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ESCRITAS DA VIOLÊNCIA – Unicamp – 20 a 22/09/2010

Coordenação: Francisco Foot Hardman, Jaime Ginzburg e Márcio Seligmann-Silva

Wilberth Salgueiro (Ufes/CNPq)


No verso da dor: humor (poetas, ainda, em tempos de pobreza)

B) EXEMPLOS de POEMAS DE TESTEMUNHO COM “TEMÁTICA INDÍGENA” (→ e alguns


toques para a leitura):

0. 1982, Paulo Leminski


1. 1971, Chacal
2. 1982, Leila Míccolis
3. 1983, José Paulo Paes
4. 1984, Millôr
5. 2006, Nicolas Behr
6. 2008, Glauco Mattoso

0. [1982, Paulo Leminski]1

xavante
muitos xxxxx
avante

→ A ideia de “avante” indica estar a cultura indígena, aqui particularizada na tribo


xavante (MT e GO), adiantada em relação à cultura urbanizada. A multiplicação dos “xxxxx” iconiza também
algo de enigmático, evidenciando que no próprio nome (“x/avante”) se inscreve o estágio avançado daquela
população.

1. [1971, Chacal]
PAPO DE ÍNDIO2

Veio uns ômi de saia preta


cheiu di caixinha e pó branco
qui eles disserum qui chamava açucri
Aí eles falarum e nós fechamu a cara
depois eles arrepitirum e nós fechamu o corpo
Aí eles insistirum e nós comemu eles.

→ Bem no espírito antropofágico oswaldiano, o poema mostra o “desencontro de


civilizações”. Os “ômi de saia preta”, representantes de fé e valores estranhos e indesejados, são recusados. Nos
versos, vence a decisão indígena de não se subsumir à força do outro. O humor marginal se faz desde o ambíguo
título em que “papo” diz de “conversa” e de “estômago”.

2. [1982, Leila Míccolis]


CANIBALISMO3

Aos poucos foram chegando


os portugueses,
os holandeses,
os burgueses com suas reses,
as queimadas,

1 LEMINSKI, Paulo. Caprichos & relaxos. São Paulo: Brasiliense, 1983, p. 104.
2 CHACAL. Muito prazer [1971]. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1997, p. 53.
3 MÍCCOLIS, Leila. MPB: muita poesia brasileira. Rio de Janeiro: Edições Trote, 1982, p. 145 [o poema
“Homenagem póstuma” também está na p. 145].
e a FUNAI pra proteger...
Hoje, numa floresta, em pé de guerra,
posseiros matam índios disputando
o direito de ver quem primeiro sai da terra.

→ Depois dos colonizadores externos (portugueses, holandeses) e internos


(burgueses e fazendeiros), os índios devem se defender da figura do grileiro – o canibalismo, outrora atribuído a
certos grupos aborígines, agora é geral.

HOMENAGEM PÓSTUMA

Dói essa sensação de desconforto:


hoje, todo dia é dia de índio.
Morto.
E como ele vai continuar a ser abatido,
logo erguerão um monumento-túmulo
ao índio desconhecido.

→ O poema aponta a extinção – em andamento – da população indígena.

3. [1983, José Paulo Paes]


19 de abril / DIA DO ÍNDIO4

o dia dos que têm


os seus dias contados

→ Repete-se: o poema aponta a extinção – em andamento – da população indígena.

4. [1984, Millôr Fernandes]


MiscigeNAÇÃO5
(dedicada à nova lei dos estrangeiros)

Poeminha multirracial

O cacique Borduna
E o mafioso Capoluna
Se encontraram
Na encruzilhada do Brasil;
Mil conceitos de raça
Pintados
Na paisagem verde-anil.
Se beijaram na boca
(Coisa pouca),
Pegaram
No louco motivo
Do progresso,
Subindo
Na locomotiva
Do regresso.
E cheios de fé,
Pondo fumaça antiga
Pelo Nariz
E pela chaminé,
Penetraram,

4 PAES, José Paulo. Calendário perplexo [1983]. Poesia completa. Apresentação de Rodrigo Naves. São Paulo:
Companhia das Letras, 2008, p. 261.
5 FERNANDES, Millôr. Poemas. Porto Alegre: L&PM, 1984, p. 89.
Siameses,
No atlas amarelo
Dos novos Estados
Japoneses.

→ Ironicamente, o poema diz das novas relações globais, em que as culturas se


misturam: índios (brasileiros), italianos, japoneses. Na mistura, os valores se hibridizam. A conotação sexual se
impõe, desde o nome do cacique (Borduna: porrete, cacete, tacape), ao beijo na boca até a insinuação, aqui
kitsch, da penetração.

5. [2006, Nicolas Behr]


[trechos do livro Umbigo]6

minha poesia come as cascas das feridas dos prisioneiros no campo de concentração
(p. 1)
minha poesia é o dops lá em casa no dia 15 de agosto de 1978 às três horas da tarde
(p. 16)
minha poesia é a pedra no estilingue do menino palestino morto com um tiro na
cabeça (p. 32)
minha poesia nada pode fazer contra os mísseis que explodem neste momento sobre
o afeganistão (p. 57)
minha poesia é um índio que vai dormir no ponto de ônibus mas leva extintor de
incêndio (p. 72)

→ Ao longo das 84 páginas do livro Umbigo, entre as mais de 2000 definições de


“minha poesia”, aqui e ali aparecem preocupações de ordem social. O verso 72 rememora o episódio trágico do
índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, que, com 44 anos, na madrugada do dia 20 de abril de 1997, teve o corpo
todo queimado por 5 jovens da classe média brasiliense (que disseram, então, pensar se tratar de um mendigo de
rua). Galdino morreu no dia seguinte. Os assassinos foram condenados, em 2001, a 14 anos de prisão, mas desde
2004 estão em liberdade.

6. [2008, Glauco Mattoso]


PARA UM ATRITO COM A TRIBO [2632]7

O quê? Mim não querer quinquilharia,


miçanga, anel, colar, porra nenhuma!
Pensando índio ser trouxa? Aqui não fuma
cachimbo algum da paz quem negocia!

Não quer índio saber pirataria!


Só quer que o cara pálida se assuma
e veja se a tal ongue logo arruma
as coisas que promete todo dia!

Um índio necessita é dum apito!


Faz falta, aqui na taba e na reserva,
quem ouça nosso apelo e nosso grito!

Aqui só vem o branco buscar erva,


madeira e mineral! Não acredito
que, desse jeito, a selva se preserva!

→ Diferentemente do índio da marchinha de 1960, de Haroldo Lobo e Milton de


Oliveira, o índio “moderno” não quer se deixar mais seduzir por quinquilharias dadas/trocadas pelo colonizador

6 BEHR, Nicolas. Umbigo. Brasília: LGE, 2006.


7 MATTOSO, Glauco. Cancioneiro carioca e brasileiro. São Paulo: Annablume, 2008, p. 28.
– imagem que se perpetua desde a Carta de Caminha. Cidadão, cobra as promessas de todos, do cara pálida
comerciante à ONG e aos ecologistas.

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