Nas suas obras critica a sociedade do seu tempo, pondo a descoberto muitos dos
vícios e hábitos das várias classes sociais. Por isso se considera a sua obra um
espelho, porque reflete fielmente a sociedade do século XVI. Criticava,
nomeadamente:
Comédias;
Farsas;
Moralidades.
Autor de transição
Gil Vicente tem mantido bastante da sua atualidade uma vez que, dominado por
um espírito reformador e satírico, observava a sociedade e o comportamento de
típicos grupos humanos que ainda hoje persistem.
A. Características medievais:
a. Linguagem popular e arcaica;
b. Linguagem individualizada – própria da categoria das
personagens que falam;
B. Características clássicas:
a. Sátira irreverente, mas moralizadora;
b. Entusiasmo nacionalista;
c. Crítica alheia a superstições, em particular:
i. À questão das indulgências;
ii. À classe sacerdotal (a caça, a mancebia, o desleixo no
cumprimento das suas obrigações).
d. Compreensão dos problemas sociais, insurgindo-se contra a
materialização da época;
e. Pelas referências mitológicas e clássicas;
f. Por algumas tentativas formais: a divisão em quadros; o prólogo
em algumas peças.
Estrutura
A Farsa de Inês Pereira é uma das peças de Gil Vicente melhor estruturadas, uma
das suas obras-primas, que podemos dividir em sete momentos:
Personagens
Inês Pereira
Pêro Marques
Com a sua estupidez não só é um ser feliz, mas espalha felicidade à sua volta.
Representa na peça o papel de «asno» que leva a mulher às costas, de visita a um
antigo pretendente. Através do seu trabalho conseguiu amealhar alguns bens.
Proveniente do universo rural e desconhecedor das regras de convivência, cai no
ridículo, não só pelo modo como se veste, mas também pela maneira de falar e
agir (senta-se na cadeira ao contrário e de costas para Inês e sua mãe). É a
personagem cómica da peça.
É uma figura muito importante na peça, que contrasta com Pêro Marques. É fácil
concluir da elegância, da cultura, da astúcia e finura do Escudeiro em contraste
com a simplicidade bronca, a ignorância e a inadaptação de Pêro Marques.
O Escudeiro, pobre e cobarde, ostenta perante Inês qualidades que não tem.
Antes de casar, apresenta-se como um grande senhor, rico, culto e bem falante.
Depois de casar revela-se um tirano mesquinho que deixa a esposa à guarda do
criado e parte para África com o objetivo de ser armado cavaleiro. O Escudeiro,
candidato a cavaleiro em África, acaba por ser morto por um mouro pastor,
quando fugia. O candidato a cavaleiro deserta do campo de batalha, morrendo
às mãos de um pastor e não em combate, como seria normal.
Lianor Vaz
É ela a emissária de Pêro Marques, que traz a sua carta de apresentação a Inês,
dotada de grande capacidade de persuasão, experiência e oportunidade no
desempenho do seu papelo de comadre casamenteira. Faz também um pouco o
papel de confidente e ajuda-nos a conhecer os sentimentos e intrenções de Inês e
de Pêro. Lianor é uma figura de apreciável valor moral, com bons e subtis
conhecimentos da sua «arte».
Mãe
Enquanto Pêro Marques é apresentado a Inês por Lianor Vaz, uma comadre
casamenteira de características populares, conhecida da mãe da protagonista, o
Escudeiro chega à presença de Inês pela mão dos judeus casamenteiros, que são
talvez as figuras psicologicamente mais bem tratadas da farsa. Não são imorais,
mas amorais. Conheciam bem os defeitos do Escudeiro, mas também não
ignoravam que Inês era preguiçosa, vaidosa e leviana. Por isso zombam dos dois,
jogando com os seus defeitos. As suas palavras, proferidas umas atrás das outras,
elogiam e depreciam ao mesmo tempo, revelando um pessimismo consciente
sobre os homens. Têm externamente uma atitude bajuladora, mas na verdade as
suas afirmações podem ser entendidas como críticas severas e justas. Inteligentes
e voluntariosos, adaptam-se a todas as atividades e vingam-se, de forma discreta,
de séculos de perseguição. Na sua versatilidade estão mais próximos da
alcoviteira típica do que Lianor Vaz.
O Moço
Fernando e Luzia
São uma espécie de ideal de vida: simples, amigos, sem ambições, sem maldade.
As suas palavras são de amizade e de esperança, mas as suas canções são de
desencanto e morte.
Ermitão
O eremita era uma pessoa de profundos sentimentos religiosos que vivia num
ermo para se dedicar exclusivamente ao serviço de Deus e à salvação das almas.
Porém, muitos falsos eremitas se aproveitaram da fé e da ingenuidade dos
crentes, sendo, por isso, falsos religiosos, parasitas e mentirosos. Tudo leva a crer
que o nosso Eremitão pertence a este tipo.
A – O espaço:
B – O tempo:
Por outro lado, só uma vez há referência concreta ao tempo, quando Inês recebe
uma carta de Arzila anunciando a morte do Escudeiro e o Moço lhe diz que o seu
amo partira para África há três meses.
Passagem do tempo:
o Inês solteira / fantasiosa a ascensão;
o Inês malcasada a queda;
o Inês viúva a libertação;
o Inês casada a vingança.
Tempo histórico: finais da Idade Média;
Tempo narrativo: desencontro com o tempo cronológico
(a passagem de três meses não é explicitamente percebida);
Desconhecimento e/ou desprezo da lei das três unidades (unidade de
espaço; unidade de tempo e unidade de ação).
A – A ironia:
Alguns exemplos:
B – A criação de tipos:
C3 – Cómico de linguagem:
A linguagem
Recursos expressivos