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A ANTROPOLOGIA NA ATUALIDADE* Cornelia Eckert AGRADECIMENTOS E APRESE!I TACAO Quero, antes de mais nada, agradecer ao CPG em Historia, pelo convite para compartilhar desta discussdo interdisciplinar que conside- ro muito pertinente, mas também impertinente e, por que nao dizer, pretensiosa. Além do que, falar de uma area de conhecimento na atuali- dade nos deixa sempre um gosto amargo do inacabado. Ciente destes limites tentarei trazer algumas reflexdes sobre as produg6es tedrico-metodolégicas que dao forma e contetido a Antropo- logia hoje. =. Desde ja posso convencé-los de que essa disciplina vive um rico momento de auto-avaliacao, autocritica do passado e do presente, sem | costurar necessariamente afirmagées certeiras ou respostas convictas. Nao se constréi alguma coisa sem desconstruir outra; n&o se produz paradigmas inéditos, mas paradigmas existentes sao criticados, repen- sados, bricolados e se complementam no deciframento légico sobre 0 real; no se produz uma sinfonia antropolégica melddica ou harmonica, mas ruidos e barulhos entre velhas formulagées de problemas e alterna- tivas ditas pés-modernas. Uma mudanga associada “ao processo de autocritica por que passa a antropologia hoje”, aos “desenvolvimentos recentes nas areas da critica de textos, histéria cultural, semidtica, filo- sofia hermenéutica e psicandlise” ¢ & conquista de “um espago novo, aberto pela desintegracdo do homem com telos de uma disciplina”, su- gere 0 antropélogo americano James Clifford.” Desde sua premissa basica, do relativismo cultural, a Antropolo- gia tem absorvido um carater critico na propria estrutura epistemoldgica. Critica que lhe garante a credibilidade cientifica. Cornelia Eckert ¢ professora do Departamento de Antropologia e do PPG em Antro- pologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul * Comunicagio apresentada no cusro de Extensio Histdria, hoje / CPG Histéria! UFRGS/1993. ‘Anos 90, Porto Alegre, n.2, maio 1994 7 eC F com este pano de fundo de questionamentos que busquei fazer uma reflexao das interpretagdes recentes sobre os caminhos trilhados pela Antropologia, nfo tanto em torno de seus objetos de estudo (cultu- ra e sociedade), que confirmam sempre a Antropologia como o estudo “dos modos de viver, de pensar e de conhecer de outros povos ou de diferentes setores da sociedade a que pertencemos”, mas para “pensd- laemseus fundamentos, como uma modalidade de conhecimento’™, numa espécie de etnografia do pensamento antropolégico cujas autorias e rai- zes sio internacionais. Mas antes de mergulhar nas correntes paradigmaticas da Antropo- logia gostaria de trazer-Ihes uma noticia... NOTICIA A GUISA DE INTRODUGAO Em julho deste ano ocorreu o XIII Congresso Internacional de Ciéncias Antropolégicas e Etnolégicas na cidade do México’ cujo tema foi As dimensées culturais e biolégicas da troca global. O que estava em debate niio era o desmoronamento dé paradigmas antropolégicos, mas como, a partir dos paradigmas existentes (e a perspectiva ética da antro- pologia), pode-se ambicionar a ampliag&o do projeto antropoldgico, o dar conta dos movimentos contempordneos da sociedade, da pluralidade dos didlogos, dos avangos tecnologicos sobre culturas singulares, e da disseminagao de identidades, dos movimentos transculturais, transnacionais. O tema, sem davida complexo, foi abordado levando em conta a heterogeneidade de cada pais quanto aos seus problemas, conflitos étni- cos, pobreza, lutas de identidade, descrédito sobre a ética de governos e politicos, guerras milenares, mas também a superagao de cisdes histéri- cas, refigurag4o espacial do planeta etc. A meu ver, um corpo de problemas foi levantado e discutido sob conceitos mais ou menos recorrentes: a) Como entender o mundo como uma articulagdo: ordenada de miultiplas e singulares histérias? b) Como abordar a dindmica destas institugdes globais, culturas globais, problemas globais (os direitos humanos, o desenvolvimento sustentado, controle da aids etc)? - ¢) Como pensar a diversidade das culturas submetidas a este mo- vimento geral de globalizag&o sem cair no erro de pensar em uma ten- déncia 4 uniformizagao identitaria? 8 Anos 90 d) Como dar conta das distintas manifestagdes que constroem os reais valores de uma civilizagio? Questionava-se também: a) A partir de que correntes paradigmiticas ¢ através de que meios teéricos podemos entender as participagdes das distintas populagdes humanas no surgimento e reproduciio do atual sistema global em que vivemos? E isto sem ter que “esquizofrenizar” com a angistia de ver nestes instrumentos analiticos, mais uma forma de dominagao no mun- do moderno. b) Como pensar teérica e metodologicamente 0 movimento transcultural, o desenvolvimento simultaneo de integragdio global e di- ferenciago local sem cair na armadilha de uma teoria planetéria como uma “fisica de relagdes equilibradas entre impacto econdmico e reagdes culturais”, mas sim perceber “gue os efeitos especificos das forgas ma- teriais globais dependem dos diversos modos como séo mediados em esquemas culturais loggis*? Tampouco era 0 caso de concluir? como bem colocou Sahlins, “que sé resta a Antropologia a tarefa de fazer wma etnografia global do capitalismo””. No aimbito das questdes es‘ava também colocada a tensaio de com- binar uma auto-avaliacao critica antropolégica - do relativismo cultural* - com 0 universalismo como valor ideoldgico da ciéncia, ou em outros termos, discutiu-se sobre as implicagées da ideologia (relativizadora) da Antropologia no mundo modemo ou pos-moderno. Se os antropélogos nao responderam a todas estas questdes, a im- portancia delas no minimo justificava este evento cientitico. UM ITINERARIO OBRIGATORIO: A EXPIACAO DE CULPAS DE UMA ANTROPOLOGIA INGENUA (SECULO XIX) Gostaria de nao abusar da paciéncia de ninguém repetindo 0 longo caminho percorrido pela Antropologia até adquirir estas tonalidades di- tas “atuais”, “modernas”, “contemporaneas” etc. Mas sabe-se da quase impossivel empreitada de evitar-se o reconhecimento da construgao do objeto primordial da Antropologia como a ciéncia que se propunha a estudar a origem da espécie humana como uma série rigida de suces- sdes. A questo da evolugiio estabelecendo uma nogo de Homem Uni- versal’ carece sempre de revisio e autocritica do modelo classico de Anos 90 9 etnografia pela sua atuagao junto a um processo politico imperialista, de expansio da ideologia colonialista européia dominante. No século XIX, Lewis Morgan introduz a histéria no reino natural e proclama uma premissa antropolégica basica: “a teoria da unidade psiquica da humanidade”, emunciagao que é também 0 mito de origem da ciéncia antropolégica. Para comprovar as fases evoluciondrias, pro- poe a andlise das culturas a partir de etapas de evolugdo progressiva e unilinear, delineadas por determinantes externos sobre as necessidades humanas basicas. O questionamento do evolucionismo ingénuo vem de todas as partes, rupturas que formaram Escolas: a Escola Histérico-Culturalista notadamente nos EUA, a Escola Funcionalista ou Funcional-Estrutu- ralista, notamente na Gra-Bretanha, as da Antropologia Social, Sim- bélica, Estruturalista e Dinamica, notamente na Franga. Mesmo o evolucionista francés Lévy-Briihl, o pensador da mentalidade primiti- va (1922), reavalia sua nogSo de pré-Idgico ao afirmar que “a estrutu- ra légica do espirito é.a mesma em todas as sociedades humanas co- nhecidas”'®. A Antropologia visa doravante propor uma teoria da relatividade cultural restrita, a principio, generalizada em seguida. Nao se trata mais de falar de mentalidades, mas de pensamentos e ldgicas diversas, de visdes de mundo ¢ estilos de vida diferentes, de representagdes simboli- cas e praticas sociais miultiplas. Junto a um novo método, o de Boas, o de Malinowski, reformulado teoricamente por Mauss, que aponta uma ética outra de interagdo, de intervengao e participagao, faz-se uma antropologia explicativa. De fato € sobretudo via uma etnologia francesa que nascem os instrumentos metodoldgicos e analiticos para romper com 0 etnocentrismo."! E toda uma nova geragao de antropdlogos americanos, franceses e ingleses que priorizam a representagaio do vivido pelo “outro” (0 “nati- vo”), a partir do processo interativo em campo (0 encontro intersubjetivo entre o pesquisador ¢ os pesquisados). O outro é descrito como diferen- te a partir do seu préprio ponto. de vista, seu préprio discurso (visio émica), traduzido pelo antropdlogo em textos etnograficos/etnolégicos. Mas isto niio sem os vicios de uma Antropologia aplicada, de andlises comprometidas com a ideologia das instituigdes cientificas e governa- mentais americanas ¢ curopéias financiadoras ¢ solicitantes das pesqui- sas de campo. De qualquer forma, nfo se trata mais de descrever sistemas evolutivos, de provar supremacias raciais, mas de descrever a diversi- 10 Anos 90 dade do mundo, a singularidade de cotidianos vividos, das praticas tipi- cas ou tradicionais e seus sentidos, enfatizando as permanéncias sociais (Malinowski) ou a dinamica das mudan culturais (R. Firth, Evans- Pritchard) as formas de dramatizar 0 social (Gluckman, Turner) que podem ser observadas pelo pesquisador.!? As culturas a partir de percepcdes subjetivas objetivadas, praticas ¢ agdes sociais como objetos fundamentais da Antropologia passam a ser analisadas como “ordens de significado de pessoas e coisas”*. De Boas, de Malinowski, de Mauss apreende-se o método de uma observa- ao completa, participante e viva das sociedades estudadas, de uma “imersdo no cotidiano de uma outra cultura’* e a ética profissional (dominio da lingua nativa, relativizagao ética dos dados colhidos, quali- tativa e quantitativamente)'’, revelando o sentido de culturas diferentes numa critica ao etnocentrismo e ao racismo. Fica clara a tarefa do antropélogo, encarregado de investigar “wm sentido em configuragées muito diferentes, por sua ordem de grandeza ¢ por seu afastamento, das que estéio imediatamente préximas do obser- vador""®, e fica evidente a pratica antropologica como a “busca da gra- mitica da vida humana e social a partir da diversidade presente™"”. Isto se faz com o postulado do relativismo cultural de que os com- portamentos das pessoas e as construgées sociais devem ser apreendidas desde sua propria cultura para sé entdio conquistar um plano comparati- vo e uma perspectiva generalizante, que transcende a diferenga particu- larizada e relativa, para encontrar os principios bisicos inconscientes e universais, “as estruturas permanentes”, “as formas elementares”, nos termos de Lévi-Strauss. UM JOGO DE FUSOES E TENSOES: OS PARADIGMAS ANTROPOLOGICOS NA MATRIZ DISCIPLINAR DE CARDOSO DE OLIVEIRA Reafirmo que a Antropologia hoje tem questionado e “descons- truido” seus paradigmas emblematicos. Para compreender estas trans- formagées, apresento estes paradigmas conforme exposigio de Cardoso de Oliveira. Este autor reavalia os diferentes paradigmas numa espécie de fusio de horizontes antropoldgicos formadores de uma matriz disci plinar de duas perspectivas: tradigdo e cronos. Nesta matriz os paradigmas antropolégicos aparecem associados em relago estrutural (bindria e antinémica).'* Anos 90 ae r— ‘Temios, assim, na perspectiva de suas tradi¢des uma linha vertical abrigando wma tradi¢dGo intelectualista e outra empirista. Na linha hori- zontal temos a perspectiva caracterizada pela categoria tempo presente nas citadas tradigdes, contendo um eixo sincrénico, isto é, uma “pers pectiva atemporal (pois mesmo negando o tempo por ele se define)” e um eixo diacrénico, ou seja, uma perspectiva “temporal ou histérica, no seu mais amplo sentido”.° Divididas por coordenadas cartesianas encontramos, segundo Car- doso de Oliveira, as seguintes associagSes: © 1. A tradig&o intelectualista cruzada com o eixo sincrénic: paradigma racionalista, exemplificado com a Escola Francesa de Soci- ologia de Durkheim, Mauss e Hubert. Em sua forma moderna, estrutu- ralista, com Lévy-Strauss. 2. A tradigao empirista cruzada com 0 eixo sincrénico: paradigma estrutural-funcionalista, expresso na Escola Briténica de Antropologia, com Rivers e Radcliffe-Brown, onde “o tempo é colocado entre parén- teses em nome da defesa do conhecimento objetivo ameagado pela his- Loria especulativa” 2° 3. A tradigao empirista cruzada com 0 eixo diacrénico - paradigma culturalista na forma em que é atualizado pela Escola Histérico-Cultu- ral Norte-Americana, comegando com Boas e seus seguidores, como Kroeber. Nesta tradig&o a histéria e o interesse pelo individuo sao reintroduzidos via noges de cultura-personalidade através da obra de Benedict, Mead, Sapir etc. 4. A tradigfo intelectualista cruzada com o eixo diacrénico - paradigma hermenéutico, gerador de uma modalidade de Antropologia dita interpretativa, conforme propée Clifford Geertz?!. O tempo é interiorizado, conforme o pensamento hermenéutico de Dilthey, Ricoeur, Heidegger ou Gadamer. Cardoso de Oliveira acrescenta ainda que muitos dos mais impor- tantes antropdlogos sempre transitaram, “consciente e criticamente, en- tre os paradigmas, entre as Escolas”, como Malinowski, Evans- Pritchard, Leach, Schneider, Godelier, Louis Dumont etc, buscando seus referenciais complementares muitas vezes em outras abordagens, como é o caso de Godelier com a chamada “antropologia marxista” ou Balandier com a “antropologia politica”. Analisando esta matriz, pode-se verificar que “historicamente pas- samos de uma concepg¢éo de ciéncia marcada por uma visio racionalista do conhecimento, para uma tradi¢do empirista ciosa de diferenciar-se da metafisica”. Acrescenta Cardoso de Oliveira: “A passagem entre 12 Anos 90 esse segundo e 0 terceiro paradigma, ambos (...) imersos na mesma tradigdo, representou a recuperagio da historia, encontradica nos pri- mérdios da disciplina”. No tltimo paradigma, 0 hermenéutico, “por meio do qual a antropologia, interiorizando o tempo exorciza a objeti: vidade, é que a vemos reconciliar-se com um pensamento néo compro- metido com o idedrio cientifico ou ‘cientificista’” No paradigma da Antropologia Interpretativa’’, encontra-se a pro- posta de uma antropologia “nova” em continuidade aos outros paradigmas englobados doravante pelas definigdes de classicos ou tradicionais, isto é, antropologias tradicionais. E a Antropologia Interpretativa que per- mite a fusao de horizontes de que fala a filosofia hermenéutica de um Gadamer ou de um Ricoeur.** Assim, 0 paradigma hermenéutico reivindicado por Geertz se opde 4 Antropologia Tradicional, “primeiramente por uma negagao radical daquele discurso cientificista exercitado pelos trés outros paradigmas; em segundo lugar, por uma reformulagéo daqueles trés elementos que haviam sido domesticados pelos paradigmas da ordem: a subjetivida- de, que liberada da coeredo da objetividade, toma sua forma persona- lizada (portanto o individuo socializado) e néio teme assumir sua indivi- dualidade e a historia, desvencilhada das peias naturalistas que a tor- navam totalmente exterior ao sujeito cognoscente, pois dela se espera- va fosse objetiva, toma sua forma interiorizada e se assume como historicidade. Esses trés elementos, assim reformulados, passam a atu- ar como fatores de desordem daquela antropologia que os interpretati- vistas tendem a chamar de ‘antropologia tradicional’, sustentada pelos paradigmas da ordem 2 Para Cardoso de Oliveira, interiorizagao do tempo nao significa, entlo, outra coisa que a admissao tacita pelo pesquisador hermencuta de que a sua posigao histérica jamais é anulada; ao contrario, ela é res gatada como condigao do conhecimento. Conhecimento que, abdicando de toda objetividade positivista, realiza-se no proprio ato de “tradu- ¢do”* Indica a transformagao da histéria exteriorizada e objetivada em historicidade, viva e vivenciada nas consciéncias dos homens e, por cer- to, do antropdlogo. A CIENCIA DAS SIGNIFICAGOES Privilegio neste momento refletir sobre as teorias idealistas de cul- tura em detrimento, por falta de tempo, de teorias que consideram a Anos 90 13 >——— cultura como um sistema adaptativo (Leslie White, Marvin Harris, B. Meggers), onde de forma renovada destaca-se o trabalho de Sahlins, autor, a meu ver, de uma das mais ricas revisdes criticas de teorias da cultura.?” Retomemos a proposigao de uma antropologia social, para isto detenho-me na produgao francesa. Na Franga do inicio deste século, depois de Durkheim que defen- de apreeminéncia do fator social e que participa com seus seguidores da fundagao de L’ Année Sociologique em 1898, temos a constituigaio de programa especifico da ciéncia etnolégica, tarefa empreendida por Marcel Mauss, Paul Rivet, Lévy-Briihl, Hubert entre outros. Nasce uma nova disciplina, a Antropologia Social, tendo por especificidade de objeto 0 estudo das sociedades simples e por procedimento epistemolégico a perspectiva alimentada pelo método comparativo e 0 conhecimento etnografico de sociedades diferentes da do pesquisador. Nesta dimen- so antropolégica, o estudo do “outro” é reciprocamente 0 estudo de um “nds”, com 0 objetivo de se atingir, num segundo nivel de anélise, uma dimens§o universal. Mauss recorre A nogfio de inconsciente para melhor dar conta da natureza das representagées coletivas (“‘categorias do entendimento”) ¢ jam 1902, recomendava aos etndgrafos “buscar os fatos profundos, inconscientes quase, porque eles existem apenas na tradigéio coletiva” Talvez seja o conceito de fato social total”, proposto por Marcel Mauss, aquele que melhor caracteriza a abordagem antropolégica liga- da a pratica etnografica: “Menos a preocupagdo de isolar e analisar sistemas econémicos, politicos, juridicos ou religiosos, do que o esfor- ¢o de integrar todos estes aspectos em termos de prdticas sociais cujas miiltiplas dimensées se unificam pelo significado” .° E esta mesma tradigdo que contemporaneamente encontramos na obra de Lévi-Strauss ¢ de Dumont*!: “(...) em ambos as categorias do entendimento continuam a se constituir no centro das indagagées an- tropolégicas”. Nesta tradigao 0 “nds” segue no se referindo ao antro- pologo como ator, “mas a ideologia ou civilizacdo do mundo (ociden- tal) que ele representa e incorpora, e tem como objeto primordial o estudo de wna perspectiva comparativa, de valores sociais, também definidos como ideologia ou representagdes” Entretanto, é em Lévi-Strauss que a Antropologia Explicativa ga- nha seu maior refinamento™; a Antropologia colocada como uma cién- cia semiolégica (Saussure). O antropélogo em campo toma as narrati- vas como modelos conscientes, tradugdes de vivéncias empiricas. Seu 14 Anos 90 r— objetivo é alcangar a estrutura inconsciente do espirito humano; das sub- jetividades interpretadas chega a objetividade encontrada, “onde ndo hd variagéio possivel: a inconsciéncia™. Por “baixo da sujetividade da consciéncia’, Lévi-Strauss busca a “objetividade do inconsciente”®. A cultura é definida como sistemas estruturais, como “um sistema simbé- lico que é uma criagdo acumulativa da mente humana’. A tarefa do antropélogo aqui é descobrir na estruturagao dos dominios culturais - mito, arte, parentesco e linguagem - “os principios da mente que geram essas elaboragées culturais” >> Lévi-Strauss formula autrement uma nova teoria da unidade psi- quica da humanidade, uma etnologia comparavel a astronomia: uma observagao a partir do exterior”. A metafora é usada para sugerir uma distancia que separa o olhar do objeto sobre o qual repousa. Apesar de a intengao do olhar no ser questionada, tampouco a natureza apreendida do objeto, essa abordagem evidencia uma pretendida relagao de objeti- vidade entre ambos. A distancia, a manipulagao de um método, nao influencia eventuais transformag6es ocorridas no objeto, nem altera sua natureza.*° Mas 0 mergulho ortodoxo no estruturalismo Iévi-straussiano aporta dificuldades ao trabalho antropolégico no que se refere ao “privile- giamento da razdo analitica em detrimento, quase uma anulagdo, da razdo dialética™' e & supremacia do momento sincrénico. O “rigor for- mal exigido pelo estruturalismo” afasta-se da historia, “sacrifica 0 particularismo, a multidimensionalidade revelados pela pesquisa empirica voltada para grupos atuantes”.® Como elucida Cardoso de Oliveira, era preciso encontrar na histéria dos contatos entre sociedades ena propria histéria da disciplina os limites e as eficcias na construgao do conhecimento antropolégico. E aqui que entra a tiltima pega deste bric-a-brac de paradigmas. A proposta interpretativa do americano Geertz coloca a Antropologia pro- xima de um antigo casamento: a historia. Em suas obras 4 interpretagao das culturas e O conhecimento local, 0 autor acentua no s6 0 encontro intersubjetivo (pesquisador/informantes) mas também 0 contexto do en- contro histérico em si e a construgo da narrativa. o trabalho artesanal das etnografias (estas sfo ficgdes no sentido de “algo feito”, “algo construido™*). Segundo os pressupostos de Geertz, “é 0 sentido que pro- porciona um entendimento sobre 0 mundo, e a racionalidade é apenas uma expressdo desse entendimento. A racionalidade, também ela, esta mesmo inserida dentro de um ponto de vista. Assim, sé ha racionalidade se houver sentido. A racionalidade, também é uma racionalidade-para”.* Anos 90 15 Ao contrario de Lévi-Strauss, para Geertz, “os simbolos e signifi- cados séo partilhados pelos atores (os membros do sistema cultural) entre eles, mas néio dentro deles. Séo mais piblicos que privados. Estu- dar a cultura é portanto estudar “m cddigo de simbolos partilhados pelos membros dessa cultura -erpreta-lo e nao decodifica-lo, como propde Lévi-Strauss. Geertz no busca as estruturas profundas e permanentes do pensa- mento humano; busca interpretar “como pensamos atualmente” e rei- vindica uma etnografia do pensamento moderno: “wna tentativa ndo de exaltar a diversidade, mas de tomd-la seriamente em si mesma, como um objeto de descrigdo analitica e de reflexdo interpretativa”.” Se com a Antropologia Estrutural de Lévi-Strauss, temos “wna codificagdo de leis regulares’**, em Geertz “o conhecimento obtido resulta na compre- ensdo de um evento, que ndo tem na influéncia das leis sua explicagdo. Se o conhecimento estruturalista tem pretensdo a universalidade obje- tiva, o interpretativista adota um ponto de vista e assume uma inter- subjetividade”.” Se um é explicativo, o outro é compreensivo. E neste caso a Antropologia nao aparece como uma “ciéncia da alteridade” pela construgdo de um discurso sobre o outro, mas de um didlogo com o outro, caracterizando uma Antropologia reflexiva, dialégica.” Mas assim como Lévi-Strauss, Geertz vai beber na fonte da Teoria dos Significados (Semiologia ¢ Semiética).!! Em Geertz a Antropologia & compreensiio®, ¢ a cultura (semistica) é “wma teia de significado: (no que se inspira em Weber), “wn complexo jogo de interpretacées e contra-interpretagdes, possiveis porque intérprete e interpretado co- mungam os mesmos mundos de sentidos, que produz tal ‘teia’”®. Em- bora se inspire em Weber, ao contrario deste para Geertz “a agdo social é 0 pressuposto do sentido, seu lugar. Nao ha sentido sem agdo”; nio é de se estranhar portanto que hoje Geertz proponha uma Antropologia hermenéutica.™ A Antropologia de Geertz nao se opde radicalmente ao trabalho de Lévi-Strauss. Esta consciéncia hermenéutica reinvindicada por Geertz “consolida-se exatamente na interacdo dialética entre explicagdo e com- preenséo, num vaivém entre elas que pressupoe a superacdo de ambas numa hermenéutica que as ultrapassa”.°> Azzan Junior critica em Geertz, que hermenéutica e empirismo, se confundem na Antropologia’*. Cardoso de Oliveira, por sua vez, per- gunta se “consciéncia hermenéutica na Antropologia pés-moderna” nio estaria nos levando para os limites da ciéncia com a filosofia? Ou ainda, do cientificismo ao humanismo? Ou ainda, nos deslocando - como antro- 16 Anos 90, pologos - da explicagao causal ou funcional-estrutural para a compreen- sao de sentido?*’ Acrescento mais uma critica, a de Michael M. J. Fischer, que avalia que a “estética do insight fragmentario (...) é uma forma de critica salutar e atenta e tem um efeito renovador ao trazer de volta o prazer de explorar e descobrir”. Mas, em tiltima anilise, segue ele, “é insatisfatéria porque deixa de responder aquela obrigagéo para com 0 lado cientifico, sistematizante e generalizante da empresa antropoldgi- ca 5 Apesar dos limites deste “enxerto do problema hermenéutico na disciplina”, pode-se apontar um ganho, visto que “gracas ao exercicio continuo da suspeita (da teoria, do autor, da exclusividade do conheci- mento cientifico, etc), uma perspectiva critica sistemdtica sobre as dife- rentes modalidades de saber” vem sendo introduzida na Antropologia tornando-a “uma disciplina sensivel ndo apenas d relatividade de cultu- ras outras que a do pesquisador mas também as ‘culturas’ interiores as disciplinas, isto 6, aos seus paradigmas: Finalmente tornou a questéo epistemoldgica um problema de consideragdo inevitével para qualquer investigacdo etnogrdfita que se pretenda contempordnea e consistente com a atualidade da Antropologia” 2° NOVA ANTROPOLOGIA OU NOVIDADES NA ANTROPOLOGIA? A nova etnografia Importa agora falar um pouco sobre o que tem se autodenominadado de uma nova antropologia. Iniciemos pela chamada nova etnografia (William Sturtevant, Ward H. Goodenough), que surge nos Estados Unidos no inicio dos anos 80. O interesse recai sobre as varias “abordagens formais da andlise de materiais etnograficos - etnociéncia, etnossemdntica, andlise componencial etc”. A nova etnografia problematiza questdes em tor- no do método etnogrifico, da pratica de campo, apoiando-se sobre uma reflexao conceitual da “relagdo entre a linguagem, as regras cognitivas, os principios e cédigos, por wn lado, e os padrées de comportamento e organizacdo sociocultural, por outro lado”! Ao contrario de L De Strauss ¢ mesmo de Geertz, a nova etnografia aceita simplesmente “o: modelos conscientes de uma comunidade”, forma reducionista de aftr. mar que “os significados estiio na cabeca das pessoas”. Seu objetivo imediato é de “tentar eliminar ou, ao menos, neutralizar, as Anos 90 17 tendenciosidades potencialmente distorcidas do etnégrafo”® voltando- se apenas para as categorias dos informantes (emic) em detrimento das categorias do antropélogo (eric). Isto é, “tornar a descrigdo emografica mais acurada do que fora, presumivelmente, no passado”. Goodenough chega mesmo a propor uma separagiio entre ser etndgrafo descritivo ¢ ser ctndlogo comparativo. Formulagao inaceita- vel pela academia classica em varios aspectos, sobretudo por apoiar-se. a Antropologia, na constante inter-relacdo entre os conceitos e principi os da disciplina c suas investigagées empiricas e por entender 0 método antropolégico composto por estas duas praticas como “momentos dis- tintos mas complementares, cuja unido permite apreender o que Mauss denomina o ‘fato social total’ (1. a apreensdo da significagao do com- portamento dos individuos; 2. a transposigdo desta vivéncia nos termos de uma compreensao objetiva).”** Ou entao, para parafrasear Sahlins, 0 estudo da cultura visto “ndo simplesmente mediando arelagdo humana com 0 mundo através de uma légica social de significagdo, mas com- preendendo através daquele esquema os termos objetivo e subjetivo re- levantes da relagao.”** * Com certeza a nova etnografia pds em cena a importancia de reavaliar-se 0 método tradicional da Antropologia, historicizando 0 pré- prio método e criticando algumas linhas analiticas de forte generaliza- g4io.°° Pode-se dizer, no entanto, que houve um mergulho exagerado nas categorias emic,.colocando-se nos limites de um método analitico esotérico ou paramental. A final, “ninguém tem acesso direto a mente de qualquer pessoa. Portanto a etnografia é também, em ultima andlise, inferéncias tragadas pelo etnégrafo - elas sdo as suas concepgées do que deveriam ser as concep¢des dos informantes’”®’, a interpretacao de interpretagdes, como nos ensina Clifford Geertz, ou uma das leituras possiveis do social, como nos ensina Lévi-Strauss. Ou, ainda, somos todos inevitavelmente comparadores, ensina a premissa antropolégica, cisso significa que o etnégrafo “tem que empregar categorias de pensa- mento tragadas da antropologia e ndo exclusivamente do informante nativo”®, Etnografias realistas e pés-modernas, Antropologia do texto, da retérica, da critica. Por uma pés-Antropologia? Os mais recentes ruidos vém igualmente do questionamento da pesquisa de campo e da construgiio do texto etnografico tomando ora as tonalidades de uma antropologia interpretativa, ora de uma antropolo- 18 Anos 90 gia critica, dialégica, alegérica, pés-moderna etc. Segundo Cardoso de Oliveira: Tais estudos (...) partem do paradigma hermenéutico, cujo micleo estd na propria nogéo de Comprender (Verstehen), independentemente das diferentes modalidades de apreensao etnogréfica - elas mesmas destinadas a se constituirem em verdadeiros ‘experimentos’(...) onde a intersubjetividade, a individualidade e a historicidade passam a ser exercitadas pelo pesquisador.® A repercusio das posturas hermeneutas (pés-modernas) foi tanta que pode-se falar em um movimento, sendo no entanto falso pensar-se em uma postura homogénea - este proposto “movimento” é marcado pela heterogencidade de posigdes, 0 que o préprio titulo deste item de- nuncia. A proposta mais comum ¢ a de “escrever etnografias tendo como modelo 0 didlogo ou, melhor ainda, a polifonia.”” Os “meta- etndgrafos”” (Geerté,‘Rabinow) querem chamar a “atengdo para o fato de que a maneira como se faz etnografia/pesquisa de campo esta inti- mamente ligada & forma como se escreve, como se constr6i etnografias em textos. Assim, estdo intimamente relacionados na constru¢gdo etnogrdfica a pesquisa de campo (incluindo, naturalmente a escolha do objeto), a construgéo do texto e 0 papel desempenhado pelo leitor””?. O certo é que a etnografia é um exercicio reflexivo. A novidade consiste em pensar sujeito, objeto e contexto como uma totalidade e em avaliar 0 contexto no qual ocorrem estas preocupagées e¢ se produzem as ctnografias, De acordo com Caldeira: Nesta viséio, ‘cultura’ é sempre algo relacional, uma inscrigdo de processos comunicativos que existem, historicamente, entre sujeitos em relagées de poder (...)”. A énfase é nos elementos do encontro intersubjetivo historicizado (© contexto em que sio produzidos também é historicizado), e aqui a postura tedrica do etnégrafo é visivel, suas tendenciosidades culturais sao trabathadas ¢ o seu papel participante esta explicito: (..ndo se trata de um presente definido pela narrativa histérica, mas sim pela mem6ria, as suas préprias narrativas e tragos, uma ‘arte de meméria’ que é sinénimo com o processo fragmentado da constru- Anos 90 19 ¢ao de identidade num local - um presente cujas formas sociais espect- ficas sdo dificeis de serem captadas ou até de serem vistas de forma etnogrdfica - e que por isso coloca outra problematica a ser explorada na produgo de obras modernistas.”* Mas quem é esta “turma do barulho”? E de onde partem estes no- vos sons “polifénicos” e ditos pés-modernos? Localiza-se a oficializagaio deste movimento no Seminario realizado em Santa Fé Novo México, em 1984, do qual participaram, entre outros, James Clifford, Mary L. Pratt, Vincent Crapanzano, Renato Rosaldo, Stephen Tyle, Talal Asad, George Marcus, Michael Fischer, Paul Rabinow etc. Entre eles, George Marcus e Michel Fisher defendem a disciplina como “critica cultural e o fazem num momento experimental das ciéncias humanas””*, como preferem classificar o perfodo atual da Antropologia cultural americana. Diz Trajano: E-exatamente a partir de uma elaboragdo critica da nogéo de cultu- racomo texto que temas tais como a autoridade cientifica e etnografica, acrise da representagdo, recursos retéricos e fazer etnogrdfico, didlo- go e polifonia, poder e dominagéo, entre outros, séo objetos de reflexdo na obra de Clifford e Marcus in Writing Culture.” E Geertz como se posiciona nesta polémica? Incorporado a Antro- pologia Interpretativa, Geertz é criticado pelos “pds” (Dwyer. 1979, Crapanzano, 1986) por limitar 0 aspecto dialdgico e situacional da in- terpretagio. A reflexdo maior cai sobre o aspecto artesanal da constru- cdo etnografica, “abrindo-se espago para criagées e construcées litera- rias que independem de definigées do que seja arte, literatura, ciéncia ou historia’.”” Como \embra Peirano: Neste contexto, a linguagem volta a merecer uma aten¢do especi- al. De novo, é preciso lembrar que a dimensdo literdria nunca esteve ausente da antropologia, como atestam os trabalhos de autores cldssi- cos, de Malinowski e Bateson a Lévi-Strauss e Geertz. No entanto, a questéo da ‘literaridade’ da antropologia e, especialmente, da etnografia é hoje mais que uma questéo de estilo.” Sem querer formar escola, estes antropslogos buscam romper com ‘o positivismo cientifico, com as diversas formas de reducionismo e com o empirismo ingénuo”, assumindo a “defesa de uma postura 20 Anos 90 humanista para o fazer antropolégico e do cardter provisério e parcial de toda andlise cultural”, onde a fungao de uma etnografia modernista se coloca sobremaneira como a de fazer “uma critica cultural”. O que perpassa em todos estes autores da nova Antropologia é as- sim sintetizado por Peirano: 1°) “A dimensdo literdria que diz respeito a ‘constituigdo dos ob- jetos culturais, as maneiras com que fenédmenos coletivos sao configu- rados (...) e as formas com que estas configuragées fazem sentido em determinadas formas de leitura’”**, 2°) “A nogéio de ‘observacdio participante’ é complexificada pela questdo do ‘confronto etnogrdfico’, onde a pesquisa de campo resulta em um didlogo, e é nesta dimenséio dialdgica que o texto antropolégico é dimensionado”. Dir-se-ia que sao requisitos para uma etnografia modernista: a) revelar uma atitude experimental transposta na andlise e na ela~ boragao do texto, tanto no relato experiéncias reflexivas explicitadas pelo autor como no processo de explicar como a estrutura se articula com as experiéncias culturais éspecificas; b) a especificacdo de como o global se articula com o local ou de como se exprime atualmente, como as identidades se formam na simul- taneidade da relagiio entre niveis de vida e organizagdes sociais (“isto é, a co-existéncia (...) do Estado, economia, midia internacional, cultura popular, regiao, do local, contexto transcultural, do mundo do etndgrafo e dos seus sujeitos tudo ao mesmo tempo”). Trajano Filho organiza em quatro tépico produgao deste gru- po*: 1°) dentincia e desmistificagdo do estilo realista das etnografias classicas, focalizando temas como a constitui¢o da autoridade do autor da etnografia e os recursos estilisticos utilizados para tal (Pratt, Crapanzano e Rosaldo); 2°) reflexfio sobre as possibilidades e os limites do conhecimento antropolgico contemporéneo e por sugestées de carater mais geral e tedrico o alargamento destes limites (Clifford e Tyler); 3°) exame de formas concretas e existentes de experimentagao em etnografia (Marcus e Fisher); ‘4°) relag&io entre o experimentalismo e as condigdes de poder e dominagiio (Asad, Rabinow e a conclusao de Marcus). Estes estudiosos, na opiniao de Trajano Filho, advogam “wma con- Anos 90 21 -——— — cepedo abrangente para a etnografia, uma dimenséio ética para o fazer antropolégico e uma énfase nas insténcias especificas do discurso, em vez do foco na representagéo do mundo”. Continua-se a incentivar a experimentagaio na construgao das etnografias, “propondo 0 modelo do didlogo que sempre conduz & explicitagdo das diversas vozes que falam e do contexto das falas”.* Em acréscimo: (..) @ alternativa modernista de ‘voz’, no sentido de aceitar a montagem de polifonia como simultaneamente um problema de repre- sentacdo e de andlise, provavelmente tem tanto a ver com as mudangas de ética no emprendimento etnogrdfico como com uma insatisfagéo no que se refere & andlise estrutural de fenémenos culturais.®° Neste contexto, a intersubjetividade concretizada na experiéncia de campo reflete uma nova dimensiio comparativa, a preocupaco com um nds”: “ndio se desenvolve como perspectiva teérica, mas como resulta- do politico da pesquisa”. Nao se trata apenas de “ler” ¢ “traduzir” um corpus estavel de simbolos e significados, como nos sugere Lévi-Strauss, ou interpretar as interpretagdes, segundo Geertz, “adere-se agora a uma definicdo de cultura temporal e emergente, na qual os cédigos e representacdes sdo suscetiveis de serem sempre contestados”™. Dai surgem duas conseqiiéncias, aponta Peirano: J. “a primeira, que a emografia passa a ser vista como tarefa experimental e ética”; 2. “a segunda, que o leitor deixa de lado sua atitude passiva e é visto como necessariamente implicado no projeto de construgao etnografica. Quer aceitando, rejeitando, ou modificando a percepgao do antropélogo, o leitor tem que se unir ao didlogo (Dwyer, 1979; Clifford, 1986)” Segundo Mareus, na etnografia realista ou modernista (em diregaio a pressupostos modernistas sobre a organizagiio da realidade social con- temporanea), trés requisitos tratam da construgiio dos sujeitos de uma etnografia: espago, tempo e perspectiva ou voz. Além disso, trés requisitos dao conta das estratégias para estabelecer a presenga analitica do etnégrafo no seu texto: o didlogo adequado de conceitos analiticos (onde se privilegiam autobiografias, que melhor permitem avaliar as experiéncias histéricas “carregadas na meméria e que determinam a for- 22 Anos 90 ma de movimentos sociais contemporaneos”, a bifocalidade e a justapo- sigdo critica das possibilidades.” Considera Marcus 0 carater bifocal da pesquisa etnografica, “um caréter que é ressaltado pelo significado modernista do real - que 0 mundo geralmente e intimamente esta se tornando mais integrado, e que isto paradoxalmente, ndo esta levando a uma compreensGo mais facil da totalidade, mas muito pelo contrario, a uma diversidade cada vez maior das ligagées entre os fendmenos, antigamente concebidos como disparos e pertencendo a mundos diferentes” >» Nos foruns atuais da Antropologia brasileira as reflexdes e criticas aos pés-modernos é tema de peso, como pudemos perceber nos posicionamentos aqui citados de Mariza Peirano, Tereza Caldeira, ‘Trajano Filho etc. Como mostra Caldeira, “os pressupostos de que par- tem os pos-modernos nascem da critica ao uso das conven¢des classi- cas, inspiradas pela teoria que concebia as culturas como totalidades e pela construgao da experiéncia de campo segundo os requisitos de cientificidade” ‘No entanto, esta pds-antropologia, ou antropologia auto-reflexiva, “preocupada ao extremo com a éonstituigdo e a construgdo de etnografias, tem abdicado de ver no antropélogo, no informante e no leitor atores socioldgicos. Tem abdicado, assim do importante aspecto da auto-reflexiio tebrica e histérica da disciplina”. Como sugere Peirano, “sem negar a importancia da problemdtica do encontro etnografico em si, somente a inclusGo de um questionamento num contexto tedrico mais amplo poderia, em tltima instancia, abrir espago para um didlogo maior entre os praticantes da disciplina. Este tipo de didlogo implicaria com- binar os problemas do encontro etnogréfico, a construgdo de etnografias e areflexdo tedrico-sociolégica”.» Continua esta autora: (...) éjustamente aqui que a questéo sobre uma reflexividade da antropologia sobre si prépria em termos socioldgicos e historicos se torna necessdria. Porque, se uma antropologia ‘teoricamente inspira- da’ pode nao atingir leigos, uma antropologia-para-leigos pode ainda se considerar antropologia? Esta é uma questdo que justamente uma nova concepedio etnogrdfica deveria resolver2* Como diz Trajano Filho, este “barulho” todo vem de uma academia americana em crise com problemas na produgao da demanda. Temos sem- pre que perguntar até onde chegaram os pés-modernos e, lembra ainda 0 autor, apesar dos pés-modernos apontarem para questdes gerais de An- Anos 90 23 OO tropologia, o mais realista ¢ afirmar sobre a existéncia de Antropologias, aquelas feitas no Brasil, na India, no México etc, e que estas no siio exatamente idénticas nao dividem as mesmas questdes daquela feita na América do Norte®. Tereza Caldeira avalia um aspecto importante, os pés-modernos recolocam em discussao a dimensao politica e de critica cultural. Mas, denuncia a autora, a discussio se limita a politica do texto, assinalando a auséncia de discussées sobre 0 contexto politico em que se dé o pro- cesso de construgio etnogrifica e a avaliago da construgao: As alternativas sGo basicamente textuais: referem-se a como en- contrar uma nova maneira de escrever sobre culturas, uma maneira que incorpore no texto um pensamento e uma consciéncia sobre seus procedimentos.° As criticas surgem, alids, da propria avaliag%io de pés-modernos como Rabinow: i (..) para Rabinow, a discussdo textual nunca vai se sustentar por si s6. Ela deveria estar aliada a uma anéilise como a que é feita por Bourdieu (1983) e que tenta localizar autores em instituigdes num cam- po epistemdlogico e de poder, com estratégias préprias e marcado his- toricamente. Deveria estar também associada a uma andlise inspirada em Foucault, que tentasse analisar as relacdes de poder que definem quais enunciados podem ser aceitos como verdadeiros em cada mo- mento. A discussdo textual seria ainda insuficiente, na perspectiva de Rabinow, por néo incorporar uma andlise sociolégica que estabelega as mediagées entre, por exemplo, as criticas ao colonialismo realiza- das em um nivel macro e os experimentos textuais. O que estaria faltan- do, em suma, seria questionar a academia americana nos anos 80 ¢ seus jogos de poder. Até hoje, contudo, os pds-modernos parecem nao ter se atrevido a isso.” Assim a dimensao politica da critica antropolégica nao se limitaria auma apreciag&o das condigdes de produgao do conhecimento, coloca-se a possibilidade da antropologia vir a realizar uma critica cultural das sociedades que estuda e mesmo das sociedades dos antropélogos™. De fato, penso que este vasto panorama aqui resumido néio faz mais que mostrar a dinamica de abordagens ¢ perspectivas, nem sempre complementares, das diversas maneiras do fazer antropolégico. Limites O4 Anos 90 e “furos” existem, mas acredito que Marcus tenha razao ao dizer que 0 estudo do moderno ou da modernidade, da organizagio da realidade soci- al contempordnea, “exige wm quadro de referéncia diferente, a consci- éncia disto é 0 que tem ocupado tanto tempo na teoria social do século XY, ela mesma um projeto de auto-identidade que ainda ndo se comple- tou ou que talvez ndo seja possivel completar”.” UM POUCO DOS REFLEXOS DA TENSAO DE PARADIGMAS MARCANDO A ESPECIFICIDADE DA ANTROPOLOGIA NO BRASIL Nao disponho de muito tempo para comentar sobre como percebo uma Antropologia brasileira na atualidade como lhe seria justo. No mini- mo um breve roteiro de sua trajetéria deveria aqui ser perseguido. Me limito a remeter ao roteiro de Julio Cezar Melatti, publicado no BIB n° 17. S6 me resta discorrer rapidamente sobre alguns aspectos que vém ao encontro dos textos de andlise critica citados no item anterior.' Penso que no Brasil os impasses quanto a adesio a pratica tradici- onal antropolégica da pesquisa ctnografica (tanto na tradi¢do funcionalista, quanto na histéricc -culturalista) integrando-a e conceben- do-a em novos esquemas interpretativos nao positivistas foram rapida- mente assimilados, pois respondiam a uma demanda importante dos estudos antropolégicos locais buscando tratar de um pais complexo e heterodoxo, marcado pela dialética do tradicional e moderno. Em grande parte as tentativas de saldar este embaragamento vém sendo buscadas de forma saudavel na multidisciplinaridade. Seja fazen- do pesquisa no mundo indigena, no mundo agrario ou na cidade, o en- contro etnografico é discutido e rediscutido a partir de diferentes pris- mas antropoldgicos, por si s6 ja interdisciplinares, mas num recurso a meu ver constante com a sociologia, psicandlise, histéria, politica, macro micro economia etc, Em grande medida a qualidade da nossa Antro- pologia se reflete niio sé na diversidade de temas, mas também no fato de a produgao académica, em grande parte, nao se radicalizar em um método, ou em uma teoria antropolégica, experienciando instrumentos metodolégicos ¢ teorias sob uma dtica interdisciplinar mais ou menos eficaz para 0 estudo de problemas brasileiros. Assim & que Da Matta pode estudar tanto os indios Apinayé aplicando o método estruturalista, como 0 carnaval carioca, quando busca recursos analiticos nas diferen- tes disciplinas humaniticas (politica, sociologia, antropologia, na filo- Anos 90 22 Ee sofia e mesmo na literatura) e Roberto Cardoso pode relacionar o mundo indigena ao mundo dos brancos, propondo pensar as relagées entre etnia e classe social como uma “fricgdo interétnica” (influéncia do materialis- mo hist6rico), avancando a entio ja limitada busca de explicagdes difusionistas, culturalistas e funcionalistas. Tanto fazendo antropologia no meio indigena como na cidade, pode-se sugerir que no Brasil, boa parte das produgdes antropolégicas, durante a década de 70 e 80, buscam nao so captar totalidades sdcio- culturais e desvendar sistemas de significados num sentido sécio-antro- poldgico, mas relacionar a estes enfoques os processos de producio his- t6rica e a dindmica vinculada a estrutura de poder. Busca-se “desconstruir” concepgGes obsoletas sobre a sociedade brasileira atra- vés de uma revisao critica ao funcionalismo positivista, elaborada pri- mordialmente pelos sociélogos ¢ incorporada pelos antropélogos (Durhan, Sigaud, Cardoso de Oliveira, Caldeira, Zaluar, Leite Lopes, Velho, Da Matta, Dias Duarte, Carneiro Cunha etc). O estudo antropalégico no Brasil em geral nasce de uma experién- cia etnografica interpretativa e n&o raro da construgéio de uma critica cultural (critica “a énfase no entendimento das culturas nos seus prépri- ‘os termos ¢ o distanciamento dos contextos culturais”"), No que diz respeito aos estudos na cidade, a énfase maior recai sobre os temas de cultura popular, etnia, religiao, identidade, género, familia, sociabilida- de, territorialidade etc, salientando as representagdes “interpretadas”. Menos do que explicados, sio interpretados. As representagées sfio aqui vistas como sistemas simbélicos, cabendo ao pesquisador compreendé- los na interioridade de campos semanticos identificaveis nas dimensdes n&o de uma exclusiva subjetividade, mas de uma intersubjetividade.' Pode-se avaliar (correndo-se sempre algum risco) que a produgio antropolégica dos tiltimos dez anos tem buscado superar este impasse de nao passar unicamente uma visao colada a realidade imediata ¢ & experiéncia vivida das populagées pesquisadas, procurando apreender o modo pelo qual os fenémenos estudados sfio produzidos, incluindo a contextualizagdo da construgao de experiéncia etnografica e o produto final da etnografia,' E aqui que a aproximagio com a histéria é fundamental para a Antropologia brasileira. Penso, como Durhan, que 0 trabalho etnografico é extremamente rico, mas no podemos nos contentar em reconstruir as sombras que essa histéria projeta na consciéncia dos homens (referin- do-me aos estudos de representagiio). Devemos, sim, aprender a rela- gio entre ago ¢ representacio, “relagdo que permeia necessariamente 26 Anos 90 toda a discussGo sobre anatureza da dindmica cultural (...) desse modo, a prdtica social adquire forma e sentido, mas ndo é estritamente deter minada, admitindo-se todo um espago de arbitrio, criatividade, impro- visagdio e transformagao”.'* Acredito que em grande parte o expressivo consumo da produgio antropoldgica deveu-se ao rico desvendamento da situagao de vida de brasileiros, tendo também uma forga politica de demincia e de negocia- ¢4o por um maior reconhecimento humanitario por parte das estruturas de poder de grupos econémica ¢ politicamente desfavorecidos. Isto por- que a Antropologia no Brasil iniciou uma tradicaio que nao esta de todo superada, a de elucidar as visiveis e incompreendidas contradigdes de um pais terceiro mundista mas moderno, etnicamente miltiplo e idealmente branco, politicamente democratico ¢ socialmente injusto, um pais que se quer sério ¢ vanguardista obrigando a maioria a rir dos infindaveis erros éticos de politicos ou sugerindo a passividade frente a crimes humanitarios. A Antropologia, como outras areas afins, tem se instrumentalizado justamente para dar conta desta realidade ao mesmo tempo especifica e dialeticamente produzida num ambito internacional. PETITE FINALE Os limites rondam as técnicas ¢ teorias antropolégicas que jazem na observagaio do comportamento, na interpretacao do vivido, na trans- crigdo de praticas culturais, Propde-se a constante busca de um esforco interdisciplinar, para ver além do circunstancial e analisar as forgas subjacentes que dao forma as cotidianidades vividas, elucidando sobre as estruturas profundas, os sistemas de significado, as forgas contra- estruturais que colocam as pessoas em certas relagdes entre si, a criatividade humana. A Antropologia brasileira tem produzido seu conhecimento a par- tirdos paradigmas que assinalei, buscando na enriquecedora tenstio destes paradigmas, abrir um espago salutar de negociagiio por lentes tedricas apropriadas para interpretar a situagdo brasileira na modernidade que ainda “ndo se esgotou”"’. Talvez esteja exagerando na minha positividade, mas reivindico como tarefa, aqui, o exercicio de uma certa sedugio antropolégica. Quanto a proposta dos intelectuais ditos pés-modernos, com uma etnografia modernista, n4o é tanto em torno de discutir se estiio corretos ou nao, se est&o utilizando os termos corretos ou nfo, que penso que Anos 90 27 ce devemos concentrar nossos esforgos, mas em dimensionar os aspectos criticos que estes autores apontam, a respeito de referenciais tedricos e, sobretudo, a respeito de uma ética que recoloca em questo “contradi- ¢des embutidas na pesquisa e elaboragdo de etnografias” e “que tor- nam o etnégrafo vulneradvel a uma parte critica da sua propria é ca”.!°7 Em acréscimo, concordo com Cardoso de Oliveira quando diz: “C..) amim me parece que tal tensdo, que nos dias atuais é a caracteris- tica maior de nossa matriz disciplinar, ja é em si mesma um indice eloqiiente de sua modernidade”'™., Por fim, nao se trata de destruir uma ordem cientifica estabelecida, mas “desconstruir” a ordem para melhor avaliar nossos papéis na cons- trugdio de uma temporalidade mais humanitaria. NOTAS E REFERENCIAS 1. CALDEIRA, 1988. p, 133. 2. CLIFFORD, James.” 986. p. 4. Apud PEIRANO. 1985. p. 252. 3. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p."15. 4, CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 15. 5. Agradego a Fapergs o financiamento de passagem para participagiio deste evento cientifico. 6. SAHLINS. 1988 p. 53. 7. SAHLINS. 1988. p. 49. Sahlins refuta uma teoria do sistema mundial. “Uma histéria do sistema mundial deve, portanto, descobrir a cultura mistifica- da no capitalismo”. In: SAHLINS. 1988. p. 49. 8. “(...) 0 relativismo cultural, ao marcar a diferenga entre as culturas, ao enfatizar a unidade de cada uma delas e a impossibilidade de que uma fosse avaliada em fungio dos valores e da visdio da outra, acabou parado- xalmente dificultando que os antropélogos trabalhassem com o fato da diferenga de uma maneira que nao fosse para acentuar a disténcia entre as culturas. As diferengas acabaram sendo tao marcadas que ficou cada vez mais dificil fazer com que uma cultura falasse a outras em termos criti- cos.” CALDEIRA. 1988. p. 140. 9. “O tema fundador neste itinerdrio da histéria da Antropologia é 0 Homem, sua origem, suas praticas culturais e expressdes sociais, num sistema progressivo promovido pelo sentimento de propriedade que aparece na obra de Morgan, por exemplo, em 1877 (Sociedade primitiva) nas suas pressuposigGes sobre a consangtiinidade e sistema de filiagao”. AUZIAS. 1976. p. 29 10. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988, 11. Para Mauss, o método antropolégico consistia em explicar “o que as pesso- as créem e pensam, e quais sao os que créem e pensam™. LEVI-STRAUSS. In: MAUSS. 1985. 28 Anos 90 12. Nesse contexto “o outro ¢ a sua cultura eram distanciados e definitiva- mente apresentados como diferentes. A diferenga nao era mais de estagi- os de evolugao, mas de perspectiva. O ponto de vista nativo, ao se repro- duzir 0 seu contexto especifico, nao poderia mais ser incorporado ao da cultura do antropdlogo e de seus leitores. No maximo, os pontos de vista poderiam ser justapostos pelo antropdlogo, este ser privilegiado que se movimenta entre dois mundos, que conhece o estranho, descobre seu ca- rater corriqueiro, ¢ traduz essa perspectiva diferente para os leitores de sua propria cultura. A partir de Malinowski, os antropdlogos tém que criar em seus textos uma consciéncia sobre a diversidade do mundo. Eles tém que criar uma ‘ficgdo persuasiva’ (Strathern 1987) sobre um outro que é radicalmente diverso”. In: CALDEIRA. 1988. p. 140. 13. SAHLINS. 1979. p. 10. 14, “Culturas eram totalidades que deveriam ser recompostas pelo antropélo- go e descritas como tais, embora no se apresentassem a experiéncia des- sa maneira”. CALDEIRA. 1988. p. 137 15. Para construir uma realidade holistica, as etnografias clissicas usaram. “uma série de convengées textuais: Marcus e Cushman (1982) apontam nove delas: 1) nas etografias classicas 0 texto esta em geral estruturado seqtiencialmente, apresentando as unidades nas quais considerava-se que as culturas (ou sociedades) estavam divididas. 2) O antropdlogo, para ga~ rantir a cientificidade ¢ a neutralidade de seu texto, retirava-se do texto. Simples observador, nao usa a primeira pessoa (...), mas expressa sua autoridade em uma 3° pessoa coletiva (...). O resultado desse seu afasta~ mento do texto (...) € paradoxal, ja que a legitimagio da autoridade depen- de também da exposigio da experiéncia do antropélogo. 3) Essa exposi- g&o ¢ relegada a posigdes marginais no texto, como apéndices, prefacios, notas de rodapé etc, e é acompanhada da publicagio de fotos, mapas e desenhos, que reafirmam o sentido de realidade e a presenga do antropé- logo no lugar pesquisado. 4) 0 individuo nao tem lugar na etnografia rea- lista: fala-se do povo em geral, ou de individuos tipicos. 5) para enfatizar © carater de realidade das vidas retratadas, acumulam-se detalhes da vida cotidiana. 6) pretende-se apresentar ndo o ponto de vista do antropélogo, mas 0 ponto de vista nativo, idéia que se assenta no pressuposto de que esse ponto de vista existe pronto para ser representado no texto. 7) apesar de cada trabalho de campo ser muito especifico, nas etnografias tendeu-se a generalizagdes; o que era particular rapidamente vira tipico, ¢ assim se distancia a experiéncia de campo (sempre particular) do texto. 8) usa-se 0 jargao exigéncia cientifica. 9) faz-se a exegese de termos e conceitos nati- Vos (...) ¢ reafirma-se 4 competéncia lingiiistica do antropélogo.” CAL- DEIRA. 1988. p. 138. 16. LEVI-STRAUSS. In: MAUSS. 1985. 17. LEVI-STRAUSS. In: MAUSS. 1985. 18. Estes paradigmas “sobrevivem, vivendo um modo de simultaneidade, onde Anos 90 29 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31, 30 todos valem a sua maneira (prépria de conhecer), 4 condigao de nao se desconhecerem uns aos outros, vivenciando uma tensfio da qual (...) ne- nhum dentre nés pode se furtar de levar em conta na atualizag&o compe- tente de sua disciplina e de seu ensino”. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 23. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 15. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 19. Geertz (tb. em D. Schneider) considera a cultura como sistemas simbdli- cos, “nao um complexo de comportamentos concretos mas um conjunto de mecanismos de controle, planos, receitas, regras para governar 0 com- portamento”; para isto “refuta a idéia de uma forma ideal de homem, de- corrente do iluminismo e da antropologia classica, (...) e tenta resolver 0 paradoxo (...) de uma imensa variedade cultural que contrasta com a uni- dade da espécie humana”, LARAIA. 1987. p. 63. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 19. “O paradigma subjacente a essa ‘antropologia interpretativa’ pode ser cha- mado de hermenéutico.” CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 97. “A fusio de horizontes implica que na penetragao do horizonte do outro, nao abdicamos de nasso préprio horizonte. Assumimos nossos preconcei- tos. (...) E somente nesta tensfo entre o outro e cu mesmo, entre o texto do passado ¢ 0 ponto de vista do leitor que o preconceito se torna operante, constitutivo da historicidade.” CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 21. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 97. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 97. Sahlins toma como “qualidade distintiva do homem nao o fato de que ele deve viver num mundo material, circunstancia que compartilha com to- dos os organismos, mas o fato de fazé-lo de acordo com um esquema de significado criado por si préprio, qualidade pela qual a humanidade é wnica”. E a cultura que constitui a utilidade; toma por qualidade decisiva da cultura “nao o fato de essa cultura poder conformar-se a pressdes mate- riais, mas 0 fato de fazé-lo de acordo com um esquema simbdlico defini- do, que nunca € 0 tinico possivel”. SAHLINS. 1975. p. 8. “Para Mauss, a nogio de inconsciente parecia indispensdvel para explicar nao apenas a categoria, mas igualmente o costume, os habitos em geral”. CARDOSO DE OLIVEIRA, 1988. p. 38. Uma vez “que dizer que o fato social € total nfo significa apenas que tudo © que é observado faz parte da observagao, mas também, e principalmen- te, que em uma ciéncia em que o observador é da mesma natureza que o seu objeto, o observador &, ele mesmo, parte de sua observagao”. LEVI- STRAUSS. In: MAUSS. 1985. p. 16. DURHAN. 1974, “(..) no que é seguido por Dumont que A semelhanga de Mauss, agrega a dimensiio do inconsciente aos ‘elementos de base da ideologia’” CARDO- SO DE OLIVEIRA. 1988. p. 45 Anos 90 32. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 45. 33. PEIRANO. 1985. p. 261 34. “Ele trabalha privilegiadamente o nivel da sintaxe”. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 41, 35, AZZAN JUNIOR. 1993. p. 52. 36. AZZAN JUNIOR, 1993. p. 52. 37. O estruturalismo “contribui para recolocar a importincia da dimensio sim- Délica da vida social, pelo biais do conceito de estrutura que se coloca no proprio cerne dos fendmenos culturais, pois implica o reconhecimento de uma l6gica propria da produgao simbélica”. DURHAN, 1984. p. 9. 38, LARAIA. 1987. p. 62. 39. “O pensamento € ‘coisa social’ (niio 4 maneira durkheiminiana como algo exterior ao antropdlogo) e deve ser empiricamente levado a efeito pela via da interpretago; essa “coisa social’ ¢ transcrita no horizonte do sujeito cognoscente””. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 21. 40. “Por outro lado, a metafora também é usada para sugerir uma vista geral, cuja vantagem sobre uma que fosse ‘localizada’ - como qualquer tipo de local knouwledge, para lembrar Geertz - bem poderia ser expressa na vantagem que leva aquele que analisa um mapa, em relagao aquele que olha dircto para 0 chiio sob seus pés. Mas, claro, o primeiro s6 leva vanta- gem se 0 objetivo for o conhecimento da geografia do pais, nfo o tipo de solo onde pisa...”. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 52. 41, CARDOSO DE OLIVEIRA. 1983, p. 197. 42. DURHAN. 1984 43. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. . AZZAN JUNIOR. 1993. 45, AZZAN JUNIOR. 1993. p. 16-17. 46. LARAIA. 1987. p. 64. 47. GEERTZ Apud. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 15. 48. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 22. 49, Para Geertz “é na parte e no no todo que reside o cariter diferenciador para anilise, pois que se preocupa com a positividade”. AZZAN JUNIOR. 1993, p. 21. 50. Em Geertz, “o que se generaliza nao € uma regularidade, mas um conjunto de diferencas, ¢ por isso mesmo tal generalizagao acaba por particularizar 0 objeto. O principio € o da indugao, pois esse processo consiste no estabe- lecimento de uma verdade a partir de dados singulares, nao representati- vos de qualquer generalidade. Ou seja, representam apenas sua propria significagfio. Nao remetem a uma estrutura ou a um cédigo”. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 18-21 51. “Desse modo, se Lévi-Strauss supde que a significagiio é 0 produto das relagdes dos termos entre si, num sistema, se supde que 0 acesso a essa significagao se da através de um cédigo, regulador de tais relagdes, ¢ que deve, portanto, ser decodificado; supde também que a relagao que interes- Anos 90 31 53. 54. 55. 56, 57. 58. 59. 60. 61 62. 32 . “A semidtica aborda a dissocia . KAPLAN e MANNERS. 1981. p. 267. sa desvendar se situa entre identidades abstratas de fendmenos similares. No entanto, para Geertz, o interesse ndo esta na relagdo dos termos, nem no sistema, mas no proprio termo enquanto individualidade. Seu pressu- posto mais importante € 0 de que - como o que importa é a leitura ¢ 0 sentido - a cultura ndo se resolve numa estrutura, e assim nao interessa saber o cédigo e sim a escritura, o texto. Este deve ser lido e nao decodificado. Nele Geertz busca ‘relagdes sistematicas entre fendmenos diversos.” Nao ha cddigo que regulamente essas relacdes aqui, somente significagdes.” AZZAN JUNIOR. 1993. p. 17. da linguagem em elementos significati- vos; a semantica, a reconstrugdo do sentido no redutivel apenas a esses elementos. (.,.) a semiética guarda alguma semelhanga aos procedimen- tos explicativos e a semantica, aos compreensivos (...) Ricoeur, a explica- gdo e a compreensdo formam uma realidade dialética, complementando- se entre si. Pode-se dizer, portanto, que a semidtia supde uma semantica tanto quanto a semantica no prescinde da semiética. A relagio dialética parece ser a mesma”. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 28/29. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 15. Embora Geertz se diga hermenéutico, ele ainda nao a pratica realmente. Geertz confunde sua antropologia compreensiva com hermenéutica, nao é de se estranhar que confunda-se esta ainda com a empirica. AZZAN JUNIOR, 1993. p. 39 “Se 0 que aprendemos com Ricoeur puder ser tomado como paradigmatico e, de fato, as antropologias de Lévi-Strauss ¢ de Geertz puderem ser mes- mo tomadas como explicativa e compreensiva respectivamente, entdo a mesma complementaridade entre esses conceitos haveré também entre essas antropologias. Ocorre, porém, como fica claro na teorizactio de Ricoeur, que explicagdo ¢ compreensdo s&o termos complementares, antipodas, e é somente numa espécie de superagdo sintética desses tipos de inteligéncia que a interpretagdo hermenéutica se da. O Circulo hermenéutico (que comega com Dilthey) é reapropriado por Ricoeur e pretendido até mesmo por Geertz, (...) Nesse sentido, se as antropologias siio mesmo explicativa e compreensiva, deve haver, para a superagio des- ses dois tipos de inteligéncia que representam, um terceiro, também sur- gido da interagdo dialética entre elas.” AZZAN JUNIOR. 1993. p. 37. AZZAN JUNIOR. 1993. p. 39-40. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 22. FISCHER. 1983. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p.102-3 KAPLAN e MANNERS. 1981. p. 267. “Esta abordagem antropoldgica tem se distinguido pelo estudo dos sistemas de classificagao de folk (classificacao popular) isto é, a anilise dos mode- los construidos pelos membros da comunidade a respeito de seu préprio Anos 90 71. 72. 73. 74. 75. 76. 77. 78. 79. 80. 81. 82. universo. A cultura é vista como sistema cognitivo, assim para Goodenough, cultura é um sistema de conhecimento”. LARAIA. 1987. p. 62-64. . KAPLAN e MANNERS. 1981. p. 273 . LEPINE. 1979. p. 10. . SAHLINS. 1979. p. 9 e 10. . KAPLAN e MANNERS. 1981. p, 275 . KAPLAN ¢ MANNERS. 1981. p. 273-274-275, . KAPLAN ¢ MANNER: . CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 100. . “Ter como modelo nao significa necessariamente transcrever dialogos, 1981. p. 273 embora alguns autores tenham interpretado isso literalmente. A idéia é representar muitas vozes, muitas perspectivas, produzir no texto uma plurivocalidade, uma ‘heteroglossa’, e para isso todos os meios podem ser tentados: citagdes de depoimentos, autoria coletiva, “dar voz ao povo’ ou 0 que mais se possa imaginar. O objetivo final, no que diz respeito ao autor, seria fazer com que ele agora se diluisse no texto, minimizando em muito a sua presenga, dando espago aos outros, que antes sé apareciam através dele”. In: CALDEIRA. 1988. p. 141. ‘Aqueles que tomary. como seu ‘outro’ os textos etnograficos”. CALDEI- RA, 1988. p. 135. DWYER. 1982. p. 281 Apud PEIRANO. 1985. p. 252. “Assim que o dialogismo e a polifonia sao reconhecidos como modos de produgiio textual, a autoridade monofénica é questionada, aparecendo como caracteristica de uma ia que pretendeu representar culturas”, CAL- DEIRA. 1988. p. 142. “Hoje em dia existe um esforgo animado no sentido de ligar 0 local das detalhadas observacées etnogrificas ao trajeto da histéria, dentro do qual pode ser explicado por referéncia as suas origens, ndo no sentido genérico da antropologia antiga, mas dentro do quadro da narrativa histérica.” MARCUS, 1989, p, 12 € 14, CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988, p, 99 TRAJANO. 1986. p. 134. PEIRANO. 1985. p. 254. PEIRANO. 1985. p. 253. TRAJANO. 1986. p. 134. “As estratégias modernistas para uma etnografia se articulam com as idéias foucaultianas e gramscianas quanto a encenagiio das relagdes de poder nas cognigées, ideologias e discursos - entendidos como VOZES aqui - cultu- rais.” MARCUS, 1989. p. 22 e conclusao. CLIFFORD. 1986. p. 4. Apud PEIRANO. 1985. p. 253. “Partilhando das caracteristicas comuns a todos os encontros: ele é ‘recursivo’ - seu significado em qualquer momento depende daquele que 0 precedeu -; ‘contingente’ - 0 confronto pode ser interrompido a qualquer momento; e ‘engajado” - no sentido de que é vinculado a forgas especifi- Anos 90. 33 cas que transcendem atividades puramente pessoais (Dwyer, 1979:215)”. PEIRANO, 1985. p. 253. 83. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 23 84. TRAJANO. 1986. p. 135. 85. Rabinow, por exemplo, “examina a tendéncia de pensar a etnografia como texto e as estratégias neste caso adotadas: discute a questéo da autoridade etnografica, o surgimento de uma meta-antropologia e os conceitos didlo- go e polifonia. Rabinow relaciona esta nova tendéncia com o surgimento de uma crise da representag’io e com a emergéncia de uma cultura pés- moderna.... um evento hist6rico especifico e localizado... tem uma visao critica da cultura pés-moderna e dos debates, a partir desta perspectiva, acerca da escrita etnografica”. p.135 86. MARCUS. 1989. p. 15 87. PEIRANO. 1985. p. 261. 88. DWYER, 1979 ¢ CLIFFORD, 1986 Apud. PEIRANO. 1985. p. 254. 89. PEIRANO. 1985. p. 254. 90. MARCUS. 1989. p. 10, 11, 12, 14. 91. MARCUS. 1989. p. 20. 92. Argumentam os pés-modernos que “o que se acabou sendo produzindo nos textos foi uma visio deformada tanto das culturas, quanto da experiéncia do antropélogo junto a outras culturas. Muito estaria sendo perdido ou sendo substancialmente modificado na transformagéo que ocorre entre a pesquisa de campo e o texto. O que era uma experiéncia de campo frag- mentada e diversa acaba sendo retratado como um todo coerente e inte- grado.(...) O que era um processo de comunicagio, de troca, de negocia- cdo entre o antropélogo e seus informantes, vira algo auténomo (didrios de campo, graficos de parentesco, mitos etc). O que era um didlogo, vira um mondlogo encenado pelo etnégrafo, voz tinica que subsume todas as outras e sua diversidade a sua propria elaboragdo. O que era interagio vira descrigao, como se as culturas fossem algo pronto para ser observado descrito. E por isso nos textos as imagens sfio sobretudo visuais, em detri- mento de imagens que enfatizem a fala ou a audigaio (Fabian 1983). “Apa- gam-se as relac@es inter-pessoais e generaliza-se o nativo. Para usar uma expressdo de Clifford (1983), 0 que era discursivo vira puramente textu- al”. CALDEIRA. 1988. p. 138. 93, PEIRANO. 1985. p. 262. 94, PEIRANO. 1985. p. 263. 95. TRAJANO. 1986, p. 150. Ver tb. p. 143. 96. CALDEIRA. 1988. p. 141. Ver tb. p. 143. 97. CALDEIRA. 1988. p. 144. 98. CALDEIRA. 1988. p. 144. 99. MARCUS. 1989 (conclusio). 100. Refiro-me aos textos de PEIRANO, CALDEIRA, TRAJANO, CARDO- SO DE OLIVEIRA, etc. 34 Anos 90 101. Nem sempre 0 produto antropolégico conseguiu escapar da “armadilha positivista” ou de deslizes semanticos, como o coloca Durhan, denuncian- do trabalhos antropolégicos que utilizam conceitos como ideologia, hic- rarquia etc, desvirtuando-os de sua matriz. original, esvaziando-os de sua conotagao politica. 102. CALDEIRA. 1988. p. 140. 103. “Ea estas alturas j4 estariamos falando de uma antropologia hermenéutica, cujo programa se funda numa recuperagao do conceito de cultura, adotan- do-se a nogio de bildung”. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. 104, Aproveito para incluir aqui as dissertagdes de mestrado defendidas no PPG de Antropologia da UFRGS, quando penso nos trabalhos das colegas Ana Luiza Rocha (sobre mulheres separadas), Ondina F. Leal (sobre re- cepgaio de mensagens televisivas), Carmen Silvia Rial (sobre a comunida- de da Lagoa da Conceigao) e minha prépria dissertag4o sobre mineiros de carvao em Charqueadas. 105. DURHAN. 1984. 106. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 102. 107. MARCUS. 1989. Conclusio 108. CARDOSO DE OLIVEIRA. 1988. p. 110. 109. DERRIDA apud MARCUS. 1989. Conclusao BIBLIOGRAFIA AZZAN JUNIOR, Celso. Antropologia e interpretagdo. Explicagdo e compre- ensdo nas Antropologias de Lévi-Strauss e Geertz, Campinas, Ed. UNICAMP, 1993. CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. A presenga do autor e a pés-modernidade em Antropologia. NOVOS ESTUDOS CEBRAP. n° 21, julho 1988. CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto.’Enigmas e solugdes. Rio de Janeiro/For- taleza: Tempo Brasileiro/UFCe, 1983. CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. Sobre o pensamento antropolégico. Brasilia, Tempo Brasileiro, 1988, DURHAN, Eunice. “Antropologia hoje: problemas e perspectives Painel Cultura ¢ Ideologia, PPG UFRGS, GEAS, 1984. DURHAN, Eunice. “Cultura e Ideologia”. ANPOCS, Belo Horizonte 1974, FISCHER, Michael M. J. Da antropologia interpretativa antropologia critica, Anuario Antropolégico 1983, Tempo Brasileiro/UnB KAPLAN e MANNERS. Teoria da Cultura, Rio de Janeiro, Zahar, 1981. LARAIA, Roque de Barros. Cultura, um conceito antropolégico. 2.ed, Rio de Janeiro, Zahar, 1987, MARCUS, George EF. “Identidades passadas, presentes e emergentes: requisi- tos para etnografias sobre a modernidade no final do século XX ao nivel mundial.” Tradugio do original (por I. Boaventu ast, Present, and Emergent Identities: requirements for ethnographies of Late Twenticth mimeog. Anos 90 35

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