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Coregio Esrupos Cunrurais em Epucacho Coordenadores: Tomaz Tadeu da Silva e Pablo Gentili ~Alienigenas na sala de aula ~ Uma introdugdo aos estudos eulturais em educagio ‘Tomaz, Tadeu da Silva (Org.) ~ Pedagogia da exclusio — Critica ao neoliberalismo em educagéio Pablo Gentili (Org.) ~ Tervitérios comtestados ~ O curriculo ¢ os novos mapas politicos e culturais ‘Tomaz Tadeu da Silva e Antonio Flavio Moreira (Orgs.) —Identidades terminais ~ As transformagdes na politica da pedagogia ¢ na pedagogic da politica ‘Tomaz Tadeu da Silva ~ Educagito ¢ crise do trabalho — Perspectivas de final de s Gaudéncio Frigotto (Org, = Teoria € educagao no labirinto do capital Gaud€ncio Frigotto e Maria Ciavatta (Orgs.) slo Dadas Internacionais de Catalogacio na Publicagfo (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) ‘Alienfgenas na sala de auls / Toma. Tadeu da Silva (org) ~ Pett6polis, RI: Vozes, 1995. — (Colegio estudos calturais ‘em educagao} Varios auores ISBN 85-326-1497-3 1. Cultura ~ Estado e ensino 2. Educagao ~ Filosofia 1 Silva, Tomaz Tadeu da. IL Série. 95.2997 cpp-370.192 fodices para eatstogo sistemético: 1. Bstudos culturais: Educaggo 370.192 7 Jurjo Torres Santomé AS CULTURAS NEGADAS E SILENCIADAS NO CURRICULO [yin es inalidades andamentais de toda intervengio curicu- lar € a de preparar os/as alunos/as para serem cidadaos/as ativosias ¢ criticos/as, membros solidarios e democréticos de uma sociedad solidéria e democritica. Uma meta desse tipo exige, por conseguinte, que a selegao dos contetidos do curriculo, os recursos € as experiéncias cotidianas de ensino e aprendizagem que carac- terizam a vida nas salas de aula, as formas de avaliagao € os modelos organizativos promovam a construgio dos conhecimen- tos, destrezas, atitudes, normas valores necessirios para set bom/boa cidadao/ © desenvolvimento de tal responsabilidade coletiva implica que os/as estudantes pratiquem e se exercitem em ages capazes de preparé-los/as adequadamente para viver ¢ participar em sua comunidade. Uma instituigdo escolar que trabalha nessa directo precisa colocar em acio projetos curriculares nos quais o alunado se veja obrigado, entre outras coisas, a tomar decisoes, solicitar a colaboragio de seus companheiros/as, a debater e criticar sem medo de ser sancionado negativamente por opinar e defender posturas contririas as do/a docente de plantio. Cotidianamente deve ver-se implicado na realizagao de agbes fundamentadas em um conhecimento adequado, suficientemente contrastado, acerca dos aspectos da sociedade da qual faz parte: seu grau de desen- volvimento cultural, politico, cientifico e tecnolégico, seus costu- mes, valores, etc. As tinicas limitagSes nessa participagao ativa ¢ tomada de decisées ¢ nas condutas subseqiientes devem ser as impostas pela ética que rege toda situagao democrética. 159 © planejamento do curriculo ¢ sua posterior colocagio em agd0 — necessaria para conseguir metas similares — esto muito longe de uma visio acumulativa, bancéria, de conteidos para serem adquiridos pelos/as estudantes, como se esses/as fossem gravadores de som. Muitas propostas de escolarizaco mantém ainda uma forte estrutura fordista, no sentido de que seu modo de funcionamento se assemelha ao da cadeia de montage de uma grande fébrica. Assim, os alunos/as se posicionam de forma fixa em sua carteira e diante deles/as vio passando diferentes matérias € professores/as a um determinado ritmo. A nica coisa a que os/as estudantes aspiram € acabar quanto antes seus deveres e desse modo conseguir uma recompensa extrinseca, como uma determi- nada nota ou um determinado conceito...O. que tem menos importincia nessa situacao € 0 sentido, a utilidade e 0 dominio real do que devem aprender. Temos um exemplo desse fendmeno fordista quando escutamos os/as estudantes avaliarem sua experi- éncia nas salas de aula dizendo que obtiveram tal ou qual conceito, mas nio anunciando que aprenderam tal ou qual coisa ou a fazer algo concreto, etc. O importante é a recompensa extrinseca a um trabalho que em muitas ocasiées podemos rotular como alienado. Uma operario/a alienado/a também comunica apenas o salirio que ganha, nio 0 que produz, nem seu interesse e envolvimento no trabalho. Pelo contrério, um projeto curricular emancipador, destinado aos membros da uma sociedade democratica e progressista, além de especificar os principios de procedimento que permitem com- preender e sugerir processos de ensino e aprendizagem de acordo com isso, também deve necessariamente propor certas metas educativas ¢ aqueles blocos de contetidos culturais que melhor contribuam para uma socializagio critica dos individuos. A aco educativa pretende, portanto, além de desenvolver capacidades para a tomada de decisdes, propiciar aos alunos e as alunas € 20 préprio professorado uma reconstrucio reflexiva € critica da realidade, tomando como ponto de partida as teorias, conceitos, procedimentos e costumes que existem nessa comuni- dade e aos quais se deve facilitar o acesso..Nesse trabalho-de formagio de pessoas criticas, ativas ¢ solidéfias, e de ajuda na reconstrucio-da tealidade, € imprescindivel prestar uma aten¢: prioritéria aos contetidos culturais, assim como, naturalmente, 3s 160 estratégias de ensino e aprendizagem e avaliagio para levar a cabo tal miss4o. Nao podemos esquecer que 0 professorado atual é fruto de modelos de socializacao profissional que lhe exigiam unicamente. } Prestar atencao.A formulacao de objetivos e metodologias, nao considerando objeto de sua incumbéncia a selecao explicita dos Gontetidos culturais. Essa tradiggo contribuin de forma decisiva para deixar em maos de outras pessoas (em geral, as editoras de livros didaticos).os contetidos que devem integrar o curriculo e, o.que € pior, a sua coisificacdo. Em muitas ocasiées os contetidos sio contemplados pelo alunado como férmulas vazias, sem sequer 2 compreensao de seu sentido. Ao mesmo tempo, se criou uma tradi¢4o na qual. os contetidos apresentados nos livros didaticos aparecem como os sinicos possiveis, os tinicos pensdveis, Como conseqiiéncia, quando um/a professor/a se pergunta que outros contetidos poderiam ser incorporados ao trabalho de sala de aula, encontra dificuldade para pensar em contetidos diferentes dos tradicionais. Nao constitui nenhuma surpresa, pois, que nessa altura da hist6ria j4 sejam muitas as vozes ausentes c/ou deforma- das na maioria dos curriculos. VozEs AUSENTES NA SELEGAO DA CULTURA ESCOLAR Quando se analisam de maneira atenta os contetidos que sio desenvolvides de forma explicita na maioria das instituicoes escolares © aquilo que é enfatizado nas propostas curriculares, le estruturas importantes de poder costumam, ser silenciadas, quando nao estereotipadas e deformadas, para anular suas possi- bilidades de reagdo. Entre essas culeuras ausentes podemos desta- car as seguintes: — As culturas das nagées do Estado espanhol. — As culturas infantis, juvenis ¢ da terceira idade. — As ctnias minoritarias ou sem poder. —O mundo feminino, — As sexualidades lésbica ¢ homosexual. 161 — A classe trabalhadora ¢ 0 mundo das pessoas pobres. —O mundo rural ¢ litoraneo. — As pessoas com deficiéncias fisicas e/ou psiquicas. — As vores do Terceiro Mundo. Por razées de espaco nio poderei me deter a analisar cada uma dessas culturas negadas, fazendo isso com aquelas que con- sidero que tém merecido pouca atengio. As CULTURAS DAS NAGGEs Do ESTADO ESPANHOL Algo que apenas se considera como parte importante dos conte- dos e tarefas escolares nas instituig6es educacionais € a preocu- pacio pelas distintas culturas nacionais. Em épocas muito recentes, especialmente na ditadura do Generalissimo Franco, a existéncia de uma preocupacio obsessiva por reconstruir 0 con- ceito de nacio espanhola trouxe também um forte silenciamento c/ou ataque 2 idiossincrasia e, portanto, aos direitos de cada um dos povos ou nacées que integram o Estado espanhol. Essa repressao das identidades nacionais da Espanha vinha acompanhada, além disso, de um silenciamento e desfiguracao das diferentes culturas nacionais existentes em qualquer dos outros Estados plurinacionais reconhecidos. Assim, por exemplo, nos materiais curriculares utilizados durante a ditadura franquista é impossivel encontrar uma s6 alusio & existéncia das diferentes nag6es que integram Estados como: a ex-Uniao Soviética, os Estados Unidos, o Reino Unido, Franca, Canadé, ex-lugoslévia, ete. Quando alguma vez aparece a denominagao de alguma dessas nag6es, isso ¢ feito de um modo similar ao conceito mais folelérico de regio proposto pelos defensores da ditadura. Quantos dos preconceitos ¢ esteredtipos negatives sobre com- portamento ¢ caracteristicas do povo galego, basco, catalio, andaluz nao sio mais que a traducao de atitudes de ataque, negacdo e silenciamento de seus sinais de identidade? Na atualidade, esses sentimentos nao foram de todo contra- postos e anulados. Inclusive pode ver-se reafirmado um notavel sentimento antinacionalista na medida-em que se propaga uma mensagem explicita ¢ implicita sobre uma Gnica concep¢ao de nacionalismo, a da direita politica, a qual, além disso, vem im- 162 pregnada de manifestagdes xenéfobas. Nao podemos ocultar que, na atualidade, para muitas pessoas, nacionalismo é igual a racis- mo, egoismo ¢ intransigéncia. Nao vamos nos deter a analisar as diferentes concepgées de nacionalismo existentes, \ A defesa da identidade nacional a partir de perspectivas de esquetda nunca foi unida a posturas de racismo, mas, ao contrario, \ de salidariedade, respeito e valorizacao das diferengas. A nacao é © espaco onde se forja a identidade social dos diferentes grupos humanos. A aceitacao da prépria identidade é uma das principais condig6es para saber valorizar a dos demais, A patologizacao da consciéncia nacional, elaborada de acordo com uma consciéncia de-superioridade, de total autosuficiéncia, € o que explica a aparigéo de uma.consciéncia e conduta racistas. Como sublinha Benedict Anderson (1983, p. 136), “o pesadelo do racismo tem. sua origem em ideologias de classe mais que nas de nacio”. AS CULTURAS INFANTIS E JUVENIS Outra das grandes auséncias e ocultamentos aos olhos do proprio. alunado séo os modos de vida dos grupos infantis e juvenis, tanto na atualidade quanto no passado, tanto aqui quanto em outros lugares da terra, E isso ocorre mesmo que, qualitativamente, cles sejam uma parte importante da hamanidade. O_adultoceneristmo de nossa cultura nos Jeva a uma ignorancia realmente grande acerca do mundo idiossincratico da infancia e da javentude. As ctiangas desconhecem por que sao criancas, qual € o significado dessa fase de desenvolvimento, que direitos e deveres tém. Todo seu mundo de relacées, predilecées, intcresses, jogos | ¢ brinquedos, é objeto de atencio, de reflexio e critica apenas no | quadro das instituig6es académicas, Apesar de se dizer, as vezes insistentemente, que 0 jogo € a principal atividade durante a etapa \ infantil, como atividade escolar poucas vezes se oferecem possi- | bilidades de refletir ¢ analisar as razées de cada um dos jogos infantis, das peculiaridades e significados dos brinquedos, etc. 1 Um notavel gra de sentimentalismo por parte das pessoas adultas tem como resultado um afi por colocar a infancia em um mundo paradisfaco. Costuma-se contemplar as pessoas nessa fase de desenvolvimento como: ingénuas, inocentes, desvalidas, etc., &, portanto, sem maiores preocupacées, interesses ¢ desejos. 163 A adogao dessa filosofia propicia um silenciamento de outras infancias mais reais.c, por sua vez, leva a que durante 0 periodo de escolarizacio obrigat6ria nao exista uma clara inténcionalida- de em estudar como conteidos escolares as condigées e modos de vida da infancia pobre, das criangas do mundo rural ¢ litoraneo, as condigdes de vida infra-humanas das que vivem no Terceito Mundo, etc. Assistindo a qualquer meio de comunicagio de massas, podemos constatar que existem muitas zonas de guerra na atualidade, lugares onde existem guerras civis, insurreigdes € disputas de fronteiras que afetam seriamente a infancia. Entretan- to, tais problemas nao existem quando lemos a maioria dos livros didaticos. Atualmente, existem muitos paises afetados por situacées de guerra, fome ¢ pobreza nos quais a infancia que ali vive e sofre em nada se parece a de outros paises ¢ lugares. Em um mundo que definimos como aldeia global, 0 conhecimento, dessas injus- ticas € imprescindfvel para gerar a suficiente solidariedade capaz de corrigir as desigualdades e injustigas que sio causa desses conflitos. Nossa sociedade e, por conseguinte, os espagos onde existe a obrigacio de refletir criticamente sobre 0 mundo, ou seja, as instituigdes escolares, no podem fazer vista grossa ¢ ouvidos moucos a situagSes de injustica que afetam a infancia. Assim, nao podemos silenciar que existem criangas que sio objets de tréfica de drgios ¢ objetivo de “esquadroes da morte”, como acontece, por exemplo, no Brasil ¢ em muitos pafses sul-americanos ou, em geral, nos paises do chamado Terceiro Mundo. Os assassinatos de criangas pobres, as agressGese torturas fisicas e sexuais, os traba- Ihos desumanos s4o uma triste realidade, 4 qual, nas instituigdes de ensino, pouco se presta atengio. © alunado deve adquirir consciéncia dessas tristes realidades © comprometer-se com essa infincia maltratada, na medida de suas possibilidades e forcas. Uma forma de preparar as novas ‘geragbes para a vida e para sobreviver € informando-as claramente das peculiaridades do mundo no qual Ihes toca viver. ‘Nessa tarefa de reconstrugao da realidade que, conjuntamen- “f te, levam a cabo alunas, alunos, professoras € professores nas \ instituiges escolares, algo que precisa concentrar nossa atengio 164 € que realidade, que cultura definimos como tal; que cultura pressupomos como existente ¢ como valida, que cultura necessi- tamos transformar. Os programas escolares ¢, portanto, os professores e profes- soras que rejeitam ou nao concedem reconhecimento a cultura popular e, mais concretamente, ’s formas culturais da infancia e da juventude (cinema, rock and roll, rap, quadrinhos, etc.) como veiculo de comunicagio de suas visbes da realidade e, portanto, como algo significativo para o alunado, estao perdendo uma oportunidade maravilhosa de aproveitar os contetidos culturais ¢ 08 interesses que essas pessoas possuem como base da qual partir para o trabalho cotidiano nas salas de aula. Uma instituicio escolar que nao consiga conectar essa cultura juvenil que tao apaixona- damente os/as estudantes vive em seu contexto, em sua familia, com suas amigas e seus amigos, com as disciplinas académicas do curriculo, est deixando de cumprir um objetivo adotado por todo mundo, isto é 0 de vincular as instituigées escolares com o contexto, tinica maneira de ajudé-los/as a melhorar a compreen- sio de suas realidades e a comprometer-se em sua transformagao. Se uma das miss6es-chave do sistema educacional € a de contribuir para que_os alunos ¢ alunas possam reconstruir a Cultura que essa sociedade considera mais indispensavel para poderem ser cidadaos ¢ cidadas ativos/as, solidérios/as, criticos/as e democraticos/as, € Gbvio que nao podemos partir de uma ignorancia daqueles conhecimentos, destrezas, atitudes e valores culturais que a juventude valoriza acima de todas as coisas. Os curriculos.planejados e desenvolvidos nas salas de aula vém pecando por uma grande parcialidade no momento de definir a cultura legitima, os contetidos culturais que vafem a pena. Isso acarreta, entre outras coisas, que determinados recursos sejam empregados ou nao, metegam nossa atengao ou nossa displicén- cia. Sabe-se que as instituig6es educacionais sto um dos lugares mais importantes de legitimagao dos conhecimentos, procedi- mentos, destrezas ¢ ideais de uma sociedade ou, a0 menos, das classes e dos grupos sociais que posstiem parcelas decisivas de poder. Todos aqueles contetidos e formas culturais que so con- siderados como relevantes por tais grupos sio facilmente encon- 165 trados como parte de alguma disciplina ou tema de estudo nas salas de aula, Basta observar as disciplinas dos distintos cursos € niveis do sistema educacional ¢ seus correspondentes temdrios para logo nos darmos conta do tipo de cultura que a escola valoriza e contribui para reforcar, a0 mesmo tempo que também podemos observar as auséncias, ou scja, tudo aquilo que essa mesma instituigao nao considera merecedor de ocupar sua aten- Gao. © ensino e a aprendizagem que ocorrem nas salas de aula representam uma das manciras de construir significados, reforgar ¢ conformar interesses sociais, formas de poder, de experiéncia, | que tém sempre um significado cultural ¢ politico. “ Nesse Ambito, algo que dificilmente se encontra presente € 0 que podemos denominar de cultura popular e, particularmente, aquilo que se vern se denominando de culturas juvenis, em geral Podemos considerar essas culturas como formas de vida, como ocupagées e produtos que envolvem a vida cotidiana dos alunos ealunas fora das escolas. Sao essas formas culturais as que melhor traduzem os interesses, preocupacdes, valoracées ¢ expectativas da juventude, as que nos permitem descobrir 0 verdadeiramente relevante de suas vidas. Se as distintas culturas destacam os caminhos € as maneiras através das quais 0s seres humanos dio sentido a suas vidas, constroem seus sentimentos, crengas, pensamentos, praticas € artefatos (desde textos até instrumentos e produtos em geral), as calturas juvenis vao ser as que, por definigéo, traduzem a juven- tude, Nao obstante, essa realidade juvenil € algo que a instituicio escolar vai tratar de ocultar, quando nao atacar frontalmente. A tinica cultura que as instituicbes_académicas_costumam_ rotular como tal € a construida a partir das classes e grupos sociais “com poder — ¢ com sua aprovacio. Dessa forma, o idioma e a norma lingiistica que a escola exige € a dos grupos sociais dominantes, a literatura daqueles autores ¢ auroras que esses mesmos grupos valorizam, a geografia ea hist6ria dos vencedores, a matematica necessiria para proteger suas empresas ¢ negécios, etc. Assim, por exemplo, nossas instituigbes académicas conside- ram arte aquilo que se encontra nos museus, o que outras pessoas 166 produziram, come norma geral, em outras épocas e/ou lugares € que os grupos de intelectuais e criticos com reconhecido prestigio dizem que vale a pena. Nao obstante, quando passamos em revista uma Historia da Arte de maneira mais detalhada, é facil descobrir que 0 que agora consideramos um marco artistico, em seu mo- mento foi considerado como inferior. Grandes partituras musicais (como as de Mozart, de Beethoven, dos Beatles, por exemplo) € pinturas ¢ esculturas hoje muito valorizadas, foram qualificadas, em sua época, como algo de péssimo gosto. Se, nas instituigées educacionais, alguém pede, em um exame, uma listagem das diferentes artes, 0 resultado mais freqiiente costuma ser o de incluir em tal enumeragio a miisica clissica, 0 balé classico, a épera, o teatro dos grandes autores classicos, a Poesia, a literatura, a pintura e a escultura também daqueles autores ¢ autoras que aparecem em livros de texto de Hist6ria da Arte, Entretanto, € quase certo que ndo encontraremos nessa classificacao:.0 rock,.o.punk, 0 rap, os desenhistas de quadrinhos ou grafitti, as foronovelas, as telenovelas, os bailes de moda juventude, as éperas rock, talyez tampouco a musica de jazz, os videoclips, 0s estilos cinematogrificos preferidos desse setor jo- vem, etc. Sem esquecer que também nessa diltima lista cada forma cultural tem diferentes classificagdes em seu interior, as quais, por sua vez, traduzem as hierarquizag6es que introdwzem varidveis como o género, a raca, a etnia, a nacionalidade, o carter rural ou urbano, etc., dos diferentes grupos de adolescentes que produzem € consomem esses produtos culturais, AS ETNIAS MINORITARIAS OU SEM PODER Sem diivida, a reflexio sobre o verdadeiro significado das dife- rentes culturas das racas ou etnias é uma das importantes lacunas que ainda existem. E precisamente em momentos como os atuais, em que surgem problemas devido a que racas ¢ etnias diferentes trata de compartilhar ou utilizar um mesmo territério, que esse vazio mais se deixa sentir. E é também a instituicao escolar o lugar no qual a caréncia de experiéncias e reflexes sobre uma educagio anti-racista.¢ programas plurilingiisticos se deixa notar de forma vistvel. Nao podemos esquecer que qualquer comunidade humana 167 trata sempre de salvaguardar sua cultura, jé que é dessa maneira que se asseguta sta continnidade. A cultura de cada povo nao traduz outra coisa que seus constructos conceituais, seus sistemas simbélicos, seus valores, crengas, pautas de comportamento, et. Por conseguinte, toda cultura especifica supée o “acervo de saber ide se abastecem de interpretagdes os participantes na comu- (Gio ao entender-se entre si, sobre algo no mundo” (Habermas, 1950, p99) Dessa mancira as pessoa egulam seu perencimien, to a grupos sociais ¢ asseguram a solidariedade entre elas, ou seja, se garante a continuidade dessa sociedade. Nesse trabalho, 0 sistema educacional desempenha um papel importante. Através das préticas educacionais, dos conhecimentos, destre- zas ¢ valores que, de uma maneira explicita on ocuita, sto estimulados, as criangas vao se sentindo membros de uma comu- nidade, Pouco a pouco, tornam-se conscientes de uma série de peculiaridades que as identificam e dos lagos que as unem como grupo de iguais. Por contraposicéo, descobrem que algumas das caracteristicas fisicas, idioma, costumes, modos de pensar das quais elas comungam, sio diferentes das de outras pessoas ¢ grupos humanos. Todos os seres humanos, no momento em que se encontram diante de outras pessoas com caracteristicas fisicas muito diferentes ou com outro idioma materno, ou com costumes muito diferentes, adquirem algum grau de consciéncia de sua exist@ncia como grupo diferenciado; compreendem que compar- tilham uma certa visio do mundo com seu grupo de iguais ¢, a0 esto tempo, que existem ontras maneiras de pensar e de ser. A constatagio. dessas diferengas nfo tem nada a.ver com a crenga exrénea ¢ injustificada de que grupos humanos ow ragas sao superiores ¢ outras inferiores. E preciso estar consciente de que as ideologias raciais so wtilizadas como alibi para a manuten- cao de situagdes de privilégio de um grupo social sobre outro. Essas ideologias sio, com freqiiéncia, acompanhadas de uma linguagem com aparéncia de cientificidade, com o fim de impedir que as racas ou grupos étnicos oprimidos possam exigit a modi- ficagio das estruturas sécio-politicas que perpetuam seu atual estado de inferioridade, Os discursos e praticas racistas sio 0 resultado da histéria econdmica, social, politica e cultural da sociedade na qual sio produzidos. Sao utilizados para justficar € reforgar os privilégios.econdmicos € sociais dos grupos sociais 168 dominantes. A raga é, pois, um. conceito bio-sécio-politico._ Nas instituig6es de ensino, nao se costuma considerar essa fortita de opressio Como objeto de atencao prioritaria. E freqiien- te que tanto as autoridades politicas, quanto os proféssores’e protessoras se vejam a si mesmos/as. coma. pessoas objetivas, Heutras e, POF Conseguinte, como pessoas.que.ndo. favorecem a reproducio e producio de comportamentos racistas. Entretanto, quaiido se fazein andlises emogréficas no interior das salas de aula ou se observam os materiais curriculares, logo aparecem, diante de nossos olhos, condutas que invalidam as auto-imagens de neutralidade que o sistema educacional oferece. Sao numerosas as formas através das quais o racismo aflora no sistema educ:cional, de forma consciente ou oculta. Assim, por exemplo, podem-se detectar manifestagées de racismo nos livros didaticos de Ciéncias Sociais, Histéria, Geografia, Literatura, etc. especialmente através dos siléncios que si produzidos em relagio aos_direitos ¢. caracteristicas de comunidades, etnias ¢ povos Minoritirios.¢ sem poder. As comunidades ciganas, numerosas nagées da Africa, Asia e Oceania, a maioria das etnias sul-ameri- canas € centro-americanas, etc. no existem para os olhos dos leitores desse tipo de materiais curriculares, As atitudes de racismo e discriminagao costumam ser dissin ladas também recorrendo a descrigdes dominadas por esteredti- pos € pelo silenciamento de acontecimentos hist6ricos, s6cio-econémicos ¢ culturais. Uma mostra da politica de racismo € discriminacio que atravessa a maioria dos livros didaticos sio as descrig6es ¢ qualificativos com os quais se nomeiam invasbes coloniais e espoliagoes de recursos naturais de numerosos povos do Terceiro Mundo, Basta uma repassada pelos livros didaticos para nos fazer ver de que forma fendmenos como os anteriormen- te assinalados aparecem nomeados como atos de descobrimento, aventuras humanas, feitos herdicos, descjos de civilizar_seres Primitivos ou barbaros, de fazé-los participar da verdadeira reli- gido, etc 6 muito dificil encontrar raciocinios em torno de conceitos como.exploracio e dominio, alusées a situagdes de escravidao ¢ a acdes de brutalidade, com as quais se levam a cabo muuitas das inyasées e colonizagoes de populagées ¢ tertitérios, A preponderancia de visdes e/ou silenciamentos da realidade 169 A das populagées marginalizadas com as estruturas politicas, econ6- micas ¢ culturais dessa mesma sociedade. Uma educagio libertadora exige que se leve a sério os pontos: fortes, experiéncias, estratégias e valores dos membros dos grupos optimidos. Inplica também ajudé-los a analisar e compreender as estruturas sociais que os oprimem para elaborar estratégias ¢ “inhas de atuagao com probabilidades de éxito. ms Posturas de silenciamento similares nos contetidos dos currf- culos que sao desenvolvidos nas instituigées de ensino so as que costumam sofrer também, por exemplo, as culturas da terceira 5, idade, o mundo rurale litoraneo, a classe trabalhadora eo mundo das pessoas pobres, o Terceiro Mundo, as pessoas com deficién. ) Cas fisicas e/ou psiquicas, as pessoas lésbicas e homossexuais, e 0 mundo das mulheres. Embora esse tiltimo grupo, o das mulheres, tenha obtido jé importantes reconhecimentos, tem ainda um longo caminho até conseguir a verdadeira supressio das discriminacdes que tém sua origem na dimensao do género. A presenga do mundo feminino, embota com avancos signi- ficativos, deve prosseguir, de maneira especial se tivermos presen- te que, em minha opiniao, esta ocorrendo uma forte remasculinizacdo da sociedade, Frente a avangos importantes nos direitos das mulheres co- mega a se verificar, no obstante, ataques importantes a tal filosofia. O fato de que o cinema que se produz na atualidade insista nas dimensOes mais agressivas do homem ¢ que, por sua vez, ao tratar da mulher, ponha énfase em valores exclusivamente estéticos e em sua cancepgao como objeto de desejo sexual serve para deixar claro que a alguns setores importantes e poderosos da sociedade interessa outro tipo de mulher, diferente daquela que desejam as proprias mulheres. Assim, por exemplo, titulos de filmes ¢ sérics televisivas como Las chicas de oro, Uma Linda Mulher, etc. insistem em que para a mulher © énico objetivo importante € conseguir um namorado e satisfazer uma sexualida- de apresentada de mancira exagerada e, portanto, ridicularizada. Ao mesmo tempo, filmes como O Exterminador, Arma Letal, Rambo, etc., que passam por ser os mais vistos, nos apresentam o homem musculoso e agressivo como o modelo a ser imitado. 171 Parece que ja ficaram distantes as imagens tipo Woody Allen, de homem roméntico e suave. Nessa linha da remasculinizagio da sociedade, também fez sua apariggo uma nova mensagem: a de que as mulheres nao sfo imprescindiveis nem.para cuidar. dos filhos ¢ filhas. Um exemplo desée tipo de mensagem € encontrado em filmes ¢ em séries televisivas, nos quais aparecem homens soltciros com criangas sob sua responsabilidade ¢ onde se vé como sio resolvidos de maneira muito aceitével os problemas que cotidianamente Ihes so colo- cados nesse ambito. Isso esté bem, mas mio deve ocorrer & custa de excluir a mulher. Nao obstante, também continua existindo um cinema de resisténcia que sublinha que nem tudo esté perdido. Titulos como Thelma e Louise ridicularizam as visées machistas da interagio entre homem ¢ mulher. O sistema educacional tem que contribuir para situar a mulher no mundo, 0 que implica, entre outras coisas, redescobrir sua Hist6ria, recuperar a voz perdida. Se alguma coisa os alunos alunas de nossas instituicbes desconhecem é a histéria da mulher, arealidade dos porqués de sua opressao e silenciamento. Estudar € compreender os erros histéricos € um bom antidoto para impedir que fendmenos de marginalizagio como esses continuem sendo reproduzidos. RESPOSTAS CURRICULARES DIANTE DA DIVERSIDADE & DA MARGINALIZAGAO. Algo que é preciso ter em conta é que uma politica educacional que queira recuperar essas culturas negadas nio pode ficar redu- zida a uma série de licoes ou unidades didaticas isoladas destinadas a seu estudo. Nao podemos cair no equivoco de dedicar um dia do ano & luta contra os preconceitos racistas ou a refletir sobre as , formas adotadas pela opressio das mulheres e da infancia. Um _curriculo anti-marginalizacio é aquele em que todos os dias do “ano letivo; em-todas.as-tarefas académicas e em todos os recursos didaticos esto presentes as culturas silenciadas sobre as quais vimos falando, O tratamento desse tipo de tematica nas escolas e nas salas de aula corre o perigo, nao obstante, de cair em propostasde trabalho 172 4 tipo curriculos turisticos, ou seja, em unidades didéticas isoladas, nas quais, esporadicamente, se pretende estudar a diversidade cultural, As situagGes sociais silenciadas até 0 momento € que normalmente se colocam como situacées problematicas na socie- dade concreta na qual se encontra a escola (as etnias oprimidas, as culturas nacionais silenciadas, as discriminag6es de genero, de idade, etc.) passam a ser contempladas, mas a partir de perspec- tivas de distanciamento, como algo que nao tem a ver conosco, algo estranho, exético ou até mesmo problematico, mas, nesse {iltimo caso, deixando claro que sua solugao nao depende de nada em concreto, que esté fora de nosso alcance. Trata-se, segundo essa visio, de um tipo de situagao sobre as quais nés nao temos capacidade de intervir. Podemos falar da existéncia de um curriculo.turtstico sempre € quando esse tipo de tematica referidas sobre a diversidade é tratado recorrendo as seguintes atitudes: —A trivializagdo. Ou seja, estudando os grupos sociais dife- rentes dos majoritétios com grande superficialidade c banalidade. Estudando, por exemplo, seus aspectos mais de estilo turistico, por exemplo, seus costuines alimentares, seu folclore, suas formas de vestir, seus rituais festivos, a decoracao de suas habitagoes, etc. — Como sowvenir. Ao estilo dos souvenirs de uma viagem turistica ou dado exético, com uma presenca quantitativa muito pouco importante. Esta forma de trabalhar a diversidade social cultural seria aquela na qual, entre o total de unidades didéticas a trabalhar em uma determinada etapa educativa ou entre os recursos didéticos disponiveis na sala de aula, 56 uma pequena parte serve de souvenir dessas culturas diferentes. Por exemplo, quando em todo o currfculo de um curso ou de uma etapa educativa existe apenas um par de tarefas escolares referidas a essas tematicas. Ou, quando, dentre o total de livros da biblioteca existe apenas um livro no qual se contemplam essas dimensées multiculturais. Ou, quando, entre um conjunto de recursos didé- ticos e de brinquedos existe; por exemplo, unicamente uma boneca negra, ou algumas castanholas que lembram a cultura cigana, ou um disco de rock. —Ao desconectar as situacées de diversidade da vida cotidi- ana nas salas de aula, Esta € uma das formas mais freqiientes de 173 enfrentar-se com a diversidade, como no caso da situago que conhecemos como “O DIA DE...”. Em apenas um determinado diae, inclusive numa tinica disciplina, nos detemos sobre esse tipo de problemética social; no’ restante dos dias do ano letivo, essas realidades sio silenciadas, quando nao atacadas. Este é o perigo que ameaga as reas curriculares que a reforma educacional espanhola chama de transversais: podem acabar ficando como algo anedético ou reduzidas a nada. —A estereotipagem. Ou seja, recorrendo a imagens estereo- tipadas das pessoas ¢ situacdes perrencentes a esses coletivos diferentes, Recorre-se a explicacdes justificativas das situacbes de marginalidade baseando-se, para isso, em estere6tipos. Assim, por exemplo, afirmando que as pessoas ciganas sio discriminadas porque sto ladvas por natuereza ou que, na melhor das hipéteses, 86 podem trabalhar naquilo para o qual estéo dotadas, ou seja, cantar ¢ bater palmas, ou em oficios tradicionais, tipicos de populagGes residuais e/ou marginalizadas: funilaria, cestaria, etc. Alega-se que 0 povo galego € desconfiados 0 basco, teimoso; 0 andaluz, falso; 0 cataléo, avarento, etc. Argumenta-se que as populagoes negras so primitivas, que ainda precisam evoluir € que seu melhor ambiente para viver é uma selva frondosa ¢ em estado selvagem, que nao tém necessidades vitais e culturais t40 urgentes quanto nés. A juventude que manifesta interesse por miisicas préprias e mais originais se rorula como perversa ¢ degenerada, etc. —A tergiversagéo, quando se recorre 4 estratégia de deformar c/ow ocultar a histéria ¢ as origens dessas comunidades objeto de marginalizacio e/ou xenofobia. Este é 0 caso mais perverso de tratamento curricula, ji que se trata de construir uma hist6ria na medida certa para enquadrar ¢ tornar naturais as situagdes de opressio, Explicar que se existem grupos marginalizados ou oprimidos é devido & sna inferioridade genética, 4 sua vagabun- dagem, & sua maldade inata, etc. Também se cai em tergiversagées quando se recorre a explicacées da marginalizacio fundamentan- do-a na estrutura familiar dessas populagbes, na qual ainda man- tém costumes barbaros ow habitos de vida inadequados, etc. Uma das formas mais sofisticadas de tergiversagao, na qual atualmente também se costuma cair com freqiiéncia, esta naquilo 174 4 que podemos denominar como a psicologizacdo dos problemas. {. faciais e sociais. Oui seja, tratar de buscar a explicacao das sitwagoes de marginalidade baseando-se em andlises que tém como centro de estudo a pessoa individualmente considerada ou as relacdes interpessoais, sem prestar atencio a outras estruturas. Assim, ainda nao faz muito tempo, tratava-se de justificar que a margi nalidade da populagao negra se devia a que cada um dos integran- jtes dessa raga tinha uma dotacao genética mais deficitéria e/ou um { menor quociente intelectual que os da raga branca. Nessas formas de tergiversacio nunca se chega a prestar atencao as verdadeiras relagdes ¢ estruturas de poder que sio causa dessas situacdes de

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