O produto final não é apenas o
desenho bordado, é o resultado da produção de um indivíduo que participou ativamente
de todo processo; atrás das linhas e pontos trabalhados existem histórias imaginadas,
verbalizadas ou não no decorrer da atividade manual. O “motivo” do desenho, de fato,
torna-se o “motivador” que envolveu a pessoa que estava bordando; e isso, torna o
trabalho com bordado uma prática eficaz no atendimento arteterapêutico.

Jung apresenta a importância do símbolo para a articulação do inconsciente com


a consciência, o afeto e a subjetividade caracterizam este como um mediador daquilo
que é íntimo, pessoal e que pode ser desconhecido apesar de existir. Philippini associa
ao bordado uma série de ações que simbolicamente podem contribuir para a
ressignificação de sentimentos que aprisionam o individuo, e diante disso, o ato de
bordar ganha espaço no atendimento arteterapêutico.

Criar um símbolo que seja capaz de representar uma história dolorosa ou um


momento especial pode ser o mesmo que revivê-lo numa perspectiva diferente.
Construir a cena escolhida passo a passo, ponto a ponto traz ao indivíduo um novo
sentido, um sentimento de acolhimento necessário para a aceitação e ressignificação.
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Cada ponto concluído é parte e ao mesmo tempo o todo. Visto como parte, temos a
abrangência geral do trabalho e, por outro lado, se o virmos como o todo,
valorizaremosa importância de cada etapa da construção, é a sequência, a continuidade
que forma o símbolo.

Associar o bordado à história do indivíduo no atendimento arteterapêutico é


reconhecer a importância dos símbolos que constituem a psique. Assim como os pontos,
quando unidos, formam um desenho, os símbolos formam nossa personalidade total.

Oferecer essas possibilidades no atendimento arteterapêutico é mediar uma


ressignificação entre o indivíduo e sua história.

5. O BORDADO COMO RECURSO ARTETERAPÊUTICO

O ato de bordar advém da tecelagem. Na história da humanidade o bordado


esteve atrelado à nobreza e à religiosidade para diferenciar vestuários comuns daqueles
usados para cerimônias especiais. Com esse fazer manual foi possível criar figuras
ornamentais, desenhos, fazer contornos e aplicações utilizando cores e pontos variados.

Existe uma variedade de pontos que podem ser utilizados no bordado: pontos de
contorno (alinhavo, ponto atrás, pequinês, haste), pontos chatos (ponto reto, ponto
russo, ponto de folha, ponto chato, ponto cruz) e pontos de cadeia (margarida, elós,
nozinho francês) que tem em comum além das linhas, agulhas e tecidos, a ação
transformadora de quem borda.

Quando um indivíduo dispõe-se a bordar exerce, imediatamente, sua capacidade


de escolher. Primeiro o tecido, depois vem a escolha da agulha mais adequada, os
desenhos ou figuras e as linhas; e nesse primeiro ato o fazer milenar já conduz à
introspecção e a concentração necessária para o processo artístico.

No contexto arteterapêutico o bordado, assim como as diferentes técnicas


artísticas, não está associado à estética; a atenção volta-se prioritariamente para a
escolha dos materiais, para o fazer terapêutico e para a relação que o indivíduo
estabelece com sua criação.
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Philippini (2009, p. 67) afirma que “no processo arteterapêutico, tecer equivale a
ordenar, a articular,entrelaçar, a organizar, a apropriar-se do fluxo criativo e existencial
(...)” e, assim, de ponto a ponto, de fio a fio, o indivíduo constrói, dá vida a uma figura
ou símbolo abstrato, trama e destrama uma ideia, aprende que, às vezes, é necessário
parar para observar, desmanchar para recomeçar. A cadência dos movimentos, a
paciência e a delicadeza do bordado propiciam momentos de autoconhecimento e
valorização pessoal; visto que, ao concluir sua produção o indivíduo se transforma em
autor de um símbolo.

No atendimento arteterapêutico o bordado só tem eficácia se for feito com as


mãos; com a máquina a rapidez da produção não atua na introspecção esperada e isso
desvaloriza este recurso. Nas mãos existe um simbolismo que está ligado ao
conhecimento, a diferenciação da espécie em relação aos outros animais. Leloup (2012,
p. 124) afirma que “a palavra mão está ligada ao conhecimento. Tocar a mão, apertar a
mão, é se apresentar, é firmar um conhecimento” e,

”(...) há um elo entre as mãos e o cérebro. Quando, por exemplo,


rezamos um terço, quando temos as mãos ocupadas em um trabalho
manual, quando temos alguma coisa entre nossas mãos, nosso mental,
nossa psique, se acalma” (LELOUP, 2012. p. 124).

Bordar manualmente estimula a criatividade, traz plenitude, concentração e


tranquilidade mental, uma vez que a pessoa que borda tem sua atenção totalmente
voltada para seu trabalho. Se for feito em grupo, o bordado estimula aintegração,
desperta a curiosidade e possibilita o aprender e o ensinar valorizando o saber
individual.

Legitimar o trabalho manual e, especificamente o bordado, como recurso para o


atendimento arteterapêutico é trazer para este espaço inúmeras possibilidades de
representações simbólicas. Ao tecer o paciente entra em contato com sua ancestralidade,
com suas crenças e com sua história e, assim, concretamente, é convidado a
experimentar escolhas, ampliar sua criatividade diante das opções de linhas, pontos e
tecidos construindo seus símbolos, ressignificando suas escolhas e seus objetivos.

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REFERÊNCIAS

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